Microbiota intestinal e Obesidade
Tipo de documento:Redação
Área de estudo:Administração
O presente trabalho tem como objetivo a produção de um material atual e acessível à comunidade acadêmica brasileira na forma de revisão bibliográfica, a respeito da relação entre a Microbiota Intestinal e a Obesidade. Para isso, foi realizada a presente revisão bibliográfica a partir da busca ativa de artigos nas bases de dados selecionadas. A principal limitação no estudo da microbiota intestinal é a dificuldade devido à heterogeneidade das interações, considerando a enorme quantidade de espécies que vivem neste habitat e suas relações com organismo humano. Palavras-chave: Disbioses. Microbiota Intestinal. INTRODUÇÃO A obesidade é uma doença crônica multifatorial na qual está presente o acúmulo de gordura corporal em excesso. Esse excesso é responsável por ocasionar prejuízos à saúde dos indivíduos, uma vez que a obesidade está relacionada a diversas comorbidades como diabetes, cirrose, hipertensão e outras doenças cardiovasculares, transtornos mentais, síndrome metabólica e disbioses 1,21–3.
A obesidade é uma doença multifatorial, estando relacionada a um estilo de vida inadequado, grande ingestão calórica, sedentarismo, mecanismos neuronais e hormonais, bem como fatores genéticos e epigenéticos 4. O intestino, principal órgão responsável pela absorção de nutrientes provenientes da dieta, apresenta cerca de 10% de todos os neurônios presentes no corpo humano e, devido a isso, sofre grande influência cerebral e pode influenciar mecanismos e processos cerebrais os quais não estão completamente elucidados 3,5,6. Um dos componentes que controlam a ingestão alimentar e a composição corporal é o sistema neuroendócrino, coordenado pelo “eixo intestino-cérebro”, transmite informações do tratogastrointestinal para os centros hipotalâmicos e para o tronco cerebral através da extensa rede de inervações presentes no intestino e dos hormônios intestinais 6.
Existe uma grande variação no número de bactérias no trato digestório. De maneira geral, ela é relativamente baixa no estômago, devido ao baixíssimo pH proporcionado pelo suco gástrico e, conforme caminhamos para o intestino delgado e grosso, a tendência é que este número aumente 14. No intestino grosso ocorre a absorção de água dos resíduos indigeríveis do quimo líquido e sua conversão em fezes sólidas e é nesta porção intestinal, especialmente no cólon, que existe o maior número de bactérias, devido seu conteúdo e pH (Figura 2) 4,14. Uma das principais limitações no estudo da microbiota intestinal é a dificuldade devido à heterogeneidade das interações, considerando a enorme quantidade de espécies que vivem neste habitat e suas relações com organismo humano 15.
COMPOSIÇÃO DA MICROBIOTA INTESTINAL E SEU DESENVOLVIMENTO De acordo com o conceito hologenômico, o desenvolvimento da microbiota simbiótica presente nos humanos está diretamente relacionada à seu processo evolutivo, uma vez que as variações e peculiaridades desta associação tem modulado diveras funções e limitações em nossa fisiologia e homeostase 7. Idosos apresentam maiores variações em sua composição do que adultos 11. Dois dos principais filos de bactérias as quais constituem a microbiota intestinal normal de mamíferos são Bacteroidetes e Firmicutes, mas também estão presentes representantes dos filos Actinobacteria, Proteobacteria e Verrucomicrobia, em menores concentrações 4. Firmicutes representam até 64% da microbiota intestinal, ao passo que Bacteroidetes 23%, as bactérias do gênero Proteobacteria representam cerca de 8% e Actinobacteria 3%. Pouco mais de 1% é composto com diferentes grupos como Methanobrevibacter smithii, Deferribacteres, Fusobacteria, Melainabacteria, Spirochaetes e Verrucomicrobia 11.
Dietas ricas em gordura animal provocam aumentos no número de bactérias do filo Bacteroidetes. A função protetiva da microbiota intestinal é de extrema relevância, uma vez que permite ou barra a entrada de nutrientes e microrganismos para nosso próprio corpo, potencializando mecanismos de defesa contra patógenos e aumentando a imunidade intestinal 6. Outra função desempenhada pela microbiota intestinal é a de imunidade, uma vez que estão relacionadas a diversos papéis na saúde digestiva eu influenciam ou dependem do sistema imunológico humano. Alguns autores defendem a ideia que a microbiota direciona o sistema imunológico a aprender a prevenir infecções patogênicas e se estende à outros órgãos 23. Tais funções de proteção e imunidade são de extrema importância, o que fica evidente quando analisamos trabalhos que envolvem a colonização microbiológica de animais germ-free.
Tais animais, desenvolvidos com o intuito de verificar as funções da microbiota, de maneira geral apresentam irregularidades no processo de crescimento, além de um sistema imune extremamente susceptível à infecções 7. Esse crescente número de obesos é um desafio para a saúde pública, uma vez que a obesidade está relacionada a uma série de comorbidades como Diabetes tipo 2, hipertensão, cirrose, Síndrome Metabólica, disbioses e até transtornos mentais 3,4. O tratamento da Obesidade geralmente inclui tratamentos clínicos, dietéticos, psicoterapia, prática de atividade física e, eventualmente, tratamento cirúrgico 28 O tratamento medicamentoso tenta facilitar o processo de mudança de hábitos vindos com a mudança dietética e de prática de atividade física, não atuando como estrutura fundamental do processo, mas sim como um auxílio na abordagem terapêutica 28,29.
Em geral, o tratamento medicamentoso da obesidade inclui 3 principais tipos de medicamentos: (i) os diminuidores da sensação de fome ou modificadores de saciedade; (ii) os redutores da digestão e absorção de nutrientes e (iii) medicamentos que aumentam o gasto energético, como os termogênicos, cujo uso não é recomendado 2,28,29. Os medicamentos do primeiro grupo atuam no aumento da disponibilidade de neurotransmissores como catecolaminas, como por exemplo a anfepramona e mazindol. Alguns são derivados de anfetaminas 29 e estão relacionados com altos riscos de abuso e efeitos colaterais como euforia, insônia e constipação intestinal e, por isso, geralmente são utilizados em tratamentos de curto prazo 28. Uma população bacteriana 23% menos diversa foi encontrada na microbiota fecal de pacientes obesos 30. Adicionalmente, nos indivíduos cujas amostras se apresentavam mais abundantes e com maior diversidade, foram encontradas quantidades significativamente maiores de bactérias relacionadas a processos antiinflamatórios como Faecalibacterium prausnitzii e Akkermansia muciniphila 30.
Fredrik e colaboradores realizaram a transferência da microbiota fecal de camundongos obesos para camundongos germ-free (GF) e observaram um aumento de 60% em sua gordura corporal, bem como um aumento da resistência a insulina de 29% 31 Resultados semelhantes foram encontrados no trabalho de Tremaroli e colaboradores mostrou que camundongos germ-free (GF) acumularam gordura corporal e desenvolveram distúrbios metabólicos associados com obesidade após terem recebido a microbiota fecal de mulheres obesas, o que sugere que este tipo de disbiose pode causar alteração no fenótipo metabólico 32. No trabalho de Aron e colaboradores, foram encontradas evidências que a microbiota intestinal de animais obesos é mais eficiente do que a de animais não obesos em extraírem energia dos alimentos ingeridos o que, consequentemente, conduz a um aumento do armazenamento de gordura corporal 13.
Em outros trabalhos foram encontrados dados que não condizem com essa afirmação ou, ainda, considerados inconclusivos. Adicionalmente, os AGCC são capazes de suprimir o Fator Adipocitário induzido por jejum (FIAF) (Fasting induced adipocyte fator), responsável por inibir a Lipase lipoproteica (LPL), o que induz a acumulação de triglicerídeos nos adipócitos 36. Papel da Adesonina Monofosfato Quinase (AMPk) Uma segunda hipótese propõem que um mecanismo possível seria a capacidade dos microrganismos considerados obesogênicos diminuírem a oxidação de ácidos graxos hepáticos através da supressão da atividade catalítica da enzima Adenosina monofosfato quinase (AMPk), que atua como indicador de energia. Sua supressão resultaria na diminuição da oxidação de ácidos graxos e, consequentemente, na acumulação de gordura 37.
Desencadeamento de processos inflamatórios sistêmicos O desencadeamento de um processo inflamatório sistêmico também poderia explicar a relação entre a microbiota intestinal e o desenvolvimento da obesidade, segundo uma terceira hipótese. Segundo ela, Lipopolissacarídeos (LPS) presentes na membrana celular de bactérias Gram-negativas da microbiota se ligariam a receptores responsáveis pelo aumento da resposta e da duração do processo inflamatório, com os repectores do tipo TLR-4 (“Toll-like receptors-4”) 38. Inversamente, portanto, uma diminuição do triptofano estará relacionada a níveis mais baixos de serotonina cerebral 11. A serotonina é responsável pela regulação hipotalâmica do consumo energético. Portanto, a microbiota intestinal pode influenciar esta a sinalização cerebral e estar relacionada ao processo de obesidade, onde há uma diminuição no consumo energético global 11.
TRATAMENTOS 4. USO DE PREBIÓTICOS E PROBIÓTICOS A modulação da microbiota intestinal através do uso de prebióticos e probióticos tem sido uma estratégia possível no tratamento da obesidade. Os obesos receberam pela técnica de TMF a microbiota dos camundongos não obesos e como resultado tiveram a transferência do fenótipo da microbiota 42. Embora os resultados sejam promissores, a utilização da técnica de TMF precisa ser analisada mais aprofundadamente e cada caso analisado especificamente 41, Outro ponto muito discutido no TMF é a resiliência da microbiota. De maneira geral, a microbiota transplantada precisam coexistir com a microbiota já pré-existente do paciente e essa coexistência parece ocorrer de melhor maneira caso ambas sejam filogeneticamente relacionadas 41. Com isso, há diferentes níveis de transplantes e de resiliência à colonização da microbiota doadora e, consequentemente, diferentes níveis de capacidade de colonização41.
Desta maneira, para que o TMF seja mais eficiente, são necessárias análises prévias que envolvem a composição da microbiota do doador, a variação intra-individual entre doador e receptor para que sejam identificados possíveis limitações, estratégias de alterações antes do transplante ocorrer, como suplementação do doador com prebióticos ou mesmo a identificação de doadores mais compatíveis 41. Essa dificuldade na padronização envolve a heterogeneidade da microbiota do paciente no início do tratamento. Há autores que defendem que essa composição da microbiota é tão particular que poderia funcionar como uma impressão digital. Todo o genoma e as habilidades provenientes desta microbiota fazem com que seja um ecossistema único em cada pessoa 11,34. CONCLUSÃO • A obesidade é uma doença crônica multifatorial cujo desenvolvimento pode estar relacionado à composição da microbiota intestinal ou a alterações nesta composição, processo conhecido como “disbioses”.
• A microbiota intestinal é composta por diversos grupos de bactérias que desempenham diversas funções como melhorar a imunidade, proteção contra microrganismos patogênicos, produção de ácidos graxos, participar do processo digestivo e produção de vitaminas K e do Complexo B. Distribuição de bactérias anaeróbicas pelo trato gastrointestinal. Maior presença destes microrganismos no intestino grosso. Adaptado de DOS SANTOS; RICCI, 2018. Figura 3. Comparação entre a microbiota intestinal de pessoas com peso normal (nw 1,2 e 3; obesos (ob1,2 e 3) e pessoas após o by-pass gástrico (gb1,2 e3 ). Al-Assal K, Martinez AC, Torrinhas RS, Cardinelli C, Waitzberg D. Gut microbiota and obesity. Clin Nutr Exp. Moore KL, Dalley AF, Agur AMR. Anatomia Orientada Para a Clínica. The Role of Human Gut Microbiota in Obesity.
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