EDUCAÇÃO PARA A JUSTIÇA: conscientização dos direitos e deveres básicos do cidadão
Tipo de documento:Artigo cientifíco
Área de estudo:Direito
Palavras-chave: Educação. Justiça. Educação para a justiça. INTRODUÇÃO O Direito é um produto social e racional. É racional porque é criação do homem, ele é o autor e o intérprete da ação. Desta forma, por meio da afirmação dos direitos fundamentais individuais, sociais e políticos, orientados a partir da axiologia da dignidade da pessoa humana, conserva as conquistas incorporadas ao patrimônio da humanidade, e simultaneamente, realiza a positivação de valores e princípios, sociais, democráticos e econômicos, como objetivos na construção de uma sociedade pluralista e inclusiva. No que tange ao direito à educação, há ampla delimitação do direito, da obrigação do Estado, da política educacional a ser desenvolvida, do financiamento do ensino, da educação obrigatória, da expansão do ensino, do compromisso com a oferta qualitativa do ensino e da responsabilidade solidária da sociedade.
A regulamentação deste direito encontra-se por vários capítulos no texto constitucional. Assim, o direito à educação é definido como um direito social, “de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,” destinando-se ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. A concretização social deste direito advém da natureza conferida a ele pela constituição, qual seja, a de direito público subjetivo. É importante ainda pontuar que, dentro da obrigação legislativa do Estado, por meio da União, em competência exclusiva, houve a determinação constitucional da definição dos conteúdos mínimos para o ensino fundamental1, assegurando formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.
Este posicionamento constitucional coloca-se pela primeira vez no texto constitucional. E, atualmente, materializa-se através dos Parâmetros Curriculares Nacionais, abrangendo toda a educação básica. No que se refere ao financiamento do ensino, há determinação de percentuais fixos mínimos a serem aplicados pela União (18%), Estados e municípios (25%), da receita resultante de impostos proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino. Isto para assegurar o atendimento das necessidades do ensino obrigatório no que tange a universalização, garantia de padrão de qualidade e equidade (KANG, 2011). º da LC 80/94 apresenta-se, a nosso ver, como baliza primeira a orientar a atuação da Defensoria Pública. Afinal, para que o sujeito possa ascender à condição de cidadão, não basta que saiba da existência de direitos em abstração, recebendo-os como favores outorgados, em estado de alienação quanto à sua importância nos mecanismos de construção democrática.
Ou seja, para reconhecer como seus os direitos previstos no ordenamento jurídico e deles se apropriar com autonomia para gerir suas relações, o sujeito deve conscientizar-se de seu papel na sociedade que integra, de sua capacidade de transformar a realidade e o mundo em que se insere. Ocorre que isso não é tarefa fácil, considerando-se que o assistencialismo paternalista ainda dita a tônica da forma de se fazer política no Brasil, em clara manobra de conservação do status quo. Nosso passado de colônia atualiza-se em uma mentalidade colonizada, incutida nas massas desfavorecidas a partir de uma estratégica mobilização política das elites que, em nossa história, sempre conseguiram se antecipar e suprimir os levantes populares contra o poder estabelecido. De um modo geral, pode-se afirmar que o próprio Brasil ainda não se emancipou da condição de colônia, na medida em que a pauta política, econômica e mesmo a produção de conhecimento sempre se ajustam em função daquilo que pensam e do Brasil esperam os ditos países desenvolvidos, tendo por referência as verdades lá proclamadas.
Fato é que, de acordo com Faoro (2001), em grande medida, o brasileiro ainda se porta como colonizados diante daqueles países que, por qualquer razão, projetou como superiores, os colonizadores, portanto, cujos costumes e valores são pelo povo do Brasil, prontamente absorvidos e adotados como verdades perfeitas, padrões a serem seguidos sem necessidade de reflexão. Um bom exemplo do que se acaba de afirmar pode inclusive ser extraído da forma alienada de produzir Direito, com o que se salienta o histórico – embora marcadamente irrefletido – gosto pelo que é alheio, tanto no que diz respeito às leis que são importadas para regular as condutas do povo brasileiro, quanto no que concerne à preferência por referenciais estrangeiros para as construções teóricas nacionais. Ou seja, justamente na produção jurídica, que deveria ser expressão máxima da autonomia, insiste-se ainda na submissão e dependência de padrões alheios de comportamento e pensamento (heteronomia), tratando-se, a importação de leis e políticas, de antigo costume brasileiro, já descrito e denunciado por pensadores da envergadura de Sérgio Buarque de Holanda (1995) e Raymundo Faoro (2001).
Como se pode verificar, as dinâmicas que se pretende analisar têm por base a articulação em oposição das palavras alienação x conscientização, heteronomia x autonomia, muito bem trabalhada por Castoriadis (1982) em sua obra “A instituição imaginária da sociedade”. O Eu da autonomia não é Si absoluto, mônada que limpa e lustra sua superfície êxtero-interna a fim de eliminar as impurezas trazidas pelo contato com o outro; é a instância ativa e lúcida que reorganiza constantemente os conteúdos utilizando-se desses mesmos conteúdos, que produz com um material e em função de necessidades e idéias elas próprias compostas do que ela já encontrou antes e do que ela própria produziu. Portanto, não se pode tratar dentro dessa relação também de eliminação total do discurso do outro – não somente por ser uma tarefa interminável, mas porque o outro está presente na atividade que o “elimina”.
E eis por que não pode também existir “verdade própria” do sujeito num sentido absoluto. A verdade própria do sujeito é sempre participação a uma verdade que o ultrapassa, que se enraíza finalmente na sociedade e na história, mesmo quando o sujeito realiza sua autonomia (CASTORIADIS, 1982, p. Essa inafastabilidade da alteridade – enfim, do que seja outro no eu ou em nós –, entretanto, não pode representar uma blindagem a impedir que os valores que pautam pensamentos, condutas e escolhas sejam submetidos a uma constante atualização pela reflexão crítica, capaz de, no mínimo, viabilizar o (re)dimensionamento de sua importância (dos valores) e o acesso à sua origem (COSTA; GODOY, 2014). O até aqui exposto, portanto, é suficiente à conclusão no sentido de que a dinâmica da opressão é relacional.
Disso se deduz que não há dominador sem dominado e vice-versa, os pólos afirmando-se enquanto contrários, um simbolizando a positividade face à negatividade do outro. Daí a constatação de uma dependência do opressor (colonizador, dirigente) em relação ao oprimido (colonizado, dirigido), na medida em que a superioridade daquele só existe diante da inferioridade deste, verdadeiro espelho confirmador de sua existência, ao menos enquanto não se conscientizar que suas posturas, pensamentos e escolhas são regidas pelo discurso do outro (heteronomia) e não pelo seu próprio (autonomia) (Costa; Godoy, 2014). Eis o ponto. Está-se diante de opostos que dialogam justamente porque aderem a uma linguagem que lhes é comum, a qual constitui o meio em que circulam os símbolos de superioridade e inferioridade que partilham entre si, permitindo a identificação e diferenciação dos comunicantes.
Embora seja possível imaginar que: [. a associação desses mecanismos de dominação seja intuída pelas massas dirigidas, certo é que, para transformarem essa dinâmica, se faz necessário que tomem consciência de sua situação e realidade políticas, o que pressupõe conhecê-las objetivamente, compreendendo-as em termos históricos. Trata-se, aqui, do processo de conscientização, findo o qual os sujeitos podem afirmar-se cidadãos, apropriando-se do instrumental jurídico – e político – disponível para se autorregerem (autonomia) e transformarem sua realidade subjetiva e social (COSTA; GODOY, 2014, p. Tem-se, desta forma, que o conhecimento e o entendimento por parte das massas dirigidas no que diz respeito à sua realidade histórica, possibilidades e papéis desempenhados nas relações de poder, ou seja, de sua conscientização jurídica e política são pressupostos para a conquista da autonomia e cidadania.
Eis as bases de uma revolução possível e pacífica, que encontra solo fértil na própria Constituição Federal de 1988 e no instrumental jurídico que põe à disposição do cidadão para que coloque em movimento seus processos revolucionários, transformando o sistema de dentro de suas próprias tramas, de modo que sua insurreição não termine por convalidar a ordem contra a qual se rebela, como só acontecer, em dinâmicas perversas das quais melhor se cuidará mais adiante neste trabalho. Ou seja, para o referido autor, “a desigualdade do sistema de classes pode ser aceitável desde que a igualdade da cidadania seja reconhecida” (MARSHALL, 1967, p. Assim, para fins desse trabalho, o pressuposto da cidadania é essencialmente político e social, ainda que respaldado pelo Direito; ou seja, há de envolver o Estado, mas também a sociedade civil.
Como destaca Bello, [. deve-se ter como referência uma perspectiva ampla da política democrática, e não a restritiva e elitista da economia de mercado, de maneira a se conjugarem as atividades políticas dos cidadãos com a elaboração e implementação de políticas sociais pelo Estado e pela sociedade civil, tendo-se claro o processo atual de redefinição das relações entre esses sujeitos (BELLO, 2013, p. Apresenta-se a cidadania, portanto, em relação ao sujeito, mais por um agir consciente e político do que por um mero status atribuído pelo ordenamento jurídico. Noutros termos, o caminho ainda é longo até que nossa população possa, mais amplamente, alcançar o que Holston (2013) denomina cidadania insurgente, que implica a apropriação e uso subversivos do Direito, de modo que, assim, se torne instrumento de consolidação de conquistas – e não de favores – e acesso à igualdade.
Possíveis alternativas Acredita-se que uma possibilidade para formar cidadãos seja o trabalho com matérias propedêuticas no ensino fundamental e médio. Recorde-se que as escolas públicas, nas décadas de 80 e 90 tinham em sua grade curricular as disciplinas Organização Social e Política Brasileira – OSPB e educação Moral e Cívica, matérias estas que pouco a pouco foram excluídas do currículo dando espaço a disciplinas que visam formar para o mercado de trabalho e para tornar o aluno competitivo o bastante para conseguir uma vaga na universidade. A escola deixou de investir na formação de cidadãos para formar indivíduos aptos a competir por uma vaga na universidade ou no mercado de trabalho. Ao contrário do que se observa, por exemplo, nos Estados Unidos, o brasileiro não conhece a Constituição Federal; não conhece, portanto, seu direitos e deveres e este gap só pode ser reduzido investindo-se em educação em direitos.
Ademais, entende-se que a educação é um dos grandes instrumentos na difusão da ideia de Direitos Humanos e como consequência, observa-se que eles são ensinados, podem ser aprendidos, podem ser modificados, manipulados visto serem uma criação do homem. CONCLUSÃO Não há dúvidas de que o Direito é um produto cultural, produzido pelo homem. Assim, ao modificar o meio em que vive ajusta o direito a esta nova realidade para viabilizar a convivência. Esta constatação por si só já basta para afirmar que ao se falar em Direitos Fundamentais ou em Direitos Humanos, ambos são criação do homem, logo, moldados para a realidade em que se vive. A educação, como um processo que envolve o ser humano como um todo tem função fundamental na preparação, propagação e inculcação de novas ideias, por isso ser ela, ao direcionar o seu conteúdo para este ou aquele sentido a responsável pela afirmação do status quo.
Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadorias. Disponível em: <www. abmes. org. br/abmes/legislacoes/ visualizar/id/1226>. Acesso em: 20 jun. CURY, Carlos Roberto Jamil. Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. In: VEIGA, Cynthia Greive. Org. Carlos Roberto Jamil Cury, intelectual e educador. In: MIGUEL, Paula Castello; OLIVEIRA; Juliana Ferrari de (Orgs. Estratégias Pedagógicas Inovadoras no Ensino Jurídico. São Paulo: Lumes Iuris, 2012. p. FREIRE, Paulo. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. HOLSTON, James. Cidadania insurgente: disjunções da democracia e da modernidade no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. KANG, Thomas H. Rio de Janei-ro: Zahar Editores, 1967. MEMMI, Albert.
Retrato do colonizado precedido pelo retrato do colonizador. São Paulo: Paz e Terra, 1967. MORANDO, Dante.
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