Tendências gerais da Filosofia na segunda metade do século XIX Antero de Quental
Ou, como escreveu o estudioso português Leonel Ribeiro dos Santos: "Antero decide-se pela oportunidade de oferecer, sob pretexto de traçar um quadro do desenvolvimento do espírito filosófico no seu século, uma síntese orgânica dos problemas e motivos fundamentais que determinaram a sua própria evolução intelectual”. Antero, em seu ensaio, traça um panorama da evolução da filosofia sob a sua ótica e vivência. Define a filosofia e faz paralelos relacionando-a com a Ciência e seu desenvolvimento através do tempo. Compara o pensamento antigo e o moderno. Avança em áreas como a Psicologia a qual define como a ciência da ama e se debruça, em especial, na Psicologia escocesa e seu resgate do espiritualismo. É preciso considerar essas diferenças nos períodos para entender que os diferentes sistemas se complementam, mesmo que não saibam.
E, a Teoria Geral do Universo: seria possível uma síntese que se fizesse entender os sistemas isolados em um complemento? Não é o que se tem visto no decorrer do tempo, no entanto, acredita o autor, que o fato de não ter ainda ocorrido tal convergência, ela tem produzido uma espécie de penetração recíproca das diversas doutrinas, de aproximação dos diferentes pontos de vista, um ecletismo ou um sincretismo, mais ou menos sistemático. Antero comenta algumas vezes no texto sobre uma disputa em “intermináveis” discussões, que nada interessa às “multidões não filosofantes” que se interessam por questões mais práticas que metafísicas, talvez. E, o que dizer da civilização antiga que em alguns momentos os mais diferentes pensamentos se uniram em vista de algo comum baseado num racionalismo idealista, culminando num sistema de vida moral dos Arias, por exemplo.
E, outro momento, foi no fim da Idade Média quando São Tomás de Aquino juntou três séculos de meditações na chamada Escolástica organizando-a em sua Summa: “senão uma síntese, pelo menos uma redução a uma unidade sistemática das tendências das várias correntes do espírito medieval, mais ou menos confundidas ou harmonizadas no seu sábio ecletismo”. O século XVI, na visão de Antero é o alvorecer da Renascença, quando haverá o despontar de ciências como a astronomia e a física com grande contribuição para o pensamento moderno. A Renascença afirma Antero, “foi simplesmente a profetiza do espírito novo”. E, a filosofia ocupa papel e espaço importantes unindo e desentranhando os sistemas que eram como um fator, enquanto os filósofos, simples obreiros desta tarefa.
Por fim, o século XVII, onde enumera pensadores como: Descartes, Leibntz, Espinoza e Galileu. O triunfo das ideias de Copérnico deram a compreensão dos primeiros princípios da matéria e, só então, a Filosofia Moderna começa a tomar consistência em suas formulações. Antero adverte que é preciso distinguir no pensamento de Kant os seus propósitos, o que julgava fazer e provar e o que realmente fez e provou. E, o que realmente saiu do Kantismo é o realismo transcendental, bem compreendido por Schelling e Hegel, saídos de Kant, como Sócrates de Platão. Assim, repetiu o naturalismo e panteísmo antigos numa nova roupagem que é o novo idealismo, implicitamente contido na Crítica da Razão Pura, principal obra de Kant. Entende Antero que a nova filosofia está fundada na identidade do ser e do saber, na deia de força, de imanência e de desenvolvimento.
É na região das ideias que Schelling e Hegel fundam a doutrina da evolução que domina todo o pensamento moderno. As ideias metafísicas dominam e penetram a história, não a fazem. Na ordem dos fatos, não se pode construir apriori o que não se conheça já a posteriori. Sem direção metafísica não poderá nunca haver verdadeira e superior compreensão da história: mas, com tudo isso, os historiadores continuarão a procurar o encadeamento e a lei real dos fatos no estudo crítico dos mesmos fatos e, deixarão sempre, uma larga margem àquele fator (necessário, sem dúvida, como tudo, mas de uma necessidade que escapa à razão, embora provavelmente não esteja fora da razão), a que chamarão cada um, conforme a cambiante filosófica do seu pensamento: providência, acaso, liberdade, ou simplesmente o desconhecido".
Sobre a Psicologia, de forma especial, a escocesa, Antero pondera: "Ora, se o sentimento moral não é a filosofia nem se pode substituir à filosofia, é muito certo também que filosofia alguma, que o sentimento moral reprove, poderá prevalecer contra ele". Pois também esta que chama ciência da alma, ia contra o dogmatismo alemão. A alma considerada substância sui generis, um ser espiritual oposto a um se material são questionados. O Kantismo mostra-se sensível ao processo de dissolução do velho espiritualismo. A única realidade é a consciência, resultado líquido da evolução da psicologia e do criticismo. No entanto, Antero entende que a qualidade mais forte do Espiritualismo não cai, mas sofre uma crise profunda, saindo dela mais forte. Há embates interessantes como: ceticismo diante da nova doutrina espiritualista; materialismo ante o testemunho da consciência.
Temos aí a lembrança de Kant, com Fichte, Schelling e Hegel que assim ‘traduziram’: “o que se poderia chamar a demonstração imediata e intuitiva da identidade do ser e do saber, contida no mesmo ato do pensamento, e é quanto basta”. Estaria aqui, pergunta o autor, voltando ao idealismo transcendental e ao método de construção da filosofia alemã? Ao que responde que não. Não acredita no poder de sedução do apriorismo sobre o pensamento moderno. Nesse espiritualismo renovado e no neo-kantismo, procedem justamente da reação do criticismo que o condenou. Trata-se, em primeiro lugar, de um processo indutivo. Aqui uma afirmação que nos faze pensar: “se Deus fosse possível, seria esse ser absolutamente livre. Mas por isso, que não é real, é que é verdadeiro”, esse eu do nosso eu mais profundo, é o centro de atração de toda a vida espiritual: é na união com ele que nos sentimos livres.
E, não é descoberto pelo mundo, mas é a consciência que o revela e é a razão o seu intérprete soberano. “Só pela razão somos verdadeiramente”. Antero pondera que na liberdade descobrimos a causa final de tudo: “assim se dissipa, à luz do espírito, a grande ilusão do mecanicismo, para além disso, está a própria vida dos seres. Teria então, pergunta a autora, nos dado Antero uma síntese do pensamento moderno? A que o autor responde: “essa síntese das ideias modernas se acha por hora apenas indicada nas tendências do pensamento contemporâneo”. Para ele, cada ponto de vista traz a sua parcela de verdade: tanto o positivismo quanto o idealismo alemão ou o espiritualismo. Mas, cada filosofia particular não tem a possibilidade de se constituir como detentora da verdade, mas cada uma, enquanto forma particular e concreta, é um esclarecimento sobre a verdade.
Mas se assim é, então a verdade desvenda-se na multiplicidade dos pontos de vista. Para Antero de Quental, este desvendamento, tendo em atenção a sua preocupação filosófica central, seria de ordem moral”.
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