PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: PERCEPÇÕES ATRIBUÍDAS POR GESTORES SOBRE A NÃO OFERTA DOS SERVIÇOS NA REGIÃO METROPOLITANA DE GOIÂNIA
Tipo de documento:Dissertação de Mestrado
Área de estudo:Medicina
Os dados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas, que foram gravadas, transcritas e analisadas tematicamente, com o auxílio do software Nvivo 11. Da análise dos dados emergiram três categorias empíricas, sendo elas: a categoria temática do desconhecimento das PIC e da PNPIC. Dos 24 entrevistados 16 não conhecem as PIC e a PNPIC; quatro conhecem as PIC; e três conhecem a PNPIC. Entre as percepções atribuídas destacam-se: desconhecimento das PIC, dificuldade de conceituá-las e inquietação por não as conhecer. A segunda categoria temática foi Potencialidades e Fragilidades para implantação das PIC na APS, que diz respeito sobre fatores que facilitam e dificultam a oferta de PIC, apresentando que há fragilidade nas condições de trabalho para a oferta de PIC.
Of the 24 respondents, 16 did not know about the ICPs and NPICPs; four knew about the ICPs; and three knew about the NPICPs. Among the attributed meanings are lack of knowledge about the ICPs, difficulty to conceptualize them and uneasiness for not knowing much about them. We have come to conclusion that PHC service managers in the MRG who do not provide ICP do not attribute specific meanings to such practices, as they ignore their existence and the policy that advocates their implementation in the UHS. The implications of this lack of knowledge are the invisibility of these practices in PHC services; confusing and prejudiced concepts about ICPs, as well as social humiliation for those who use it as well as those who provide it. The second thematic category was Potentialities and Weaknesses for the implementation of ICPs in PHC, which concerns factors that facilitate and hinder the provision of ICPs, showing that there is weakness in working conditions for the provision of ICPs.
Anteriormente, houve a discussão acerca das Práticas Integrativas e Complementares (PIC), definidas como Medicinas Tradicionais e Complementares/ Alternativas pela OMS, realizada na Primeira Conferência Internacional de Assistência Primária à Saúde, em 1978, que resultou na Declaração de Alma Ata (BRASIL, 2009). Nesse cenário, surgem as recomendações iniciais para a implementação das medicinas tradicionais e práticas complementares nos sistemas nacionais de saúde (BRASIL, 2009). No tocante ao conceito de Medicina Tradicional, ele foi adotado pela OMS com base em diversas práticas médicas e conhecimentos sobre saúde usados de acordo com a cultura de cada país. Essa medicina tem o objetivo de diagnosticar, tratar e prevenir enfermidades, buscando o bem-estar das populações (OMS, 2002). Por outro lado, no caso dos países em que o sistema de saúde tem como base o modelo biomédico, a Medicina Tradicional é definida como Medicinas Tradicionais/ Complementares e Alternativas (MTCI), significando um conjunto de ações terapêuticas diversa da biomedicina ocidental.
É neste percurso que a Medicina Complementar se apresenta como resposta em curso aos limites e lacunas paradigmáticas, diagnóstico-terapêuticos e políticos da biomedicina contemporânea e, em especial, do sistema de saúde pública brasileiro. Na verdade, o estímulo ao uso das PIC potencialmente amplia o pluralismo médico, conforme elas são transportadas para o âmbito dos serviços públicos, sobretudo com reconhecida legitimidade sanitária (ANDRADE; DA COSTA, 2010). Diante de um contexto com recomendações e diretrizes da OMS, como também das demandas das conferências nacionais de saúde, o Ministério da Saúde (MS) aprova, em 2006, como resposta à essa conjuntura, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), pela Portaria Ministerial nº 971 (BRASIL, 2006; BRASIL, 2015). Inicialmente, a PNPIC contemplava cinco PIC para os serviços de saúde no SUS: a Homeopatia, a Fitoterapia e Plantas Medicinais, Medicina Antrosófica, Termalismo Social e Crenoterapia e a Medicina Tradicional Chinesa (MTC/Acupuntura).
Mais atualmente, com as Portarias nº 145/2017, nº 849 (2017) e nº 702/2018, ampliou-se para mais vinte quatro práticas, totalizando 29, incluindo: a Arteterapia, Ayurveda, Biodança, Dança Circular, Meditação, Musicoterapia, Naturopatia, Osteopatia, Quiropraxia, Reflexoterapia, Reike, Shantala, Terapia Comunitária Integrativa, Yoga, Aromoterapia, Apiterapia, Bionergética, Constelação Familiar, Cromoterapia, Geoterapia, Hipnoterapia, Ozonioterapia, Terapia de Florais, dentre outras (BRASIL, 2017a). O estado de Goiás instituiu a Política Estadual de PIC na rede pública estadual de saúde, por meio da Lei Nº 16. de 23 de setembro de 2009. Embora exista uma lei instituindo a política no estado, isso não garante a implantação e oferta dessas práticas nos serviços de APS, justificando-se, portanto, estudos que tenham como objetivos descrever o cenário das PIC no sistema público de saúde, em especial, no estado de Goiás.
De acordo com Spagnuolo e Baldo (2009), a escassez de estudos sobre PIC tem se constituído um entrave para a PNPIC, de modo que eles relatam que a inclusão dessas práticas tem ocorrido de forma gradual, já que existe pouco conhecimento sobre elas, como também falta de pesquisas na área e ausência de formação adequada que viabilize a aceitação destas práticas. Com base nisso, e levando em consideração a proposta original de pesquisa realizada pela equipe do Laboratório de Práticas Complementares e Integrativas LAPACIS1 da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), na Região Metropolitana de Campinas, surgiu o interesse em conhecer o cenário das PIC na Região Metropolitana de Goiânia, já que ambas se assemelham em números populacionais, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2015).
Específicos Analisar os significados de práticas integrativas e complementares atribuídos por gestores de unidades básicas de saúde da Região Metropolitana de Goiânia-GO; Identificar quais são as concepções2 de saúde, cuidado e integralidade que direcionam o trabalho dos gestores de unidades básicas de saúde da Região Metropolitana de Goiânia-GO; Contribuir com a discussão sobre desafios nas Práticas Integrativas e Complementares na Atenção Primária à Saúde, no SUS. REVISÃO DE LITERATURA Este capítulo contém a fundamentação teórica referente ao objeto de estudo e está subdividido em tópicos para facilitar a leitura. Os tópicos abarcam um breve histórico a respeito da compreensão sobre o processo de saúde e doença do ser humano; paradigmas que são dominantes na prática da área de saúde, tendo como parâmetro o modelo biomédico; paradigma latente da prática alternativa, integrativa e complementar na área de saúde, perspectivas, políticas nacional e dificuldades para implantação e implementação dessa prática.
Raízes Históricas da Compreensão Sobre o Ser Humano e o Processo Saúde-Doença De acordo com Aguiar (2000, p. O homem é visto como um ser inerentemente social e, como tal, sempre ligado às condições sociais. A physis poderia sarar espontaneamente (automátou) sem a utilização de medicamentos, quer por necessidade, por exemplo, as febres de outono que são curadas pela primavera; quer por acaso, quando uma doença acidentalmente elimina outra. Quando isso não era possível, o médico devia intervir e proceder à cura artificial, introduzindo recursos terapêuticos artificiais. Contudo, mesmo nesse caso, o médico apenas ajudava a physis a curar-se e o seu limite de intervenção era definido por ela. Pelo exposto nos escritos hipocráticos, o processo de saúde, doença e cura são baseados na teoria de que a natureza é a força mediadora de ação espontânea, de modo que ao médico cabe o papel de auxiliá-la no processo.
Para tanto, o médico deveria administrar um tratamento simples, baseado inicialmente pela dieta, seguido dos medicamentos e, por último, a cirurgia, já que Hipócrates acreditava que o processo de cura fosse lento (REBOLLO, 2006). Por um lado, têm-se os socialistas utópicos e, por outro, os liberais conservadores. Os primeiros desejavam uma reforma do capitalismo nascente na Europa, em especial, na Inglaterra. Para tanto, os socialistas científicos, como Karl Marx e Frederich Engels, tiveram na teoria socioeconômica, uma produção filosófica e sociológica, fundamentada no materialismo histórico. Por sua vez, os liberais conservadores, defendiam o ponto de vista da burguesia, ou seja, do capitalismo. Neste, a ideia principal era a não intervenção do Estado nos assuntos econômicos, representado principalmente por Adam Smith (LINDEMBERG, 2006).
Assim, faz-se necessário a articulação das dimensões individuais e coletivas do processo saúde-doença, de modo a focar a “totalidade” e não somente a somatória de especificidades tecnológicas. Nessa perspectiva, a OMS (1978) conceitua a saúde como um completo bem-estar, de modo que o processo saúde-doença vai se relacionando com a qualidade de vida, vida saudável e estilo de vida. Essa concepção de saúde sinaliza a natureza integradora da saúde, incluindo além do aspecto biológico, a dimensão social como também a psicológica. Tal visão foi elaborada na Conferência Internacional sobre cuidados primários de saúde, realizada em 1978, em Alma-Ata, que culminou na Declaração de Alma-Ata, reafirmando a saúde como direito humano fundamental.
Além disso, nessa conferência, passou-se a recomendar objetivamente o estabelecimento de políticas nacionais de saúde, apoiadas no uso de recursos da medicina tradicional pelos sistemas nacionais de saúde, como fonte de cuidado para melhorar e aprimorar a saúde da população (OMS, 2002). Logo, o corpo é comparado a uma máquina que, funciona de acordo com as leis universais. Quanto à alma, esta necessita do corpo, então, por meio da imaginação que este fornece àquela, os elementos sensíveis do mundo (CAPRA, 1982). Dessa maneira, a compreensão do homem como uma máquina faz predominar a fragmentação, a especialização, no sentido de que se perde a visão holística desse homem, bem como a sua dimensão psicológica e social, resultando na valorização da doença e da cura.
Da mesma maneira que, valoriza-se o diagnóstico individual e o tratamento, consequentemente, o processo fisiopatológico ganha força em detrimento do sujeito (CUTOLO, 2006). Ao efetuar um balanço da atual crise da medicina ocidental, Queiroz (1986, p. Desse modo, o aspecto que nos parece crucial na hegemonia desses modelos, tanto nas expressões políticos-institucionais nos serviços de saúde, quanto nas suas expressões culturais de medicalização social, diz respeito a converter as PIC em meras técnicas e/ou mercadorias, afastando-as de suas bases éticas que, enfatizam o autocuidado e a autonomia (HABIMORAD, 2015). Tesser, comentando o trabalho de Dalmaso sobre a crise da biomedicina, descreve: Uma mudança histórica nessa biomedicina nas últimas décadas pode ser considerada sintoma desse processo: um maior intervencionismo químico geral e um tratamento dos pacientes progressivamente estandardizado em função das doenças e riscos, com menor preocupação com variabilidades singulares, reações individuais, idiossincrasias orgânicas, contextos psicossociais etc.
como se a biomedicina cada vez mais considerasse os pacientes homogêneos entre si (TESSER, 2007, p. Para Rabello et al (2007), atualmente, predomina o conhecimento racional e o conhecimento científico entre os profissionais de saúde, de forma que a maioria tende a desmerecer o senso comum, momo como as pessoas do saber popular vivenciam e compreendem o mundo. Porém, elas acreditam que esses profissionais, formados sob a ótica do paradigma biomédico, cartesiano, sejam capazes de questionar essa visão fragmentada e hegemônica. Tomando-se em consideração as manifestações ocorridas, conquanto cada qual envolta em suas especificidades, Barros (2008) aponta que com o modelo da medicina alternativa passa a surgir um interesse de alguns atores do setor profissional, motivados pela contracultura e pela proposta de Alma-Ata. Dessa maneira, o correr da década de 70 caracterizou-se pelos questionamentos de uma nova definição que seria saúde, de modo consequente, aumentou também a compreensão da importância da natureza no equilíbrio do homem, suscitando a busca de alternativas que possam manter a saúde e prevenir as doenças (LOZOYA, 1983).
Contudo, Luz (2005) destaca encontros e tensões da medicina hegemônica com a medicina alternativa, de modo a pontuar hipóteses socioantropológicas que explicaria o sucesso e barreiras sociais, bem como institucionais no reconhecimento da medicina alternativa. O primeiro ponto crucial diz respeito à existência do encontro cultural das medicinas tradicionais com as novas representações e concepções (de saúde, adoecimento e cura, bem como relações homem/natureza). Sendo estes presentes em diversos grupos sociais, embora, nem sempre presentes nos portadores de educação formal superior. Os debates que estabelecem a estrutura de uma sociedade livre são debates abertos, não guiados (FEYERABEND, 2011, p. Luz (2005, p. destaca que “um novo paradigma médico pode nascer justamente ali onde a racionalidade médica ocidental esqueceu que era mais que um saber científico”.
Em vez de buscar somente novos métodos diagnósticos sofisticados para investigar, classificar e explicar antigas e novas patologias, ele sugere que ocorra uma dedicação à dimensão terapêutica, já que ela se constitui uma arte de curar sujeitos doentes. Assim, Luz (2005, p. Para tanto, faz-se necessário à aproximação das diferenças. Indo de encontro a essa direção, as definições de medicina complementar, nos anos 1990, se devem, principalmente, às pressões de pesquisas no campo dessas práticas. Sabe-se que o auge dessas pesquisas ocorreu com a publicação no New England Journal of Medicine, em 1993, da qual tratou sobre prevalência, custos e padrões de medicina complementar e alternativa nos Estados Unidos. Esta concluiu que 34% dos entrevistados haviam utilizado pelo menos uma terapia complementar durante o ano passado para tratar sua condição médica mais séria ou incômoda (EISENBERG; KESSLER, et al.
A evolução das definições de medicina complementar, ao que parece, não ocorreu segundo uma ordem bem estabelecida. Modelo de Medicina Integrativa A arte de integrar tem implicações fortes no acesso e disponibilidade de cuidados. Para Vickers (2000, p. “isso também implica que os médicos concordem com seus respectivos papéis para que os pacientes sintam que estão recebendo cuidados como parte de um serviço coordenado”. Embora a medicina complementar e a medicina convencional tenham sido tradicionalmente ofertadas em ambientes distintos, observa-se, atualmente, uma maior integração entre estas, de modo que têm sido fornecidas no mesmo ambiente. Dessa maneira, Zollman e Vickers (1999) descrevem que cerca de 40% das práticas geridas no Reino Unido ofertam acesso a medicamentos complementares. “é que a medicina integrativa é, de fato, integrativa.
Integra o cuidado convencional com terapias não convencionais ou não ocidentais; sabedoria de cura antiga com ciência moderna, e toda a pessoa - mente, corpo e espírito no contexto da comunidade”. Segundo Cruz e Sampaio (2016), as conceituações das práticas não convencionais, bem como a presença no cuidado primário à saúde, apresentam definições de práticas complementares como aquelas utilizadas conjuntamente, alternativas quando são substitutivas e integrativas quando relacionadas à biomedicina, de modo a existir um embasamento científico. Nesse processo de conceituação, a Medicina Integrativa ainda recebe uma reconceituação, com uma abordagem holística e com convergência em prevenção e promoção da saúde (CRUZ; SAMPAIO, 2016). Em geral, buscamos no decorrer deste texto, chamar a atenção para o fato de que a conceituação de medicina alternativa, assim como medicina complementar, bem como medicina integrativa, embute determinadas concepções fundamentais para a compreensão dos cenários em que essas práticas se situam no mundo e, em particular, no Brasil.
Isso acontece, porque elas acreditam que, se as pessoas com problemas de saúde tomarem ciência da existência dessas terapias, provavelmente, elas a utilizariam. No entanto, os autores alertam para a necessidade de estratégias para auxiliar na redução das disparidades na compreensão dessas abordagens, de modo a melhorar o acesso aos cuidados de saúde. Tais disparidades estão relacionadas à educação e a outros fatores econômicos que, afetam negativamente a qualidade do atendimento. Práticas Integrativas e Complementares e Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares à Luz do Cenário Brasileiro Remonta aos anos 80 o início da legitimação e institucionalização das práticas integrativas e complementares no Brasil. O primeiro ato de institucionalização dessas práticas na rede pública de saúde foi por meio da Homeopatia, em 1985.
Contudo, Ribeiro (2015) acredita que apesar da criação da PNPIC promover uma importante aceitação do pluralismo terapêutico por parte do Estado brasileiro, esta mesma política desconsiderou saberes e práticas populares como, rezas populares, práticas indígenas, valorizando aquelas originadas de outros países, como a China (medicina tradicional chinesa), a Índia (Ayurveda) e na Europa (homeopatia). Todavia, a notável expansão dessas práticas pelo país conduziu à produção do diagnóstico nacional da sua oferta no SUS, bem como a criação de grupos de trabalho multi-institucionais. Estes trataram da discussão sobre a Homeopatia, MTC-Acupuntura, Medicina Antroposófica, Plantas Medicinais e Fitoterapia (BARROS, 2006). Para Simoni (2014), na época, foram essas sociedades (Homeopatia, Acupuntura, Medicina Antroposófica e Fitoterapia) que procuraram o MS, inicialmente, logo, foram as primeiras práticas integrativas incluídas na política nacional.
Ainda de acordo com a autora, não havia muitos critérios para a escolha do que entraria ou não na política, já que muitas práticas eram consideradas alternativas. TERMOTERAPIA CRENOTERAPIA É uma terapia através das águas minerais e termais, utilizado desde a Grécia. Foi descrita por Heródoto (450 a. C. Compreende diferentes maneiras de utilização da água mineral para tratar e recuperar a saúde. ANTROPOSOFIA Abordagem médico-terapêutica complementar de base vitalista, com modelo de atenção transdisciplinar e buscando a integralidade no cuidado em saúde. Considera a estruturação e fortalecimento da atenção em PIC no SUS, mediante: inserção em todos os níveis de atenção, com ênfase na atenção primária; desenvolvimento em caráter multiprofissional; estabelecimento de mecanismos de financiamento; elaboração de normas técnicas e operacionais para implantação; e articulação com as demais políticas do Ministério da Saúde.
Propõe o desenvolvimento de estratégias de qualificação em PIC, em conformidade com os princípios da Educação Permanente. Incentiva a divulgação e a informação dos conhecimentos básicos das PIC para profissionais de saúde, gestores e usuários, mediante: apoio técnico ou financeiro a projetos de qualificação de profissionais da área de informação, comunicação e educação popular; elaboração de materiais de divulgação; inclusão na agenda de atividades da comunicação social do SUS; apoio a informação e divulgação em diferentes linguagens culturais; e apoio a experiências de educação popular. Estimula ações intersetoriais, buscando parcerias que propiciem o desenvolvimento integral. Propõe o fortalecimento da participação social. Apesar disso, grande parte da oferta de PIC no SUS é realizada pelos profissionais da ESF individualmente nos seus serviços, sem apoio ou conhecimento dos gestores, logo sem institucionalização expressiva da oferta (TESSER et al.
Sob o ponto de vista das pesquisas que investigam o conjunto dos profissionais da APS, na sua maioria não praticante de PIC, é frequente o desconhecimento de tal prática, embora apresentem interesse em aprender sobre estas (SANTOS; TESSER, 2012). O estudo de Neto et al (2010), realizado na cidade de Juiz de Fora (MG), com o objetivo de conhecer o perfil de usuários das PIC dessa população, quanto ao conhecimento e práticas adotadas em seus tratamentos de doenças e suas crenças, demonstrou que a grande utilização de PIC por 69,9% da população, pode ser explicada, principalmente, pelo fato de determinados tratamentos alopáticos não atenderem eficazmente, mediante o alto custo da medicina alopática, das intervenções cirúrgicas complexas e dos equipamentos modernos de diagnóstico, restringindo-se, na maioria dos casos, somente à patologia de órgãos e sistemas.
No entanto, como qualquer outra prática, identifica-se um descompasso entre o que se registra nos sistemas de informação e o que se realiza nos municípios, de acordo com o estudo de Sousa et al (2012). No que se refere a esse descompasso, os autores relatam que se deve, em grande parte, à indefinição do escopo do que se compreende como PIC na PNPIC. É sabido que o HMA, hoje CREMIC (Centro Estadual de Referência em Medicina Integrativa e Complementar), tem-se constituído como referência nessas práticas, atraindo pessoas de Goiânia, cidades do interior, como também de outros estados. No entanto, ele atende somente pacientes no setor ambulatorial, de modo que o acesso é realizado por meio da regulação, ou seja, o paciente deve ser encaminhado por uma unidade básica de saúde da capital (Goiânia) ou do interior (SES-GO, 2007).
Todavia, com o movimento do Ministério da Saúde na produção do diagnóstico nacional da oferta de PIC no SUS, em 2004, o estado de Goiás se mobilizou para uma futura institucionalização estadual dessas práticas. É nesse contexto que se inserem a participação de profissionais, trabalhadores do SUS, gestores estaduais da saúde, professores universitários e, principalmente, representantes do HMA, hoje CREMIC. Como consequência, posteriormente, institui-se a Política Estadual de PIC na rede pública estadual de saúde, por meio da Lei n. Segundo Starfield (2002), referência adotada pelo Ministério da Saúde brasileiro, a APS representa o nível do sistema de saúde, que é a porta de entrada do usuário para todas as novas demandas e problemas para os quais se busca o cuidado.
A autora apresenta alguns atributos dos serviços de atenção primária, tais como: serviço de primeiro contato; longitudinalidade; abrangência ou integralidade; coordenação do cuidado; orientação do cuidado; orientação para a comunidade; centralidade na família, e competência cultural. Logo, no âmbito internacional, a Atenção Primária à Saúde apresenta-se como uma estratégia de organização da atenção à saúde direcionada, que responde de forma regionalizada, contínua e sistematizada à maioria das necessidades de saúde da população, de modo a integrar ações preventivas e curativas, individuais e coletivas (STARFIELD, 2002). No Brasil, a APS engloba os princípios da Reforma Sanitária, assumindo no SUS a denominação “Atenção Básica à Saúde” (ABS), como também o termo de “Atenção Primária à Saúde” (APS).
Esta enfatiza a reorientação do modelo assistencial, com base em um sistema universal e integrado de atenção à saúde. Considerando a gestão de serviços de saúde na APS, compreende-se que esta constitui lócus de grande relevância ao se considerar o papel estratégico destes espaços, como ordenador da atenção e na coordenação do cuidado em saúde. Com isso, acredita-se que o espaço organizacional que os gestores destes serviços ocupam é de extrema relevância no SUS (MAGALHÃES JÚNIOR; PINTO, 2014). Cabe ressaltar que a figura do coordenador de Unidade Básica de Saúde, o qual é o gestor de saúde local, possui entre as diversas funções, a responsabilidade na maestria da organização do processo de trabalho da equipe de saúde.
Portanto, espera-se que este profissional seja o planejador de saúde, o qual necessita de algumas e/ou muitas habilidades desenvolvidas, tais como: criatividade, protagonismo, flexibilidade, coordenação de suas equipes no âmbito administrativo, como também, nos aspectos da qualificação do cuidado, de modo que a equipe trabalhe com as necessidades de saúde dos usuários (JUNQUEIRA; INOJOSA, 1992). Tais responsabilidades implicam no comprometimento com a tarefa organizacional e o trabalho de envolver todos os recursos humanos nessa tarefa, fazendo com que cada um desempenhe sua atribuição, de modo a assumir o compromisso conjunto de produzir um serviço de saúde que, de fato, satisfaça às necessidades da população assistida, com equidade e qualidade (JUNQUEIRA; INOJOSA, 1992). O crescimento das PIC se intensificou com a iniciativa do MS na aprovação da PNPIC, pela Portaria nº 971, em 2006, já citada anteriormente neste estudo.
Contudo, embora a PNPIC tenha priorizado a inserção das PIC na APS, percebe-se, ainda, desafios e fronteiras para implementação das PIC, como veremos, brevemente, a seguir. Fronteiras para implantação e implementação das Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde atual De modo mais usual, e para o que interessa a este estudo, considera-se as fronteiras enquanto construções simbólicas, compreendidas como espaço em que se define o jogo de representações capazes de “estabelecer classificações, hierarquias e limites que guiam o olhar e a apreciação, pautando condutas” (PESAVENTO, 2004, p. A fronteira é também lugar de negociação, quando transgredida, potentes fusões e possibilidades se formam, logo, potentes fusões podem ocorrer quando saberes locais se esbarram, negociam e misturam, resultando um novo estilo de pensar e trabalhar, segundo Haraway (2000).
Desse modo, com a fronteira transgredida da saúde pública, com a entrada das terapias naturais, integrativas e complementares no SUS, pressupõe-se um olhar para modelos de saúde e cuidado originários de outras culturas, indicando alguma controvérsia ao modelo que parecia estável, a biomedicina (DOS SANTOS, 2015). Para Carnevale (2018), os grupos com maior poder social e interesse em manter seus benefícios operam as fronteiras epistemológicas, sociais e cognitivas. As fronteiras epistemológicas determinam que o conhecimento científico e biomédico é o único verdadeiro, em prejuízo dos conhecimentos tradicionais, por exemplo. Assim, mantêm-se essa hierarquia e assimetria por meio das fronteiras sociais, de modo que definem que os profissionais da biomedicina são os únicos detentores da “verdade”, reduzindo os conhecedores tradicionais como inferiores e sem prestígio.
Enquanto na fronteira cognitiva, tem-se o discurso que apenas a ciência pode produzir evidências científicas confiáveis, pois é a única que desenvolve pesquisa clínica randomizada. Desse modo, fomos condicionados a crer que o maior nos constitui, em outras palavras, fomos educados a crer na Grande Ciência. A RMG, conhecida popularmente como Grande Goiânia, é uma conturbação de cidades ao redor de Goiânia, capital do estado de Goiás, onde vivem 2,5 milhões de pessoas, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ela foi constituída pela Lei Complementar nº 27, em dezembro de 1999, a princípio composta por 11 municípios. Com a Lei Complementar nº 139 de 2018 (GOIÁS, 2018), a RMG passou a ser constituída por 20 municípios: Goiânia, Abadia de Goiás, Aparecida de Goiânia, Aragoiânia, Bela Vista de Goiás, Bonfinópolis, Brazabrantes, Caldazinha, Caturaí, Goianápolis, Goianira, Guapó, Hidrolândia, Inhumas, Nerópolis, Nova Veneza, Santo Antônio de Goiás, Senador Canedo, Terezópolis de Goiás e Trindade (Tabela 1).
Esses municípios ocupam uma área de 7. km². Bonfinópolis 9. Brazabrantes 3. Caldazinha 3. Caturaí 5. Goianápolis 11. Trindade 121. Total 2. Fonte: Brasil (2017a); Brasil (2017b). Legenda: *Estimativas da população residente nos municípios da Região Metropolitana de Goiânia, em 2017; **incluem serviços de Atenção Primária, postos e unidades da Estratégia de Saúde da Família, Centros de Saúde da Família, serviços de Apoio à Saúde da Família, Academia da Saúde; ***Censo realizado para identificar os serviços de Atenção Primária à Saúde da Região Metropolitana de Goiânia que ofertam Práticas Integrativas e Complementares. Os dados acima são oriundos de um subprojeto que faz parte do projeto “guarda-chuva” intitulado: Práticas Integrativas e Complementares nos serviços de Atenção Primária à Saúde-RMG, do qual o presente estudo também faz parte.
Coleta de dados A coleta de dados ocorreu no período de novembro a dezembro de 2018. Após o cumprimento dos preceitos éticos, os gestores foram convidados a participar do estudo pela pesquisadora, por meio de contato telefônico. Nesse contato, foram apresentados os objetivos da pesquisa e a metodologia utilizada. Seguidamente, os gestores manifestaram sobre sua participação. Diante do aceite, foi agendado o dia e o horário da entrevista no local de trabalho do gestor. Assim, a amostragem por saturação se constitui uma ferramenta conceitual, a qual é utilizada para estabelecer o tamanho final de uma amostra, de modo a interromper a inclusão de novas entrevistas. Essa decisão é tomada, geralmente, quando os dados obtidos passam a apresentar, na perspectiva do pesquisador, certa redundância ou repetição das informações, de modo que estas não contribuiriam significativamente na reflexão teórica daquilo que já foi coletado (FONTANELLA; TURATO, 2008; FALQUETO, 2011).
Os dados coletados foram organizados e sistematizados no software NVIVO 11, para, em seguida, serem analisados. Análise dos dados Após a transcrição das informações, os dados foram processados e analisados por meio da técnica de Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2016). Para tanto, foi utilizado o software NVIVO 11, que consiste em um software de análise de textos e áudios, por exemplo, de modo a possibilitar a edição, visualização, interligação e organização dos documentos, de maneira que o pesquisador cria categorias, questionando os dados e respondendo ao seu objetivo de estudo que consiste em um sistema de indexação e categorização de dados não estruturados, de modo a proporcionar a descoberta e exploração dos sentidos das informações (MOZZATO; GRZYBOVSKI; TEIXEIRA, 2016).
O projeto desta pesquisa foi incluído no projeto “guarda-chuva” e aprovado sob o Parecer Consubstanciado nº 2. em 16 de outubro de 2018. A todos participantes da pesquisa foram apresentados o TCLE (APÊNDICE II), informando os riscos e os benefícios do estudo. Dentre os benefícios podemos destacar as contribuições desta para o conhecimento científico, a identificação de benefícios trazidos pela utilização da tecnologia em estudo e as dificuldades para a implantação dela. Uma vez identificadas tais informações, foi possível à elaboração de estratégias, com vistas à resolubilidade e aprimoramento das PIC nos serviços de APS na RMG. Caracterização do perfil dos gestores dos serviços de APS que não ofertam PIC Após a anuência de 17 municípios dos 20 pertencentes à RMG, uma vez que 03 não concordaram com a participação em seu território (Trindade, Goianápolis e Aragoiânia), os contatos foram realizados, primeiramente com os gestores de UBS que não ofertavam as PIC próximos às unidades que as ofertavam, situados nos 05 municípios da RMG (Goiânia, Aparecida de Goiânia, Hidrolândia, Inhumas e Abadia de Goiás), e posteriormente, com os gestores de unidades de saúde dos demais municípios, com exceção do município de Caturaí, uma vez que não se obteve êxito por contato telefônico, durante o período da coleta de dados (Figura 1).
Nesse sentido, a pesquisa foi direcionada a 24 gestores/coordenadores dos serviços de Atenção Primária em Saúde da RMG, distribuídos nos 16 municípios participantes, sendo 01 gestor de Abadia de Goiás, 01 gestor de Aparecida de Goiânia, 01 gestor Bela Vista de Goiás, 01 gestor de Bonfinópolis, 01 gestor de Brazabrantes, 01 gestor de Caldazinha, 07 gestores de Goiânia, 01 gestor de Goianira, 01 gestor de Guapó, 01 gestor de Hidrolândia, 03 gestores de Inhumas, 01 gestor de Nerópolis, 01 gestor de Nova Veneza, 01 gestor de Santo Antônio de Goiás, 01 gestor de Senador Canedo e 01 gestor de Terezópolis de Goiás (Figura 1). Figura 1- Mapa da Região Metropolitana de Goiânia Fonte: Elaborado pelos autores (2019) O perfil dos entrevistados segundo a Tabela 2, mostra que a maioria tinha idade entre 41 anos ou mais, demonstrando que ainda prevalece um quadro gerencial com maior maturidade profissional.
Esses dados que corroboram o estudo realizado no Rio de Janeiro (BLOISE, 2015), no qual verificou-se que, os ocupantes desses postos de trabalho são profissionais com uma faixa etária mais elevada, com mais tempo de graduação e formação. Dentre os entrevistados, prevaleceu o sexo feminino (87,50%), com hegemonia das gestoras enfermeiras (58,35%), seguido de outras categorias (29,16%). De acordo com Luz (2018), mulheres e homens negras/os não apenas vivenciam e se apropriam de forma desigual do território, como também estão sub-representados nos cargos públicos, em especial, no que tange aos cargos que envolvem poder de decisão. A autora ao analisar a implementação da Lei municipal n. que trata da reserva de vagas para negras e negros no serviço público da cidade de São Paulo, constatou-se que as determinações desta Ação Afirmativa8 têm sido cumpridas essencialmente pelos concursos públicos.
No entanto, no que se refere aos cargos comissionados e de livre provimento, em especial, os cargos de chefia, percebe-se que ainda persiste a sub-representação da população negra, de modo que em alguns casos, tem até se intensificado (LUZ, 2018). No âmbito restrito dos objetivos da nossa investigação, não temos a pretensão de aprofundar nesse tema, mas cabe destacar que o Estado de Goiás implementou a política de cotas somente em três centros de ensino superior de natureza pública, sendo eles: Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Estadual de Goiás (UEG), e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás (IFG). Aqui, buscamos acolher o paciente com uma palavra de incentivo, e também orações, por exemplo, quando a família está com um parente em estado terminal, por câncer.
” (G18) Todavia, identificou-se também tensões que cerca essa crença religiosa quanto à aplicação de uma das práticas integrativas, o reiki, quando um dos entrevistados relata: “Quando foi para aplicar o REIKI na equipe, teve colegas que não quiseram. Isso aconteceu por motivos religiosos. Colegas evangélicos não aceitaram. Não permitiram. Dessa forma, os profissionais passam a buscar de forma constante por cursos de pós-graduação, sem, contudo, adentrar no campo da formação permanente (BATISTA; GONÇALVES, 2011). De acordo com Da Silva (2012), ao analisar o município de Belo Horizonte, Minas Gerais, constataram-se deficiências na capacitação dos gestores de UBS, distorcendo a atuação gerencial nos serviços de saúde. No sentido de minimizar tais deficiências, a secretaria de saúde ofertou o curso de Especialização para Gerentes dos Serviços Locais de Saúde.
No entanto, apesar dos esforços, não o objetivo desejado não foi alcançado, uma vez que a preparação aconteceu de forma descontextualizada, não considerando a extensão do município, como também, as especificidades de cada regional. Dessa maneira, torna-se essencial a superação da cultura da educação fragmentada e desagregada da realidade, voltando-se para as riquezas do dia-a-dia do serviço, visando um aprendizado transformador, condizentes com a proposta de Educação Permanente em Saúde (PEREIRA et al. A modalidade do tipo de vínculo empregatício no serviço público foi um ponto importante que esperávamos encontrar relação com a continuidade dos programas nos serviços de saúde, uma vez que a rotatividade de profissionais é um dos fatores que prejudicam o sucesso dos programas na APS.
Esses resultados indicam que ainda é forte e crescente a precarização do trabalho, especialmente, no setor de atenção primária à saúde. Essa precarização perpassa pela desvalorização salarial e redução do número de servidores públicos estáveis (estatutário), sendo estes substituídos por empregados terceirizados (PIALARISSI, 2017). Acerca da jornada de trabalho, os dados revelam que dezessete (70,84%) dos entrevistados tinham uma carga horária de 40 horas semanais, cinco (20,83%) de 20 a 30 horas, sendo que dois (8,33%) não informaram. No tocante à existência de outro vínculo de trabalho, quinze (62,50%) informaram que tinham somente um (01) vínculo, seis (25%) possuem outro vínculo e três (12,50%) não informaram. Nesse sentido, Barbosa e Bosi (2017) consideram que o vínculo quase sempre é algo não percebido, porém deveria existir como condição para funcionamento do serviço em termos de responsabilização e longitudinalidade do cuidado.
Entretanto, o vínculo se encontra ameaçado frente ao excesso de trabalho e burocracia e pela falta de tempo para o desenvolvimento das atividades (SANTOS et al. Além disso, percebe-se também a falta de preparo para o desempenho das funções, como apontado pelo entrevistado que está na UBS entre 1 a 3 anos: “Você sabe como funciona quando a gente entra. Você é jogado aqui, e tipo: se vira! Ainda não fiquei sabendo nada a respeito dessas práticas que venha da gestão. ” (G14) Tabela 3- Perfil dos profissionais entrevistados nos serviços de Atenção Primária à Saúde que não ofertam Práticas Integrativas e Complementares na Região Metropolitana de Goiânia, no período de novembro a dezembro de 2018. Dos 24 entrevistados, 16 não conhecem as PIC e a PNPIC; quatro conhecem as PIC; e três conhecem a PNPIC.
O desconhecimento das PIC diz respeito a maioria dos gestores entrevistados, compreendendo, principalmente, àqueles que estão na direção das UBS entre 1 a 3 anos. Esse resultado corrobora o estudo de Plácido et al (2019) que constatou o desconhecimento de gestores de UBS sobre as PIC, assinalando isso como uma forte fragilidade para o crescimento destas práticas no contexto da APS. Destaca-se o significado que se atribui às PIC e à PNPIC como algo novo e vago, conforme as suas falas: “É um pouco vago para mim, porque eu não tenho conhecimento. ” (G1) “Esse é um termo novo para mim. Estes que a praticam o fazem movidos pela vontade de afirmar uma identidade de cuidado oposto ao modelo hegemônico (TELESI JUNIOR, 2016). Portanto, o desafio está na quebra da fragmentação do processo de trabalho, que separa o pensar e o fazer desses profissionais, incluindo a integralidade e a humanização das práticas ainda durante a formação (OLIVEIRA, 2013).
A falta de conhecimento por parte dos gestores e dos profissionais de saúde sobre PIC e a PNPIC, de acordo com Müller (2016), produz a invisibilidade dessas práticas, levando a concepções errôneas, como também a sua desvalorização. Ainda, de acordo com a autora, essa invisibilidade é resultado da falta de divulgação das PIC ofertadas na rede de serviços e suas formas de encaminhamento, assim como à falta de visibilidade que essas práticas têm na comunidade para os que queiram acessá-las (MÜLLER, 2016). Para Barros e Fiuza (2014), a invisibilidade das PIC tem prejudicado não só o conhecimento científico, como também aos usuários, uma vez que constantemente não apresentam as outras formas de cuidado e cura que eles usam, de modo a assumir os riscos com o objetivo de não se expor a nova humilhação social.
Algum tempo atrás, a secretaria enviou um questionário para saber se tinha algum servidor interessado na capacitação de auriculoterapia. ” (G5) Segundo Viana (2014), a ignorância no sentido de “ignorar algo” ou “falta de consciência ou saber” sobre alguma coisa é bastante comum, logo não é nada ofensivo considerar que alguém ignora algo ou alguma coisa. Entretanto, existem indivíduos que ignoram muitas coisas, ao passo que outros ignoram menos. Diante do exposto, percebe-se que não estar familiarizado com as políticas públicas como, a PNPIC, por exemplo, que foi institucionalizada desde 2006, oficialmente, entre outras atribuições relacionadas com a sua gerência, parece demonstrar a inexistência de diálogo com os campos de atuação aos quais esse gestor está inserido. Porém, a ignorância é prejudicial para o projeto de emancipação humana, ficando distante do processo de transformação social, portanto, da viabilização das PIC no SUS (VIANA, 2014).
A lógica neoliberal considera as políticas de caráter universal e redistributivas um atraso para o país, de modo que as políticas sociais com essa concepção é um fator desestimulador ao trabalho e à competição (ANDERSON, 1995). Nogueira (2017) argumenta que, desde 2016 observa-se uma intensificação da consolidação de graves retrocessos em relação aos direitos conquistados pela classe trabalhadora no Brasil, englobando ainda a aprovação da emenda9 constitucional que limita os gastos públicos com políticas sociais, nos próximos 20 anos. Desta forma, o neoliberalismo avança no setor saúde, mediante articulação entre os interesses das classes dominantes dos países periféricos e centrais, incluindo a promoção intensa da privatização dos cuidados de saúde (NOGUEIRA, 2017). Ainda para Nogueira (2017), o processo de terceirização da gerência dos serviços públicos de saúde atinge de forma direta o trabalhador do SUS, especialmente os da Atenção Primária à Saúde.
Sente-se nesta o aprofundamento das diferenças de tratamento entre trabalhadores estatutários e celetistas, com significativas diferenças salariais, por exemplo (NOGUEIRA, 2017). Cantatore e colaboradores (2015) trazem uma reflexão acerca da defasagem entre o aumento do uso de PIC e sua baixa institucionalização. A defasagem entre o aumento do uso de PIC e sua limitada institucionalização decorre da dificuldade de produzir evidências sobre as PIC, imposta pelo padrão metodológico produzido pelos desenhos de estudo hegemonicamente exigidos na contemporaneidade. Na medida em que têm maior valorização as evidências produzidas com estudos centrados nas patologias ou sintomas e não nas pessoas e seu processo singular de adoecimento e cuidado, o conjunto de informações e conhecimento sobre as PIC não tem sido suficiente para informar tomadas de decisões para sua implantação nos serviços de saúde (CANTATORE et al.
p. Todavia, esse cenário parece estar passando por mudanças, uma vez que a OMS desde 2010 registra a necessidade de mais pesquisas avaliativas, as quais valorizem a eficácia comparativa, padrões de utilização das PIC, bem como outros fatores qualitativos (CANTATORE et al. Para tanto, no campo das PIC, é importante considerar o conhecimento empírico, posto que, segundo Alves (2007), “a aprendizagem da ciência é um processo de desenvolvimento progressivo do senso comum. Só podemos ensinar e aprender partindo do senso comum de que o aprendiz dispõe” (ALVES, 2007, p. No que se refere aos gestores que conhecem as PIC (04), eles a relacionaram ao autoconhecimento, ao cuidado na atenção primária, bem como à prevenção e promoção da saúde, de acordo com os depoimentos: “Acho que ajudar a pessoa a ter um autoconhecimento.
É ajudar ela a se conhecer melhor, a partir das atividades mesmo, ou seja, das práticas integrativas. Saber identificar a doença no emocional, primeiro. Além disso, verificaram que prevalece o modelo biomédico nos atendimentos, onde as PIC são oferecidas, notando que nem todos os profissionais que atuavam no Ambulatório têm valorizado essas atividades. Para os gestores que conhecem a PNPIC relatam que já leram, sem, no entanto, especificá-la. Entre esses, destaca-se, principalmente, a fala do gestor (G10), que a percebe como potencial para a implantação e implementação da PIC no seu município. Ele ainda comenta que esse conhecimento foi resultado da avaliação do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB)10. “Eu conheci essa política, depois que comecei a trabalhar na unidade de saúde.
Ainda entre os gestores que conhecem a PNPIC, um deles manifestou a necessidade desse tipo de política se tornar obrigatória para, então, chamar a atenção dos profissionais para a ação, conforme a sua fala a seguir: “[. sei que ela está engatinhando ainda. Ela não é obrigatória! Acho que está até tramitando no congresso, se não me engano, de formular uma lei específica para trazer isso, realmente, para a prática. Para o conhecimento de todos! Meio que obrigado, pois a partir disso é que a maioria dos profissionais começam a trabalhar. O que acontece é o seguinte: os que interessam, trabalham! Fazem! Os que não interessam, não trabalham! A partir do momento que começa a obrigar a fazer, é quando se faz, realmente!” (G11) Sobre em que lugar político e institucional se encontram as PIC, Rodrigues (2014) aponta que as práticas da PNPIC ainda estão longe de uma universalização, uma vez que elas foram aprovadas sem ter como operar, diante da ausência de recurso indutor ou de apoio institucional.
Mas tenho muito interesse em aprender. Acho que a população só tem a ganhar com isso. Vou buscar saber sobre ela. Ainda não tinha me atentado para isso. ” (G8) “Às vezes, não conheço com a institucionalização desse nome. Demo (2014) aponta que a pesquisa como princípio científico e educativo faz parte de todo processo emancipatório. Segundo o autor, a pesquisa como diálogo “é processo cotidiano integrante do ritmo de vida, produto e motivo de interesses sociais em confronto, base da aprendizagem que não se restrinja a mera reprodução do conhecimento” (DEMO, 2014, p. Nesse tocante, acreditamos que as PIC ainda se encontram na marginalização social, fruto da falta de oportunidade da aquisição de educação permanente, sendo indispensável para inserção nos serviços de APS, demandando que o indivíduo tenha um nível educacional para usufruir das possibilidades que ela oferece.
Conforme Coswosk et al (2018), “sem a educação não há transformação pessoal e social, entretanto, a educação só transforma quando há uma completa interação entre indivíduos e práticas educativas” (COSWOSK et al. p. Para Bauman (2005), a formação da identidade não vai ocorrer enquanto o pertencimento continuar sendo uma condição que não se realizou, logo um indivíduo ou grupo, poderá contribuir intervindo para transformar o seu meio ambiente, ao se sentir pertencente a algo ou a algum lugar. Nessa perspectiva, ao serem indagados sobre a vivência ou experiência pessoal e/ou familiar no uso de plantas medicinais e fitoterapia, homeopatia, acupuntura ou algum outro tipo de cuidado terapêutico, eles relataram, principalmente, o uso de chás, conforme as falas a seguir: “Na verdade, desde criança a gente usa, né? Quando a gente era criança, minha mãe usava muito, tipo: boldo para o fígado quando estava com uma má digestão.
Usava também, mastruz (aquela planta com leite) para vermes, né! A gente usava muito esse tipo de prática. Já ouviu falar daquele ditado que: de médico e louco todo mundo tem um pouco!” (G3) “Eu já usei, e uso. Como sou uma pessoa muito ansiosa, acho que o chazinho da plantinha, por exemplo, capim-santo. Um estudo realizado sobre medicinas e terapias complementares na visão de médicos e enfermeiros da Saúde da Família de Florianópolis, Santa Catarina, apresentou e reforçou que o despertar do interesse pelas PIC foi decorrente de vivências e experiências familiares (THIAGO; TESSER, 2011). Dessa maneira, o conhecimento popular das plantas medicinais, por exemplo, bem como de outras formas de cuidados terapêuticos tradicionais, é considerado na literatura como um elemento potencializador no processo de implantação da PNPIC, uma vez que além de representar um patrimônio cultural da população brasileira, diz respeito também às práticas que valorizam a autonomia dos indivíduos (HABIMORAD et.
al, 2015). Cruz e Sampaio (2012) apontam que o uso de plantas medicinais e fitoterapia recebem maior valorização por se tratar de práticas decorrentes de tradições familiares e culturais. Neste contexto, o desenvolvimento da potencialidade produtiva da fitoterapia e plantas medicinais, por exemplo, necessita-se de abordagens que valorizem a criação de espaços que estimulem, de fato, a convivência de saberes, como também a prudência e a análise crítica, pelos profissionais e usuários, acerca do uso dessas práticas (CARVALHO, 2008). Fiquei conhecendo na Academia de Saúde que é próxima daqui. ” (G13) “Homeopatia sim. mas é muito individual. ” (G16) De acordo com o inquérito nacional (TESSER et. as plantas medicinais e fitoterapia são ofertadas com maior frequência pelos municípios (30%), seguida da acupuntura (16%) e auriculoterapia (11%).
É um tipo de homeopatia [. Ela vinha da Secretaria do Estado, do Hospital de Medicina Alternativa. Eu acredito que é um aliado ao tratamento convencional. Tem que ter os dois para ser efetivo. ” (G9) “Antes, aqui no município, tínhamos um médico homeopata. Esse medicamento é oferecido pela unidade tanto para a população quanto para a distribuição às prefeituras do interior. Ainda de acordo com a entrevista, esse remédio tem a finalidade de amenizar os sintomas da Dengue, caso a pessoa seja infectada (DUTRA, 2018). Martinez e Nunes (2014) realizaram uma revisão da literatura para identificar e sintetizar os estudos que investigaram medicamentos homeopáticos para o tratamento e a prevenção da dengue. Porém, eles concluíram que pela falta de ensaios clínicos randomizados, duplo-cegos e controlados bem conduzidos e em números suficientes não há evidências claras da utilidade desses medicamentos.
Nagai e Queiroz (2009) discutem que a dificuldade na tradução dos pressupostos da teoria homeopática para a linguagem científica dominante, levou a homeopatia a ser classificada pela medicina alopática como uma abordagem obscura e não científica. Assim, você passa a conhecer mais a população. Daí a gente consegue saber o que falta [. no que podemos ser úteis para a população. ” (G1 “Sim. Porque é uma prática a mais. Com a implantação, acredito que esta pode trazer a população para observar o cuidado com o não adoecer! Fazer a pessoa enxergar que ela não precisa adoecer. Basta ela se cuidar antes!” (G11) “Sim. Acho que ajudaria bastante. Embora eu não conheça muito, mas acho que são práticas que agregam junto com [.
não só a parte de remédio. ” (G8) “[. acho que os pacientes facilitariam. A aceitação deles é positiva” (G16) “[. tudo que vir para possibilitar melhora, ou que possibilitar menos desgaste, menos medicamento, por exemplo, é bem-vindo. ” (G19) “Acho que o fato das pessoas se conhecerem melhor a elas (autoconhecimento) [. Essas práticas alternativas seria uma boa para eles também. Acho que teria uma boa adesão, caso, tivessem profissionais capacitados e que se dedicassem a isso. ’ (G3) “[. aqui, na unidade, dentre os servidores, é normal o uso dos chás [. ” (G5) “Temos no nosso território, idosos que são benzedeiros. Essa relação é fundamental para a expansão das PIC, uma vez que as decisões de uma prática popular em saúde, inclinam uma avaliação da realidade em que o usuário está imerso, de modo que é possível integrar o saber científico e o saber empírico, rumo a um objetivo comum (COSTA et al.
Nesse sentido, o conhecimento popular pode ser utilizado como um instrumento de proximidade, autonomia e de valorização da cultura de cada cidadão, características essenciais para um cuidado continuado, humanizado e integral em saúde, sendo estes objetivos da PNPIC (BADKE et al. BARROS; SIEGEL; SIMONI, 2007). Os gestores que não ofertam PIC demonstram que estas podem representar um potencial para a equipe também, de modo que apontaram como facilidades relacionadas ao trabalho em equipe, o relacionamento e o compromisso, reforçando o trabalho em equipe como elemento estratégico à implantação das PIC. “A equipe é boa e motivada. Acredito que a secretaria de saúde está aberta também. Quando tem algo que eles passam a ter o conhecimento, eles apoiam. ” (G18) O trabalho em equipe no contexto da Atenção Primária à Saúde se configura como estratégia para avançar e alcançar o princípio da integralidade no SUS.
Nesse sentido, o trabalho em equipe pode adquirir várias conformações, como pluridisciplinar, multidisciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar, de modo que abordaremos brevemente na perspectiva da equipe multiprofissional, com característica interprofissional, características essenciais ao desenvolvimento das PIC na APS (NUNES; WOVST; NETO, 2014; DE FARIAS et al. Acerca da concepção interprofissional, vale destacar que esta é diferente da multiprofissional. É pequeno o espaço. ” (G2) “Tenho um problema pontual que é espaço físico. Não tenho praça. Não tenho lugar nenhum para fazer reuniões [. ” (G4) “A logística, pois a secretaria não tem estrutura financeira. Acho que a unidade tem que estar preparada para isso [. Falta coisas básicas na unidade. ” (G15) “Precisamos pensar no espaço, na agenda, no acolhimento melhor. ” (G17) “Espaço adequado.
Profissional capacitado. Nessa perspectiva, a ambiência passa a ser reconhecida como uma das diretrizes da Política Nacional de Humanização do SUS, enfatizando a necessidade de se repensar o espaço físico na saúde, com a implicação e o protagonismo daqueles que convivem e se inter-relacionam nesse espaço: trabalhadores, usuários e gestores (BRASIL, 2013). Para Glanzner e Olschowsky (2017), a ambiência nos serviços de saúde apresenta também uma função terapêutica, quando se incorporam aspectos relacionados à estrutura física, recursos humanos e relações sociais do trabalho. Assim, ter um espaço adequado para a realização do trabalho, caracteriza-se uma forma de fortalecer a identidade do profissional, valorizando-o como trabalhador da saúde, gerando engajamento e vontade de fazer o melhor para o usuário do serviço.
Ainda com relação aos obstáculos para ofertar as PIC na APS, um estudo realizado por Da Costa Matos (2018) correlaciona-se com os resultados encontrados neste estudo, uma vez que apresentam que, de fato, a falta de estrutura física, como também a capacitação dos profissionais se constitui em gargalos para implementação das PIC na atenção primária. Destaca-se ainda que, diferentemente de outras políticas do Ministério da Saúde, as PIC não possuem um financiamento específico para sua implementação. Essa falta de capacitação pela a secretaria é muito falha. Para melhorar isso, acredito que um local próprio, como também uma capacitação contínua. Nós também não contamos com o NASF. ” (G1) “Falta de incentivo da secretaria, da gestão.
Porque, geralmente, temos tão pouco para trabalhar com a promoção. Então, pare. ” (G22) Da Costa Matos e colaboradores (2018), mencionam que por mais valiosa e relevantes que sejam as técnicas envolvidas nas PIC há escassez de profissionais especializados, uma vez que pouquíssimos cursos de graduação na área da saúde oferecem disciplinas sobre PIC em sua grade curricular. A inclusão dessas terapias na formação dos acadêmicos da saúde é citada por De Medeiros Gomes et al (2017), sugerindo que as PIC, como política do SUS, não podem ficar à margem dos currículos de formação dos profissionais da saúde. Nessas Condições, esses autores relatam a experiência da Universidade Federal de Fortaleza (UNIFOR), que incluiu o conteúdo das PIC no currículo integrado dos cursos do Centro de Ciências da Saúde, como também sua introdução no módulo de Universidade, Saúde e Sociedade.
Nessa experiência, os autores evidenciaram que, a cada semestre, a maioria das terapias não são conhecidas pelos alunos, mas muitos relatam a riqueza da pesquisa para eles como futuros profissionais de saúde. Nesse sentido, cabe ao gestor federal, o estabelecimento de diretrizes para a educação permanente na PNPIC. Enquanto, ao gestor estadual, cabe a implementação das diretrizes da educação permanente em consonância com a realidade regional. E, para o gestor municipal, tem-se o estabelecimento de mecanismos para a qualificação dos profissionais do sistema local de saúde (BRASIL, 2006). Contudo, pode-se inferir que esse processo de capacitação para os profissionais, e, por conseguinte, a educação permanente, ainda não permeiam a realidade da maioria dos municípios da RMG. Os entrevistados relatam em seus discursos, a angústia conferida a novos programas ou propostas de ação nos serviços públicos que não são estruturados de forma a garantir a sua permanência, uma vez que, em pouco tempo, encontram entraves e perdem a adesão e o engajamento dos envolvidos.
esse tipo de serviço pode ser um problema, pois pode ser um serviço a mais para a equipe. Daí uns vão entender que, é mais um serviço para eles!” (G4) “[. é um gasto a mais também para as equipes. Eu acho que se tivesse mais incentivo contínuo, ajudaria a motivar a equipe. ” (G7) “[. Além disso, os médicos ainda são muito resistentes. Eles não vão aceitar muito não!” (G11) “[. a gente tem mais resistência é dos profissionais. A cabeça do profissional é complicada. Eles pensam assim: antigamente funcionava assim, o porquê de ser diferente ou mudar agora?!” (G17) “Acho que para implantar [. Segundo Gomes (2011), são as próprias instituições de saúde que devem alavancar o seu papel social, por meio de uma transformação profunda nos seus processos internos de gestão, de modo a reverter os resultados para a satisfação do usuário e o consequente atendimento às suas demandas em tempo hábil.
Para a autora, a adoção de práticas permanentes de investimento nos recursos humanos pode orientar uma mudança valorativa e nas atitudes, de modo que contemplem uma participação mais efetiva, gerando a redução de problemas potenciais (GOMES, 2011). Portanto, os resultados demonstram que os fatores potencializadores, que contribuem para com o processo de implantação e implementação das PIC nos serviços de APS da RMG, devem ser desenvolvidos, estimulados e incentivados pelos gestores. Ao passo que, as fronteiras externas, que dificultam o processo de oferta das PIC, precisam ser tratadas como desafios a serem enfrentados para que se consiga alcançar resultados favoráveis no percurso da gestão destas práticas nos serviços de APS. Categoria Temática 3- Concepções de saúde, integralidade e cuidado à saúde nos serviços de Atenção Primária à Saúde Esta categoria destacará, com base nas percepções e definições de nossos entrevistados, os conceitos de saúde, integralidade e cuidado primário à saúde (Quadro 2).
Embora pareça que todos tenham uma certa noção do que constituiria esse estado, o autor aponta que isso ainda é bastante indefinido e vago (DEJOURS, 1986). Segundo Caponi (1997), mesmo o conceito proposto pela OMS merecendo crítica, esta não deveria recair sobre seu aspecto subjetivo, uma vez que a subjetividade é elementar ao conceito de saúde-doença, estando presente tanto numa perspectiva restrita quanto ampliada de saúde. As concepções, compreensões e percepções a respeito do que seja saúde são cercados de complexidades, em virtude dessa definição envolver um campo bastante amplo, tornando possível que cada pessoa opine a respeito. Foram identificados a partir da análise do material obtido nas entrevistas, conceitos voltados para a qualidade de vida, para o bem-estar e para os Determinantes Sociais da Saúde (DSS).
Na perspectiva do gestor, a saúde assume uma versão positiva, como indicam os trechos das entrevistas a seguir: “[. na unidade básica, de acordo com que a gente trabalha, creio que é a prevenção, orientações aos pacientes. ” (G12) “É aquela definição da OMS [. bem-estar físico, moral, intelectual. ” (G22) Segundo Polak (1996), a concepção de corpo no contexto da saúde, demanda-se o estabelecimento relacional entre a convergência de três dimensões, a saber: sujeito, natureza e cultura. Dessa forma, o autor enfatiza a importância de considerar os riscos das posições reducionistas que percebem o homem de maneira dicotomizada como sendo só natureza, ou cultura ou apenas sujeito. É vínculo [. ” (G12) [. então, o que eu puder levar de bem-estar e saúde, como também prevenção para o meu paciente, para a minha comunidade, eu levarei.
” (G17) A percepção apresentada pelos gestores coloca a saúde como sinônimo de prevenção, a qual se destina a detecção, controle e redução dos fatores de risco de doença (BUSS, 2009). Segundo Lefvèvre e Lefèvre (2004, p. Essa concepção de saúde como expressão da qualidade de vida é sentida nas falas dos entrevistados. Nessa perspectiva, os gestores ressaltam alguns elementos dos DSS, ao indicar o peso das condições sociais como um fator importante para os usuários atingir ou não a saúde, de acordo com o trecho abaixo dito por um gestor: “Vou lá para o conceito geral, principalmente, para a gente que trabalha na Estratégia Saúde da Família. Esse conceito tem que ser mais ampliado. O tema tem que ser mais ampliado.
Então, aqui, a gente depende muito da situação da pessoa [. A inclusão da integralidade ao conceito de saúde ocorreu em vários relatos dos gestores, demonstrando em alguns, uma visão integral do ser humano, como também o inconformismo com o modelo vigente de se perceber a saúde, como se vê nas falas a seguir: “Saúde é o que não acontece [. Saúde é o integral [. É atender a pessoa na integralidade, e não só ver a doença em si. É enxergá-la como um todo. Tanto físico, quanto o principal, o emocional. ” (G12) Ainda com relação à concepção de integralidade, identifica-se, nas falas, um esforço para a melhoria da atenção à saúde dos usuários assistidos, de modo a alcançar à integralidade.
Todavia, as narrativas direcionam para a dificuldade de se concretizar plenamente essa integralidade, demonstrando a desintegração na prática do serviço, conforme estas falas: “A gente tenta sim, mas ainda é algo distante. Ainda existe a forte cultura do atendimento. Alguns gostam e pedem orientações, mas a maioria não tem paciência para ouvir, para mudar o comportamento, mudar o estilo de vida. Assim é difícil. ” (G24) Referindo-se a forma como a equipe coloca a integralidade em prática, os entrevistados mostraram, durante as suas falas, haver a hegemonia do modelo biomédico na APS, reforçando a tão discutida fragmentação da atenção, explicitados nas seguintes falas: “A questão da integralidade ainda falta muito para acontecer. Falta melhoria. Ainda prevalece o tratamento, sendo o preventivo e a promoção de saúde deixado para segundo plano.
” (G18) “Acaba que um prevalece mais sobre o outro, na integralidade. Hoje o que mais prevalece é o atendimento. Prevenção mesmo [. está sendo mais nas vacinas. ” (G23) É interessante observar que as opiniões dos gestores acima denotam um certo conhecimento da temática integralidade, assim podemos notar que esses gestores conceituam ao seu modo, de acordo com a sua experiência e vivência profissional. Além disso, podemos destacar que eles não se prendem a conceitos definidos e acabados, demonstrando que cada um lê o SUS e o representa à sua maneira através da percepção. Nesse ponto, Mattos (2001) considera que a integralidade é mais que uma diretriz do SUS, constitui-se uma bandeira de luta, um ideal de uma sociedade livre, justa e solidária. Acredito que nos esforçamos para atingir essa integralidade, mas não é fácil.
” (G2) Ainda de acordo com Silva, Miranda e Andrade (2017), é evidente a complexidade em torno do termo integralidade, diante de sua pluralidade de interpretações, que vão desde as práticas no cuidado até a articulação do sistema. Desse modo, os autores abordam a necessidade de debates, de modo que os profissionais percebam de forma constante a importância da integralidade na rotina dos serviços, sentindo a diferença quando esta não está presente. Viegas e Penna (2013) defendem que para a construção da integralidade na prática, faz-se necessário o potencial criativo de cada profissional, de forma integrada com a equipe, objetivando uma ação coordenada para a produção e a promoção do cuidado. Entretanto, o autor afirma que essa estratégia ainda não é uma realidade, posto que a assistência ainda é sustentada no modelo médico-centrado, com foco na doença, gerando uma atenção fragmentada.
O autor conclui que é possível perceber a importância da sua articulação para um processo de produção da saúde que resgate o ser humano como foco das práticas em saúde. Entretanto, sob o advento da conjuntura político-social adversa que o Brasil se encontra, agora, no qual o atual governo propõe um modelo que impacta na universalidade do sistema, pretendendo condicionar a liberação de verbas a municípios ao número de usuários cadastrados, isso parece ficar mais distante. Dessa maneira, precisamos insistir na defesa de um modo de produzir saúde que não esteja direcionado à lógica do capital, o qual desumaniza e cria obstáculos para a saúde como direito civil (CARNUT, 2017). Os participantes relacionaram o cuidado primário à saúde como símbolos do cuidar, do prevenir, e do enxergar o usuário de forma integral, enfatizadas pelas gestoras enfermeiras do estudo: “Proporcionar saúde é o cuidado.
É ver o indivíduo. A gente tem que acompanhar toda a família. ” (G15) “É você cuidar do próximo de forma integral. É você não ficar mecanizado só com a doença do paciente [. ” (G20) Neto et al (2007), acreditam que esse resultado talvez se deva ao fato de que as enfermeiras tenham uma grande apropriação dos saberes e práticas nos campos da Saúde Pública e da Saúde Coletiva, especialmente na APS. De acordo com as compreensões de Breda et al (2005), o profissional de saúde ao conceber o papel de cuidador no paradigma sanitário atual, permite-se o encontro de subjetividades, sendo alvo de investimentos e transformação do cuidado. devemos olhar a queixa dele mais a fundo. ” (G14) Deslandes (2006) ressalta que pode haver uma despersonalização do processo de cuidado, caso os profissionais de saúde não estiverem constantemente vigilantes à dimensão subjetiva.
Essa tendência à despersonalização pode ocorrer por meio da padronização do diagnóstico que desconsidera as manifestações singulares, como também o uso destemido das chamadas tecnologias duras relacionadas à equipamentos tecnológicos, normas, rotinas e estruturas organizacionais (DESLANDES, 2006). Contudo, os relatos demonstram que ainda persiste a reprodução de ações e práticas centradas no modelo biomédico, embora os gestores reconheçam suas limitações. São fatores como esses que dificultam a implementação e expansão de novos modelos de cuidado, como as PIC. Como limitação deste estudo, reconhece-se a escolha de uma única categoria profissional, o gestor do serviço que não oferta ou deixou de ofertar as PIC no momento da coleta de dados, o que se justifica o fato de ser este um estudo exploratório.
Logo, uma viabilidade de reparar tal limitação seria expandir para os profissionais de saúde e usuários do serviço, em uma próxima pesquisa.
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