A PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO BRASIL E A LEI MARIA DA PENHA
Aprovado em: ____/____/____ Banca Examinadora: __________________________________________ Prof. ° Ms. Orientador Vladimir Luís Silva da Rosa Universidade de Caxias do Sul –UCS __________________________________________ Prof. ª Ms. Anelise Rigo de Marco Universidade de Caxias do Sul – UCS __________________________________________ Prof. No entanto, não deixa de conter alguns aspectos que geram dúvidas acerca de sua eficácia prática, demandando maior atenção por parte das políticas públicas Palavras-chave: Lei Maria da Penha. Violência doméstica contra mulheres. Eficácia. ABSTRACT The present course conclusion monograph aims to discuss domestic violence against women by delimiting the focus of the research to the analysis of the practical effectiveness of the applicability of the Maria da Penha Law. To this end, the problem question is limited to researching how the Maria da Penha Law, as well as the Convention of Belém do Pará, contribute to the affirmation of Human Rights, reducing the rate of violence against women in the Brazilian legal system? It is hypothesized that the Maria da Penha Law was a breakthrough but lacks public policies to make it really effective.
Efficiency. LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ADC Ação Direta de Constitucionalidade ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade ADPF Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental CEPIA Instituto Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação CF Constituição Federal CIDH Comitê Interamericano de Direitos Humanos CNJ Conselho Nacional de Justiça CP Código Penal CPMI Comissão Parlamentar Mista de Inquérito CPP Código de Processo Penal DEAMs Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher EC Emenda Constitucional FONAVIDE Fórum Permanente de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher HC Habeas Corpus IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada JECrim Juizados Especiais Criminais JVDFM Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher LEP Lei de Execução Penal LMP Lei Maria da Penha LOAS Lei Orgânica de Assistência Social MP Ministério Público OEA Organização dos Estados Americanos OMS Organização Mundial da Saúde ONU Organização das Nações Unidas PIB Produto Interno Bruto RE Recurso Especial Serjusmig Sindicato dos Servidores da Justiça de Primeira Instância do Estado de Minas Gerais SPM Secretaria de Políticas para as Mulheres STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça SUS Sistema Único de Saúde TJBA Tribunal de Justiça da Bahia TJMG Tribunal de Justiça de Minas Gerais VEVDFM Varas Especializadas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 11 2 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER EM QUALQUER RELAÇÃO ÍNTIMA DE AFETO 14 2.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS 14 2. TIPOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER 18 3 LEI N. – LEI MARIA DA PENHA 21 3. Trata-se de uma lei amplamente divulgada no meio jurídico, midiático e, de modo geral, na sociedade como um todo. No âmbito das instituições que compõem o sistema de justiça, são desenvolvidas estratégias com o objetivo de efetivá-la, visando atingir seus fins desejáveis. Neste parágrafo é texto meu, não me baseei em nenhum autor. É uma afirmação lógica. Todos sabem que trata-se de uma lei bastante comentada. A escolha do tema foi influenciada por motivo da crescente violação e desrespeito aos direitos das mulheres e considerando o grande aumento da incidência dos casos de violência doméstica na sociedade, sendo este um grave problema que atinge mulheres de todas as idades.
A proposta de resgate da história da Lei Maria da Penha e sua contextualização possibilitam conhecer os mecanismos empregados para sua efetivação e seus possíveis efeitos na esfera familiar. O estudo se justifica haja vista ser um tema atual e amplamente discutido tanto na literatura sociológica como jurídica. Pretende-se demonstrar que a violência contra a mulher devido aos bens jurídicos ofendidos, integridade física, integridade psíquica e saúde e por ser praticados violentamente contra a pessoa não podem ser entendidos como de menor potencial ofensivo. A Lei nº 11. Também estudará suas deficiências no que tange à implementação e regulação da Lei; e elencará os desafios a serem transpostos para que a norma se efetive. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER EM QUALQUER RELAÇÃO ÍNTIMA DE AFETO “A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota” (Jean-Paul Sartre).
CONSIDERAÇÕES INICIAIS A violência é um fenômeno complexo que atinge toda a sociedade, seja na esfera pública ou privada. Seu conceito está em contínua alteração, apresentando aspectos diferentes de acordo com a cultura, os costumes e as normas de cada comunidade ao longo do tempo. De um modo geral, a violência tem seu conceito relacionado com o uso da força física, mas a ela não se limita, pois, não raras vezes, sua incidência se dá através de pressão psicológica ou de coação moral e intelectual, tanto que “a violência pode ser compreendida como uma forma de restringir a liberdade de uma pessoa ou de um grupo de pessoas, reprimindo e ofendendo física ou moralmente” (Melo; Teles, 2002, p.
De acordo com Dias (2007, p. a prática de atos de violência no seio familiar pode resultar na naturalização de sua ocorrência: Quem vivencia a violência, muitas vezes até antes de nascer e durante toda a infância, só pode achar natural o uso da força física. Também a impotência da vítima, que não consegue ver o agressor punido, gera aos filhos a consciência de que a violência é um fato natural. Nesse contexto, a violência praticada contra as mulheres é covarde e vergonhosa. Enquanto esta forma de violência continuar, não se pode dizer que está-se a evoluir efetivamente rumo à igualdade, desenvolvimento e à paz (AMARAL, 2007). A unidade doméstica compreende o local no qual ocorre o convívio permanente de pessoas, independentemente de vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas.
Nucci (2014) alerta que a mulher deve fazer parte da unidade familiar, não sendo suficiente que a violência ocorra no ambiente doméstico de terceiro. Segundo Nucci (2014), a lei seguiu um conceito aberto de família, para abranger o conjunto de indivíduos que são ou se consideram aparentados, seja por vínculos biológicos, por afinidade ou por expressa vontade. Essa previsão consagra o modelo familiar pautado no afeto e na vontade de seus membros, independentemente de qualquer prévia disposição normativa. E foi fundamento para o reconhecimento das uniões homoafetivas como entidade familiar, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI n. Depois reclamações, reprimendas, reprovações. Em seguida, começam os castigos e as punições.
A violência psicológica transforma-se em violência física. Os gritos transformam-se em empurrões, tapas, socos, pontapés, num crescer sem fim. As agressões não se cigem à pessoa da vítima. Essas ideias são comumente repassadas como verdadeiras e prejudicam o reconhecimento das reais causas dos conflitos e da responsabilidade conjunta dos envolvidos para a adequada resolução. Nesse sentido, a prevenção à violência doméstica, nos diferentes níveis dos poderes constituídos, mostra-se fundamental para encerrar o ciclo da violência e impedir que a situação da vítima se agrave, passando de um empurrão ou ofensa verbal para uma lesão corporal ou, até mesmo, para um crime contra a vida. TIPOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER Segundo Gobbato (2014), no tocante às formas de violência contra a mulher, a LMP adotou um rol meramente exemplificativo (art.
), dividindo-as em cinco categorias: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral4. A violência física ocorre quando há ofensa à integridade ou à saúde corporal da vítima (inc. Nos crimes contra a dignidade sexual, incide a majorante do art. II, CP7, com aumento de metade da pena quando “o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela”. Na hipótese de violência patrimonial, não se aplica as imunidades absolutas ou relativas dos artigos 181 e 182, do CP8, quando a vítima é mulher e mantém vínculo familiar com o agente (DIAS, 2015). Todas essas formas de violência podem ocorrer de forma isolada ou cumulativamente, sendo que a dinâmica da violência familiar contra a mulher tende a ser cíclica e de intensidade crescente, atingindo mulheres de diferentes níveis socioeconômicos e culturais (JESUS, 2010).
Explicados os tipos de violência doméstica contra a mulher, passa-se à análise da Lei nº 11. Destaque-se que as sucessivas “ondas” do feminismo não suplantam ou dão por resolvidas as questões enfrentadas pelas ondas anteriores, mas sim ampliam o espectro de debate em torno da busca pela igualdade de gênero. Enquanto o advento da segunda onda do feminismo ficou marcada pela ampliação do debate às desigualdades de fato (direitos reprodutivos, questões relacionadas ao ambiente de trabalho e familiar, sexualidade feminina, objetificação da mulher etc. alguns avanços caracterizados como vitórias desta onda do feminismo ainda são nitidamente a conquista de igualdade formal perante a lei. Já o feminismo de segunda onda (second wave feminism) é geralmente situado historicamente como ocorrido entre os anos 1960 e 1980.
Destaque-se que as sucessivas “ondas” do feminismo não suplantam ou dão por resolvidas as questões enfrentadas pelas ondas anteriores, mas sim ampliam o espectro de debate em torno da busca pela igualdade de gênero. Embora não exista consenso sobre o escopo desta onda, pode-se afirmar que são características a tentativa de afastar estereótipos de gênero, debates sobre questões linguísticas e termos pejorativos que contribuem para a opressão feminina, ativismo para conscientizar as pessoas de que determinadas situações cotidianas são emanações do machismo, etc. Por fim, já se fala de uma quarta onda (fourth wave feminism), que se referiria, sobretudo, ao ativismo e ocupação de espaços na rede mundial de computadores através de redes sociais.
Segundo Montenegro (2015), no Brasil, são marcos importantes do progresso do movimento feminista o surgimento do SOS Mulher e da Delegacia da Mulher, bem como a própria Constituinte de 1988 e a modificações no Código Civil e Código Penal. A autora destaca que: Com o surgimento do “SOS Mulher” criou-se um arcabouço organizacional capaz de influenciar na política, na medida que as mulheres que forma-vam a instituição eram “cultas e politizadas” e faziam parte dos partidos de esquerda que lutavam contra a ditadura militar no Brasil. Por outro lado, é de se frisar que as mulheres atendidas eram em geral humildes, não aderindo à ideologia professada pelas integrantes da instituição e sem nenhum interesse em se tornarem militantes (MONTENEGRO, 2015). Segundo Montenegro (2015), a problemática da violência doméstica é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como violação de direitos humanos e de saúde pública.
Na Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, em 1993, a Organização das Nações Unidas (ONU) afirmou que a violência doméstica contra a mulher é um obstáculo ao desenvolvimento, à paz e aos ideais de igualdade entre os seres humanos. O Brasil e a ONU firmaram Pacto Comunitário contra a violência intrafamiliar, em 25 de novembro de 1988. Em 1994, o Brasil assinou o documento da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção de Belém do Pará. Cuida-se de importante conquista para os direitos das mulheres, por se tratar de um compromisso internacional do Brasil, no qual existe a definição de violência doméstica e a explicação das formas desse tipo de violência (GOBBATO, 2014). Segundo Maria da Penha, após a naturalização, o marido mudou seu comportamento, passando a ser uma pessoa “agressiva, intolerante, grosseira” (Souza, 2008, p.
Em 29. ela sofreu um disparo de arma de fogo efetuado pelo próprio marido, em simulação de assalto, enquanto dormia, que a deixou paraplégica. Após retornar para sua residência, foi mantida em cárcere privado e quase eletrocutada por chuveiro elétrico propositadamente danificado. Marcos Heredia foi preso apenas em outubro de 2002, após forte pressão internacional (Souza, 2008). Criou-se a obrigação de o Estado desenvolver políticas públicas para resguardar os direitos humanos das mulheres em suas diversas gerações – liberdade, igualdade e solidariedade (DIAS, 2015) -, cabendo também à família e à sociedade desenvolver as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos das mulheres. Como forma de assegurar a segurança pessoal da vítima e de sua família, em caso de violência doméstica contra a mulher, a LMP instituiu as medidas protetivas de urgência (arts.
a 24, LMP). As medidas protetivas são importantes meios processuais para prevenir agressões e fazer cessar a situação de violência sofrida pela mulher no âmbito familiar e, desse modo, romper o ciclo da violência exposto acima (BRASIL, 2006). O artigo 22 da LMP trata sobre as medidas que obrigam o agressor, tais como: suspensão da posse ou restrição do porte de armas; afastamento do lar de convivência do casal; proibição de aproximação, contato e de frequentar determinados lugares; restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores; prestação de alimentos provisórios ou provisionais. da LMP trata das providências a serem tomadas pelo magistrado, tão logo receba o expediente que contenha pedido de medidas protetivas de urgência, fixando um prazo de 48 horas para que o juiz decida sobre tais pedidos.
Determina, ainda, que o juiz encaminhe a ofendida a órgão de assistência judiciária, normalmente a Defensoria Pública, se entender cabível e, nesse caso obrigatoriamente, comunicar ao MP (Lima; Figueirêdo, 2018). Pela redação do dispositivo, observa-se que não há obrigatoriedade de oitiva prévia do MP para que o magistrado decida sobre o pedido que verse sobre medidas protetivas de urgência, mas obrigatoriamente deverá comunicar o MP sobre o expediente. O caput do dispositivo estabelece três modalidades de concessão das medidas protetivas de urgência: de ofício, pelo magistrado competente; a requerimento do MP ou mediante pedido da própria ofendida. Tendo a legislação o objetivo de garantir maior proteção à vítima de violência doméstica ou familiar, é razoável que tenha maior possibilidade de concessão da medida, sem dificultar a concessão, exigindo-se, por exemplo, o requerimento do MP.
p). Na decisão também foi citado o julgamento de outro RE, julgado em abril de 2014, cujo relator foi o ministro Luis Felipe Salomão, em que também se entendeu que as medidas de urgência possuem natureza de cautelar cível satisfativa, e, portanto, não dependem de processo cível ou criminal, não sendo necessário, assim, assegurar a eficácia prática da tutela principal. Tendo em vista que as medidas protetivas objetivam resguardar direitos fundamentais e fazer cessar a violência, estas visam a proteção das pessoas, e não de processos (LIMA; FIGUEIRÊDO, 2018). Então, seguindo a linha de entendimento destas decisões, o STJ concedeu provimento ao RE interposto pelo MP-BA e a sentença que sustentava a medida protetiva e vigor, foi restabelecida (LIMA; FIGUEIRÊDO, 2018).
Do exposto depreende-se que a aplicação das medidas protetivas de urgência teve sua natureza autônoma e satisfativa reconhecida pelo STJ dirimindo possíveis dúvidas que ainda pudessem surgir sobre o instituto. A aplicação da LMP exige atuação articulada entre os órgãos do Poder Executivo Federal, Estadual e Municipal com o Poder Judiciário, tanto que o inciso I do artigo 8 prevê, como uma das diretrizes da política pública, a integração operacional do Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação (BRASIL, 2006). A criação da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), ainda em 2003, foi importante para a constituição de uma rede de atendimento às mulheres que sofrem violência doméstica e familiar, por permitir a implementação de políticas públicas direcionadas a enfrentar a violência contra as mulheres e seu acesso à justiça (GOBBATO, 2014).
Houve o estabelecimento da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contras as Mulheres, com diretrizes para atuação coordenada dos organismos governamentais nas três esferas da federação, inclusive a partir do incentivo à criação de redes compostas por todos os serviços que atendem à mulher em situação de violência. No âmbito do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça determinou a criação de Coordenadorias Estaduais das Mulheres de Violência Doméstica e Familiar em cada Tribunal de Justiça para atuar na melhoria do Poder Judiciário na área de combate e prevenção à violência doméstica (Resolução CNJ 128/2011). As alterações na seara criminal foram significativas e serão apresentadas na próxima seção. Primordialmente, busca-se a conciliação entre as partes.
Não sendo possível, a vítima tem o direito de representar, em caso de ação penal condicionada. Posteriormente, havendo a representação ou o crime sendo de ação pública incondicionada, o MP pode propor a aplicação imediata de penas restritivas de direitos, tais como prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, ou multa. A aplicação automática desses institutos, pelos Juizados Especiais, prejudicava o combate à violência doméstica contra a mulher (MORAES, 2009), uma vez que a grande maioria dos crimes cometidos contra as mulheres no âmbito privado (lesão corporal leve, ameaça e crime contra a honra) é enquadrada pela lei como infrações de menor potencial ofensivo. Mello (2010) explica a problemática da má aplicação do modelo consensual do juizado especial criminal: Para grande parte dos discursos feministas, essa lei teria banalizado a violência doméstica e contribuído para o arquivamento massivo dos processos, a reprivatização do conflito doméstico e a redistribuição do poder ao homem mantendo-se a hierarquia de gênero.
Ademais, a vítima somente poderá renunciar à representação em audiência, especialmente designada para esse fim, antes do recebimento da denúncia, com a participação do MP (art. LMP). A LMP incluiu hipótese de prisão preventiva para assegurar o cumprimento da medida protetiva de urgência (art. inc. III, CPP). houve relevante controvérsia jurisprudencial quanto à constitucionalidade da lei, o que resultou no ajuizamento de uma Ação Declaratória de Constitucionalidade - ADC 19 -, com o objetivo de encerrar a celeuma acerca da harmonia dos artigos 1, 33 e 41 da LMP com a CF/1988 (GOBBATO, 2014). Segundo Barin (2016), alguns tribunais entendiam que a LMP desrespeitava os princípios da igualdade e da proporcionalidade, por criar tratamento diferenciado para as mulheres, tomando o gênero por fundamento, além de afastar a aplicação da Lei n.
e seus institutos despenalizadores. Seguem as seguintes Ementas oriundas do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, demonstrando a divergência dentro do mesmo órgão: APELAÇÃO CRIMINAL - LEI MARIA DA PENHA - DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA NORMA - CONCESSÃO DAS MEDIDAS DE URGÊNCIA - POSSIBILIDADE. Para que seja afastada a possibilidade de suscitação de inconstitucionalidade da Lei 11. I). O que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, pois o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, é exigência do próprio conceito de Justiça", portanto, não se vislumbra violação ao princípio da isonomia na aplicação das regras da “Lei Maria da Penha”. Recurso a que se dá provimento (TJMG - Apelação Criminal 1.
Relator(a): Des. a) Hélcio Valentim, 5ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 15/04/2008, publicação da súmula em 26/04/2008). inc. I, CF). Por derradeiro, o STF reconheceu a possibilidade de a LMP afastar a aplicação da Lei n 9. que versa sobre o procedimento sumaríssimo do Juizado Especial, e, consequentemente, de seus institutos despenalizadores, em caso de violência doméstica contra a mulher, em virtude da proibição de proteção insuficiente dos direitos fundamentais (BARIN, 2016). Veja-se a ementa: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – LEI Nº 11. a afastar, nos crimes de violência doméstica contra a mulher, a Lei nº 9. mostra-se em consonância com o disposto no § 8º do artigo 226 da Carta da República, a prever a obrigatoriedade de o Estado adotar mecanismos que coíbam a violência no âmbito das relações familiares (ADC 19, Relator (a): Min.
MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 09/02/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-080 DIVULG 28-04-2014 PUBLIC 29-04-2014) No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 4. o STF reafirmou a constitucionalidade do art. da LMP e reconheceu que a ação penal relativa à lesão corporal leve, resultante de violência doméstica, é pública incondicionada, diante da vulnerabilidade da mulher vítima de violência (GOBBATO, 2014). , inc. XLI, CF/88). Portanto, como esclarece Barin (2016), em sede de ação constitucional, com efeito vinculante, o STF reconheceu a constitucionalidade da LMP e consolidou entendimento de que não há como submeter a iniciativa da ação penal, no crime de lesão corporal leve, à vontade da vítima, por afrontar aos princípios da igualdade, da dignidade da pessoa humana e da vedação a qualquer tipo de discriminação atentatória dos direitos e das liberdades fundamentais (CF/88, art.
, incs. I, III e XLI). No entanto, não é qualquer tratamento desigual que é discriminatório: Somente o é aquele que não se baseia em causas objetivas ou razoáveis. Revela-se insuficiente, no ponto, recordar a tão aclamada afirmação de Aristóteles, de que a igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Deve-se reconhecer a sua importância e afirmar a sua validez como ponto de partida, mas não como ponto de chegada, já que entre um e outro extremo converge a incerteza provocada pela pergunta: quando a desigualdade justifica a discriminação, sem que aja ofensa ao princípio da igualdade? É preciso determinar quais são as discriminações juridicamente toleráveis ou legítimas (BARIN, 2016, p. As discussões em torno da constitucionalidade da LMP e algumas resistências na sua aplicabilidade geraram a propositura de ações perante o STF: A Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) 19-3/610, intentada pelo Presidente da República, em relação aos seus arts.
º, 33 e 41; e a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4. O tratamento diferenciado que a LMP confere à mulher fundamenta-se no reconhecimento de que há todo um conjunto de poder simbólico, interiorizado por homens e mulheres desde a infância, que as coloca numa postura de dependência e acaba por fragilizá-las nas relações, mormente no âmbito doméstico. Deste modo, potencializa-se a vitimização das mulheres criando obstáculos à alteração daquele status, seja pela dificuldade psicológica de denúncia da violência sofrida, seja pela tendência de minimização da gravidade da violência pelas instâncias formais e informais de controle social (DIAS, 2015). No entendimento de Barin (2016): A tomada de consciência da desigualdade material entre homens e mulheres justifica a criação de políticas públicas destinadas a superar essa relação iníqua de gênero, na busca da máxima efetividade dos direitos fundamentais da mulher, por meio da construção de uma nova forma de relação social pautada no reconhecimento da idêntica dignidade humana entre os gêneros.
A lei refletiria, portanto, um panorama moderno de igualdade material, pela ótica neoconstitucionalista que inspirou teórica e ideologicamente a CF/88, proporcionando visibilidade à criminalidade doméstica contra as mulheres (BARIN, 2016, p. Neste cenário, no entendimento de Gobbato (2014), a violência doméstica contra as mulheres é uma realidade que deve ser combatida de maneira eficaz, pelo que não duvida-se da ratio legis da LMP e da Lei do Feminicídio, e da necessidade de uma intervenção penal mais intensa em matéria de gênero. Em relação ao art. para além da ofensa ao princípio constitucional da igualdade, porque traria tratamento diferenciado entre o crime de lesão corporal doméstica praticado contra homem (que se processa mediante representação) e contra mulher (independe de representação), a inscontitucionalidade encontraria fundamento na ofensa aos princípios da proporcionalidade, da intervenção mínima e da dignidade da pessoa humana, e a direitos fundamentais como liberdade, duração razoável do processo e celeridade processual, assim como afrontaria o disposto no art.
inc. I, da CF/88, que delega à legislação infraconstitucional a atribuição de identificar as infrações penais consideradas de menor potencial ofensivo (DIAS, 2015, p. Como visto, o STF reconheceu a constitucionalidade do dispositivo por ser a posição mais coerente com os princípios constitucionais e com as convenções internacionais sobre o tema das quais o Brasil é signatário. Segundo a mesma autora: Neste quadro, julga-se acertada a vedação legal à composição civil dos danos entre as partes e à concessão do benefício da transação penal. Em abono a esta interpretação, militam outros argumentos. Por primeiro, na maioria dos casos, a vítima não está em condições de “negociar” com o agressor, de modo a formalizar a composição civil. Similar à mediação, em que se debate a possibilidade de realização nos crimes de violência doméstica, também na composição não há idêntico “empoderamento” da vítima e do agressor.
E este equilíbrio parece ser essencial à composição (BARIN, 2016, p. Em um estudo do IPEA (2015)15 sobre a eficácia da LMP, divulgado em março de 2015, os resultados indicam que, embora a lei não tenha logrado uma diminuição contínua do número de assassinatos de mulheres, logrou a estabilização, enquanto a violência em relação aos homens cresceu. Diante disso, a lei foi avaliada positivamente, pois, caso não existisse, o número de mulheres mortas no ambiente doméstico seria 10% maior. Acredita-se que a LMP representou, de forma irrefutável, grande avanço no enfrentamento da criminalidade doméstica contra as mulheres no Brasil, reforçando a tutela penal e trazendo importantes instrumentos de proteção às ofendidas, a ponto de gerar uma maior sensação de segurança às vítimas.
No entanto, a lei não foi suficiente para reduzir de forma significativa os índices deste tipo de violência doméstica. Esta é uma questão instigante, cuja resposta começa-se, ainda que parcialmente, a formatar. estes crimes não são dissuadidos “com mais polícias nem com penas mais graves, pois os seus agentes nada têm a perder com o descontrole”, reclamando, assim, a contribuição de outras áreas, como da política de prevenção criminal e da Psicologia Criminal à política criminal. Em outras palavras, para o enfrentamento do problema, requer-se, para além da penal, a intervenção de outros sistemas e saberes (PALMA, 2013). No que concerne à Lei do Feminicídio, como dito, em vista de ser extremamente recente, não é possível ainda precisar seu impacto frente aos índices desses homicídios, até pela ausência de estudos.
As opiniões, contudo, caminham no mesmo sentido do aqui já exposto: o endurecimento da resposta penal, por si só, não é medida suficiente à minoração dos índices de feminicídios. Diante do quadro delineado, entende-se que, nos casos da violência doméstica, a tutela penal assegura não só a prevenção direta exercida sobre os potenciais agentes de crimes, como também “uma prevenção indireta, que se traduz no alerta social gerador do reconhecimento do desvalor e da intolerância para com essas condutas” (PALMA, 2013, p. Atentos a este cenário, parlamentares brasileiros instalaram CPMI16 com a finalidade de investigar a situação da violência contra as mulheres no Brasil e apurar denúncias de omissão por parte do poder público com relação à aplicação de instrumentos instituídos em lei para proteger as mulheres em situação de violência.
O relatório final (publicado em junho de 2013 e aprovado no mês subsequente) apresenta-se como o mais completo estudo avaliativo17 dos déficits de implementação da LMP, apontando, ainda, algumas deficiências regulatórias. Traz sessenta e oito recomendações a diversos órgãos e instituições dos três níveis de poder, além de algumas propostas de alterações legislativas. Busca-se destacar algumas das deficiências de implementação da lei, detectadas, inclusive, pela CPMI. Inicia-se pela intervenção preventiva, onde as políticas públicas têm sido insuficientes, tanto que, em âmbito nacional, a CPMI propôs a ampliação do orçamento da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República para o enfrentamento da violência e solicitou a criação de um Sistema Nacional de Informação sobre Violência Contra a Mulher, para melhor direcionamento das políticas públicas (Barin, 2016).
Neste cenário, a grande maioria das Comarcas não possui equipes multidisciplinares à disposição para atuação nos casos de violência doméstica ou familiar contra a mulher. Ainda, são raros os cursos qualificadores dos operadores jurídicos e há resistência por membros do Poder Judiciário em aplicar dispositivos da lei ou interpretá-la buscando a maior proteção da mulher. “Por vezes, os magistrados estabelecem procedimento similar ao previsto na Lei 9. deveras criticado pela sensação de impunidade que gerava, e, noutras, restringem a aplicabilidade das medidas protetivas em favor das mulheres” (DIAS, 2015, p. Segundo Barin (2016), o sistema de justiça, a CPMI recomendou a ampliação e a qualificação de todos os serviços, a permanente capacitação dos operadores do direito para a correta aplicação da lei e o atendimento às vítimas de violência.
Do cenário exposto ressalta a premência da incrementação dos meios de informação, sensibilização e intervenção precoce, sem descurar da complexidade do fenômeno e da necessidade da abordagem interdisciplinar – com atuação conjunta dos vários segmentos públicos e privados (MEDINA ARIZA, 2002). Segundo Ávila (2014), o foco principal do Estado deve ser a intervenção primária, mediante o aperfeiçoamento das medidas e das estratégias de prevenção (por excelência) da violência doméstica, sem prescindir do apoio das instâncias informais de controle. Já no âmbito da intervenção penal, segundo o autor: [. urge que se tenha mais DEAMs e atendimento policial de qualidade, e sejam implementados os JVDFMs, com suas equipes multidisciplinares para o assessoramento do trabalho do juiz e do MP e para o tratamento e o correto encaminhamento das partes aos serviços necessários.
Para além disso, é preciso que os operadores jurídicos não fiquem comprometidos com a antiga mentalidade dos JECrims, afastando a cultura da minimização da violência. da Lei 11. para explicitar que a competência cível dos Juizados e Varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher inclui as ações de alimentos, guarda, regulamentação de visitas, divórcio, indenização e outras decorrentes das relações domésticas e familiares, de modo a facilitar a busca das mulheres por justiça num mesmo juizado, bem como evitar decisões conflitantes por juízes que desconheçam a situação fática da violência; d) acrescentar dispositivo ao CPP para proibir o arbitramento de fiança pela autoridade policial nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, para garantir maior proteção às vítimas no momento e logo depois da infração penal.
Barin (2016, p. ainda diz que: Do ponto de vista das deficiências regulatórias, outros dois aspectos poderiam, em nosso juízo, ser aperfeiçoados. O primeiro diz com a ausência de regulação em relação à estrutura e à organização dos centros de educação e de reabilitação para os agressores e à especificação, ainda que sucinta, do que consistiriam os programas de recuperação e reeducação. não esgotam outras condutas que são passíveis de enquadramento nesse contexto, desde que tenham ocorrido na esfera da unidade doméstica, no âmbito da relação familiar e/ou na relação íntima envolvendo o vínculo de afeto. Para Guimarães e Moreira (2017), a definição de violência contra a mulher, que fundamenta a política criminal referente à Lei 11.
está embasada em alguns pressupostos: A desigualdade de gênero; a necessidade de enrijecimento das penas ao invés de transação penal; a criação de mecanismos para que a vítima não desista da ação; o reconhecimento dos diversos tipos de violência e a garantia da intervenção penal. Como se observa, os fundamentos da referida Lei se chocam com os propósitos da Lei 9. que, por seu turno, prioriza o afrouxamento dos mecanismos punitivos e prevê a transação penal, objetivando a despenalização, sem vislumbrar questões relativas à desigualdade de gênero (GUIMARÃES; MOREIRA, 2017, p. As ações de assistência à mulher vítima de violência doméstica e familiar serão garantidas com a oferta de serviços provenientes do Sistema Único de Assistência Social, SUS e Sistema Único de Segurança Pública.
Propõe-se que as ações desses órgãos ocorram de forma articulada, seguindo os princípios e as diretrizes legais que fundamentam tais serviços. Souza esclarece: A norma é incisiva ao dispor, não como faculdade, mas como um dever do juiz, determinar a inclusão da mulher em situação de violência doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal (Souza, 2013, p. Entre as medidas para prevenir e coibir a violência, a mencionada lei determina a implantação de atendimento policial especializado às mulheres. As providências legais cabíveis variam desde a prisão em flagrante do suposto agressor, até ações de cunho educativo que pretendam potencializar a vítima para reconhecer a violência, apresentar denúncia e prosseguir com a ação na justiça.
Barin (2016) explica que o CNJ integra a política de Reforma do Judiciário, pensada a partir de 1990, com foco na modernização e no controle administrativo da instituição judiciária, no Brasil. Nesse sentido, identificam-se diversos programas e ações criados e/ou desenvolvidos pelo CNJ, baseados na Resolução 125, de 29. abrangendo várias esferas da vida humana no campo dos direitos. A referida resolução dispõe sobre a Política Judiciária Nacional, que visa ao tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário, à garantia do acesso à justiça e à eficiência operacional. No que tange à violência doméstica e familiar contra a mulher, o CNJ desenvolve ações de prevenção e de combate junto aos Tribunais brasileiros, sendo uns mais atuantes do que outros.
Levando em conta indicadores internacionais, o Brasil ocupa o 5º lugar no ranking de países com maiores índices de homicídios femininos, o que revela a taxa de 4,8 por 100 mil habitantes (CNJ, 2016 apud CARDOSO, 2019). O Mapa da Violência, elaborado, por Waiselfisz no ano de 2012 e citado em um dos documentos produzidos pelo CNJ sobre a atuação do Judiciário na aplicação da LMP, apresenta alguns números relacionados à violência. De acordo com o Mapa, o número de homicídios cometidos em 2010 contra as mulheres foi de 4. e o índice de ocorrência no lar foi de 71,8% (Waiselfisz, 2012). O Mapa da Violência, editado em 2015, indicou o crescimento de 252% da taxa de homicídio contra a mulher no Brasil, considerando o intervalo de tempo entre 1980 a 2013. Segundo informações atualizadas do CNJ, de 2012 a 2016 foram instaladas mais 40 varas especializadas, perfazendo o total de 106 unidades judiciárias para 430 mil processos distribuídos.
Conforme o CNJ (2016 apud CARDOSO, 2019), somente em 2015, a justiça brasileira recebeu 263. novos processos referentes à violência doméstica e familiar contra a mulher, sendo aplicadas, no mínimo, 328. medidas protetivas. Segundo Cardoso (2019), o próprio CNJ reconheceu que o judiciário brasileiro precisa de aprimoramento de seus recursos materiais e pessoais para servir com eficiência à população que busca atendimento em virtude de processo de natureza criminal, proveniente da LMP. processos em trâmite devem funcionar com equipe multidisciplinar composta de dois psicólogos, um assistente social e um servidor. Nos Juizados com 2. a 5. processos em trâmite, a equipe deve ser composta de dois psicólogos, dois assistentes sociais e um servidor. Por fim, nos Juizados com 5. feitos ativos nas quatro varas especializadas (CARDOSO, 2019). No ano de 2015, o relatório anual desses feitos, do mesmo tribunal apontou um pequeno decréscimo relativo ao número de processos em trâmite, fechando o ano com 41.
ativos na Comarca de BH. Mesmo com a criação de novas Varas Especializadas, não foi encontrada informação a respeito da ampliação da equipe multiprofissional (CARDOSO, 2019). O aumento vertiginoso do número de processos, cuja natureza é a violência doméstica e familiar contra a mulher, fez com que o tribunal mineiro adotasse medidas para agilizar o julgamento de tais processos na capital. Falta capacitação dos profissionais que atuam nessa área, uma vez que é exigida uma formação devida que possibilite conhecer, com profundidade, as complexidades envolvidas na violência de gênero; não há um número suficiente de equipes para atender à grande demanda de casos de violência encaminhados aos Tribunais e Delegacias; inexiste um protocolo de atendimentos e encaminhamentos para orientar as ações dos profissionais e dos beneficiários da Lei.
Ademais, a polícia revela despreparo e o tempo que ela leva para concluir um inquérito policial, impacta o andamento do processo na justiça, fazendo com que uma quantidade considerável de processos seja prescrita sem julgamento. A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (Brasil, 2013), presidida pela Deputada Federal Jô Soares e constituída não só para investigar situações de violência contra a mulher no Brasil, bem como apurar omissões do poder público frente à mulher vítima de violência, publicou o Relatório 1, em julho de 2013, referente à situação averiguada em todos os Estados da Federação e no Distrito Federal. Concluiu-se que os Estados necessitam, de modo geral, de estrutura administrativa e de recursos humanos para aplicação da LMP. A CPMI sugeriu ao CNJ a criação de uma coordenadoria de âmbito nacional, para estudar a viabilidade de se criar política pública na área e para auxiliar os tribunais de justiça do país, visando à efetiva aplicação dessa lei.
Interroga-se, por exemplo, quais são os critérios adotados para a aplicação das medidas cíveis, uma vez que estas implicam efeitos que podem interferir na convivência dos filhos com o pai, suposto autor de agressão contra a mulher. Ressalta-se que a medida protetiva, prevista no inc. IV, do art. da Lei 11. determina a “restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar” (Brasil, 2006, s. A prisão imediata será decretada nas circunstâncias em que a mãe (mulher agredida) alegar que o pai (homem acusado) está utilizando a visitação para se aproximar dela. Outros questionamentos nesse sentido podem ser feitos: existem espaços físicos nos fóruns instalados nas diversas comarcas do país, que viabilizem as visitas assistidas? Existem profissionais disponíveis para fazerem o acompanhamento dessas famílias? Será de competência do Judiciário assumir essa função de execução das visitas autorizadas ao pai? Na falta dos Juizados Especializados, realidade esta evidenciada, as visitas ficarão sob a responsabilidade da justiça criminal ou cível? Embora esses questionamentos não desconheçam ou neguem a centralidade da mulher nas demandas amparadas pela LMP, eles problematizam seus efeitos na esfera cível, principalmente quando envolvem os direitos de filhos menores de idade.
Garland (2008), ao discorrer sobre a função das leis no campo criminal, por um lado expõe que elas possuem uma atuação simbólica, definida por ele como ações expressivas usadas de forma a censurar o crime e a confortar o público. Por outro lado, Garland (2008) considera que as leis não se detêm nos problemas subjacentes. Seguindo o raciocínio desse autor, pode-se pressupor que a LMP assume uma função simbólica, visto que sua finalidade é coibir o crime e dar uma resposta para a sociedade sobre o controle da criminalidade. As transformações socioculturais operadas na sociedade contemporânea e a visibilidade proporcionada pelos movimentos feministas conduziram ao reconhecimento gradativo – mas não linear em todos os Estados – da violência privada como um grave problema social, que viola a dignidade da pessoa humana e os mais básicos direitos fundamentais.
Neste quadro, exige a intervenção estatal, em especial do Direito Penal, que desempenha função destacada na proteção desses direitos essenciais. O fenômeno da violência doméstica contra as mulheres apresenta-se transcultural, não sendo uma particularidade de determinados grupos sociais. Constitui flagelo nas sociedades ocidentais e orientais, afeta a todos os Estados da comunidade internacional e sofre influxos socioculturais. Organismos internacionais e recentes estudos reconhecem e denunciam a dimensão universal e a gravidade do problema, que parece ser ainda mais intenso no cenário brasileiro. No entanto, não deixa de conter alguns aspectos que geram dúvidas acerca de sua constitucionalidade demandando reformulação. REFERÊNCIAS Agressões demais, punição de menos. Estado de Minas, Belo Horizonte, 19 abr. p. AMARAL, Claudio do Prado.
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