O que é etnocentrismo religioso e cultural: exemplos atuais no Brasil

Publicado em 27.03.2024 por Juliana N. Tempo de leitura: 10 minutos

Você já ouviu falar no termo “etnocentrismo”? Pode até ser que você não tenha escutado a palavra, mas com certeza você já presenciou a aplicação do etnocentrismo na prática, seja vivenciando alguma situação, ou vendo alguma notícia sobre essa prática. A visão etnocêntrica, infelizmente, é muito comum, especialmente em um país tão grande e cheio de povos distintos como o Brasil. Neste conteúdo, você vai entender o que é etnocentrismo, saber o que significa o conceito, suas variações — etnocentrismo religioso e etnocentrismo cultural, e ver alguns exemplos de etnocentrismo no Brasil. Vamos lá?

O que é o etnocentrismo?

O etnocentrismo, como o próprio nome já diz, é a prática de colocar a sua etnia no centro de tudo, partindo do pressuposto de que ela está em posição de superioridade em relação às demais. De acordo com o dicionário Priberam, o etnocentrismo é a “visão ou forma de pensamento de quem crê na supremacia do seu grupo étnico ou da sua nacionalidade”.

Para entender melhor o conceito de etnocentrismo, basta desmembramos o termo: temos etno, de "etnia", e centrismo, de "centro". Portanto, a visão etnocêntrica analisa e julga culturas, valores, religiões e outras vivências que não sejam a sua, tomando como base a sua própria cultura, costumes e vivências.

Isso gera uma visão enganosa de que as demais culturas e valores de povos que sejam diferentes do seu, estejam em uma posição inferior. Ainda que não representem a mesma coisa, o etnocentrismo está diretamente ligado a preconceitos como o racismo, a xenofobia e também a intolerância religiosa, como veremos a seguir. As consequências do etnocentrismo são sérias e podem afetar a vida das pessoas para sempre, gerando tristeza e segregação.

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Quais são os tipos de etnocentrismo?

O etnocentrismo pode ocorrer de diversas maneiras e intensidades, desde demonstrações mais sutis, como o hábito de criticar a forma de uma pessoa de falar, até as mais absurdas, como o nazismo. A seguir, vamos falar sobre dois tipos que são bastante comuns:

Etnocentrismo religioso

Etnocentrismo religioso

Foto: unsplash.com

O etnocentrismo religioso é a prática de acreditar que a sua religião tem superioridade em relação às outras, causando assim a intolerância religiosa.

O etnocêntrico religioso olha com preconceito para a maneira como as pessoas que têm crenças diferentes das dele acreditam e vivenciam a sua fé. Muitas vezes, ele chega a acreditar que essas práticas são incorretas, e que essas pessoas deveriam praticar hábitos espirituais como os dele.

Podemos tomar como exemplo a disseminação do Cristianismo, que foi amplamente difundido nas Américas a partir da colonização dos Europeus. Os índios no Brasil, por exemplo, sofreram fortemente com a catequização instaurada por parte dos Portugueses, que acreditavam piamente que as crenças e costumes dos índios eram inferiores.

José Maria de Paiva, em seu artigo “Transmitindo Cultura: a catequização dos índios do Brasil” explica:

A catequese serviu de instrumento para a imposição dos usos e costumes portugueses. O índio, em todos os sentidos, sofreu a ação: teve voz passiva porque as forças adversas eram incomparavelmente maiores. Ele sabia, na carne, que costumes novos eram destruição de sua tradição. Se cedeu, não foi porque quis: foi por impotência.

Etnocentrismo cultural

O etnocentrismo cultural, como o próprio nome diz, é a prática de acreditar que os seus costumes, sua cultura, são superiores aos dos povos que estão distantes de você, tomando como base a própria cultura.

Etnocentrismo cultural

Foto: unsplash.com

Etnocentrismo e xenofobia

Ele está diretamente relacionado à xenofobia, ou seja, à crença de que povos que sejam estrangeiros em relação ao etnocêntrico são “inferiores”. Essa é a relação entre etnocentrismo e xenofobia, ou seja, a existência de preconceitos com costumes que fazem parte da cultura de um povo, como a forma de vestir e de falar (sotaque), a alimentação, a cultura musical, entre outros.

Quais são exemplos comuns de etnocentrismo no Brasil?

Quais são exemplos comuns de etnocentrismo no Brasil

Foto: unsplash.com

No Brasil, um país tão rico em diversidade cultural, infelizmente ainda existem, nos dias de hoje, muitas demonstrações de etnocentrismo. No âmbito cultural, podemos citar como exemplo a crença de que as regiões do sul e do sudeste sejam mais desenvolvidas do que as regiões do norte e nordeste, assim como o preconceito que a população nordestina vivencia em torno do seu sotaque.

Além disso, ainda nos dias de hoje, os índios também sofrem muito com o ponto de vista de sociedades que ainda acreditam que eles sejam grupos sociais atrasados e subdesenvolvidos, simplesmente por terem hábitos e culturas diferentes.

Do ponto de vista da religião, o etnocentrismo também é muito comum. Por ser um país grande e muito diverso, o Brasil tem quatro matrizes religiosas que são bastante comuns: indígena, ocidental, oriental e africana. Nesse sentido, algumas dessas matrizes, em especial a africana, com religiões como a Umbanda e o Candomblé, sofrem as consequências de um forte preconceito, sendo, muitas vezes, relacionadas até mesmo a cultos demoníacos.

Qual a relação entre o etnocentrismo e o relativismo cultural?

No século XIX, com as divisões das regiões da Ásia, África e Oceania entre as grandes potências capitalistas da Europa, a antropologia — ciência que estuda o homem — foi criada.

No âmbito da questão racial, Herbert Spencer, geógrafo e antropólogo da Inglaterra, desenvolveu teorias de antropologia baseadas em uma visão de mundo racista de que existiriam diferentes “raças” e que, a partir de aspectos biológicos, determinadas raças teriam superioridade em relação a outras, sendo a “raça branca” a mais evoluída, e a “raça negra”, a menos evoluída, constituindo o racismo.

Aos poucos, na antropologia, foi surgindo a divisão da nação por “etnias”, ou seja, o conjunto de questões socioculturais, dando origem ao etnocentrismo.

Ao final do século XIX, o geógrafo e antropólogo alemão Franz Boas, começou a questionar a visão etnocêntrica após estudar e vivenciar culturas alheias às dele, aprendendo e mudando a sua visão de mundo sobre o outro, o diferente. Depois dele, outros grandes cientistas, assim como Bronislaw Malinowski, da Polônia, e também Claude Lévi-Strauss, da Bélgica, passaram a fazer trabalho de campo e confrontar, cada vez, mais a teoria do darwinismo social no mundo, elevando a antropologia.

Qual a relação entre o etnocentrismo e o relativismo cultural

Foto: unsplash.com

A partir de então, em contrapartida à visão etnocêntrica, surgiu e ganhou força o relativismo cultural, que se baseia no princípio da pluralidade e da diversidade, reforçando que as diferentes culturas precisam ser igualmente respeitadas.

O relativismo cultural não deve ser usado para justificar atrocidades

Vale dizer, no entanto, que o relativismo cultural é um visão que respeita às culturas de diferentes sociedades, mas que não deve ser usada para se justificar atrocidades que ferem os direitos humanos. Ou seja, a cultura e os valores dos povos devem ser respeitados, mas não mantidos a todo custo.

Podemos tomar como exemplo aqui a mutilação genital feminina, que ocorre em especial em países da África e do Oriente Médio e, apesar de fazer parte da cultura, é um costume entre os mais crueis do mundo, e que traz problemas gravíssimos, tanto físicos como psicológico para as mulheres ao longo da vida, e que é feita com a ideia de tornar as mulheres “puras”, como conta a queniana e hoje ativista antimutilação, Bishara Sheikh Hamo, da comunidade Borana:

"Fui submetida à mutilação quando tinha 11 anos. Minha avó me disse que era uma exigência para todas as meninas, que nos tornaria puras."

O relativismo cultural não deve ser usado para justificar atrocidades

Foto: unsplash.com

Hoje, a ONU (Organização das Nações Unidas) condena fortemente essa prática, tendo inclusivo definido a data de 6 de fevereiro como o Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, para que o mundo todo de volte para a conscientização contra essa atitude.

Etnocentrismo e alteridade

O fenômeno do etnocentrismo e outras formas de preconceito, infelizmente, ainda são muito presentes em nossa sociedade. Por isso, é importante entender o conceito de alteridade, ou seja, ter consciência sobre aquilo que é do outro, e acima de tudo, respeitar.

Buscar sempre se informar através de conteúdos sobre o assunto, e levar essa relação entre etnocentrismo e alteridade, ou seja, entender e ajudar outras pessoas a entenderem e respeitarem o que é do outro, é uma das maneiras de lutar contra o etnocentrismo e ajudar a evitar que uma cultura seja rejeitada, julgada e desvalorizada pelo simples fato de ser diferente.

As consequências do etnocentrismo são graves e podem afetar a vida das pessoas para sempre. Você já presenciou algo assim no seu dia a dia? Escreva nos comentários!

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Quais as perguntas mais frequentes sobre o etnocentrismo?

Como ocorre o etnocentrismo?

O etnocentrismo ocorre na história desde sempre, e é formado pela perspectiva de unilateralidade, ou seja, a visão e avaliação do outro baseado apenas em um ponto de partida. E esse ponto de partida são os padrões vividos pelo próprio observador, ou seja pelo próprio etnocêntrico. Ele ocorre na sociedade desde situaçõe mais graves, como o nazismo e a catequização dos índios, que mencionamos neste post, como também em atitudes que parecem ser normais no dia a dia, mas que são completamente equivocadas, como achar que o sotaque de determinado povo é errado ou feio, ou que uma religião é mais certa do que a outra.

Quais são as formas do etnocentrismo?

Existem várias formas de etnocentrismo, como mencionamos ao longo deste conteúdo. As mais comuns são:
  • Etnocentrismo religioso. Acredita que as religiões distintas sejam inferiores ou erradas perante a religião da pessoa etnocêntrica.
  • Etnocentrismo cultural. O etnocentrismo cultural e a xenofobia estão diretamente relacionados, uma vez que a dificuldade de entender outras culturas faz com o que os seres humanos olhem com preconceito para o outro.
  • Etnocentrismo linguístico. Pode ser incluído dentro do etnocentrismo cultural, mas o preconceito linguístico é tão comum, especialmente no Brasil, que merece destaque. Trata-se de acreditar que sotaques diferentes dos seus são “feios” ou errados. Esse preconceito é muito vivenciado pelos mineiros, nordestinos, e também por quem vive no Rio de Janeiro e São Paulo, entre outros.

Como podemos perceber o etnocentrismo em nosso dia a dia?

Para lutar contra o etnocentrismo é identificá-lo. Hábitos como os mencionados ao longo do conteúdo, como julgar a religião alheia com errada, criticar o sotaque de uma pessoa de outro estado ou região são visões etnocêntricas e devem ser combatidas. Fique atento à forma como você e as pessoas ao seu redor julgam outras culturas, o desconhecido. Sempre que notar alguma atitude etnocêntrica, busque a conscientização.

Qual a diferença entre etnocentrismo e relativismo cultural?

O relativismo cultural pode ser entendido como o oposto do significado de etnocentrismo. Enquanto este último analisa e julga o outro baseado nos seus próprios hábitos e ideias, o relativismo aponta que existem diferentes sociedades e etnias, e que todas elas devem ser respeitadas. O relativismo cultural, no entanto, não deve ser usado para proteger práticas que ferem os direitos humanos, ainda que isso seja defendido como cultura.

Qual a diferença conceitual entre racismo e etnocentrismo?

A diferença do etnocentrismo e racismo é sutil, e esses dois termos estão muito ligados. Enquanto o racismo segrega a nação a partir da suposição da existência de diferentes raças, a visão etnocêntrica faz essa segregação de modo a baseá-la nas etnias. Um exemplo que podemos citar sobre o etnocentrismo radical atrelado ao racismo foi o nazismo de Hitler, na Alemanha, que pregava que a raça ariana era superior às demais, causando não só a discrimição, como o extermínio de maneira cruel de diversos povos distintos, mas principalmente judeus.

 

Juliana N

Autora do Studybay

Meu nome é Juliana, sou Bacharel em Filosofia pela IFCH e pós-graduada em Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp. Tenho experiência grande com artigos, trabalhos acadêmicos, resumos e redações com garantia antiplágio.