A POESIA DE MANOEL DE BARROS NA SALA DE AULA: RELATO E ANÁLISE DE EXPERIÊNCIA DE LEITURA DO POEMA OBRAR

Tipo de documento:Artigo cientifíco

Área de estudo:Pedagogia

Documento 1

Consulte a 3ª Cláusula, § 4º, do Contrato de Prestação de Serviços). “Deixar este texto no trabalho conforme se apresenta, fonte e cor vermelha”. RESUMO- Esta pesquisa investiga como se dá a aproximação do texto poético por alunos da primeira série do ensino fundamental I. O poeta convocado foi Manoel de Barros. A escolha pelo autor deu-se devido à minha predileção pelo poeta e pela maneira como suas temáticas relacionadas à infância aproximam-se dos interesses do público em geral, mas também das crianças. Minha escolha pelo poeta Manoel de Barros foi devido ao conteúdo latente acerca da infância presente em sua poética. Sendo assim, elaborei uma oficina de poesia do autor Manoel de Barros para a primeira série do ensino fundamental II com o intuito de observar como se dá a recepção dessa poesia e quais ganhos estas crianças tem no quesito aprimoramento da leitura.

A pesquisa também teve como objetivo buscar respostas para os seguintes questionamentos: como formar o jovem leitor, em fase de transição (do ensino infantil para o ensino fundamental I, mais especificamente primeiro ano) em leitores de poesia contemporânea e como se dá a recepção da poesia de Manoel de Barros por este público? Este percurso torna-se um tanto árduo, haja vista que são recorrentes as reclamações acerca do pouco interesse das crianças pela leitura literária e neste quesito, o gênero lírico encontra um espaço muito limitado em sala de aula, seja pela falta de interesse e conhecimento do professor em relação a uma didática de ensino do gênero, seja pela predileção da maioria das escolas por um ensino mais pragmático e utilitário que prioriza textos funcionais em detrimento aos textos artísticos, privando a criança de descobrir nestes textos a magia da poesia.

E o intuito desta pesquisa foi, ao pensar a formação do leitor do texto poético: ampliar as percepções das crianças acerca deste mundo, além de observar como se dá a recepção da poesia de Manoel de Barros pelas crianças do primeiro ano do ensino fundamental I e analisar os resultados a luz do aporte teórico visitado. O ser humano é o inacabamento. Utilizei, como instrumentos de coleta, a entrevista observações das aulas, anotações, relatórios de campo e atividades realizadas pelos discentes. Os dados foram coletados durante o período do dia 02 a 04 de fevereiro de 2020. A escolha pelo grupo da faixa etária dos 6 aos 7 anos deu-se devido ao fato de ser um público muito jovem, considerado crianças pelo Estatuto da Criança e Adolescente: “Art.

º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos e adolescentes aquela entre doze e dezoito anos de idade. ” (BRASIL, 2010, p. O projeto foi recebido pelos alunos com bastante entusiasmo e curiosidade. Percebi muita abertura e empenho durante todas as etapas da pesquisa e em nenhum momento questionou-se acerca de notas ou avaliações. Eles compreenderam que se trataria de um momento de aprimorar o conhecimento e descobrir algo novo, haja vista que o poeta convocado e sua poesia eram totalmente desconhecidos pelo grupo. Passemos à apresentação e análise dos dados coletados pela entrevista de sondagem inicial. Quando questionados “Você gosta de ler?”, um percentual de 79%, alunos afirmam que sim; enquanto um total de 21%, responderam que não. Outro aspecto a destacar é a responsabilidade, muitas vezes delegada somente à escola, no que diz respeito à formação de leitores.

Ora, a leitura deve extrapolar os muros da escola: a família, a comunidade, as igrejas, os sindicatos, as bibliotecas enfim, a sociedade como um todo deve colaborar para a formação de leitores. Bajard (2007) lança a pergunta: “Quando grande parte da população infantil cresce longe dos livros, como esperar da escola a redução dessa disparidade, criada fora dela e antes da sua intervenção?” (BAJARD, 2007, p. Diante disto, questionei aos alunos se alguém da família os incentiva a ler e se sim quem seria essa pessoa. Os resultados apontaram que sim para (88%) e não para uma porcentagem de 12%. Estas últimas informações deixaram os alunos um tanto admirados. Em seguida, perguntei sobre o significado da palavra “obrar”. A maioria alegou desconhecer tal palavra. Percebi que esta palavra não fazia parte do léxico do grupo, outros arriscaram dizer que era trabalhar, fazer obra de arte.

Então, distribuímos para a classe folhas impressas com o poema “Obrar” do livro Memórias Inventadas: as infâncias de Manoel de Barros (2008). E que as obras trazem força e beleza às flores. Por isso, para ajudar, andei a fazer obra nos canteiros da horta. Eu só queria dar força às beterrabas e aos tomates. A vó então quis aproveitar o feito para ensinar que o cago não é uma coisa desprezível. Eu tinha vontade de rir porque a vó contrariava os ensinos do pai. Ao final ocorreu uma verdadeira celeuma na sala de aula, reações de riso, de nojo e de espanto. Os alunos ficaram indignados com o fato de Manoel de Barros convocar um elemento tão desprezível para a matéria de sua poesia, pois estavam acostumados com o tratamento de sentimentos e elementos sublimes, expostos na entrevista de expectativas.

Então, aproveitei o momento para elucidar a questão do poeta e do sujeito lírico. Questionei se sabiam o que é o sujeito lírico e a maioria respondeu que não, logo explanei que o sujeito lírico também era conhecido como eu lírico e se tratava da voz do personagem presente no poema e esta entidade fictícia não é necessariamente o autor, o que não impede de encontrarmos a subjetividade do criador no próprio poema. Em seguida, perguntei em qual fase da vida encontrava-se o sujeito lírico do poema “Obrar” e os alunos foram unânimes ao responderem que o sujeito lírico encontrava-se na infância. Assim, surgiu uma nova hipótese, a avó poderia ser um desdobramento do próprio sujeito lírico, haja vista que este também era transgressor, pois contrariava os ensinamentos do pai.

Outro aluno mencionou o fato de que, na realidade, as avós são permissivas para com os netos, pois permitem que façam coisas que os pais das crianças não autorizam. Já no segundo momento, empreendi uma discussão sobre a forma como a linguagem é trabalhada artisticamente no poema, o coloquialismo, o registro da oralidade, a palavra livre das regras gramaticais. O grupo percebeu a falta de vírgulas em alguns versos e concluiu que o sujeito lírico também era transgressor da linguagem. Então, esclareci que se tratava de algo chamado agramaticalidade e que em virtude dela, a linguagem reencontra o que poeta Manoel de Barros denomina como o “criançamento” da linguagem, esta o leva a subverter a língua convencionada como padrão, a procura de um retorno à infância e isto o conduz a uma linguagem inaugural, não contaminada pelas formas gramaticais estudadas na escola.

Foi um momento muito divertido e lúdico. Os trabalhos traziam ilustrações com neto e a avó figurando como personagens principais. Todos com finais muito burlescos. Percebi que os alunos compreenderam o dom peculiar do verbo obrar, pois em todas as produções, as obras modificavam as coisas para melhor, o que era feio ficava belo, o que era fraco adquiria robustez e as obras pareciam curar todas as mazelas do mundo. Eles conseguiram desconstruir o significado dos dejetos humano dando importâncias inimagináveis às fezes. E este foi um dos intuitos desta pesquisa, ao pensar a formação do leitor do texto poético: ampliar as percepções das crianças acerca do mundo. Constatei que uma questão crucial para o sucesso da formação de leitores de poesia está na figura do mediador.

Nas palavras de Ebe Siqueira (2013), “a forma como esse mediador compreende e lida com o texto pode levar o aluno a gostar ou não desse ou daquele gênero em especial” (SIQUEIRA, 2013, p. Assim, percebi que um dos requisitos iniciais para a qualidade da mediação do texto poético está em consonância com os estudos de Pinheiro (2007), pois o professor/mediador deve ser leitor de poesia e ter o gênero em sua mais alta estima. E munido de um conhecimento teórico contundente, estudar, observar e analisar as preferências de seus alunos no universo da leitura e escolher textos que atendam os anseios do leitor, conceito também presente nos pressupostos de Bordini e Aguiar (1993) no que tange ao horizonte de expectativas do leitor. As atividades sobre o poema “Obrar” trabalhado em sala de aula também tiveram boa aceitação dos alunos.

Minha proposta procurou explorar a criatividade dos discentes, de forma que eles pudessem exercê-la com liberdade. Penso que a formação de leitores de poesia contemporânea alcançou de forma positiva e contundente os alunos participantes da oficina, apesar do curto espaço de tempo da oficina. E o recorte do poema “Obrar” de Manoel de Barros e as leituras desenvolvidas em sala de aula também conseguiram alcançar os resultados inicialmente almejados. Por fim, sabe-se que há inúmeros trabalhos acadêmicos com o mesmo propósito desta pesquisa, mas para que a poesia possa continuar a trilhar o caminho árduo em relação à aceitação e a formação do jovem leitor, faz-se necessário dar continuidade a esta linha de pesquisa, para nortear a práxis do professor e fornecer trocas de experiências para com o texto poético em sala de aula, de modo a enriquecer este contato tão necessário às crianças.

Estatuto da Criança e do Adolescente, Câmera dos Deputados, Lei no 8. de 13 de julho de 1990. DOU de 16/07/1990 – ECA. Brasília, DF. CALVINO, ÍTALO. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. PILATI, Alexandre. Poesia na sala de aula: subsídios para pensar o lugar do leitor e a função da literatura em ambientes de ensino. Brasília: Pontes, 2017. PINHEIRO, Hélder.

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