FILIAÇÃO POR SOCIOAFETIVIDADE NO DIREITO DE FAMÍLIA: O VALOR JURÍDICO DO AFETO E A IMPORTÂNCIA DO RECONHECIMENTO EXTRAJUDICIAL DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

Tipo de documento:TCC

Área de estudo:Direito

Documento 1

Aprovada em: / / BANCA EXAMINADORA ____________________________________________ Prof. José Martins Costa Neto (Orientador) Universidade Ceuma _______________________________________________ (Examinador) Universidade Ceuma _______________________________________________ (Examinador) Universidade Ceuma 3 AGRADECIMENTOS A Deus acima de tudo, ao meu amado Jesus, Aquele que morreu em uma cruz por mim para que eu tenha o dom da salvação. Ao Cristo, que me amou desde o princípio, e entre as inúmeras bençãos concedidas a mim, me deu mais esta oportunidade de cursar esta graduação em direito. A minha amada esposa Rose Baldez, que sempre acreditou em mim quando ainda não havia elementos concretos para tal, porém sempre me incentivou e está comigo em todos os momentos, sendo meu alicerce, meu porto seguro. Aos meus pais Maria Inês e Mariano César, pelo dom da vida e por me ensinarem em retidão, o que resultou na construção do meu caráter.

Para tanto, apresenta uma análise jurídica sobre a família no Brasil; discute os vínculos de família, explicando as espécies possíveis de filiação socioafetivas; esclarece sobre a multiparentalidade no Brasil; e aborda o reconhecimento extrajudicial da socioafetividade e os avanços trazidos pelo Provimento nº 63 do CNJ no quer diz respeito ao reconhecimento extrajudicial da filiação socioafetiva. Como metodologia, foi realizada uma pesquisa bibliográfica em doutrinas e na legislação vigente, aliada a uma análise jurisprudencial, a qual orienta a elucidação do tema proposto permitindo concluir que a unificação e a simplificação viabilizadas pelas novas normas que facilitam o registro da filiação demonstram a necessária sensibilidade com relação à atual realidade da sociedade brasileira, sendo também uma tentativa de investir na desjudicialização.

Palavras-chave: Família. Reconhecimento extrajudicial. Novas configurações. Conceito e evolução da Família. Os novos tipos de família. Princípios do Direito de Família. A família no Código Civil 2002. DOS VÍNCULOS DE FAMÍLIA. REFERÊNCIAS. INTRODUÇÃO A filiação socioafetiva é uma possibilidade jurídica da ordem civilconstitucional de 1988, uma vez que a constituição desta relação familiar passou a levar em conta o critério da socioafetividade, rompendo com a hegemonia do parâmetro natural ou consanguíneo, atentando-se a evolução da sociedade, que vivencia uma intensa transformação das famílias, que passaram a ser vistas como um verdadeiro mosaico, um ninho de comunhão, focalizada na realização pessoal dos indivíduos e no respeito mútuo entre seus membros.

A abertura do direito aos fatos sociais implica em maior aproximação da realidade vivenciada. Quanto maior for a eficácia da norma, maior será sua correspondência com os costumes, valores e com a vivência que se pratica na vida social e no núcleo familiar. Abdica-se da compreensão da família como uma organização natural, para reconhecê-la como um fato cultural, recepcionando o afeto como elemento constituidor destas entidades. Trata-se de estudo relevante, pois, além da redução da quantidade de demandas judiciais que se referem ao registro civil, as novas regras trazidas pelo Provimento nº 63/2017 passaram a favorecer um grande contingente de pessoas em todo o país, pessoas que não tinham sua filiação legalizada devido aos óbices que até então eram impostos.

Referidas medidas objetivam simplificar o acesso ao direito ao registro do estado de filiação. Mister destacar a extensa capilaridade das disposições trazidas pelo Provimento nº 63/2017 frente a atual realidade da família brasileira, que apresenta múltiplas combinações e especificidades, o que levava a um déficit registral, especialmente quanto à filiação. No desígnio de cumprir o objetivo geral dessa pesquisa, qual seja, explicar o reconhecimento extrajudicial da socioafetividade foi realizada uma pesquisa bibliográfica em doutrinas e na legislação vigente, aliada a uma análise jurisprudencial, a qual orienta a elucidação do tema proposto. Para atingir ao objetivo proposto, esta pesquisa encontra-se dividida em três capítulos. Conceito e evolução da Família Não é possível oferecer uma noção definitiva sobre o que seja a família.

Ao contrário, por ser uma instituição de caráter cultural, está sujeita aos acontecimentos e mudanças históricas e geográficas. Exemplo disso são as muitas formas de constituição familiar existentes no Brasil. Existe as famílias constituídas por pares homoafetivos, as originadas pela adoção, pela reprodução assistida, aquelas em que o laço que une seus integrantes é o afeto, além daqueles cujo laço predomina é o biológico. Há, também, as famílias que são constituídas por integrantes de diversas gerações e as famílias extensas (DEMARI, 2019). Essa visão predominou no séc. XVIII, quando ainda não havia qualquer ingerência do Direito Público no Direito Privado. Caso o Estado limitasse direitos dos cidadãos seria com o objetivo de suprir interesses deles próprios (CALDERÓN, 2017).

O Direito Público emanava do Estado e se referia a interesses gerais, enquanto o Direito Privado atuava apenas na esfera dos direitos naturais de cada pessoa (GIORGIANNI, 1998). Sobre o individualismo marcante do Direito Privado, percebe-se o aspecto predominantemente subjetivista, que se disponibilizava a disciplinar a vida dos indivíduos em meio à sociedade. No início do séc. XX o foco do direito civil ainda recaía sobre o indivíduo, a propriedade, que traduzia o Direito Privado em termos econômicos, e o contrato, que regulamentava a aquisição dessa propriedade. Esse era o tripé que sustentava e dava segurança às codificações da época. Sob o enfoque jurídico, esse período, iniciado a partir do Código Napoleônico de 1804, não inaugura apenas um século de estabilidade, mas também um século de esterilidade.

Isso, porque os juízes exclusivamente aplicavam e respeitavam com rigor os códigos já existentes e que continham os interesses individuais dos cidadãos. No entanto, ainda não havia influência do Direito Público no Direito Privado. Na década de 1930, no Brasil, já havia um número significativo de leis extravagantes, demarcando uma segunda fase na qual as relações patrimoniais deixam de ser exclusivamente reguladas pelo Direito Privado. Esse conjunto de leis formou um direito especial que disciplinava situações originadas a partir das modificações na economia. Com a maior intervenção do Poder Público desenvolveram-se programas assistenciais, oriundos do dirigismo contratual, que contribuiu significativamente para as mudanças no direito civil (MULTEDO, 2017). Constituições posteriores à 2ª Guerra Mundial apresentavam normas divididas entre princípios e regras que se preocupavam em tratar de direitos sociais, da limitação da autonomia privada e da propriedade.

da liberdade de planejamento familiar no art. § 7°, e nos deveres da família e dos pais para a proteção das crianças, adolescentes e idosos no art. caput, § 6°, 229 e 230, a CRFB/1988 não estabeleceu qualquer prioridade ou superioridade das famílias constituídas pelo casamento sobre as demais, conferindo igualdade de tratamento para as famílias, independente da forma como são constituídas. Segundo Paulo Luiz Netto Lôbo (2018), a questão que se aventa e que é objeto de recorrentes debates jurídicos é se a CRFB/1988 reconhece como entidade familiar apenas o casamento, a união estável heteroafetiva e as famílias monoparentais. O autor concluiu que os três tipos previstos na Constituição são meramente exemplificativos. Esse direito constitucionalmente assegurado à criança e ao adolescente salvaguarda o ambiente familiar de interferências estatais arbitrárias (CALDERÓN, 2017).

É possível afirmar que o princípio constitucional que assegura a convivência familiar traz consigo uma carga positiva, de cunho nitidamente prestacional, e outra carga negativa (abstencionista), com a coibição de interferências estatais desnecessárias ou injustificadas no ambiente, estrutura, dinâmica e gestão familiar (DIAS, 2016). O direito à convivência familiar, entretanto, não é absoluto, não encerra um fim em si mesmo, não se circunscreve ao estrito núcleo de pais, mães e filhos, muito menos comporta formulações apriorísticas e quadros pré-concebidos. O primeiro ponto a ser explorado é que o direito à convivência familiar, como dito, não é absoluto, devendo guardar sintonia com outros princípios constitucionais que lhe conferem legitimidade, com especial realce para o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, o princípio da parentalidade responsável e, em um espectro mais amplo, o próprio princípio da dignidade da pessoa humana.

Significa dizer que a convivência somente deverá ser assegurada se, por seu intermédio, os membros de determinado grupo familiar – notadamente aqueles que se apresentam mais vulneráveis, mais suscetíveis e mais dependentes – puderem dele (grupo) se valer positivamente, ou seja, se das relações interpessoais mantidas dentro de determinada estrutura familiar seus membros puderem angariar elementos que contribuam para seu desenvolvimento biopsíquico-social (MULTEDO, 2017). Assim, considera-se um valor ético-moral, confundindo-se com a fraternidade, pois significa colocar-se no lugar ocupado pelo outro e assumir como seu um interesse que é de um terceiro. No plano social, a solidariedade é o elemento essencial para que exista um grupo formando a sociedade, uma vez que sem essa não há como se constituir um grupo humano dotado de dignidade. Juntamente com a liberdade, também a igualdade e a justiça constituem um quarteto axiológico que confere suporte ao Estado Democrático de Direito brasileiro (MARTÍN, 2017).

No ambiente familiar, a solidariedade apresenta-se como ingrediente fundamental para a existência do grupo familiar. Os membros de uma família, independente de como essa se formou, se unem com interesses comuns, ligados pela afetividade e cumprem deveres de natureza solidária uns com os outros (MARTÍN, 2017). e 1. do CC ou mesmo de atitudes que se iniciam com uma ação solidária, como a adoção (art. CC/2002). Além disso, está presente em diferentes danos sofridos no ambiente familiar como lesão à capacidade sexual ou de procriar de um dos cônjuges, estupro de vulnerável, envolvendo filha ou enteada, não reconhecimento de vínculo parental, falta de assistência ou visitação, descumprimento de deveres alicerçados na boa fé e danos extrapatrimoniais como abandono afetivo de grupos mais vulneráveis, como as crianças e os adolescentes (MORAES, 2016).

Dessa forma, entende-se que o princípio da solidariedade familiar tem como objetivo a assistência mútua, o respeito e a cooperação entre os componentes do núcleo familiar. O mesmo diploma legal também traz em seu art. um conceito claro sobre as distintas formas de parentesco. Segundo este dispositivo legal, o parentesco pode ser natural ou civil, conforme decorra de consanguinidade ou tenha outra origem. O termo “outra origem” explicita a possibilidade desse parentesco ser socioafetivo. Esse entendimento é reforçado pelo Enunciado 103 da I Jornada de Direito civil do CJF que dispõe que o Código Civil, em seu art. Em todas as relações intersubjetivas, principalmente familiares, antes mesmo de ser reconhecido 3 REsp 1330404/RS – Rel Min Marco Aurélio Bellizze, julgado em 05/02/2015. como valor jurídico, pode-se verificar a presença do cuidado.

Referido pressuposto antecede diversos princípios e definições do Direito, que são fortalecidos por ele. Entendendo, portanto, que a afetividade seja um princípio, para que esse possa ser melhor compreendido, faz-se necessário, inicialmente, analisar os alicerces sobre as quais se sustenta. O princípio da afetividade é corolário do princípio da dignidade da pessoa humana e da solidariedade. A Constituição a aprecia como fundamento incontestável da República, alicerce precursor para a constatação da absoluta prioridade que as situações existenciais têm perante as patrimoniais (MORAES, 2016). Acrescente-se que o princípio da igualdade, advém da dignidade da pessoa humana, podendo ser dividido em: igualdade formal, com a máxima de que todos são iguais perante a lei, e igualdade substancial, com a qual se entende que os desiguais devem ser tratados conforme as suas desigualdades.

Essa última é a interpretação que há de ser considerada. Compreende-se dessa forma, que o Estado Democrático de Direito no Brasil é alicerçado em três fundamentos: dignidade da pessoa humana, igualdade substancial e solidariedade social. Essa tríade configura-se nos parâmetros axiológicos da jurisprudência e de todo o aparato jurídico conceitual, colaborando 21 intensamente para a reviravolta que ocorreu nos conceitos próprios do direito privado (MORAES, 2016). Nesse dispositivo, está sendo feita a aplicação prática dos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar e, resultando dessa conexão, o princípio da afetividade. Entretanto, deve-se entender que a tradução para todos os conceitos que se referem a criar, assistir, amparar e ajudar está no simples cuidar. A ausência do cuidado pode configurar abandono afetivo, que pode ser definido como o ato onde um ou ambos os genitores descumprem o dever, previsto na CRFB/1988 de dar total assistência, educação, saúde, além de promover o desenvolvimento físico, psicológico e social de seus filhos.

A família no Código Civil 2002 Diferentemente de outros sistemas jurídicos, o CC brasileiro atual designa o Livro IV ao Direito de Família, na Parte especial, um total de 273 artigos, que vão do art. até o art. Sabe-se que as regras vigentes antes que a Lei 10. passasse por mudanças, não podiam mais suportar as modificações de um país tão distinto de quando a antiga legislação fora criada (DIAS, 2016). No que tange especificamente ao conteúdo do Livro de Direito de Família dentro do CC/2002, importa destacar alguns pontos que trouxeram sensíveis modificações, para nosso ordenamento, em relação à matéria codificada anterior. Assim, merecem ser observados: i) O fim da supremacia do homem como chefe da família e as distinções entre o homem e mulher em um relacionamento conjugal.

Essa transformadora mudança de parâmetros, implementada pela CRFB/1988, se espraiou por toda a matéria de Direito de Família no CC e, por si só, já bastaria para justificar a alteração e o progresso dos paradigmas do Direito de Família codificado; ii) O fim das desigualdades entre os filhos, o encerramento da distinção entre legitimidade e ilegitimidade da filiação, a mudança de pátrio poder para poder familiar; iii) alterações nas normas de invalidade matrimonial, inclusive alterando prazos importantes; iv) A nova perspectiva do direito de alimentos, afastado agora da mera garantia de subsistência para um panorama muito mais voltado para a dignidade da pessoa alimentada; v) A supressão do regime dotal e a inclusão do regime de participação final nos aquestos; vi) A preservação do bem de família como uma reserva de patrimônio para a proteção familiar; vii) Reforço do arcabouço teórico dos institutos da tutela e da curatela; viii) A inclusão, mesmo que malfeita, da união estável como modalidade de família codificada (NERY, 2013).

p. Tem-se, de maneira muito próxima à família nuclear (aí incluída a entidade familiar) o conceito de família de Diniz (2020, p. segundo a qual se trata de “um grupo fechado de pessoas, composto de pais e filhos, e para efeitos limitados, de outros parentes, unidos pela convivência do afeto, numa mesma economia e sob a mesma direção”. Destacam-se, no conceito da renomada professora, os aspectos da afetividade dos membros e da economia familiar. Sobre o primeiro ponto, o da afetividade, não restam maiores dúvidas em relação ao progresso da afetividade no que tange à família nuclear em relação à família em acepção lata ou amplíssima (DINIZ, 2020). Se a família nuclear é a constituída pelos pais e sua prole, a família 25 plural não se enquadra em nenhum desses padrões.

E, a aplicação técnica de referida concepção de família, no dia a dia dos tribunais e nas varas de família, necessita estar em consonância com essa visão. DOS VÍNCULOS DE FAMÍLIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO Como já visto, o sistema jurídico brasileiro, sob a forte influência de preceitos de ordem constitucional, e informado por uma visão aberta e plural (não exclusivamente matrimonializada da família), tornou, seguramente, o afeto como valor jurídico. Foi visto também que a evolução histórica, no Brasil, da organização das entidades familiares encontra, em determinado momento, o conceito de família como um elemento estruturante do moderno Direito de Família em nosso país. A despeito de uma tradição excludente e minimalista – pois considerava família apenas aquela organização oriunda de um enlace matrimonial – a CRFB/1988 apresenta ao Direito pátrio um novo instituto, denominado de “entidade familiar”, que passou a ser, progressivamente, o parâmetro doutrinário e interpretativo para uma nova concepção de família, dessa vez baseada fortemente na ideia de “afetividade”.

Parentesco, no conceito de Diniz (2020, p. “é a relação de vínculo existente entre descendentes ou entre pessoas que possuem um mesmo tronco comum, mas também entre um cônjuge e os familiares do outro, entre o adotante e o adotado, e entre o pai institucional e filho socioafetivo”, estendendo-se aos demais parentes. O conceito inclui o parentesco por afinidade, que abrange não apenas os parentes do cônjuge, mas também do companheiro, bem como o parentesco socioafetivo. Assim, considera-se o parentesco por consanguinidade, por adoção ou socioafetivo e por afinidade. Conforme explica Dias (2016), o parentesco por consanguinidade, que é o vínculo entre os indivíduos que descendem uns dos outros (linha reta), como pais e filhos, avós e netos, ou que descendem de um tronco comum (linha colateral), como irmãos, tios e sobrinhos, era discriminado no CC de 1916, como também ocorria com a filiação, denominando-o de legítimo, quando havido do casamento, e ilegítimo, quando fruto de relações extramatrimoniais.

É o chamado parentesco de sangue, seja na linha reta ou na colateral. Este parentesco se divide em matrimonial, quando advém do casamento, e extramatrimonial, se oriundo de uma união estável, concubinato e relações sexuais eventuais, sem que esta diferenciação, necessária em razão das presunções legais de filiação observada na constância do casamento, importe em discriminação da prole. Nos dizeres de Diniz (2017), o parentesco natural pode ser duplo, se derivado de ambos os genitores, a exemplo dos irmãos germanos ou bilaterais, ou simples, se derivar somente de um genitor, como ocorre com os irmãos unilaterais e os sobrinhos. Parentesco civil, conforme elucida Diniz (2017) é constituído por sentença judicial, por ato voluntário das partes, como a adoção (art.

da Lei 8. Assim, não são afins os sobrinhos, tios e primos do cônjuge, não ocorrendo, da mesma forma, a afinidade entre os afins, como os concunhados, por tratar-se de um vínculo pessoal. Estabelece o art. do CC que: Art. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade. § 1º O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro. Cada uma dessas possibilidades será discutida a seguir. Da adoção judicial A adoção judicial é aquela que advém de um ato jurídico por meio do qual é criado um vínculo ao qual denomina-se de “paternidade-maternidade-filial” entre pessoas estranhas, não havendo a necessidade de existir um vínculo de relação de parentesco biológico consanguíneo.

Este tipo de adoção, no magistério de Diniz (2017) dá origem a um parentesco eletivo, já que ocorre exclusivamente por força da vontade e de um gesto de amor e solidariedade, onde o que se visa somente o benefício do filho adotado. Ao adotado, segundo Dias (2016) é conferida a condição de filho, passando a ter todos os direitos e deveres que um filho consanguíneo possui. O instituto da adoção é amplamente prestigiado pela CRFB/1988, pelo ECA e pelo CC/2002, em que resta claramente demonstrada a preocupação dispensada pela sociedade em valorar, com maior intensidade, os vínculos afetivos, atribuindo a qualidade de pais aos que por alguma razão não puderam sê-los. Como explica Gonçalves (2015), por tal conduta ser vista como um ato de nobreza, cujo intuito é apenas incluir o filho alheio ao seio familiar, defende-se então sua descaracterização no CP, valorizando assim, o lado humano e social da falsa declaração.

O fato de se desejar criar de qualquer forma a filiação, de fato, acaba obrigando os pais a infringirem as normas legais, porém deve-se levar em conta os vínculos afetivos criados entre filhos e pais adotantes, o que acaba tornando irrevogável o registro promovido. Do reconhecimento voluntário de filho do cônjuge ou da companheira Quando um cônjuge, sozinho, comparece por livre e espontânea vontade ao cartório de registro civil e declara como se fosse seu filho, de vínculo biológico, a criança do outro cônjuge, na verdade está-se diante de uma das formas de adoção à brasileira. Porém, segundo Gonçalves (2015), com o rompimento do vínculo conjugal, o autor da falsa declaração e do registro busca via judicial a anulação do referido registro, alegando o vício ocorrido quando do registro civil, uma vez que, findando o vínculo conjugal, ainda persiste, em tese, a obrigação de prestar alimentos ao suposto filho.

O registro de filho alheio quando realizado de forma consciente, inexistindo prova seja de coação ou erro, acaba impossibilitando uma posterior anulação, pois configura o desejo de formar o vínculo familiar, assim como, a ligação pelo afeto entre pai e filho. Irrevogabilidade do ato registral (art. ECA), mesmo diante de exame de DNA excluindo a paternidade e não demonstrada presença de vícios de vontade no ato 6 jurídico. Deram provimento à apelação. Segundo o Min. Massami Uyeda (2009 apud FIGUEIREDO; FIGUEIREDO, 2015) quando se trata de adoção à brasileira, o melhor que existe a ser feito é somente autorizar que o pai adotante busque pela nulidade do registro civil da criança, quando ainda não se houver constituído qualquer tipo de vínculo de socioafetividade com o adotado.

Do filho de criação A adoção de fato se baseia única e exclusivamente na relação de afeto, não tendo qualquer vínculo jurídico nem biológico, ao contrário do que se observa na adoção civil e na adoção brasileira. Por tratar-se de uma relação fundamentada exclusivamente no amor obtido pelos pais, para que a situação de “filho de criação” seja vista como uma realidade social (socioafetiva), é necessária a sua consolidação. Neste caso, a comprovação da posse do estado de filho está diretamente relacionada à finalidade de mostrar ao mundo jurídico uma verdade social (GRAEFF, 2019). É importante analisar sempre a situação fática, avaliando o convívio entre pai e filho, por este ser um dos mais importantes pressupostos para que a paternidade socioafetiva seja evidenciada, além da presença do afeto, desejo livre e consciente de ser pai.

É óbvio que a criança que passa a conviver em uma família, mesmo tendo conhecimento que não há vínculo biológico entre ela e os pais, merece ser agraciada com os mesmos direitos pertinentes à filiação biológica. É evidente que a partir do momento em que se vê caracterizada a figura do “pai de criação” tem-se a “adoção de fato”. Diante do acima exposto entende-se que o reconhecimento da adoção de fato, conforme os princípios consagrados na CRFB/1988 e os entendimentos doutrinários mais modernos são de grande valia na medida em que valoriza o vínculo socioafetivo buscando, acima de tudo, assegurar o melhor interesse da criança. Finalizando esta seção e tendo sido analisado o valor jurídico do afeto frente à pluralidade de entidades familiares convivenciais existentes, passa-se na próxima seção a analisar o paradigma da multiparentalidade e as mudanças trazidas ao direito de família.

Multiparentalidade A multiparentalidade não se encontra expressamente prevista no texto constitucional, como ocorre com as modalidades de família conjugal, convivencial e monoparental e, de mesmo modo, não possui previsão legal nas normas jurídicas vigentes no ordenamento jurídico posto. O reconhecimento jurídico da existência de tal modalidade familiar e a possibilidade de seus efeitos fáticos gerarem repercussão na seara jurídica se deu com o julgamento do RE 898060/SC realizado pelo STF. do Provimento nº 63/2017. Pessoa até 12 anos incompletos, em conformidade com o que determina o art. º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8. publicação do novo ato normativo acarretou, desse modo, sutil modificação das disposições anteriormente emanadas pelo Conselho Nacional de Justiça. Explica-se. Ante às informações analisadas, verifica-se que mesmo com a mudança ocasionada pelo Provimento nº 83/2019 e as restrições por ele estabelecidas, ainda se faz possível a configuração da multiparentalidade pela via extrajudicial, sabendose que a referida modalidade de convivência familiar se caracteriza na existência de três ou mais vínculos parentais em primeiro grau ascendentes, o que se fará plenamente preenchido no caso de haver o reconhecimento e o registro de um 11 “Art.

O reconhecimento voluntário da paternidade ou da maternidade socioafetiva de pessoas acima de 12 anos será autorizado perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais. ascendente socioafetivo – seja na linha maternal ou paternal – na constância de outros dois vínculos parentais. Por essa razão, entende-se que a manifestação de Regina Beatriz Tavares da Silva (2019), no sentido de que o próprio CNJ havia modificado seu entendimento no que se refere à possibilidade de formatação de família multiparental de forma extrajudicial, não encontra esteio no que dispõe o Provimento nº 63/2017, seja ele considerado antes ou depois das modificações carreadas pelo Provimento nº 83/2019. Além de a mencionada modalidade familiar ser tratada nos atos normativos aludidos, ela é objeto ainda de manifestação do Projeto de Lei nº 470, de 2013 – anteriormente referido –, já que no art.

° do Código Civil). Carvalho (2015) diz, ainda, que a parentalidade registral é a que identifica, na certidão de nascimento, os parentes do indivíduo e goza de presunção de veracidade e publicidade. É esta parentalidade que fornece a base documental do ser humano em toda a sua vida, tornando possível que este comprove juridicamente que existe e consubstanciando-se em requisito para o gozo de direitos e cumprimentos de deveres que surgem em razão do parentesco. A paternidade, segundo Carvalho (2015) é o vínculo mais próximo de parentesco do qual se tem conhecimento e é presumida no casamento. Então, em caso de casamento entre homem e mulher não é necessária a declaração do marido para o registro dos filhos gerados por sua esposa na vigência do matrimônio.

Esta forma de parentalidade não está, portanto, limitada à posse do estado de filho, sendo esta somente uma das diversas espécies existentes (art. do CC/2002), configurando-se também na adoção, reprodução medicamente assistida (reprodução heteróloga) e até na adoção à brasileira, que é a que se concretiza quando uma pessoa, motivada pelo afeto, registra e cria como se fosse seu próprio filho, o filho biológico de outrem. Aqui importa destacar que a adoção à brasileira não é uma modalidade de adoção permitida no ordenamento brasileiro, porém, não se pode 12 Art. A filiação prova-se pela certidão do termo de nascimento registrada no Registro Civil. Art. O tabelião e o registrador brasileiro, pelo conhecimento que possuem, ao desempenharem as suas funções, adequarem os atos e fatos aos instrumentos jurídicos e não jurídicos necessários à produção do melhor feito jurídico a cada caso concreto, conferem fé pública ao documento que eles próprios lavram, funcionando como um instrumento que garante a segurança e assegura a extensão dos direitos privados, acautelando eventuais conflitos.

O Provimento nº 63 do CNJ traz disposições sobre o reconhecimento voluntário e a averbação da paternidade/maternidade sociafetiva; e, complementarmente, regulamenta o registro de nascimento dos filhos que foram gerados por reprodução assistida. Com este Provimento, que deve ser observado por todos os cartórios do Brasil, passa-se a permitir o registro voluntário dos vínculos de filiação consensuais socioafetivos diretamente nos cartórios de registro civil, sem que seja necessário que o Judiciário intervenha, o que é uma mudança significativa, se alguns requisitos forem observados. Dentre os requisitos previstos na norma cita-se a existência inequívoca de vínculo de filiação socioafetiva. A normativa também esmiuça todos os demais requisitos que devem se fazer presentes para tornar possível a celebração de um registro nos moldes previstos por esta normativa.

Presentes estas hipóteses, o pedido de reconhecimento deverá ser feito pelas vias jurisdicionais. Outro aspecto abordado pelo Provimento foi o registro de filhos gerados por técnicas de reprodução assistida, o que até então enfrentava grandes resistências. Diversos casais que geravam filhos valendo-se destes métodos enfrentavam dificuldades no registro em nome de ambos os consortes, sendo necessário, na maioria das vezes, recorrer ao Judiciário para que este registro pudesse ser concretizado. Observe-se que, referente a estes casos, o Provimento nº 63 passou a suprir uma lacuna da legislação, pois, a partir dele os filhos gerados por técnicas de reprodução assistida passaram a poder ser registrados sem necessidade de autorização judicial. Dito de outra forma, a certidão de nascimento pode ser obtida no cartório de registro civil, o que foi recebido como um grande avanço.

Segundo o art. do Provimento 63 do CNJ, “o reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva só poderá ser realizado na forma unilateral e não comportará o registro de mais de dois pais e duas mães no campo filiação no assento de nascimento” (CNJ, 2017, s. p. Resta claro, pelo conteúdo do art. reforçado pelos apontamentos iniciais do regramento, que é possível juridicamente o reconhecimento da multiparentalidade adotando-se o procedimento extrajudicial. Ainda, é de se destacar que a multiparentalidade faz revelar a existência de vínculos simultâneos entre os pais e filhos (vínculos biológicos e socioafetivos), de natureza diversa, mas igualmente importantes, sem prevalência de um sobre o outro. Com efeito, apesar de não existir nenhuma legislação expressa sobre este tema, a doutrina, e de modo prático, a jurisprudência, passam a compreender melhor e reconhecer a existência de tais vínculos e os efeitos que deles decorrem com a naturalidade que merecem, pois é assim que é vista a parentalidade socioafetiva no contexto vivido pelas famílias modernas.

Neste trilhar, é a felicidade 46 buscada que ganha destaque, ultrapassando antigas imposições no seio de uma sociedade em que as mudanças e as relações sociais se constroem das mais variadas maneiras, todas elas abarcadas pela licitude, e pela preservação dos valores previstos na Constituição. É de se destacar, nesse sentido, o advento de decisões dos Tribunais Superiores (como a proferida pelo STF em sede de Recurso Extraordinário com repercussão geral reconhecida, firmando-se tese que tem servido de parâmetro para o julgamento de futuros casos semelhantes acerca da existência simultânea e independente dos vínculos biológicos e socioafetivos, bem como os efeitos deles decorrentes. Assim, tem-se que a decisão proferida pelo STF na Repercussão Geral nº 622 abriu caminhos para que além das existentes, novas relações parentais sejam reconhecidas com fundamento no afeto, dando-se maior visibilidade a uma via não excludente, que permite as diversas formas de família decorrentes do convívio humano.

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