Você já ouviu falar no termo “etnocentrismo”? Pode até ser que você não tenha escutado a palavra, mas com certeza você já presenciou a aplicação do etnocentrismo na prática, seja vivenciando alguma situação, ou vendo alguma notícia sobre essa prática. A visão etnocêntrica, infelizmente, é muito comum, especialmente em um país tão grande e cheio de povos distintos como o Brasil. Neste conteúdo, você vai entender o que é etnocentrismo, saber o que significa o conceito, suas variações — etnocentrismo religioso e etnocentrismo cultural, e ver alguns exemplos de etnocentrismo no Brasil. Vamos lá?
Você vai encontrar aqui:
O que é o etnocentrismo?
O etnocentrismo, como o próprio nome já diz, é a prática de colocar a sua etnia no centro de tudo, partindo do pressuposto de que ela está em posição de superioridade em relação às demais. De acordo com o dicionário Priberam, o etnocentrismo é a “visão ou forma de pensamento de quem crê na supremacia do seu grupo étnico ou da sua nacionalidade”.
Para entender melhor o conceito de etnocentrismo, basta desmembramos o termo: temos etno, de "etnia", e centrismo, de "centro". Portanto, a visão etnocêntrica analisa e julga culturas, valores, religiões e outras vivências que não sejam a sua, tomando como base a sua própria cultura, costumes e vivências.
Isso gera uma visão enganosa de que as demais culturas e valores de povos que sejam diferentes do seu, estejam em uma posição inferior. Ainda que não representem a mesma coisa, o etnocentrismo está diretamente ligado a preconceitos como o racismo, a xenofobia e também a intolerância religiosa, como veremos a seguir. As consequências do etnocentrismo são sérias e podem afetar a vida das pessoas para sempre, gerando tristeza e segregação.
Quais são os tipos de etnocentrismo?
O etnocentrismo pode ocorrer de diversas maneiras e intensidades, desde demonstrações mais sutis, como o hábito de criticar a forma de uma pessoa de falar, até as mais absurdas, como o nazismo. A seguir, vamos falar sobre dois tipos que são bastante comuns:
Etnocentrismo religioso
O etnocentrismo religioso é a prática de acreditar que a sua religião tem superioridade em relação às outras, causando assim a intolerância religiosa.
O etnocêntrico religioso olha com preconceito para a maneira como as pessoas que têm crenças diferentes das dele acreditam e vivenciam a sua fé. Muitas vezes, ele chega a acreditar que essas práticas são incorretas, e que essas pessoas deveriam praticar hábitos espirituais como os dele.
Podemos tomar como exemplo a disseminação do Cristianismo, que foi amplamente difundido nas Américas a partir da colonização dos Europeus. Os índios no Brasil, por exemplo, sofreram fortemente com a catequização instaurada por parte dos Portugueses, que acreditavam piamente que as crenças e costumes dos índios eram inferiores.
José Maria de Paiva, em seu artigo “Transmitindo Cultura: a catequização dos índios do Brasil” explica:
A catequese serviu de instrumento para a imposição dos usos e costumes portugueses. O índio, em todos os sentidos, sofreu a ação: teve voz passiva porque as forças adversas eram incomparavelmente maiores. Ele sabia, na carne, que costumes novos eram destruição de sua tradição. Se cedeu, não foi porque quis: foi por impotência.
Etnocentrismo cultural
O etnocentrismo cultural, como o próprio nome diz, é a prática de acreditar que os seus costumes, sua cultura, são superiores aos dos povos que estão distantes de você, tomando como base a própria cultura.
Etnocentrismo e xenofobia
Ele está diretamente relacionado à xenofobia, ou seja, à crença de que povos que sejam estrangeiros em relação ao etnocêntrico são “inferiores”. Essa é a relação entre etnocentrismo e xenofobia, ou seja, a existência de preconceitos com costumes que fazem parte da cultura de um povo, como a forma de vestir e de falar (sotaque), a alimentação, a cultura musical, entre outros.
Quais são exemplos comuns de etnocentrismo no Brasil?
No Brasil, um país tão rico em diversidade cultural, infelizmente ainda existem, nos dias de hoje, muitas demonstrações de etnocentrismo. No âmbito cultural, podemos citar como exemplo a crença de que as regiões do sul e do sudeste sejam mais desenvolvidas do que as regiões do norte e nordeste, assim como o preconceito que a população nordestina vivencia em torno do seu sotaque.
Além disso, ainda nos dias de hoje, os índios também sofrem muito com o ponto de vista de sociedades que ainda acreditam que eles sejam grupos sociais atrasados e subdesenvolvidos, simplesmente por terem hábitos e culturas diferentes.
Do ponto de vista da religião, o etnocentrismo também é muito comum. Por ser um país grande e muito diverso, o Brasil tem quatro matrizes religiosas que são bastante comuns: indígena, ocidental, oriental e africana. Nesse sentido, algumas dessas matrizes, em especial a africana, com religiões como a Umbanda e o Candomblé, sofrem as consequências de um forte preconceito, sendo, muitas vezes, relacionadas até mesmo a cultos demoníacos.
Qual a relação entre o etnocentrismo e o relativismo cultural?
No século XIX, com as divisões das regiões da Ásia, África e Oceania entre as grandes potências capitalistas da Europa, a antropologia — ciência que estuda o homem — foi criada.
No âmbito da questão racial, Herbert Spencer, geógrafo e antropólogo da Inglaterra, desenvolveu teorias de antropologia baseadas em uma visão de mundo racista de que existiriam diferentes “raças” e que, a partir de aspectos biológicos, determinadas raças teriam superioridade em relação a outras, sendo a “raça branca” a mais evoluída, e a “raça negra”, a menos evoluída, constituindo o racismo.
Aos poucos, na antropologia, foi surgindo a divisão da nação por “etnias”, ou seja, o conjunto de questões socioculturais, dando origem ao etnocentrismo.
Ao final do século XIX, o geógrafo e antropólogo alemão Franz Boas, começou a questionar a visão etnocêntrica após estudar e vivenciar culturas alheias às dele, aprendendo e mudando a sua visão de mundo sobre o outro, o diferente. Depois dele, outros grandes cientistas, assim como Bronislaw Malinowski, da Polônia, e também Claude Lévi-Strauss, da Bélgica, passaram a fazer trabalho de campo e confrontar, cada vez, mais a teoria do darwinismo social no mundo, elevando a antropologia.
A partir de então, em contrapartida à visão etnocêntrica, surgiu e ganhou força o relativismo cultural, que se baseia no princípio da pluralidade e da diversidade, reforçando que as diferentes culturas precisam ser igualmente respeitadas.
O relativismo cultural não deve ser usado para justificar atrocidades
Vale dizer, no entanto, que o relativismo cultural é um visão que respeita às culturas de diferentes sociedades, mas que não deve ser usada para se justificar atrocidades que ferem os direitos humanos. Ou seja, a cultura e os valores dos povos devem ser respeitados, mas não mantidos a todo custo.
Podemos tomar como exemplo aqui a mutilação genital feminina, que ocorre em especial em países da África e do Oriente Médio e, apesar de fazer parte da cultura, é um costume entre os mais crueis do mundo, e que traz problemas gravíssimos, tanto físicos como psicológico para as mulheres ao longo da vida, e que é feita com a ideia de tornar as mulheres “puras”, como conta a queniana e hoje ativista antimutilação, Bishara Sheikh Hamo, da comunidade Borana:
"Fui submetida à mutilação quando tinha 11 anos. Minha avó me disse que era uma exigência para todas as meninas, que nos tornaria puras."
Hoje, a ONU (Organização das Nações Unidas) condena fortemente essa prática, tendo inclusivo definido a data de 6 de fevereiro como o Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, para que o mundo todo de volte para a conscientização contra essa atitude.
Etnocentrismo e alteridade
O fenômeno do etnocentrismo e outras formas de preconceito, infelizmente, ainda são muito presentes em nossa sociedade. Por isso, é importante entender o conceito de alteridade, ou seja, ter consciência sobre aquilo que é do outro, e acima de tudo, respeitar.
Buscar sempre se informar através de conteúdos sobre o assunto, e levar essa relação entre etnocentrismo e alteridade, ou seja, entender e ajudar outras pessoas a entenderem e respeitarem o que é do outro, é uma das maneiras de lutar contra o etnocentrismo e ajudar a evitar que uma cultura seja rejeitada, julgada e desvalorizada pelo simples fato de ser diferente.
As consequências do etnocentrismo são graves e podem afetar a vida das pessoas para sempre. Você já presenciou algo assim no seu dia a dia? Escreva nos comentários!
Quais as perguntas mais frequentes sobre o etnocentrismo?
Como ocorre o etnocentrismo?
O etnocentrismo ocorre na história desde sempre, e é formado pela perspectiva de unilateralidade, ou seja, a visão e avaliação do outro baseado apenas em um ponto de partida. E esse ponto de partida são os padrões vividos pelo próprio observador, ou seja pelo próprio etnocêntrico. Ele ocorre na sociedade desde situaçõe mais graves, como o nazismo e a catequização dos índios, que mencionamos neste post, como também em atitudes que parecem ser normais no dia a dia, mas que são completamente equivocadas, como achar que o sotaque de determinado povo é errado ou feio, ou que uma religião é mais certa do que a outra.
Quais são as formas do etnocentrismo?
Existem várias formas de etnocentrismo, como mencionamos ao longo deste conteúdo. As mais comuns são:
- Etnocentrismo religioso. Acredita que as religiões distintas sejam inferiores ou erradas perante a religião da pessoa etnocêntrica.
- Etnocentrismo cultural. O etnocentrismo cultural e a xenofobia estão diretamente relacionados, uma vez que a dificuldade de entender outras culturas faz com o que os seres humanos olhem com preconceito para o outro.
- Etnocentrismo linguístico. Pode ser incluído dentro do etnocentrismo cultural, mas o preconceito linguístico é tão comum, especialmente no Brasil, que merece destaque. Trata-se de acreditar que sotaques diferentes dos seus são “feios” ou errados. Esse preconceito é muito vivenciado pelos mineiros, nordestinos, e também por quem vive no Rio de Janeiro e São Paulo, entre outros.
Como podemos perceber o etnocentrismo em nosso dia a dia?
Para lutar contra o etnocentrismo é identificá-lo. Hábitos como os mencionados ao longo do conteúdo, como julgar a religião alheia com errada, criticar o sotaque de uma pessoa de outro estado ou região são visões etnocêntricas e devem ser combatidas. Fique atento à forma como você e as pessoas ao seu redor julgam outras culturas, o desconhecido. Sempre que notar alguma atitude etnocêntrica, busque a conscientização.
Qual a diferença entre etnocentrismo e relativismo cultural?
O relativismo cultural pode ser entendido como o oposto do significado de etnocentrismo. Enquanto este último analisa e julga o outro baseado nos seus próprios hábitos e ideias, o relativismo aponta que existem diferentes sociedades e etnias, e que todas elas devem ser respeitadas. O relativismo cultural, no entanto, não deve ser usado para proteger práticas que ferem os direitos humanos, ainda que isso seja defendido como cultura.
Qual a diferença conceitual entre racismo e etnocentrismo?
A diferença do etnocentrismo e racismo é sutil, e esses dois termos estão muito ligados. Enquanto o racismo segrega a nação a partir da suposição da existência de diferentes raças, a visão etnocêntrica faz essa segregação de modo a baseá-la nas etnias. Um exemplo que podemos citar sobre o etnocentrismo radical atrelado ao racismo foi o nazismo de Hitler, na Alemanha, que pregava que a raça ariana era superior às demais, causando não só a discrimição, como o extermínio de maneira cruel de diversos povos distintos, mas principalmente judeus.
Autora do Studybay
Meu nome é Juliana, sou Bacharel em Filosofia pela IFCH e pós-graduada em Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp. Tenho experiência grande com artigos, trabalhos acadêmicos, resumos e redações com garantia antiplágio.