Breves traçados de uma proposta de concepção intermediária às duas escolas de pensamento
Por outro lado, a lógica do utilitarismo busca sopesar, basicamente, a produção de prazer e a diminuição da dor, restando, no mais das vezes, afastada a vontade individual em prol do benefício ao âmbito geral. Diante de concepções tão díspares, a pretensão do presente trabalho será, a princípio, apresentar um breve traçado do que consiste cada uma das linhas de pensamento, de modo geral. Em um segundo momento, a intenção será a de realizar uma proposta sintética que resida entre os dois posicionamentos supramencionados a fim de colocar os benefícios e as consequências de modo mais equilibrado, ao invés de implicar numa escolha, em absoluto, pelos direitos e liberdades individuais ou pela preservação diante da dor de um maior número de indivíduos frente aos desígnios causados pelas escolhas provenientes do individual.
O campo de análise envolverá as propostas decorrentes da obra do professor de Harvard, Michael Sandel, Justiça - o que é fazer a coisa certa, mais especificamente o que se pode encontrar nos capítulos 2 e 3 do livro. Concepção utilitarista da justiça Para o utilitarismo, há o pressuposto de que a moral envolve um sopesamento das consequências sociais. O corpo, nesse sentido, é concebido como “corpo fictício”, logo um conjunto formado pela soma dos indivíduos que a abarcam. Quanto aos argumentos pautados na moral, estes devem levar em consideração o horizonte da máxima felicidade. Aqui, a crença nos direitos tomados por absolutos ou categóricos cairia por terra no momento em que o respeito a eles não fosse concebido em conjunto com a pretensão de maximizar a felicidade.
Caso o princípio da utilidade fosse combatido, Bentham entende que se trataria de uma própria derivação do princípio mencionado, na medida em que as divergências morais podem ser entendidas como discordâncias a respeito do modo de aplicação do princípio utilitarista da maximização do prazer e da minimização da dor, ou seja, a oposição trataria da interpretação do respectivo princípio e do sopesamento diante do questionamento referente ao anseio pela prevalência do prazer no lugar da dor. E, na concepção do autor inglês, o princípio da utilidade “era uma ciência da moral que poderia servir como base para uma reforma política”. Vigiar e Punir. Petrópolis: Ed. Vozes, 2015; e Bauman, Z. Vigilância Líquida.
Portugal: ed. Contudo, a fim de trazer à vida novamente a doutrina utilitarista, John Stuart Mill reformulou-a com bases mais humanas e menos calculistas. Em sua perspectiva o autor deteve-se na busca pela maximização da utilidade, o que permitirá a máxima felicidade humana. A proposta de Mill era a da maximização da utilidade ao longo do tempo e com respeito à liberdade individual a fim de alcançar a máxima felicidade humana. O desrespeito à liberdade individual poderia se fazer útil a curto prazo, mas a censura ao livre pensar e aos dissidentes recrudesceria a sociedade a longo prazo. A justiça no sentido do autor acima envolveria uma contraproposta ao conformismo pautado numa oposição à opinião da maioria, considerando que esta envolveria um conformismo que, em razão de se privar da energia e da vitalidade, impediria o avanço social.
Sob a bandeira de defesa de um Estado mínimo, cuja função reside unicamente na realização de contratos, na proteção da propriedade privada e na manutenção da paz, recusa-se a presença de um Estado mais atuante na medida em que seria moralmente injustificável, portanto ilegítimo e impassível de ser enquadrado na definição de justiça. Nesse sentido, apresenta-se três dispositivos capazes de remeter às diretrizes e às leis (portanto, às normas) promulgadas pelo Estado, seja de modo negativo, seja em questão das bases do pensamento em questão a fim de alcançar o que se imagina por justiça: há ausência de normas que busquem a proteção das pessoas contra si mesmas, dado que o Estado não deve apresentar o caráter paternalista e o direito de direcionar a quais riscos o indivíduo pode ou não se submeter; há oposição às normas de caráter moral e do uso da coerção a fim de fazer valer noções de virtude ou de opinião da maioria; por fim, sinteticamente, a teoria libertária parte do pressuposto de que não deve haver redistribuição dos proventos, sendo facultativo a cada indivíduo (e não uma obrigação a ele imposta) a distribuição de suas riquezas, o que se opõe diretamente à concepção de solidariedade de programas sociais.
Entre os representantes da postura libertária, Milton Friedman (1912-2006) ganha renome na década de 80, dada sua argumentação direcionada às inúmeras infrações, praticadas pelo Estado, pautadas na ilegitimidade diante da liberdade individual, entre os quais se menciona a previdência social ou os programas assistencialistas, de caráter obrigatório. A fim de ilustrar ainda mais a concepção libertária de Friedman, menciona-se a regulamentação do salário mínimo na medida em que o Estado não detém o direito a si de intervir no salário estipulado entre empregados e empregadores, situação em que incorreria na invasão à liberdade individual, sendo esta a pauta central da respectiva teoria. Permitiria, portanto, ao seu ver, a discriminação, no momento da contratação, com bases em raça, em religião ou em qualquer fator outro, porque ao Estado não remonta o direito de vedar a atuação do contratante, caso contrário a violação seria grave por conta da interferência à livre capacidade dos indivíduos de contratar por si mesmos.
ibid. p. O registro conceitual de Nozick gira em torno das oposições entre propriedade de si e apropriação por outro, de pessoa livre e de escravo, de trabalho livre e de trabalho forçado e, além do mais, de produto do trabalho em oposição ao imposto. No fim das contas, o Estado, ainda que em seu funcionamento mínimo conforme estipulado, deteria posse de uma parte dos indivíduos a ele submetido, a fim de sustentá-lo em sua atuação. Logo, a restrição deve ser direcionada ao quantum da respectiva concessão. Ora, até mesmo atos punidos na seara penal restariam potencialmente aceitos como lícitos. Sandel (2012, p. ainda traz os exemplos: da venda dos rins, ou seja, da disposição de órgãos do corpo humano como desdobramento da livre disposição individual; do suicídio assistido, enquanto uma escolha que se resume à esfera individual (e não estatal) de escolha; e ao canibalismo consensual, na medida em que os gostos de cada indivíduo, respeitada a concepção de contrato e de consensualidade, não recairia numa esfera de debate moral ou de penalização, dada que moral foi respeitada tendo em vistas a aceitação mútua e a liberdade individual (além do respectivo livre arbítrio).
Em vias de uma concepção intermediária Enquanto uma posição que se encontra entre o excesso utilitarista diante do indivíduo, ou seja, o potencial dano que pode ser causado aos direitos individuais e abertura demasiada do libertarismo contrapondo o que se pode denominar interesses públicos em detrimento de uma abordagem radical e protetiva dos direitos individuais e da liberdade de cada cidadão, buscar-se-á uma espécie de meio-termo rente aos excessos que ambas as teorias, grosso modo, podem vir a causar. Nota-se, por outro lado, que a pretensão deste trabalho não será dispor de algo inovador, mas apenas de um balanço diantes dos excessos que ambas as teorias podem vir a implicar. Portanto, a fim de buscar uma posição intermediária entre os polos utilitarista e libertário, no sentido do anseio pelo justo, há de se considerar, sim, a possibilidade de flexibilizar os direitos individuais em caso de contraposição incisiva ao bem estar de um grupo mais amplo.
Ora, a flexibilização, a fim de sustentar uma concepção de justiça, trata propriamente a proteção ao teor do caráter individual, de escolhas e de direitos, mas que pode sofrer cerceamento em caso de proteção do que se pode considerar por interesse público. Exemplifica-se, inicialmente, com a situação do terrorismo, em que o agente terrorista, desde que comprovados os indícios de sua participação ou de influência, detém a hipótese de ter seus direitos suspensos a fim de proteger os interesses públicos mais amplos, o que remonta a um cálculo semelhante ao utilitário. Para não restringir a análise apenas aos casos de cunho penal, evidencia-se a possibilidade de obrigar um particular a vender terrenos em razão de desapropriação por interesse público, sob pagamento, desde que haja motivação legítima a fim de sobrepujar o direito de propriedade frente ao interesse público.
Considerações Finais Há dificuldade em estabelecer um meio termo in concreto entre o utilitarismo e o libertarianismo, visto que ambos tratam de extremos. s/d. Disponível em <http://www. ufrrj. br/graduacao/prodocencia/ publicacoes/etica-alteridade/artigos/Pedro_Hussak. pdf>.
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