IMPOSSIBILIDADE DE APLICAR A TESE DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL EM CASO DE INADIMPLÊNCIA EM CONTRATOS DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO

Tipo de documento:Dissertação de Mestrado

Área de estudo:Direito

Documento 1

Esta dissertação discute a aplicabilidade da teoria do adimplemento substancial em contratos de alienação fiduciária. Para tanto, discute os direitos fundamentais nas relações privadas; explica a Política Nacional de Habitação, os contratos de financiamento habitacionais e suas peculiaridades; aborda a Teoria do Adimplemento Substancial com base nos princípios da boa-fé objetiva, função social do contrato e equivalência material; e discute a (im)possibilidade de aplicar a tese do adimplemento substancial em caso de inadimplência de contratos de financiamento imobiliário que já foram quase que integralmente quitados, restando adimplir um número ínfimo de parcelas. A metodologia empregada na realização desta dissertação foi a pesquisa bibliográfica realizada a partir de referências já publicadas, a exemplo de doutrinas, legislações e jurisprudência que se dedicam ao estudo do tema esmiuçado neste trabalho, permitindo concluir que a teoria do adimplemento substancial deve ser aplicada aos contratos de alienação fiduciária e isto não implica, de forma alguma, em incentivo ao inadimplemento das parcelas finais do contrato, tendo em vista que não há perdão da dívida, mas, sim a proibição de uma medida desproporcional e que pode trazer sérios prejuízos ao devedor, atentando contra sua dignidade e de seus familiares ao retirar-lhe o teto sob o qual está abrigado juntamente com seus entes queridos.

E o pior: tudo isto após passar muitos anos de sua vida pagando as parcelas acordadas e tendo quitado a grande maioria delas. Palavras-chave: Financiamento imobiliário. Substantial performance. SUMÁRIO INTRODUÇÃO 6 1 DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS 8 1. Direitos Fundamentais 8 1. Das dimensões de direitos 22 1. Direito social à moradia 27 1. A teoria do adimplemento substancial 62 3. Adimplemento substancial e boa-fé objetiva 65 3. Adimplemento substancial e função social do contrato 69 3. Adimplemento substancial e equivalência material 72 3. Parâmetros para a aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial 74 3. Desta feita, passou-se a aplicar, nas relações consumeristas, onde uma das partes buscava a extinção do contrato por conta de inadimplemento de parcela insignificante, a teoria do adimplemento substancial. Esta dissertação objetiva discutir a aplicabilidade da teoria do adimplemento substancial em contratos de alienação fiduciária.

Trata-se de um tema relevante, pois, no Brasil, as decisões judiciais têm se mostrado controversas no que diz respeito à possibilidade de aplicar a teoria do adimplemento substancial em contratos de alienação fiduciária de bens imóveis. Este é um tema que aflige um grande número de pessoas que por motivos diversos, após adimplir a maioria das parcelas do contrato de alienação fiduciária de um bem imóvel, se vê em mora e correndo o risco de ter o imóvel tomado de volta. Busca-se, pois, demonstrar que em homenagem à função social do contrato bem como dos princípios que concorrem para assegurar a dignidade da pessoa humana, deve-se aplicar a teoria do adimplemento substancial do contrato, pois, desta forma, valores de relevância indiscutível restam preservados.

Por outro lado, sabe-se que os Estados têm ampliado consideravelmente o conteúdo de suas Constituições, buscando trazer para o corpo delas alguns temas que, à época do Liberalismo clássico, não figuravam naqueles diplomas normativos. Esse fenômeno coincidiu com o surgimento do denominado Estado Social (Welfare State), iniciado com a Constituição mexicana de 1917, porém notabilizado com a Constituição de Weimar de 19192. Portanto, as Constituições dos Estados passaram a prever, de maneira cada vez mais intensa, diversas hipóteses de intervenção estatal na vida privada. Ao invés de conter apenas regras de regência do Estado e de proteção dos indivíduos contra o poder estatal, passaram também a conter um conjunto de normas de ordem social, cultural e econômica, tanto para a redução das desigualdades sociais, como também para incentivar o desenvolvimento nacional e foi neste contexto que surgiram os direitos fundamentais.

O homem se comporta socialmente baseado em crenças religiosas e ideológicas, em princípios morais e éticos e, muitas vezes, sob limitantes problemas biológicos e sociais. A Constituição é o topo da ordem jurídica do Estado constitucional ao congregar em si as decisões mais importantes da comunidade política. O que se deseja enfatizar é a natureza normativa, ou seja, entender a Constituição como verdadeira norma jurídica neste modelo; uma Constituição normativa é aquela que efetivamente domina o processo político ao garantir o seu desenrolar democrático e, além disso, regula, em certa medida, os direitos fundamentais, não apenas os enunciando. Além disso, como expõe Osvaldo Ferreira de Carvalho5, uma das características que melhor define o atual Estado Constitucional é a imposição ao Estado de proteger os direitos, mesmo que o realize à margem da lei ou inclusive em posição/condição que supere os parâmetros da legalidade, visto que não se trata da eficácia dos direitos fundamentais na medida e nos termos demarcados na lei, mas se consubstancia na eficácia dos direitos fundamentais na medida e nos termos estabelecidos na Constituição.

Conforme enfatiza Sarlet “os direitos fundamentais [. nascem e se desenvolvem com as Constituições nas quais foram reconhecidos e assegurados”6. Entretanto, a manutenção da ordem social plena só será possível quando cada cidadão respeitar suas responsabilidades individuais. Referente aos direitos fundamentais, Sarlet coloca que uma das mais importantes inovações é a trazida pelo art. º, § 1º, da Constituição Federal de 1988, pois segundo este dispositivo consigna, as normas que definem direitos fundamentais têm aplicabilidade imediata, a princípio excluindo a natureza programática destes preceitos9. Mesmo assim ficou assegurada a supremacia dos direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988e importa destacar, ainda, a proteção trazida pelo art. § 4º, que é o artigo em que as cláusulas pétreas são estabelecidas. Em outros casos, o legislador possui autorização constitucional para definir ou modular os contornos do Direito.

E, quando o Judiciário faz uso do método da ponderação de interesses, tem-se que a limitação ao direito fundamental ocorre in concreto por meio do afastamento de sua incidência numa hipótese específica. Carvalho explica que as restrições de direitos fundamentais são normas que estabelecem privações ou supressões de certas formas de exercício dos direitos que, partindo-se de uma interpretação ampliativa, estariam compreendidas no âmbito de proteção dos preceitos constitucionais que os consagram12. Ao afirmar que as restrições são normas, cumpre consignar que, como destaca Robert Alexy, “[. uma norma pode ser uma restrição de direito fundamental só se é constitucional”13. A contraposição entre definição de limites, de um lado, e imposição de restrições, de outro, explicita as diferenças entre os dois enfoques15.

A teoria externa, de caráter liberal, identifica os direitos fundamentais como uma maneira de obstar a intervenção do poder estatal na esfera privada. A teoria externa entende por restrições determinações que são externas aos direitos, ou seja, vêm de fora, que teriam de ser previstas expressamente na Constituição, e que deveria prevalecer a liberdade. A regra é a não intervenção. A restrição amputa, diminui o âmbito do direito. Segundo Oscar Vilhena Vieira19, primeira, liberal e garantista, limita a intervenção do Estado na promoção de interesses públicos que se chocam com liberdades individuais; a segunda é mais favorável à intervenção do Estado, mas deixa fluidos os limites de tal intervenção, ameaçando a liberdade. Por isso, parece mais interessante um entendimento intermediário, que leve em consideração os valores envolvidos na situação específica por meio da ponderação que, conforme Luís Roberto Barroso é uma “técnica de decisão jurídica, aplicável a casos difíceis, em relação aos quais a subsunção se mostrou insuficiente”20.

Pode-se aproveitar também os limites aos limites (legalidade, igualdade, proporcionalidade, não-retroatividade) como critérios que podem auxiliar na resolução das controvérsias. Destaca-se a necessidade de coerência e integridade na jurisprudência para assegurar que as colisões que eventualmente surjam, sejam adequadamente solucionadas e que não existam posições que não respeitem a Constituição, ou, sejam discricionárias ou subjetivas, devendo haver coerência e integridade em decisões que busquem resolver colisões entre tais direitos. A exigência de coerência e de integridade decorre da teoria da argumentação jurídica, a partir de autores como Ronald Dworkin21, e pode auxiliar na resolução de referidas colisões fazendo uso da ponderação. Isto porque o princípio da dignidade da pessoa humana ocupa condição de supremacia sobre os demais princípios e, portanto, apesar de não ser absoluto, dificilmente possuirá um peso menor se comparado a outros princípios.

Trata-se, pois, de um princípio que, segundo Flávia Piovesan23, exerce controle sobre a atividade estatal em face dos indivíduos, impedindo, assim, que o homem seja reduzido à condição de objeto, garantindo-se que o pleno gozo dos direitos tipicamente fundamentais, a exemplo do direito à moradia, seja inviolável. Nada mais lógico que seja assim, na justa medida em que as colisões e conflitos de direitos fundamentais e os conflitos destes com outros bens constitucionalmente protegidos também induzem a introdução de limites e restrições àqueles direitos. Nesse sentido, o dever de proteção imposto essencialmente aos órgãos estatais, é igualmente estabelecido aos particulares nas relações entre si e mesmo no sentido da proteção da pessoa contra os atos que ela própria possa cometer atentatórios à sua dignidade, como decorrência da natureza indisponível da dignidade humana como parcela do núcleo fundamental dos direitos fundamentais.

Assim, necessário em todos os casos é o exercício da ponderação dos bens em causa com vistas na proteção eficiente da dignidade da pessoa ao aplicar também o princípio da proporcionalidade que, por sua vez, igualmente encontra-se conectado ao princípio da dignidade da pessoa humana. A principiologia constitucional permite o diálogo com os dados concretos, de modo a redesenhar a concreta relação contratual tendo por base os valores fundamentais do sistema. Este caminho alinha-se à constitucionalização do Direito Civil, entendida como concretização de direitos fundamentais nas relações jurídicas privadas, dentre as quais as relações contratuais. Eros Belin Cordeiro28 destaca que o conteúdo e o sentido do princípio da obrigatoriedade dos contratos tiveram uma alteração qualitativa a partir da influência dos princípios e valores consagrados no texto constitucional brasileiro.

Assim, as alterações perpassadas pelo referido princípio são mais qualitativas (revelam um novo significado do pacta sunt servanda) do que meramente qualitativas (diminuição do alcance do princípio). a vinculatividade dos princípios e valores constitucionais, determinadores da feição contemporânea do nosso ordenamento jurídico permitem a reconstrução de institutos e princípios construídos séculos atrás29. A justificativa é que o desenvolvimento social também é do interesse de toda a sociedade, o que faz, consoante Humberto Theodoro Jr. com que “os deveres éticos da dignidade da pessoa humana se sobreponham a outros valores, quer econômicos, quer sociais”33. Embora o princípio da dignidade da pessoa humana parta de uma expressão indeterminada, vaga e genérica, consegue reproduzir o sentido que pretende expressar.

A difícil definição não pode ser obstáculo à sua concretização. A título de exemplificação, cita-se a questão do inadimplemento de contratos de financiamento habitacional. O mínimo que a lei deve fazer para auxiliá-lo a quitar suas dívidas é promover um meio para tanto, garantindo-lhe a dignidade. Segundo André Perin Schmidt Neto35, este é um problema, inclusive, de saúde pública que atinge um número incontável de pessoas no mundo, mas em alguns países não recebe a atenção devida. No Brasil, é possível fazer-se uma interpretação do ordenamento conforme a Constituição, reforçando os deveres decorrentes da boa-fé dos contratantes. É válido abrir um parêntese sobre o culturalismo jurídico36, eis que este possibilita uma abertura do Código Civil a essas influências aqui cogitadas.

Importa consignar que Miguel Reale, coordenador da Comissão responsável pelo Código Civil brasileiro de 2002, embasou todo este diploma em três princípios fundamentais: eticidade, socialidade e operabilidade37. Também o mínimo existencial, o reste à vivre dos franceses, ou mínimo social, como denominou a Lei 8. – a chamada “lei orgânica da assistência social” –, se identifica muito com este princípio. Assim, ainda que se insista em uma leitura mais clássica do Código Civil e não se admita em nenhuma hipótese a revisão dos pactos entre privados, há que se atentar para a importância da manutenção de um mínimo existencial. Segundo Cláudia Marques39, um mínimo que garanta a sobrevivência digna deve não apenas ser protegido pelo Estado como, também, deve ser conferido àquele que não o possua, a fim de permitir um mínimo de cidadania.

Um Estado que tem o dever de prover tais condições de existência não pode, ao mesmo tempo, tratá-las como objeto de intervenção e retirá-las a pretexto do cumprimento de uma obrigação particular. Os direitos de primeira geração ou direitos de liberdade têm como titular o indivíduo são oponíveis ao Estado e ostentam a subjetividade como seu traço característico. Os direitos de oposição ao Estado são conhecidos pelo seu status negativus, segundo a Classificação de Jellinek, prestigiando um caráter antiestatal e valorizando o homem-indivíduo. Conforme ensina Paulo Bonavides, “um homem de liberdades abstratas, o homem da sociedade mecanicista, que compõe a sociedade civil”42. Os direitos de segunda dimensão nascem do antiliberalismo, sobretudo no século XX, vinculados ao ideal de Estado Social e intimamente ligados ao princípio da igualdade e, são definidos como direitos sociais, culturais e econômicos, bem como, direitos coletivos ou da coletividade43.

Esses direitos não existiam antes da formação do Estado Contemporâneo, que, por sua vez, concorre com a formação do Estado Social, surgido em razão das diversas classes criadas pela sociedade industrializada. No plano constitucional deve-se ressaltar que cerca de 55 países do mundo reconhecem expressamente o Direito à Moradia em suas constituições, o que, por sua vez, demonstra a ascensão dos direitos de segunda dimensão. Porém, a referida previsão expressa vem de algum modo frustrar tanto a sociedade em geral como os operadores do direito, pois os referidos direitos constam destes diplomas, mas não conseguem atingir níveis satisfatórios de efetividade. Especificamente, no ordenamento constitucional brasileiro, os direitos sociais foram introduzidos a partir da Constituição de 1988 e espalhados por todo o texto.

Como já mencionado, o Direito à Moradia aparecia apenas como componente secundário de diversos outros institutos. Somente com a Emenda Constitucional 26/2000 é que estes direitos foram expressamente elevados ao status formal de direito fundamental. Essa dimensão de direitos recebeu guarida do STF no Julgamento do Mandado de Segurança 22. SP (julgado em 30 de outubro de 1995, relator Ministro Celso de Melo). Questão relevante para o debate sobre a qualificação dessa dimensão dos direitos fundamentais é a sua titularidade, pois no tocante à paz, à autodeterminação e desenvolvimento, questiona-se se os referidos direitos são autênticos direitos fundamentais, já que a titularidade e responsabilidade por eles são muitas vezes de Estados e até Mundial. Conquanto haja um número crescente de tratados relativos ao tema, ainda não há um conjunto positivado para dar conta da estrutura geral que envolve os direitos de solidariedade e fraternidade52.

Ressalte-se que apesar de ser comum confundir tais direitos com os direitos de primeira geração por se tratarem de liberdades, como é o caso do direito à liberdade de internet, mas os defensores dessa dimensão afirmam que o que os difere é a titularidade difusa deles. Está regulamentado por normas que têm por escopo sua efetividade. Traz em si, portanto, a finalidade de reduzir as desigualdades sociais na promoção do bem para todos, sem preconceitos relacionados à origem, raça, sexo, cor, idade ou outras formas de discriminação, na acepção dos objetivos fundamentais postos na Constituição Federal vigente (Art. °, I, III e IV). Sua realização perpassa o interesse em proporcionar um ambiente salutar de vivência a cada pessoa, em conexão a meta constitucional de preservar e aperfeiçoar a nação brasileira como uma sociedade solidária.

Isso exige um arcabouço normativo atento a esse duplo efeito. Em razão da urgente necessidade de moradia para a população, entende-se a criação de políticas públicas amplas, como a que se instalou no Brasil nos anos 1960. A Lei n° 4. é um caso paradigmático e importa ao tema sob exame na medida em que explicita o movimento organizado pelo Estado para suprir a demanda social por moradia, de modo a legitimar medidas que possam ir ao encontro dessa finalidade. Por ela se instituiu a correção monetária em contratos imobiliários de interesse social, o sistema financeiro para aquisição da casa própria, foi criado também o Banco Nacional da Habitação (BNH), a Sociedades de Crédito Imobiliário, as Letras Imobiliárias, o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo, implementou políticas públicas voltadas para a habitação criando o Sistema Financeiro da Habitação (SFH).

Essa norma indica que a aplicação dos recursos terão prioridade na construção de conjuntos habitacionais cujo objetivo é eliminar as favelas, mocambos bem como outras aglomerações em que as pessoas vivem em condições sub-humanas de habitação; além dos projetos municipais ou estaduais que, a partir das ofertas de terrenos urbanizados e dotados dos melhoramentos necessários, autorizarem o início imediato da edificação de residências; os projetos apresentados por cooperativas e outras tipos de associações que priorizam a construção de casa própria; a construção de moradia para a população rural; dentre outras, especificadas no Art. Jorge Miranda, a seu turno, explica que quando da consagração constitucional do princípio da dignidade humana encontra-se implícita a ideia de ser a pessoa “fundamento e fim da sociedade e do Estado”62.

Embora seja a dignidade da pessoa humana um valor superior que não pode ser ignorado pelo direito positivo, sua importância vai muito além dos limites do positivismo. Deste modo, por se referir à preservação da integridade e dignidade dos indivíduos e à realização completa de sua personalidade, e, frente às exigências de respeito à dignidade humana, a vigência dos direitos humanos não condiciona que a dignidade esteja declarada em constituições, leis e tratados. Referente à definição de dignidade humana, Sarlet63 expressa que as formulações são insatisfatórias, com noções pouco precisas, cuja dificuldade decorre do fato de a dignidade estar relacionada à condição humana, guardando estreita relação com as complexas e imprevisíveis manifestações afetas à personalidade humana. É, pois, o princípio da dignidade humana uma categoria axiológica aberta, mas que não se reduz a garantir apenas a liberdade, “mas também um mínimo de segurança social, já que, sem os recursos materiais para uma existência digna, a própria dignidade da pessoa humana ficaria sacrificada”64.

nas relações firmadas por particulares”69, como, por exemplo, o ajuste de cláusulas abusivas em contratos. Mas não é somente no viés pós-violatório que o instituto do mínimo existencial se faz presente. Outrossim, “as relações particulares devem ser pautadas por meios de se proteger e de se promover o mínimo existencial antes da ocorrência do dano”70 defluindo daí a boa-fé objetiva, a função social, eticidade e outros princípios que fundamentam a estipulação das cláusulas contratuais e o comportamento dos contraentes antes e durante a execução do pacto. Há de se frisar ainda que o mínimo existencial, enquanto vetor de razoabilidade e baliza de quantidade e qualidade na fruição de direitos, limita as cláusulas contratuais e permite a readequação do contrato não apenas para defender a existência condigna do devedor, mas também para obstar o locupletamento abusivo e desmedido por parte do credor, evitando que este lucre além daquilo que, nas particularidades inerentes ao caso concreto, lhe seria licitamente permitido auferir.

A dignidade da pessoa humana, contudo, transcende o aspecto garantista individual, mas assume uma consideração comunitária, de modo que sua plenitude é realçada no contexto de intersubjetividade das relações humanas: [. Ainda, ante o fato de que a concepção do homem-objeto constituía antítese da ideia de dignidade da pessoa humana, a prestação obrigacional que, por abuso na estipulação da cláusula ou pela superveniência de fatos no decurso da execução ocasione demasiado sacrifício do devedor, estará reduzindo o devedor em objeto, em instrumento de enriquecimento e aumento patrimonial do credor, em desprestígio ao princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que, “onde não houver limitação do poder [. não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana e esta (a pessoa) por sua vez, poderá não passar de mero objeto de arbítrio e injustiças”75.

Em termos quantitativos, a quantificação de quando a prestação contratual atenta à dignidade da pessoa humana, por exigir do devedor sacrifício exagerado, não pode ser tarifada aprioristicamente, mas deve ser verificada à luz das circunstâncias que permeiam o caso concreto. Mesmo valendo-se do mínimo existencial, a quantificação é realizada na análise do caso sub judice, já que a quantidade de fruição dos direitos “será diferente entre si e entre eles mesmos em diferentes contextos”76. Isto não obsta, todavia, de se vincular à prestação atentatória àquela que empobrece em demasia o contratante, já que segundo Ricardo Lobo Torres “o problema do mínimo existencial confunde-se com a própria questão da pobreza”77. A escusa da obrigatoriedade estaria na cláusula rebus sic stantibus, que por sua vez tinha seu fundamento na desigualdade superveniente das obrigações contratadas e no enriquecimento ilícito de uma das partes.

No entanto, esta ideia deveria, ainda, segundo o jurista, e em conformidade com os paradigmas daquela época, se contrapor à ideia da necessidade de estabilidade dos negócios, condição para a paz e segurança social. Neste princípio uma vez realizado o contrato, não pode ser modificado, a não ser por acordo das partes. A força obrigatória é o que dá sentido ao contrato, visto que se não tivesse esta obrigação, de nada valeria firmar um contrato, pois neste sentido, cada contratante observaria somente os seus interesses e modificaria cada cláusula visando atender em sentido unilateral. Assim, como bem colocam Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, “de nada valeria o negócio, se o acordo firmado entre os contraentes não tivesse força obrigatória”82.

XIX até os anos de 1930 surgiram diversas modalidades de moradia pensadas para as camadas populacionais de baixa renda, todas construídas pela iniciativa privada com objetivo de obter renda. As formas mais comuns foram: cortiços-corredor, cortiço-casa de cômodos, vilas e correr de casas geminadas. Nesta época, a forma de moradia que dominava era a moradia de aluguel e coletiva, pois não existia sistema de financiamento da casa própria. Somente se conseguia adquirir a casa própria após anos de trabalho. Adotados em todas as regiões e por todos os níveis do governo do país, os estímulos à iniciativa privada foram sempre muito bem aceitos por todos: higienistas, poder público e empreendedores84. A Fundação Casa Popular (FCP) foi a primeira iniciativa por parte do Estado de instituir uma política nacional de habitação, criada pelo Decreto-lei n.

durante o governo do presidente Eurico Gaspar Dutra, a escolha da data para sua criação revela a dimensão política que se quis dar a esta iniciativa. O dispositivo legal referente à sua criação elencava como público brasileiro e estrangeiro residente a mais de 10 anos no país, ou que possuíssem filhos brasileiros que não possuíssem moradia própria, obedecendo a seguinte proporção: trabalhadores em atividades particulares 3 - servidores públicos ou de autarquias 1 - outras pessoas 1. E posteriormente foi acrescido a estes a renda familiar de 60 mil cruzeiros anuais (equivalente a 12,8 salários mínimos da época) e responsáveis que tivessem um mínimo de 5 pessoas como dependentes88. A política habitacional como política pública é permeada por mudanças no modelo intervencionista público e caracterizou-se por iniciativas tímidas e assistemáticas até a década de 1960.

Nesse sentido, [. o BNH cumpriu funções econômicas e políticas, aplicando recursos da poupança pública obrigatória e da poupança particular voluntária em atividades que deviam ser lucrativas, enquanto criava oportunidades de absorção maciça de mão de obra e auxiliava os planos de controle da inflação92. A política do BNH gerou questões como a reapropriação do espaço para além do seu controle. As cidades brasileiras foram se organizando a partir desta configuração de opostos: Entender tal dialética significa encontrar as explicações para as diversas formas de assentamentos urbanos no que elas tem de estrutural. Significa, também, entender que a ocupação do espaço não se faz por acaso, e que o BNH e a sua negação estão inscritos em um quadro mais amplo que lhes dá sentido e a própria razão de ser93.

Santos97 afirma que o BNH em quase dez anos de atuação passou a ser um referencial para a edificação de moradias e por consequências para o fenômeno de morar e para a definição das cidades em si, o que significa que o BNH teve forte influência sobre a política urbana no país. O período em que foram construídas mais moradias populares foi o período do BNH, após um período de estagnação foi alavancado a partir de 2009 com o início do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), que será visto a seguir. O Programa Minha Casa Minha Vida Nos anos 1990 o país viveu mudanças significativas nas políticas públicas e em muitos aspectos com a sua redemocratização e conquistas advindas com a Constituição Federal de 1988, entre eles no campo da política urbana.

Foi a partir da Constituição de 1988, título VII, capítulo II, artigos 182 e 183 que se instituiu a política habitacional que posteriormente passou a ser regulamentada pelo Estatuto da Cidade, Lei nº 10. após tramitar por doze anos no Congresso Nacional, que traduziu no seu conteúdo a função social da cidade, da propriedade, o direito à cidade, sua gestão democrática, além do direito à cidadania. Referido marco legal aborda uma série de aspectos que se referem à questão habitacional, dando-se destaque às famílias de baixa renda, o que levou à segmentação do programa em três níveis de renda familiar distintos, quais sejam: “a) até três salários mínimos; b) de três a seis salários mínimos e; c) de seis a dez salários mínimos”99.

Também, foram disciplinadas questões relacionadas à estrutura e normas gerais deste programa, às peculiaridades de condições das custas e emolumentos para os projetos habitacionais destinados aos níveis de renda mencionados e, por derradeiro, à operacionalização da regularização fundiária de interesse social ou de interesse específico. Especificamente no que tange à habitação, sabe-se que houve tempos no Brasil em que foi observado um hiato temporal de investimentos em moradias, o qual pode ser relacionado entre a data em que foi extinto o Banco Nacional de Habitação (BNH), no ano de 1986 e a data em que foi criado o PNH. Este lapso temporal totalizou quase 20 anos de ações descontinuadas que foram implementadas nos três níveis federados, sem coesão acerca do tema em âmbito nacional100.

Em 2003, foi criado o Ministério das Cidades, com uma Secretaria específica destinada à área de habitação, marcou o início de uma nova institucionalidade. Dito isto, acrescente-se que os quatro eixos que se estabeleceram para a PNH foram: “a) política urbana e fundiária, b) financiamento e subsídios, c) arranjos institucionais e d) cadeia produtiva da construção civil”103. Porém, o PMCMV priorizou o eixo “financiamentos e subsídios”. A este respeito, Bonduki observa que deve-se reconhecer que “o programa elevou até um patamar ótimo os recursos orçamentários em habitação, como há décadas os que lutam por moradia digna reivindicam”104. No entanto, isso não se mostrou suficiente para obstar os efeitos negativos causados pela omissão do Estado para com os outros eixos da PNH.

Desta forma, o que se nota é que o PMCMV constitui-se em uma política de subsídios cuja operação se dá dentro de uma lógica de mercado. Neste novo ambiente, destacam Silva et al107, era necessário criar mecanismos legais e regulatórios que pudessem assegurar aos investidores a segurança jurídica com relação aos contratos firmados. Visando a este objetivo, foi elaborada a Lei nº 9. que instituiu a alienação fiduciária, e criou o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), que, além de oferecer segurança jurídica, criou novas modalidades de financiamentos, modernizando os mecanismos de empréstimo, visando garantir maior liquidez ao mercado, e, consequentemente, expansão de crédito imobiliário. Consoante redação do art. º da Lei nº 9. Com esta generalização, segundo este autor, o legislador teria deixado claro que sua intenção era dotar o setor imobiliário em sua amplitude, e o próprio SFN como um todo, com um novo instrumento apto a dinamizar suas atividades, atentando-se à sua função multiplicadora na economia bem como a sua capacidade de gerar um grande número de empregos.

Nesse mesmo sentido segue Marcelo Terra111, para quem esta norma legal não traz objeções quanto à legitimidade das partes, bastando, para confirmar tal afirmação, verificar a redação do § 1º do art. que traz o seguinte em sua parte primeira: “A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SFI”. Cai por terra, ainda, a dúvida existente no regime do Decreto Lei n° 911/69, em que, segundo este autor, muito se discutiu se entidades não financeiras poderiam efetuar a contratação da alienação fiduciária de bens móveis. Mairink112 também dá a sua contribuição, trazendo que esta autorização é válida para qualquer pessoa física ou jurídica e teve como objetivo difundir o instituto para englobar um número mais abrangente de pessoas.

Segundo Renan Miguel Saad, [. a alienação fiduciária não é uma espécie de negócio fiduciário, mas, um direito real de garantia de categoria autônoma, que caracteriza-se por ser acessório a um negócio jurídico principal, conferindo a garantia ao credor através da transferência resolúvel da propriedade116. Chalhub, por sua vez, a conceitua como sendo o contrato através do qual o devedor, ou fiduciante, com vistas a garantir uma dívida, pactua que a propriedade fiduciária do bem seja transferida ao credor, sob condição resolutiva. O negócio fiduciário é caracterizado pela titularidade à conta de outrem ou para a promoção de certa finalidade. Essa é a função que as partes perseguem com o negócio fiduciário: a transmissão de um direito para que ele seja exercido de determinada forma, com o objetivo de alcançar um escopo comumente avençado.

Por outro lado, o bem continua na posse direta do devedor, que, assim, pode usufrui-lo em suas atividades. Da mesma forma, tem-se a cessão fiduciária de créditos, por meio da qual o devedor (ou o terceiro garantidor) transmite ao credor, direitos pessoais de sua titularidade para garantir a dívida que tem para com este. Em ambos os casos, transfere-se, em caráter resolúvel e fiduciário, a titularidade do objeto da garantia ao credor, o qual, por isso mesmo, não tem seu crédito ameaçado por eventual falência do devedor ou do terceiro garantidor do contrato119. O devedor ou mesmo o terceiro que transmitiram o bem ou o direito em garantia fiduciária também se encontram protegidos com a falência do credor, pois a propriedade deste subordina-se à condição resolutiva do pagamento.

Assim, uma vez que a obrigação à qual se vincula a garantia tenha sido adimplida, a titularidade do bem ou direito retorna automaticamente para o devedor ou terceiro. Ocorrida a transição do Estado Liberal ao Estado Social, nulificada a rígida dicotomia público/privado, assentada a força normativa dos princípios constitucionais como garantia da unidade do ordenamento e, enfim, reconhecida a necessidade de se investigar não apenas a estrutura dos institutos jurídicos, mas sobretudo a sua função, já não se questiona a insustentabilidade de um direito obrigacional hermético em seus próprios dogmas, apartado da realidade social e neutro aos imperativos éticos. Mesmo este secular ramo do direito, erigido a “santuário”, não pôde resistir à ação do tempo e historicizou-se, propondo a obrigação como uma categoria dinâmica, com valor histórico-relativo e atenta à constante dialética entre o social e o jurídico120.

Direcionando-se o foco da análise à definição de obrigação, o desafio é consolidar na prática o que até então já foi reconstruído em teoria, a partir da concepção de relação obrigacional complexa. Com efeito, se o direito das obrigações sofre os influxos da sociedade, também a relação obrigacional está sujeita às condicionantes e vicissitudes de cada caso concreto, cujo ordenamento específico deve ser a resultante dos fatos envolvidos e das fontes normativas incidentes, unificadas pela Constituição121. Nessa perspectiva, uma releitura da obrigação sob a perspectiva funcional importa o seu entendimento como relação jurídica. Embora o interesse não seja um elemento exclusivo da situação creditória, nesta assume um papel distinto daquele desempenhado em outras situações subjetivas, onde o titular do direito, exercitando o próprio poder, pode realizar diretamente e por si o seu interesse.

Diversamente, na relação obrigacional, o credor depende da atuação e da cooperação do devedor. É importante considerar, no entanto, tendo em vista o tema central deste trabalho, que dita “dependência” refere-se apenas à realização, à satisfação direta do interesse do credor, e não deve ser estendida à defesa da lesão ao interesse, uma vez admitida a autotutela como meio legítimo de reação àquela lesão. Enfim, a patrimonialidade da prestação é outro elemento inafastável da relação obrigacional, malgrado existirem controvérsias na doutrina a respeito, prevalecendo o entendimento em sentido positivo. Isso porque a obrigação não deve ser confundida com todo e qualquer dever jurídico, pois restringe-se às relações com objeto patrimonial, embora o interesse do credor possa, inclusive, ser existencial.

Nestas últimas, a pessoa não tem apenas um vínculo de titularidade, pois é o próprio objeto de tutela, ou seja, é o sujeito titular do direito e o ponto de referência objetivo da relação, que tem então em mira o desenvolvimento da personalidade. Diversamente, as situações não patrimoniais stricto sensu abrangem “vários deveres que podem ser chamados de instrumentais, os quais, embora sem ter equivalente pecuniário, estão a serviço de situações patrimoniais, a exemplo dos deveres decorrentes da boa-fé objetiva”129. Por outro lado, também algumas situações patrimoniais podem ser instrumentais à realização de certos interesses existenciais, do que é exemplo a prestação de serviços médicos, ou simplesmente ter reflexos existenciais para um dos contratantes, como acontece nas hipóteses de fornecimento de bens ou serviços essenciais.

Dúplices, enfim, são as relações jurídicas compostas, ao mesmo tempo, de situações existenciais e patrimoniais, eis que relacionadas à pessoa do titular, mas com expressão econômica, pelo que ingressam no comércio jurídico. É o caso do direito à imagem e dos direitos autorais. Trata-se de um novo papel da autotutela, entre outros que uma perspectiva constitucionalizada pode oferecer, permitindo-lhe a dissociação de sua origem “primitiva”131. Estando em jogo situações não patrimoniais stricto sensu, entre as quais se inserem os deveres de conduta derivados da boa-fé objetiva, é possível constatar uma extensão ou ampliação do próprio objeto da obrigação. A este aspecto será dedicado o tópico seguinte. A extensão do conceito de adimplemento A relação obrigacional em sua contemporânea perspectiva complexa e funcional caracteriza-se pela imprescindibilidade não apenas da prestação principal, decorrente da vontade dos contratantes, mas também dos deveres oriundos da cláusula geral de boa-fé objetiva, dirigidos à plena satisfação dos interesses envolvidos merecedores de tutela.

Tais deveres não dependem de expressa previsão, embora possam desta se valer, pois correspondem a uma imposição do ordenamento, permitindo “construir objetivamente o regramento do negócio jurídico, com a admissão de um dinamismo que escapa, por vezes, até mesmo ao controle das partes”132. Figurando-se como condição necessária para o adimplemento da prestação devida, os chamados deveres laterais, anexos ou secundários só não serão considerados “principais” por não serem determinantes na identificação do tipo contratual, para o que releva a prestação principal, isto é, o dever primário de cumprimento. Pode-se afirmar, desta feita, que a inserção de deveres de conduta na relação obrigacional ensejou que o objeto da obrigação fosse ampliado. Este já não se limita ao comportamento do credor que somente executa a prestação principal.

Adota-se uma renovada concepção personalista de obrigação, desancorada da ótica proprietária que concebe o direito do credor como propriedade sobre o ato do devedor para compreendê-lo como direito à prestação, permitindo àquele exigir do devedor um comportamento cooperativo para a satisfação dos seus interesses. O adimplemento traduz, portanto, a produção de um resultado útil, que concretiza os interesses do credor. É importante ter presente, no entanto, que, apesar de antiteticamente ligados, “adimplemento e inadimplemento não constituem, simplesmente, o verso e o reverso de uma mesma medalha que possa ser tratada como uma coisa só”, vez que “cumprimento e incumprimento pressupõem regras próprias e inconfundíveis: nem sempre o termo ‘cumprimento’ esgota todas as formas de extinção das obrigações, nem ‘inadimplemento’ indica todas as possíveis formas de violação de situações obrigacionais”137.

Sustentando a relevância de uma noção plural e não única de inadimplemento, com base num modelo normativo constituído de princípios e regras entre si articulados numa estrutura e, tal como toda a teoria das obrigações, fundado no princípio da confiança e seus consectários, Judith Martins-Costa138 aponta para a insuficiência de uma noção meramente descritiva de inadimplemento e para a necessidade de um conceito normativo, que a doutrina concebe em sentido amplo e em sentido estrito, apresentando como mais adequado o segundo, assim delineado: Em sentido estrito o inadimplemento é a não-realização da prestação devida enquanto devida. Expliquemo-nos: a figura do “inadimplemento” indica, sob uma perspectiva analítica, um critério de qualificação, em termos de “dever-ser”, de uma conduta futura.

Ora, se no momento em que são verificados os fatos que tornam operativo esse critério de qualificação tais fatos não mais existem, não há propriamente um “inadimplemento”, pois não há, mais, a “conduta devida”, o dever-ser incidente sobre a conduta. O inadimplemento não é, pois, nem a simples ausência de cumprimento nem a mera não-realização da prestação devida: constitui, especificamente, a não-realização da prestação devida na medida em que essa não-realização corresponda à violação da norma (legal, convencional, imposta pelos usos ou derivada de modelo jurisprudencial) que era especificamente dirigida ao devedor (cominando o dever de prestar) ou ao credor (cominando o dever de receber)139. Nota-se que, com a reforma do direito obrigacional, ditas lacunas foram supridas com a introdução no sistema alemão de uma cláusula geral de reparação de danos decorrentes da violação de quaisquer deveres oriundos do contrato (§ 280, I, do BGB).

A mesma tendência de se conferir um tratamento unitário às diversas obrigações e deveres contratuais já havia sido manifestada na Convenção de Viena de 1980 (Convention on Contracts for the International Sales of Goods), prevendo a resolução por inadimplemento fundamental e atentando mais para os efeitos da violação do que para a natureza do dever violado143. Não obstante doutrina minoritária ainda sustente haver um espaço no sistema brasileiro para a teoria da violação positiva do contrato, abrangendo restritivamente o descumprimento culposo de deveres de conduta quando tais deveres não se relacionem diretamente com o interesse do credor na prestação, entende-se mais consentâneo com o hodierno direito das obrigações a compreensão de que: [. há deveres de conduta que produzem efeitos diretos sobre o resultado útil programado, ligando-se visceralmente à prestação principal, e outros que, apesar de se conectarem apenas de forma indireta a esse resultado útil, também se incluem na concepção mais ampla de prestação devida.

De toda sorte, o que importa é que a violação de qualquer desses deveres de conduta conduz à não execução do comportamento devido e, consequentemente, ao não cumprimento da prestação devida. Pode-se dizer que, se o conceito de adimplemento ampliou-se pela incidência dos deveres de conduta na concreta relação obrigacional, o descumprimento apenas formal da prestação devida, sem afetar o seu resultado útil programado, torna abusivo o exercício pelo credor do direito potestativo de resolução contratual ou da exceção de contrato não cumprido, pondera Anderson Schreiber. Em tal sentido: Da mesma forma que o cumprimento meramente estrutural da prestação principal não configura adimplemento, exigindo uma análise mais atenta à função concreta do negócio celebrado, a inadequação formal do comportamento do devedor ao débito, tal como estruturalmente definido pelas partes, não ensejará inadimplemento, desde que atendido o escopo especificamente perseguido pelas partes com a constituição do vínculo obrigacional147.

Assim, diante da realização do resultado útil programado, mesmo ocorrendo inadimplemento, este será considerado mínimo, determinando a adoção de remédios menos incisivos na relação contratual, a exemplo da execução específica da obrigação inadimplida ou da reparação de perdas e danos. A Teoria do Adimplemento Substancial propõe, em tais termos, a necessidade de se avaliar a gravidade do inadimplemento, a fim de que a patologia contratual seja remediada proporcionalmente à importância da lesão ao interesse do credor. Além da proporcionalidade, os princípios da vedação ao abuso e da conservação dos negócios jurídicos devem ser atuados, especialmente tratando-se de relações sinalagmáticas, cujo equilíbrio entre as prestações correspectivas não tenha sido abalado pelo descumprimento parcial.

o primeiro, baseado na vontade das partes, que poderiam estabelecer o que eram conditions e o que deveria ser considerada como warranties; o segundo, em que se tomava em conta a relevância do pacto considerado em si mesmo. Assim, seriam considerados conditions os deveres que, uma vez descumpridos, afetassem diretamente a economia do contrato. Aqueles deveres que são tão essenciais que seu descumprimento acarreta o descumprimento do contrato em sua totalidade, de forma que poderá a outra parte buscar a resolução do contrato149. Pode-se ressaltar, no entanto, que a Teoria do Adimplemento Substancial teve seu ápice no século XVII, quando as Cortes inglesas começaram a valer-se dos precedentes já existentes para julgarem os casos concretos, dentro da individualidade e equidade que lhes eram exigidas150. Assim, desde a Inglaterra de 1779 houve diversos avanços na amplitude da teoria do adimplemento substancial, tudo ensejado pelo princípio da boa-fé e função social do contrato.

o direito vai progressivamente se abrindo para uma certa porosidade, no sentido de apreender essas relações, dar relevância jurídica, inclusive na lacuna da lei e, as vezes, até mesmo contra o sentido literal da regra, quando a aplicação desse sentido não conduz ao resultado justo e razoável num caso concreto. Esta ordem de ideias, todavia, não é aquela que está como base informativa do sistema clássico. Duas são órbitas pelas quais a relação jurídica é normalmente apreendida. A primeira, como paradigma, e a segunda, como relação jurídica em concreto, ou a relação jurídica propriamente dita. A relação paradigmática é aquela que estabelece uma moldura, em face da qual o desenho da realidade do vínculo estabelecido entre as pessoas deve se amoldar.

“Importa, pois, examinar o elemento subjetivo em cada contrato, ao lado da conduta objetiva das partes. A parte contratante pode estar já, de início, sem a intenção de cumprir o contrato, antes mesmo de sua elaboração”153. No ordenamento jurídico pátrio no art. do código civil brasileiro é disciplinado o presente princípio: “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé”154. Complementarmente, segundo Maria Helena Diniz: Esse princípio quando da interpretação do contrato, e preciso ater-se mais a intenção do que ao sentido literal da linguagem, e, em prol do interesse social de segurança das relações jurídicas, as partes deverão agir com lealdade e confiança recíprocas, auxiliando-se mutuamente na formação e execução do contrato155.

Portanto, mesmo que não esteja caracterizada em contrato a resolução por atitude de má-fé, não exonera a parte que agiu de forma ilícita de sofrer a responsabilidade civil subjetiva159. Portanto, aquele que abusa do próprio direito ao pactuar (liberdade contratual) e extrapola os limites ao fixar obrigações abusivas, também descumpre as previsões do ordenamento jurídico, tornando possível a modificação do contrato se for levado ao Judiciário. Afinal, os preceitos normativos e de interpretação referentes à boa-fé em verdade constituem uma cláusula inibitória da ocorrência de cláusulas abusivas160. Desta forma, seja por ação, por omissão ou por abuso na ação, em todas elas estará o contratante sujeito ao atendimento pleno da boa-fé, sob pena de cogente manifestação do Judiciário.

A dimensão da boa-fé é tão significativa que ela não se restringe ao âmbito do direito contratual, mas sim alcança diversas outras áreas, como o direito das coisas, o direito processual e também o Direito Público. COMPROVAÇÃO. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. Tendo o decisum do Tribunal de origem reconhecido o não cabimento da busca e apreensão em razão do adimplemento substancial do contrato, a apreciação da controvérsia importa em reexame do conjunto probatório dos autos, razão por que não pode ser conhecido em sede de recurso especial, ut súmula 07/STJ. Agravo regimental não provido163. Assim, ao se estabelecer a função de algo, está-se diretamente apontando que este algo passa agora a agir em virtude de algum padrão comportamental.

Comparato166 aponta que o descumprimento da função (no caso, atualmente, da função social do contrato) acarreta um desvio de finalidade, caracteriza uma disfunção e, portanto, uma ilegalidade que precisa ser enfrentada pelo Judiciário. A respeito da importância e da vinculação da palavra legal (função), disse: “[. é um poder de agir sobre a esfera jurídica alheia, no interesse de outrem, jamais em proveito do próprio titular. A consideração dos objetivos legais é, portanto, decisiva nesta matéria, como legitimação do poder”167. Feitas todas estas considerações, cabe apontar que a função social do contrato leva à humanização da relação contratual, como quando repelem as cláusulas leoninas (por sinal, expressão esta até decaída face à ideia de cláusulas abusivas e o diálogo das fontes com o Código de Defesa do Consumidor).

Do exposto depreende-se que a função social do contrato, bem como a boa-fé objetiva possui natureza jurídica, cabendo em toda relação contratual e expressamente previsto no art. do Código Civil e estabelecendo-se como imperativo inafastável e de observância obrigatória. Referente à função social do contrato, importa destacar o que preceitua Bierwagen: No que tange ás funções sociais do contrato, três são as principais: uma econômica, na medida em que se representa um instrumento de circulação de riquezas e difusão de bem; outra regulatória, enquanto enfeixa direitos e obrigações voluntariamente assumidas pelas partes; e por fim, social, considerando que seu exercício dirige-se para a satisfação de interesses sociais171. A função social do contrato pode ser compreendida como a cláusula geral, aberta, que se presta a vincular a legitimidade e validade do contrato para ambiente metaindividual, para fora do ambiente restrito ou de interesse privado dos contratantes.

Autorizando a revisão ou a resolução do contrato, o princípio do equilíbrio contratual mitiga a força obrigatória dos contratos para [. realizar e manter o equilíbrio real de direitos e deveres durante toda a dinâmica do contrato, seja para manter o equilíbrio estabelecido no início da tratativa, ou para restaurá-lo, nos casos de onerosidade excessiva; ou, ainda, instaurá-lo, quando inexistente180. Sua aplicação, vale dizer, será autorizada mediante a constatação do desequilíbrio quando a prestação contratual objetivamente considerada tiver sua causa, natureza e finalidade perturbada ou destruída e do poder contratual dos sujeitos, não apenas em relação à capacidade econômica, mas também acesso a informações, conhecimento do negócio, do mercado, dos riscos relacionados ao negócio.

No plano da teoria da imprevisão, a superveniência de fatos extraordinários e imprevisíveis, onerando excessivamente uma ou ambas as partes, o que ocasiona a quebra da equivalência e o enriquecimento injustificado de um dos contraentes, atua o princípio do equilíbrio contratual para solucionar o desequilíbrio, fazendo renascer a igualdade substancial181. Não se trata, saliente-se, de um subterfúgio para que o devedor se desvincule das suas obrigações, mas sim de um instrumento para que haja o cumprimento segundo as expectativas econômicas iniciais das partes, observadas a boa-fé, a função social do contrato e as bases éticas e equitativas, evitando abusos, situações de injustiça e a desnaturalização da finalidade social do contrato. É, todavia, necessário ter consciência que se é verdade que a análise custo-benefício contribui para realizar a eficiência, ela sozinha não consegue representar a especificação e a complexidade da ciência jurídica186.

Veja-se que o autor ao fazer uma análise acerca desse critério interpretativo pondera que a complexidade do Direito pode vir a impedir a aplicação do critério econômico nas questões jurídicas. Perceba que é interessante observar como os aspectos patrimoniais podem influenciar direitos existenciais. Observe-se o posicionamento dos tribunais no que tange a apreciação valorativa nos casos de adimplemento substancial por meio de suas decisões: É pela lente das cláusulas gerais previstas no Código Civil de2002, sobretudo a da boa-fé objetiva e da função social, que deve ser lido o art. segundo o qual "[a] parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos".

No exemplo citado acima não bastou para o legislador que se tenha adimplido com 80% do contrato, uma vez que considera não ser razoável aplicar a Teoria do Adimplemento Substancial valendo-se de critério matemáticos. Assim, importa observar o que traz a doutrina e a jurisprudência acerca da apreciação qualitativa. Referente à apreciação qualitativa, inicia-se citando um precedente judicial do Tribunal de Justiça do Paraná, a título de exemplificação: 1. O uso do instituto da substancial performance não pode ser estimulado a ponto de inverter a ordem lógico-jurídica que assenta o integral e regular cumprimento do contrato como meio esperado de extinção das obrigações. Ressalvada a hipótese de evidente relevância do descumprimento contratual, o julgamento sobre a aplicação da chamada “Teoria do Adimplemento Substancial” não se prende ao exclusivo exame do critério quantitativo, devendo ser considerados outros elementos que envolvem a contratação, em exame qualitativo que, ademais, não pode descurar dos interesses do credor, sob pena de afetar o equilíbrio contratual e inviabilizar a manutenção do negócio.

Por não haver um “Código de Defesa do Consumidor”, pode-se encontrar, em Portugal, o conceito de consumidor em vários diplomas legais, tais como o DL 29/2006, DL 133/2009, além das generalidades das Diretivas da União Europeia. Nesse interim, entende-se como o conceito mais adequado para consumidor o extraído do art. º - 1 da Lei 24/69, que: [. considera-se consumidor todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios191. Assim, pode-se afirmar que, em Portugal, pela regra geral, é considerado consumidor toda pessoa singular (pessoa física) que adquira um bem/ serviço desde que seja destinado a uso não profissional.

Requisito inserido de uma interpretação teleológica do próprio Código de Defesa do Consumidor. Deve-se salientar que, ao se questionar uma relação de consumo entre pessoa física (pessoa singular) com uma pessoa jurídica (pessoa colectiva), a vulnerabilidade é presumida. Todavia, diferentemente de Portugal, pelo fato de no Brasil a pessoa jurídica ser tida como consumidora, no moldes do art. º do Código de Defesa do Consumidor, é necessário uma maior atenção ao requisito da vulnerabilidade, vez que esta deve ser provada. De forma radical, ao ver do subscritor, alguns doutrinadores nacionais chegam a defender que, apenas, a pessoa jurídica sem fins lucrativos pode ser vista como consumidora. Construindo mecanismos que garantissem a proteção do consumidor face aos arbítrios que ocorriam. De forma similar, em Portugal, no ano de 1996 fora criada a lei 24/96 que logo no artigo 1º trouxe o dever geral de proteção ao consumidor, incumbindo: 1 - ao Estado, às regiões autónomas e às autarquias locais proteger o consumidor, designadamente através do apoio à constituição e funcionamento das associações de consumidores e de cooperativas de consumo, bem como à execução do disposto na presente lei.

A incumbência geral do Estado na proteção dos consumidores pressupõe a intervenção legislativa e regulamentar adequada em todos os domínios envolvidos197. Nesse interim, cumpre, trazer parte do sumário do Decreto Lei 446/85, que institui o regime jurídico das cláusulas contratuais, ao preceituar que o Código Civil português “consagra em múltiplas disposições o princípio da boa-fé. com vista à salvaguarda dos interesses da parte negocialmente mais fraca. Tamanha relevância da matéria que, atualmente, já se encontra pacificado nas Cortes lusitanas: Ac. STJ de 04. Swap de taxa de juro. Contrato de adesão. Cláusulas contratuais gerais. IV do Código de Defesa do Consumidor que considera nula as cláusulas que: “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade201;”.

Nesse interim, ressalta-se ainda dispositivos do Código Civil brasileiro, que como já narrado, enaltecem o princípio da boa-fé; citado cinquenta e cinco vezes no referido diploma: Art. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Art. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé202. Daí, a partir da análise de cada caso concreto de desequilíbrio contratual, diante dos vários que se apresentam, é que o magistrado poderá decidir pela aplicação ou não da teoria da onerosidade excessiva. No entanto, delimitar os pressupostos de aplicabilidade da teoria é de suma importância, para que se crie um parâmetro, que seja tomado como base para a aplicação aos demais casos concretos, evitando-se, assim, aplicações divergentes e incabíveis.

Isso porque a obrigatoriedade dos pactos ainda é uma regra, que não pode ser esquecida, sob pena de se implantar a insegurança e a desordem. A onerosidade excessiva está ligada tanto a um elemento material, de troca econômica de prestações, quanto a um elemento consensual, ambos existentes em todo contrato oneroso. De plano, pode-se excluir do âmbito de aplicação da teoria, as obrigações advindas das declarações unilaterais de vontade e dos atos ilícitos, posto que a presente teoria é de aplicação restrita ao campo contratual, tanto é que foi disposta em parte, exclusivamente, contratual do Código Civil207. Todas as teorias criadas a partir do prenúncio da modernidade têm em comum a tentativa de harmonizar esses dois aspectos para dar uma satisfatória solução a esse problema, que chega a ter ares de insolubilidade210.

Dito isto, passa-se à análise dos pressupostos de aplicação da Teoria da Imprevisão no direito brasileiro. A revisão contratual no direito português e brasileiro Portugal não trazia um dispositivo sobre o tema no CC de 1867, determinando inclusive que “os contratos legalmente celebrados devem ser prontamente cumpridos (. Passou a possibilitar a resolução dos contratos de empreitada ao acrescentar um parágrafo único ao art. do CC, através do Decreto 19. Requerida a resolução, a parte contrária pode opor-se ao pedido, declarando aceitar a modificação do contrato nos termos do número anterior. Art. Mora da parte lesada). A parte lesada não goza do direito de resolução ou modificação do contrato, se estava em mora no momento em que a alteração das circunstâncias se verificou.

Art. Castro216 entendeu ser nossa codificação uma das mais infelizes; equivocadamente, ao copiar disposições italianas, elegeu também a excessiva onerosidade, instituto distinto da Teoria da Imprevisão. As sugestões legislativas de derrogação dos artigos nacionais, cópias pouco alteradas do texto italiano, além de corrigir falhas congênitas de redação do modelo copiado, mantiveram-se dentro das fronteiras da conceituação consagrada pela doutrina revisional. Confronto entre textos – italiano, nacional e derrogativo – foram reduzidos a quadros sinóticos para comparação. Nos arts. e 480 foram evidenciadas fortes dissonâncias que demandavam reparos. Será comutativo “o contrato que, desde sua formação determina certamente qual é a vantagem e a desvantagem para cada uma das partes. São exemplos: a compra e venda, a permuta, a locação, a sociedade”219.

Portanto, é indiscutível que a teoria da imprevisão se aplica aos contratos bilaterais, onerosos e comutativos, haja vista que são espécies contratuais que pressupõem prestação e contraprestação da obrigação, a patrimonialidade e a predeterminação dos riscos do contrato, respectivamente, características estas típicas de incidência da teoria da imprevisão. Na verdade, só se pode falar em “desproporção das prestações”, quando se trata de contratos bilaterais; da mesma forma, só se pode falar em “onerosidade” e “vantagem”, em contratos onerosos; e, enfim, só se pode exigir a “álea normal”, nos contratos comutativos220. É oportuno afirmar que além de bilaterais, onerosos e comutativos, tais contratos devem possuir um razoável lapso temporal entre o momento da celebração e o de sua execução, pois o Código Civil, no art.

e parágrafos), estado de necessidade (art. ou abuso de direito (art. sendo cada um desses institutos tratados por regras próprias. De outro lado, sendo o fato superveniente, será o caso de se aplicar a teoria da imprevisão ou da onerosidade excessiva, conforme se trate de contrato consumerista ou civil. A superveniência, portanto, é pressuposto fundamental para aplicação dessas teorias, de maneira que a qualidade de extraordinário e imprevisível será analisada em um segundo momento, tendo em vista que, no último caso, essas condições são dispensáveis225. Ademais, a relatividade da previsibilidade ou imprevisibilidade do evento pode estar relacionada ainda a situação ou condição de cada parte contratante. Dessa forma, um acontecimento pode ser imprevisível em relação ao conhecimento comum, em nível de informação, ao grau de instrução, a capacidade de discernimento do homem médio.

Mas também, pode ser previsível de acordo com o conhecimento especializado, a experiência, a informação privilegiada ou qualquer outro motivo, correlacionado ao fato, que lhe dê condições de prever a alteração das circunstâncias que outro contratante pode encarar como imprevisível. E, neste caso, a efetiva previsibilidade destrói a imprevisibilidade227. O fato é que foram inúmeras as tentativas da doutrina de se identificar a noção de fato extraordinário e imprevisível, constituindo-se todas como ideias meramente relativas, na medida em que dependem da análise singular de cada caso concreto aliado a diversas outras situações, as quais precisam resultar na desproporção econômica das prestações228. A onerosidade excessiva da prestação constitui-se numa dificuldade extrema de cumprimento da prestação por parte do devedor, a qual não se confunde com a impossibilidade de seu cumprimento, não sendo necessário que o evento imprevisível ocasione a impossibilidade ou desaparecimento da prestação, que é característica do caso fortuito ou de força maior230.

Nelson Borges alerta que a impossibilidade não admite graus: O impossível existe ou não existe. Se existe, seu entendimento só pode ser absoluto; se não existe, não há o que discutir e nada justifica sua divisão em absoluto e relativo. Não se divide o que não existe. E se é dispensável dizer-se que uma impossibilidade sempre será total (simplesmente porque não pode ser parcial), pela mesma razão não se poderá dividi-la em absoluta e relativa. Muito se discute acerca desse pressuposto, especialmente quanto a sua verificação ou não, para se configurar a possibilidade de revisão ou resolução do contrato. Arnoldo Medeiros da Fonseca se posicionou em relação ao pressuposto da extrema vantagem ao credor: De nossa parte, pensamos que, quando a superveniência imprevista apenas acarreta para o devedor uma onerosidade maior, mas em nada vem a melhorar a situação do credor, que apenas pretende os benefícios esperados e decorrentes do contrato, não haverá iniquidade nenhuma em exigir do primeiro o cumprimento da obrigação livremente assumida pois o direito, no conflito de interesses a que aquela dá lugar, não tem nenhuma razão para preferir o sacrifício do segundo233.

Othon Sidou234, em sentido contrário, assegurou que o enriquecimento sem justa causa ou vantagem extrema do credor não é indispensável para que a teoria da onerosidade excessiva reste confirmada, por dois motivos: primeiro, porque a excessiva onerosidade para uma das partes nem sempre resulta em excepcional vantagem para a outra; e segundo, porque a excessiva onerosidade não se relaciona, necessariamente, com a vantagem extrema. De fato, a inserção da exigência da vantagem extrema do credor como pressuposto, além limitar demasiadamente a aplicação da teoria, apresenta outro problema que diz respeito ao ônus probatório, que recairá sobre o devedor. Na mesma esteira, tem-se a lição de Antonio Celso Fonseca Pugliese: [. Pela análise do art. do CC, depreende-se que a teoria da onerosidade excessiva é um recurso destinado, exclusivamente, ao devedor.

O dispositivo legal exclui, totalmente, a possibilidade de o credor solicitar a resolução ou revisão do contrato, por motivos supervenientes e imprevisíveis. Os principais defensores desta tese a fundamentam no fato de que os credores não estão obrigados a realizar uma contraprestação, daí porque não teriam qualquer prejuízo. Contrariamente, Nelson Borges237 e Othon Sidou238 tecem severas críticas ao dispositivo legal, amparado, precipuamente, no Código Civil português que assim menciona no art. Em último caso, verifica-se, ainda, que o credor em vias de ser lesado pode se socorrer do instituto do enriquecimento sem justa causa, previsto nos arts. a 886 do Código Civil. Portanto, percebe-se que a regra do art. do CC/02 foi destinada ao devedor-obrigado, que sofre as consequências da excessiva onerosidade do contrato, em caso da ocorrência de acontecimento superveniente e imprevisível, o que não significa tratar de forma desigual as partes contratantes, pois o credor, diante da sistemática do atual Código Civil, não ficou carente de proteção.

Como se viu para que seja aplicada a Teoria da Onerosidade Excessiva é imprescindível que o contrato seja de execução continuada ou diferida, que o acontecimento extraordinário seja imprevisível, que haja, simultaneamente, de a excessiva onerosidade por um lado e por outro, a extrema vantagem, ainda assim, será necessário, àquele que tenha que cumprir a obrigação, que não esteja em estado moratório, ou seja, a sua obrigação não pode ter atingido ou ultrapassado a data de cumprimento240. Neste diapasão, José de Oliveira Ascensão sustenta ser necessário distinguir “as hipóteses em que a mora é causal para que a relação fique desequilibrada em conseqüência da alteração das circunstâncias e as restantes”242. Ou seja, “a parte pode prevalecer-se da alteração das circunstâncias que teria sobrevindo de qualquer modo e atuado sobre o contrato, houvesse ou não mora”.

O jurista português dá um exemplo esclarecedor: Imagine-se uma empresa que se obrigue a reparar um navio e atrasa-se seis meses em relação ao prazo a que se comprometera, contratualmente. Durante este período, desencadeia-se uma guerra que atinge o país de origem das matérias-primas necessárias, o que leva estas a cotações exorbitantes. Evidentemente, nesse caso, não poderá a empresa de navios se valer da teoria da imprevisão. Trata-se de uma evidência, de que o acontecimento extraordinário causador do dano iminente não pode ter sido provocado por quem invoca a aplicação da excessiva onerosidade, isso porque, considerando a teoria como um benefício ao devedor, parece lógico que a ninguém é lícito alegar a própria torpeza, e ainda com ela auferir vantagens (turpitudinem suam allegans non est audiendus).

Embora seja coerente a opinião do jurista, é preciso ter cautela no rigorismo das exigências. Evidentemente, podendo evitá-las, o devedor deve agir para impedi-las, porém, é preciso levar em consideração o grau dessa inevitabilidade e as circunstâncias do caso concreto. Im)possibilidade de aplicar a tese do adimplemento substancial em caso de inadimplência de contratos de financiamento imobiliário Sabe-se que o CC de 2002 acolheu a teoria da imprevisão e da onerosidade excessiva, tanto que Azevedo245, em palestra no seminário realizado pela Câmara Federal dos Deputados, em quatro de junho de 2002, acerca do novo CC, alertou sobre a necessidade de se fazer revisão no teor no art. do CC a fim de eliminar o termo “imprevisíveis”. Nesse passo, encontra-se a efetivação da autonomia da vontade como instrumento norteador do equilíbrio contratual, em que pese o teor do art.

determinar a resolução. Para Zanetti248, a onerosidade excessiva se apresenta de maneira direta e indireta. Na direta, a onerosidade é evidenciada quando existe um evento que provoque a onerosidade excessiva para o contratante, fornecedor da coisa. Na última, a onerosidade excessiva ocorre quando existir desproporção no valor da prestação, devido ao aviltamento do preço base do negócio, ou seja, quando por alguma situação, os valores de custo daquele que fornece reduzirem sem que tal redução seja repassada àquele que deve pagar o valor. O adimplemento substancial foi previsto inicialmente pela Convenção de Viena de 1980 quando esta regulou o comércio internacional. No Brasil decorre da boa-fé objetiva (STJ, 4a Turma, Resp 272. MG. DJ 02-04-2001253. Neste caso, o poder hermenêutico do juiz poderá permear as cláusulas gerais e as definições legais indeterminadas para identificar e definir a função social, a boa-fé objetiva além de definir e verificar o alcance da onerosidade.

AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E NÃO PROVIDO254. APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C REINTEGRAÇÃO DE POSSE – COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – PAGAMENTO DE 84% DO CONTRATO – TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL – RECURSO NÃO-PROVIDO. Mostra-se viável a aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial havendo o cumprimento significativo e expressivo das obrigações assumidas, tendo como propósito principal a preservação do interesse do consumidor contra eventuais abusos por parte do credor, sempre em observância aos princípios da função social e da boa-fé objetiva, não se admitindo, assim, a rescisão do contrato255. RESCISÃO DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - PREÇO - PAGAMENTO - ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - CONFIGURAÇÃO - ENCARGOS DA MORA - AÇÃO PRÓPRIA.

Ocorre o adimplemento substancial, quando a prestação for essencialmente cumprida, estando assim satisfeitos os interesses do credor. Recurso Especial provido257. Nosso entendimento é que estes argumentos não podem prosperar especialmente em se tratando de alienação fiduciária de bens imóveis. Entende-se que a omissão legal referente ao número de parcelas não deve ser interpretada contra o devedor, posto que a boa-fé objetiva é um princípio que sustenta toda a legislação cível brasileira, além de conformar-se à Constituição Federal. Ademais, na maior parte dos contratos de alienação fiduciária fica configurada uma relação de consumo. Nesse sentido, a decisão do STJ contraria o art. O diploma civil apenas se refere à revisão contratual de modo subsidiário, colocando a resolução como primeira opção, demonstrando que os artigos estão claramente desatualizados e em desacordo com a principiologia contratual contemporânea, que defende a conservação dos contratos para perseguir a função social.

A preocupação com os efeitos sociais do contrato é uma realidade, tem-se os princípios atualmente vigentes da boa-fé objetiva, do equilíbrio das prestações, da justiça social, da função dos contratos, todos eles corroboram para noção de conservação dos contratos e com a revisão. Ao abordar a revisão contratual sob o prisma do Direito Contemporâneo, concluiu-se que a teoria da onerosidade excessiva tem aplicação restrita no Direito Comum, na medida em que seus pressupostos são rígidos e de difícil configuração, o que ensejaria alternativa ou causa diversa para se configurar uma revisão contratual. É notório que as noções de contrato e de obrigatoriedade são indissociáveis, sendo instrumentos que ancoram a segurança das relações jurídicas e visam a pacificação social.

Porém, não se pode ignorar que uma relação jurídica contratual, a princípio paritária, possa se tornar desigual sem necessariamente ser caracterizada de excessiva onerosidade. Referente ao contrato de alienação fiduciária, a ocorrência da onerosidade excessiva nestes contratos afeta diretamente a segurança da relação contratual pautada na confiança. Essa confiança deve ser preservada por conta da manutenção do equilíbrio contratual, a fim de evitar lesão, com espeque na garantia da dignidade dos contratantes. Foi visto que a aplicação da teoria do adimplemento substancial em contratos de alienação fiduciária de bens imóveis é prevista expressamente em Portugal, embora no Brasil, sua aplicação seja controversa. Recentemente, o STJ entendeu pela inaplicabilidade da teoria do adimplemento substancial em contratos de alienação fiduciária e embora não se tratasse de um bem imóvel, passou-se a considerar que o mesmo raciocínio deveria ser aplicado aos contratos de alienação fiduciária de bens imóveis.

Nosso entendimento é de que a teoria do adimplemento substancial deve ser aplicada aos contratos de alienação fiduciária e isto não implica, de forma alguma, em incentivo ao inadimplemento das parcelas finais do contrato, tendo em vista que não há perdão da dívida, mas, sim a proibição de uma medida desproporcional e que pode trazer sérios prejuízos ao devedor, atentando contra sua dignidade e de seus familiares ao retirar-lhe o teto sob o qual está abrigado juntamente com seus entes queridos. REFERÊNCIAS ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. ALSINA, Jorge Bustamante. p. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. ed. São Paulo: Malheiros, 2018. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. AZEVEDO, S; ANDRADE, L.

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