DANO MORAL POR ABANDONO AFETIVO

Tipo de documento:TCC

Área de estudo:Direito

Documento 1

XXX SETE LAGOAS 2020 NOME DO ALUNO DANO MORAL POR ABANDONO AFETIVO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito, do Centro Universitário de Sete Lagoas UNIFEMM, como requisito parcial à obtenção de grau de Bacharel em Direito. Sete Lagoas, de 2020. Aprovado com a nota: __________________. BANCA EXAMINADORA: _____________________________________________ ORIENTADOR: Prof. AVALIADOR: Prof. A pesquisa tomou como base para sua realização, além da CF/1988 e a legislação ordinária que trata sobre o tema. Foi, ainda, imperioso implementar uma pesquisa jurisprudencial usando o método hipotético-dedutivo, a fim de que fosse possível comparar a evolução e as mudanças nos principais posicionamentos dos tribunais na última década. Ao final do estudo concluiu-se pela possibilidade de responsabilização na esfera civil pelo abandono afetivo.

No entanto, para que reste configurada a responsabilidade civil, e, em conseqüência, o dever de indenizar um filho por ter sido abandonado afetivamente é imprescindível que estejam presentes alguns elementos, a saber: ato ilícito que consubstancia-se na conduta omissiva ou comissiva do consorte; trauma psicológico suportado pelo filho (dano) e, por fim, o nexo causal entre o ato ilícito e o dano. Além dos citados elementos, é imprescindível que se faça prova da presença de elemento volitivo. However, for there to be a configuration of civil liability, bringing with it the duty to indemnify for emotional abandonment, it is essential that some elements are present, namely: illicit act that takes shape in the consort's omissive or commissive conduct; psychological trauma borne by the child (damage) and, finally, the causal link between the wrongful act and the damage.

In addition to the aforementioned elements, it is essential to prove the volitional element, be it intent or guilt. Keywords: Children and adolescents. Affective abandonment. Civil responsability. No direito de família, a afetividade vem sendo empregada como relevante valor jurídico. Seu significado está relacionado ao dever imaterial de cuidado, o qual pode ser exteriorizado e observado de forma concreta em decisões que envolvem socioafetividade, multiparentalidade, adoção, poliafetividade, biodireito e abandono afetivo, por exemplo. Observa-se, expressamente, o uso dos termos afeto e afetividade em dispositivos codificados que tratam de guarda compartilhada (arts. e 1584 do CC) e na legislação esparsa como a Lei de Adoção (Lei nº 12. e a Lei de Alienação Parental (Lei nº 12. Entende-se por situações jurídicas subjetivas aquelas que imprimem valor ao ordenamento jurídico.

São, portanto, interesses juridicamente tutelados que envolvem direitos de personalidade, vontade individual e relações psicológicas, o que vai muito além do cunho econômico. As situações jurídicas subjetivas precisam passar por um controle, para que seja analisado se realmente merecem ser tuteladas. Dentre as diversas situações jurídicas subjetivas que abrangem crianças, encontra-se o abandono afetivo. Este pode ser conceituado como o ato em que um ou ambos os genitores descumprem o dever, previsto na CF/1988, de garantir total assistência, saúde, dignidade, educação e contribuir para o desenvolvimento físico, social e psicológico de seus filhos. da CF/1988, o art. do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), bem como o art. a 1710 no Código Civil (CC), que estabelecem que compete aos pais assistir e educar sua prole, assegurando seu sustento, proporcionar recursos e meios para que sua prole se desenvolva de modo saudável.

Assim, é importante demonstrar que cuidar implica promover todos os atributos necessários ao desenvolvimento de quem seja filho, biológico ou adotivo, bem como daquele que se tenha a guarda ou o simples dever de cuidado. Basta analisar os arts. Foram utilizadas obras tanto das Ciências Jurídicas como das Ciências Sociais, artigos científicos, dissertações, bem como informações obtidas na internet. Assim, o estudo realizado tem natureza teórico-bibliográfica e teórico-documental. A pesquisa tomou como base para sua realização, além da CF/1988, a legislação ordinária que trata sobre o tema, os projetos de lei que buscam disciplinar o assunto, os princípios da dignidade da pessoa humana, da solidariedade familiar, da liberdade e da afetividade. Foi, ainda, imperioso implementar uma pesquisa jurisprudencial usando o método hipotético-dedutivo, a fim de que fosse possível comparar a evolução e as mudanças nos principais posicionamentos dos tribunais na última década.

ANÁLISE JURÍDICA SOBRE FAMÍLIA NO BRASIL Esse primeiro capítulo tem como objetivo principal apontar o perfil funcional da família contemporânea brasileira e a emergência do afeto como figura jurídica. A noção de família no Brasil, não obstante as influências globais que sofre, possui características específicas, especialmente no tocante à relevância atribuída aos laços de sangue na sua compreensão. As relações de parentesco que estão além da família nucelar são muito relevantes enquanto suporte à dinâmica familiar, seja pelas grandes distâncias geográficas da vida moderna, seja em função da atual ineficiência estatal na prestação de serviços sociais ligados à família. É claro que, mesmo dentro do contexto brasileiro, percebemos variáveis dessa organização familiar, principalmente devido à classe social da família.

Na classe média, o modelo de família conjugal é preponderante, enquanto que, nas camadas mais populares, a família também conta com a ajuda mútua de pessoas próximas a ela, além, é claro, dos membros domésticos. As elites, por sua vez, estruturam seu modelo familiar a partir de uma solidariedade de linhagem (DEMARI, 2019). Não existia ainda uma preocupação com a situação familiar desse indivíduo. O sujeito e os direitos que a ele cabiam, a expressão de sua vontade, a propriedade e o negócio jurídico através do contrato traçavam a linha de ação do Direito Privado. A Revolução Industrial foi de fundamental importância para solidificar a burguesia como classe dominante e detentora de forte poder econômico (BONAVIDES, 2013).

Na ocasião, foi promulgada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, documento jurídico que registrou os ideais dessa vitória burguesa. Embora esse documento conferisse novos objetivos para as relações jurídicas, promovendo a liberdade, a segurança e o desenvolvimento dos cidadãos, ainda não foi suficiente para lhes garantir a integralidade de seus direitos políticos e sociais (RODRIGUES, 2014). Isso, porque os juízes exclusivamente aplicavam e respeitavam com rigor os códigos já existentes e que continham os interesses individuais dos cidadãos. O legislador, portanto, era considerado o representante do povo soberano. Não havia espaço para jurisprudência ou obras de professores e magistrados (MULTEDO, 2017). Até então, não existia ingerência do Estado nesta seara.

O CC de 1916, da mesma forma que outros códigos civis oitocentistas, era tido como a Constituição do Direito Privado e normatizava, de forma exclusiva e suficiente, as relações privadas (MULTEDO, 2017). Constituições posteriores à 2ª Guerra Mundial apresentavam normas divididas entre princípios e regras que se preocupavam em tratar de direitos sociais, da limitação da autonomia privada e da propriedade. O foco, que antes se concentrava no indivíduo, direcionou-se às atividades exercidas por ele e os riscos que assumia (MULTEDO, 2017). Com a publicação da CF/1988, identifica-se uma terceira fase que consolidou definitivamente o novo papel do Código Civil. A partir da CF/1988, o conceito de família foi modificado, passando de entidade formal constituída por pais e filhos legítimos tidos na constância de um casamento, para um conceito mais flexível e instrumental, exigindo a presença de ao menos um genitor, fundada não somente no casamento e completamente direcionada à realização espiritual e completo desenvolvimento da personalidade dos seus membros.

Segundo Paulo Luiz Netto Lobo (2018), as entidades familiares constitucionalizadas extrapolam o numerus clausus (número fechado) descritos na Constituição/1988 e que serviu de orientação para o conceito hodierno de família. Com efeito, as referências da constituição de família apenas pelo casamento, prevista na Constituição de 1967-1969 (art. foram suprimidas na atual pelo art. caput, que se trata, inequivocamente, de cláusula geral de inclusão. O § 4° do art. reforça a cláusula geral de inclusão em razão do termo nela contido, que tem o significado de “igualmente”, e, da mesma forma, de inclusão de fato sem que outros sejam excluídos. Significa dizer que a convivência somente deverá ser assegurada se, por seu intermédio, os membros de determinado grupo familiar – notadamente aqueles que se apresentam mais vulneráveis, mais suscetíveis e mais dependentes – puderem dele (grupo) se valer positivamente, ou seja, se das relações interpessoais mantidas dentro de determinada estrutura familiar seus membros puderem angariar elementos que contribuam para seu desenvolvimento biopsíquico-social (MULTEDO, 2017).

A propósito, calha sempre relembrar que o conviver ao qual se reporta o dito princípio constitucional está bem além do simples “viver com outrem”. Como realça Multedo (2017, p. “a convivência, neste ínterim, não assume apenas a faceta do conviver e da coexistência, mas vai muito mais além, ou seja, de participar, interferir, limitar, enfim, educar”, tudo no afã de tornar – acrescenta-se – aquele que depende, afinal, autônomo. Disso se infere que a convivência familiar resta comprometida não só nas hipóteses de ausência física do pai e/ou da mãe (ou, ainda, de outras pessoas que assumam esses papéis e desempenhem essas funções), mas também quando essas figuras se abstêm de assegurar à prole, mormente nos períodos da infância e da adolescência, condições para um crescimento saudável e para a construção de sua autonomia.

Os membros de uma família, independente de como essa se formou, se unem com interesses comuns, ligados pela afetividade e cumprem deveres de natureza solidária uns com os outros (MARTÍN, 2017). Nas relações familiares são encontrados conjuntamente o cuidado e a afetividade. Embora seja possível extrair o cuidado de dispositivos constitucionais (arts. e 230, CF/88) e o afeto, como será demonstrado no próximo tópico, seja encontrado em vários momentos na legislação ordinária, esses dois elementos ganham força quando ligados ao princípio da solidariedade, explícito como objetivo maior da República Federativa do Brasil no art. º, inc. Busca fazer com que cada um deles alcance todo o seu potencial em termos de desenvolvimento da personalidade e perante a sociedade. Vale relembrar que a cooperação entre familiares pode ser relacionada tanto a bens materiais como imateriais, a exemplo do afeto (OLIVEIRA; SANTOS, 2017).

Embora esse último seja entendido como um sentimento, atualmente constitui-se como elemento fundamental do princípio da afetividade, que como será adiante analisado, gera um dever jurídico. A inclusão do afeto nos relacionamentos familiares, como ingrediente básico da afetividade e do cuidado, contribuiu sensivelmente para fundamentar diversas decisões judiciais e insuflar possíveis mudanças legislativas. Salienta-se que a afetividade é a manifestação real e objetiva do afeto. Assim, ratifica-se o entendimento de que as pessoas que fazem com que a criança se sinta bem e amada é que são consideradas sua família. Da mesma forma, o STJ entendeu que a paternidade socioafetiva pode ser rompida, no interesse do filho, se este optar pela investigação biológica3. Constata-se igualmente a presença do tema afetividade”em legislações de importância significativa no que tange às relações familiares, como: Lei Maria da Penha (Lei nº 11.

Lei da Adoção (Lei nº 12. a Lei da Alienação Parental (Lei nº 12. Inúmeras atitudes nas relações intersubjetivas são consequência do cuidado, o qual é encontrado nas relações humanas até mesmo antes que fosse reconhecida a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental. Trata-se de um valor que será observado antes mesmo que haja uma situação jurídica, a partir de fatos do cotidiano e mudanças sociais. Quando normas decorrem desse pressuposto, pode-se dizer que ele atingiu o status de valor jurídico, pois tem influência pertinente no ordenamento. O cuidado tem importância fundamental tanto para os membros de uma família como para a sociedade. Revela que, do ponto de vista existencial, o cuidado aparece amparando cada situação e atitude que envolve o ser humano (BOFF, 1999).

Ademais, não resta qualquer dúvida de que o cuidado contribui significativamente para a concretização da afetividade, agregando valor a esta (TUPINAMBÁ, 2017). Faz-se necessário diferenciar ainda os termos afeto e afetividade, a fim de que melhor se compreenda o princípio. Observa-se que o afeto é sentimento, é fator psicológico. Já a afetividade é dever imposto aos pais com relação aos filhos. Com isso é possível confirmar que esse último possui sua tradução imbricada ao cuidado (LÔBO, 2009). As matérias foram distribuídas em 4 Títulos, sendo o primeiro o que trata do Direito Pessoal, o segundo, o Direito Patrimonial de Família; o terceiro, da União Estável; e o quarto da Tutela e da Curatela. Essa distribuição é apenas programática, posto que, em termos práticos, ao longo de toda a parte do Direito Pessoal de Família, encontram-se fortes indicadores de uma proteção patrimonial, latente na legislação brasileira, como herança do Direito Francês.

De qualquer forma, a citada subdivisão do Direito de Família no atual diploma civil passou longe de abranger as verdadeiras e complexas nuances desse ramo do Direito Civil, que comporta muito mais que dois blocos de análise (CARVALHO, 2019). É importante lembrar, ainda, que, ao longo do CC, há outros artigos que tratam da matéria do Direito de Família, porém não de forma direta, como ocorre em alguns momentos do Direito Obrigacional, dos Contratos ou das Sucessões, além de dois artigos das Disposições Finais e Transitórias (art. e art. O CC de 1916 dispunha que a família se originava somente de núcleo familiar constituído pelo casamento. Além da formação de união estável, a família monoparental (formada por um dos pais e a prole) também recebeu a denominação de entidade familiar dada pela CF/1988, o que significou ampla modernização e relevante avanço (GONÇALVES, 2014).

Na época da entrada em vigor da atual CF/1988, a diferenciação aplicada às entidades familiares diversas do casamento foi muito criticada. O mais correto, provavelmente, seria tratar todas as modalidades de maneira absolutamente idêntica. Entretanto, essa distinção continua em vigor, e tem um exemplo muito claro no que tange ao direito sucessório4. Já a família enxuta, marcada pela presença de poucos membros, mais próxima entre si, permite que os conviventes possam conhecer de perto os problemas e as angústias de cada um, todos os dias, e compartilham essas experiências, de modo que cada um serve como ponto de referência e força para os demais (ANDRADE, 2010). De toda forma, pode-se dizer que a família nuclear ocupou a condição de estruturação preferida da família pós-moderna.

De grupo pequeno, relativamente homogêneo, com perspectivas e objetivos comuns, a família nuclear transformou-se no impulso ao desenvolvimento educacional e econômico de seus membros. Segundo Barroso (2010), a aproximação dos laços afetivos e o reconhecimento da individualidade de cada componente no ambiente externo, junto com a cumplicidade dentro de casa fortaleceu a família nuclear como sendo o modelo mais apropriado à nossa época. No entendimento de Carvalho (2019), o falecimento da estrutura familiar que se concentrava no casamento como fonte de procriação e de respaldo institucional cede, pouco a pouco, espaço ao companheirismo. Uma mudança de paradigmas se consolidou com a isonomia dos pais em se tratando de exercício do poder parental, abandonando a ideia ultrapassada, adotada pelo antigo Código, alterado pela Lei n.

em que a vontade do pai era priorizada. As disposições da lei civil de 1916, que diferenciavam o exercício do pátrio poder, não foram recepcionadas pela ordem constitucional hodierna (CF, arts. º, I, e 226, § 5º). Como expõe Ataíde Jr. As alterações que se processaram no direito de família, decorrente da CF/1988 e do CC/2002, não deixam dúvidas sobre a função social da família no Brasil pela instituição da igualdade absoluta de cônjuges e filhos; regulamentação da guarda, suprimento das necessidades materiais e educação da prole, tendo o juiz poderes para decidir em favor do interesse da criança e do adolescente. Não está estabelecido na CF/1988 que a origem biológica funda a família. Ao contrário, a origem biológica foi dispensada, fixando-se uma relação baseada no afeto e convivência familiar, independentemente de consanguinidade.

Segundo Lôbo (2011), a importância dada à convivência, no ordenamento jurídico pátrio, consagra os laços afetivos gerados nas famílias socioafetivas. O art. O objetivo é garantir, segundo Carvalho (2019), que toda criança tenha o direito à educação respeitado. Referido direito encontra-se materializado com a obrigação dos consortes de assegurar que os filhos freqüentem a escola dos 4 aos 17 anos. No caso deste crime, a pena prevista é de 15 dias a 1 mês de reclusão e multa. Carvalho (2019) conceitua, ainda, o abandono afetivo como a indiferença afetiva de um dos genitores para com os filhos, mesmo que não exista o abandono material e/ou intelectual. Madaleno (2018) dispõe que dentre o inafastável dever paterno, encontra-se o de assistir moral, psíquica e afetivamente os seus filhos.

Algumas questões de cunho inconsciente, vividas na idade infantil poderão dar ensejo a problemas futuros. Assim, o ECA prevê em seu artigo 3º, os direitos que são garantidos ao menor: Art. º - A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade (BRASIL, 1990, s. p). Ademais, o art. É, portanto, devida a reparação dos malefícios causados. A privação de uma criança ao convívio de um dos pais deve ser repudiada pela sociedade, por ofender os princípios mais comezinhos, da humanidade.

Aqueles que sofrem abandono afetivo experimentam uma sensação de rejeição, sendo essa capaz de fazer com que a pessoa abandonada se sinta inferior e, portanto, preterida de sua dignidade. É válido relembrar que o afeto é um sentimento, tratando-se de fator psicológico, enquanto que a afetividade está ligada ao cuidado e releva-se como um dever, seja dos pais com relação aos filhos ou desses para com os pais idosos. É por esse motivo que, nos últimos anos, as discussões envolvendo o tema vêm ganhando força nos tribunais. XVIII na cidade de Marselha, revestindo-se de cunho eminentemente político, no qual o termo foi reconhecido, exprimindo a responsabilidade dos governantes pelos seus atos relacionados aos cargos políticos que ocupavam. No entanto, segundo o mesmo autor, foi no Código Penal francês de 1810 que o termo foi empregado em um texto legal pela primeira vez, com o mesmo sentido que atualmente lhe é designado mundialmente.

A partir de então todos os ordenamentos jurídicos vieram a adotá-lo. Segundo Diniz (2020), a responsabilidade civil busca conhecer se o prejuízo suportado pela vítima merece ou não a reparação por parte de quem o causou. E, em caso de a resposta ser afirmativa, importa inquirir sob que condições e de que forma essa reparação se dará. Ademais, aquele que causa um dano a coisa de outrem, em estado de necessidade, também pode não ser obrigado a reparar, posto a presença de uma excludente de ilicitude. Nesta hipótese, tal como na anterior, como informam Gagliano e Pamplona Filho (2018) não há o dever de indenizar, mesmo o dano sendo evidente. Explicada a abrangência da responsabilidade civil passa-se a apresentar sua classificação.

Inicia-se trazendo a diferenciação entre a responsabilidade subjetiva e a objetiva. Responsabilidade subjetiva e objetiva A doutrina predominante sobre responsabilidade civil objetiva determinar aquele que deve indenizar quando algum dano é produzido. Assim, acabava que o dano era suportado somente pela vítima. Segundo Nader (2016), com o intuito de driblar a necessidade de fazer prova sobre a culpa, embora sem dela se descurar como base para imputar a responsabilidade civil, foi desenvolvida a teoria da culpa presumida, uma solução intermediária em que a culpa continuava como pressuposto da responsabilidade civil, mesmo já havendo sinais de sua degradação como único elemento causal que sustentava o dever de reparar o dano, e surgisse, outrossim, fatores que considerassem a vítima como centro da estrutura de reparação. Cavalieri Filho (2015) esclarece que na responsabilidade em que a culpa presumida continua subjetiva, no entanto invertendo-se o ônus da prova da culpa, que, ao se distanciar da norma geral, deixa de estar a serviço da vítima e passa a ter peso também sobre o ofensor, que deverá fazer prova de que não possui culpa.

A responsabilidade objetiva contenta-se com relação positiva entre fato e agente, a simples causação, a mera produção do resultado, para que ocorra o dever de indenizar. Nerilo (2015) acrescenta que é indiferente que o agente tenha querido comportar-se daquela maneira, que tenha movido com negligência, ou que alguma causa escusável justifique seu comportamento. Apesar de possuir certa resistência à responsabilidade civil objetiva, Rizzardo (2015, p. já dizia que “aqueles que se entregam a uma atividade lícita, mas perigosa, têm obrigação de não causar prejuízo a outrem, ou, em todo o caso, de reparar o prejuízo que causaram”. Neste sentido assevera Gaburri (2018, p. que “a atividade de risco insere-se no ordenamento como cláusula geral de conteúdo semântico vago e impreciso, que será concretizada pelo magistrado conforme os valores vigentes em determinado tecido social”.

A responsabilidade subjetiva é aquela em que o danoso ocorre vinculado à culpa. Embora o art. do CC não mencione a imperícia, esta é considerada uma forma de imprudência, analisada em um sentido técnico-profissional. Desta feita, segundo Pereira (2016), a imperícia consubstancia-se na conduta profissional imprudente, que deixou de observar as normas técnicas de procedimento, ou a conduta do profissional liberal que não atuou com sua habilidade peculiar. Já o dolo é verificado na conduta comissiva ou omissiva do agente, direcionada à causa de um dano. Ao comportar-se com dolo o agente precisa ter claro conhecimento sobre aquilo que faz. A tendência é que essa distinção, com o passar do tempo, perca sua importância. Mas, por enquanto, segundo Rizzardo (2015), ainda deve ser estudada, já que o tratamento de ambas é feito de maneira distinta na legislação civil.

Em se tratando da responsabilidade contratual, Gaburri (2018) informa que preexiste uma relação jurídica entre autor e vítima; e será extracontratual se não existir, até a ocorrência do dano, nenhum elo jurídico entre autor e vítima. Em ambos os casos, o dever de indenizar é o mesmo, porém, segundo Gomes (2011) diferem quanto ao fundamento, à razão de ser e ao ônus da prova, o que será mais bem analisado ao longo do presente tópico. Segundo Gomes (2011), a sanção para aquele que comete um ato ilícito é a indenização e esta se afigura como uma relação obrigacional, já que o agente que dá causa ao dano é devedor e a vítima, credora. Essa é uma das ramificações do Direito que mais sofre atualizações constantes.

Assim, diante da impossibilidade que a legislação tem de acompanhar as mudanças e necessidades da sociedade, cabe aos julgadores, baseados na interpretação de cláusulas gerais e em princípios constitucionais fundamentais procurar adequar, da melhor forma possível, suas decisões, a fim de que consigam solucionar as diversas questões jurídicas que diariamente são impetradas. Em recentes decisões, observa-se o uso constante do princípio da afetividade para construir respostas convincentes, que coincidam com os interesses da sociedade atual e com os novos tipos de família. Encontra-se comentário explícito sobre o princípio da afetividade em decisões que envolvem temas como multiparentalidade, adoção, direitos dos idosos e outras ações que enfrentam questões existenciais em relações familiares.

O curioso é que, em praticamente todos os casos, juntamente ao argumento sobre afetividade está também inserida a palavra cuidado. Visando tornar mais concreta essa constatação, parte-se para a análise do REsp 1. – SP, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, o qual veio revolucionar o sentido da afetividade e traz uma rica abordagem sobre o dever de cuidado8. No referido julgado foi concedida uma indenização no valor de duzentos mil reais para a filha abandonada afetivamente pelo pai. No caso em tela, é apontado um núcleo mínimo de cuidados, os quais procuram garantir aos filhos, condições para uma formação psicológica apropriada e inserção social. O princípio da afetividade é traduzido, portanto, no dever de cuidado. Não no sentido de dar amor, mas de fazer com que aquela pessoa se sinta assistida e efetivamente cuidada.

Acredita-se que a decisão tomada, especialmente no que tange à considerável quantia indenizatória a qual o genitor foi condenado a pagar, foi a forma encontrada para prover uma carência que já havia prejudicado em muito o desenvolvimento da filha requerente em diversos aspectos. Existe, portanto, um mínimo que precisa ser feito pelos pais para que os filhos tenham a oportunidade de se desenvolverem e concretizarem sua liberdade. Fazendo um salto histórico, em decisão recente da 8ª Turma Cível do TJDF e Territórios foi negado provimento ao recurso interposto pelo réu que foi condenado pelo Juiz da 1ª Vara Cível de Sobradinho a pagar indenização no valor de 50 mil reais pelo abandono afetivo à sua filha. TJDF – Processo n. Igualmente, é importante lembrar que a questão da afetividade, desdobramento da dignidade da pessoa humana, sobrepõe o princípio da liberdade dos genitores, constituindo verdadeiro dever.

A CF/1988 não afasta a incidência de seus princípios, apenas demonstrando que, por meio da ponderação, um sobressai ao outro a depender do caso concreto, como o aqui externado. O risco que começou a refletir nas relações entre os sujeitos na modernidade líquida é outro ponto que circunda pontualmente a teoria social de Bauman (2001). A sugestão do autor é que este processo de liquefação não pode ser confundido com inexistência de relações de poder ou mesmo autossuficiência em relação à vida em sociedade. Bauman afirma que: [. O mesmo é desdobrado na solidariedade familiar, prevista no art. do texto constitucional, que obriga os pais a conferirem ampla assistência aos filhos menores. A partir desse dispositivo entende-se a existência implícita do princípio da afetividade, o qual seria extraído da solidariedade familiar.

Estabelece-se, assim, uma relação de confiança entre as pessoas e o dever geral de cuidado, o qual vem sendo usado para fundamentar diferentes decisões. Um dos casos mais emblemáticos envolvendo o abandono afetivo trata do REsp 1. Entretanto, conforme foi demonstrado, há decisões recentes que consideram que é o amor que está sendo questionado quando se responsabiliza civilmente alguém por abandono afetivo, que não se pode obrigar alguém a amar o outro e que sentimentos não são objeto de discussões jurídicas. Realmente não cabe ao Direito discutir sentimentos. No entanto, não é isso que está sendo questionado no abandono afetivo, mas uma obrigação constitucional que foi descumprida. Quando o dano moral se refere ao abandono afetivo de crianças, adolescentes ou jovens, há uma maior aceitação de que o genitor que rejeita cuidados ao filho pode ser responsabilizado civilmente.

Acredita-se que os menores de idade ainda estão se desenvolvendo física e psicologicamente e, ao serem abandonados afetivamente, podem jamais se recuperar da insegurança que terão para relações futuras, do sentimento de rejeição e, segundo foi confirmado por meio de testes clínicos realizados por profissionais da área médica, desenvolverem problemas cognitivos que os acompanharão para o resto de suas vidas. Salvador: Juspodivm, 2010. p. ATAÍDE JR. Vicente de Paula. Destituição do Poder Familiar. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo. São Paulo: UNESP, 2002. BOFF, Leonardo. Disponível em: http://www. planalto. gov. br/ccivil_03/leis/L3071impressao. htm. Acesso em: 3 ago. CALDERÓN, Ricardo. Princípio da Afetividade no Direito de família. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

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