O FIM DO ESTADO: AS ORGANIZAÇÕES NAS COMUNIDADES DO RIO DE JANEIRO

Tipo de documento:Artigo acadêmico

Área de estudo:Direito

Documento 1

A omissão do Estado na luta às várias e repetidas atitudes delituosas dos grupos citados robustece a teoria de falência estatal. Partindo-se desses apontamentos, é defendida a tese de que o Estado falhou no que tange à segurança pública do estado-membro centro desta análise. Palavras-chave: Milícias. Rio de Janeiro. Estado. INTRODUÇÃO A Constituição da República Federativa do Brasil, enquanto Constituição Cidadã, lista variados direitos e garantias de natureza fundamental que devem ser observados. Desta feita, sob a ótica constitucional de máxima efetividade à esta espécie de norma, não existe lacunas para que o Estado proceda à omissão no que diz respeito a assegurar o direito à segurança pública. Em virtude do avanço da violência e da construção dos grupos paramilitares que colocam em riso a ordem pública, questiona-se a falência do Estado em razão da omissão específica na luta às milícias.

Não é razoável sustentar a falência estatal em virtude da omissão específica no que cerne às milícias sem abordar o hodierno cenário social em que se insere a luta contra a marginalidade. Para isso, a princípio, procederá à conceituação, bem como à listagem dos componentes construtores dos grupos paramilitares e ressalta a existência ostensiva de agentes públicos na construção e domínio dessas organizações. Desta forma, o afligimento da população na luta contra os delitos comuns e rotineiros, cotidianamente anunciados pela mídia, inclina-se a camuflar o progresso sem controle de outros tipos de crimes que são incentivados por agentes a quem o Estado conferiu a tarefa de tutelar a sociedade da marginalidade. Em outros termos, apesar de a Lei Maior, de modo genérico, conferir às forças armadas e às polícias federais, civis e militares a asseguração do direito à segurança pública, atualmente, o caso concreto indica a sociedade como vítima desses anti-heróis da segurança pública.

Se, num giro o delituoso individual apavora o homem médio através da sua habilidade de confrontar a organização estabelecida pelo Estado, valendo-se de requintes de crueldade com o fito de consumar seus delitos sem receios, o delito fundamentalmente sistematizado confronta a soberania nacional, bem como ameaça a confiança que a sociedade entrega ao Estado para a luta contra a violência. Perante o contexto de instabilidade social no qual se acha a cidade do Rio de Janeiro, percebido pelo jornalista e escritor estadunidense Jon Lee Anderson, enquanto “Calamidade Social” (ANDERSON, 2009) amplia-se a quantidade de grupos armados construídos por agentes ou ex-agentes públicos que se valem da farda e de um roteiro protecionista com o objetivo de se inserir e controlar comunidades carentes e esquecidas pelo Estado.

Portanto, as milícias se demonstram, a princípio, em certas regiões, como sendo a solução para o domínio da criminalidade, bem como para a progressão social que o Estado, por sua omissão, deixou de viabilizar, tornando-se, consequentemente, uma efetiva milícia leviatã e um concreto Estado Paralelo inserido no interior do Estado propriamente dito. Para corroborar a afirmação supra elaborada, nem sequer as autoridades incumbidas pelo âmbito da segurança pública detêm o condão de definir um conceito preciso. Na acepção do delegado Marcus Neves, da 35ª Delegacia de Polícia, as milícias simbolizam: [. grupos armados compostos por agentes do Poder Público e pessoas cooptadas nas comunidades carentes, inclusive ex-traficantes, que usam a força e o terror para dominar uma determinada região e explorar de maneira ilegal as atividades de transporte alternativo, gás e tevê a cabo.

Seu mote é a questão financeira, o lucro farto e fácil (NEVES, 2008, p. Por seu turno, Jaqueline Muniz e Domício Proença definem que as milícias consistem em gangues compostas por policiais e ex-policiais que alienam segurança contra eles próprios (MUNIZ; PROENÇA, 2008, p. p. O componente espacial existente no domínio do território e da população advindo da atuação das milícias, em nem todas as vezes estará relacionado a uma natureza coativa. Em um primeiro momento, em virtude de uma promessa de tutela, esses grupos armados agem com legitimação conferida pelos membros da comunidade que sofreu a dominação. O cenário sócio-econômico do Rio de Janeiro simboliza a inexistência de uma política pública em seus âmbitos que apresentam maior carência, e efetiva a consideração da falência do Estado.

Logo, é nesta conjuntura de omissão do Estado que grupos de agentes ativos ou não tornam a exercer domínio sobre comunidades, se valendo, comumente, da estrutura e mecanismos oportunizados pelo Estado com o fito e lutar contra a prática de crimes. Além disso, insta destacar que, semelhante ao que ocorre com a atividade ilícita do narcotráfico, existe, de modo majoritário, o componente econômico, intrínseco à finalidade de se adquirir lucro com a prestação dos serviços de segurança, fornecimento de TV a cabo, gás e transporte. Com efeito a argumentação baseada na tutela inicial aplicada na ocasião da instauração dos grupos armados nas comunidades se transformou em secundário. O simples teto de salário ao qual estão submetidos os agentes estatais incentivou a avidez particular de complemento de renda mensal.

Comumente, os noticiários dão conta que a atuação das milícias no estado do Rio de Janeiro não possui restrições (RAMALHO, 2009). Prova disso é que, em desarmonia com as atividades de regulamentação, foram apreendidos mais de cinco mil botijões de gás em um depósito camuflado em Campo Grande no ano de 2009. Em outros termos, a notória inexistência estatal nessas searas autorizou o progresso das mencionadas organizações criminosas. Os indivíduos esquecidos pelas políticas públicas governamentais vislumbraram na promessa da milícia uma solução para o horrível contexto social no qual estão inseridos. Desta feita, é absolutamente justificável a legitimação que esses grupos delituosos adquiriram. Cano (2008, p. sustenta que existe uma racionalidade econômica no contexto fático.

Ou seja, não apenas se valem dos mecanismos oportunizados pelo governo para a execução das tarefas que lhe são incumbidas, como se promovem e conquistam a confiança da comunidade local por intermédio deste ícone de representação estatal. Assim sendo, pode-se dizer que, embora sejam organizações de caráter ilícito, cumprem com a finalidade de fornecer a segurança pública melhor do que o próprio Estado. Insta elucidar, todavia, que não são incomuns os indivíduos civis que compõem a estrutura organizacional das milícias. Entretanto, as mais relevantes tarefas são executadas pelos indivíduos que, de certo modo, mantêm vínculo com os quadros de segurança pública estatal. Em suma, a maioria dos milicianos são membros ativos ou inativos do quadro de funcionários do estado, não raro afastados por desvio de conduta.

A determinação de um mandamento público passou a ser um dos mais relevantes obstáculos da modernidade, uma vez que o dia a dia da sociedade domiciliada no Rio de Janeiro apresenta um ceticismo considerável no que diz respeito às políticas estipuladas pelo Governo em relação à segurança pública. A referida inexistência de perspectiva se acentua paulatinamente. A violência alcançou índices altíssimos, que alarma a população, causando, assim, uma sensação coletiva de ausência de segurança. O temor é geral, tanto para os cidadãos, quanto para aqueles que integram os quadros das Polícias (GOULART, 2008). A afirmação acima tecida pode ser corroborada pela notícia de que policiais militares rejeitaram um pedido de recuperação de um carro roubado e encontrado em localidade próxima a um morro situado no bairro da Tijuca (GOULART, 2008).

Nessas regiões, o poder público entra apenas por meio da repressão, não há escolas, postos de saúde nem políticas sociais que absorvam a juventude. A lógica da Segurança Pública no Rio é a da ditadura, da busca de inimigos e a reafirmação da lógica de guerra, no sentido de derrotar o inimigo. É um cenário que enfraquece o poder público e faz com que a sua soberania seja absolutamente limitada (FREIXO, 2009). Logo, os fatos se constituem em apenas uma genuinidade. Os grupos milicianos agem nos locais onde o Estado não existe. Contudo, é necessário verificar que, diversamente do que defende o entendimento acima esposado, o direito à segurança pública é um mandamento consagrado pela Constituição Cidadã, razão pela qual deve receber máxima efetividade.

A teoria do contratualismo social legitima a gênese do Estado e explicita, em termos genéricos, que o cidadão renuncia a parcela de sua individualidade com o fito de que a tutela de sua integridade física e de seu patrimônio se conservasse no poder estatal. É manifesta e vergonhosa a omissão estatal no que tange ao combate à violência. Grupos violentos agiram nas searas mais carentes do Rio de Janeiro, procedendo à prática de diversos delitos em prejuízo da comunidade local. A alienação de serviços básicos intrínsecos à atividade do Estado viabilizou aos grupos milicianos rendimentos mensais milionários e explicitou o poder econômico que conquistaram em razão da inexistência estatal nas referidas localidades. de julho de 2009. Segundo Caderno. CALDEIRA, César.

Grupos paramilitares: do extermínio ao controle territorial. Insight Inteligência. Rio de Janeiro: 2008. p. Disponível em: < <http://www. global. org. br/alerj/consulta/materia. asp?mat=231485&cliente=alerj&>. Acesso em: 15 abr. G1. Polícia e ANP fazem operação contra venda ilegal de gás controlada pela milícia e tráfico no RJ. Caderno O Globo. Rio. LAZZARINI, Álvaro. Comunidade e Polícia. Temas de Direito Administrativo. MUNIZ, Jaqueline; PROENÇA, Domício. Relatório Final da CPI. p. Disponível em: <http://www. neppdh. br/relatorio_milicia. pdf>. Acesso em: 30 mar. PINHO, Pedro Paulo. Relatório Final CPI. Rio de Janeiro. de abril de 2009. Caderno O Globo. Rio. RAMALHO, Sérgio. p. RODRIGUES, Matheus; GRANDIN, Felipe. Polícia investiga parceria entre milicianos e traficantes na venda de drogas no Morro da Coreia, Zona Oeste do Rio.

G1. Disponível em: <https://g1. JORNAL O GLOBO. SILVA, Jaílson de Souza; FERNANDES, Fernando Lannes; BRAGA, Raquel Willadino. Segurança, Tráfico e Milícias no Rio de Janeiro. Grupos Criminosos Armados com Domínio de Território: Reflexões sobre a Territorialidade do Crime na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. p.

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