ASPECTOS TÉCNICOS DA PSICOTERAPIA DE GRUPO

Tipo de documento:Projeto de Pesquisa

Área de estudo:Psicologia

Documento 1

O caráter dinâmico da interação constitui, por assim dizer, a infra-estrutura do grupo a partir da qual se forma nova estrutura — a sueperestrutura — que é a configuração do grupo. Esta configuração seria sempre a mesma se os componentes possuíssem caracteres invariáveis e reações imutáveis. Na realidade há polimorfismo caracteriológico nas diferentes personalidades que compõem o grupo, disso resultando que a superestrutura é variável e continuamente mutável. Assim, o estudo de um grupo deve visar dois fatôres: 1) o interno, isto é, os indivíduos em interação; 2) o externo, resultante do primeiro e cuja configuração é unitária, apresentando individualidade própria. Êste postulado se confirma pelos trabalhos terapêuticos, em que se evidenciam claramente as reações globais do grupo e que conduzem a uma configuração específica, variável de momento a momento.

Pressupomos no grupo também a coexistência de dois aspectos: 1) o interno, profundo, caracterizado pela interação; 2) o externo, superficial, resultante do dinamismo interior. A interação do grupo assume, às vêzes, modalidade afetiva (de colorido agressivo, de amor ou de mêdo). Nosso objetivo é reconhecer o caráter individual do grupo. Compreende-se melhor esta formulação através de pontos de semelhança e de contactos resultantes dos estudos feitos sôbre a personalidade isolada. Estudando a criança descreveu Watson três tipos de reações emocionais primárias (a reação catastrófica identificada com o mêdo, a reação agressiva e a reação amorosa), que são verificáveis tôdas no recém-nascido e que representam as formas emocionais instintivas elementares da personalidade.

Já o matiz amoroso se faz sentir quando o contacto da dependência está perfeitamente entrosado. De forma geral, o bom ou mau funcionamento da dependência originária, respectivamente, os sentimentos de amor ou de hostilidade. Concluímos daí que, hieràrquicamente, a dependência estaria num primeiro plano, subordinando-se a ela as outras modalidades afetivas. Segundo Foulkes , a essência da terapêutica de grupo permite uma revisão da neurose infantil do paciente e sua elaboração na última manifestação da neurose, na situação transferencial; portanto, se os contactos provocam reações evocadoras e representativas de situações não solucionadas, é evidente que as interações num grupo onde existam pessoas neuróticas, com distúrbios de caráter, terão aspectos que representarão o retrato fiel da imaturidade do paciente.

Constituindo-se a interação, portanto, como o elemento dinâmico primordial num grupo, torna-se possível utilizá-la para fins terapêuticos. Assim teremos grupos homogêneos, mistos, de adultos, de adolescentes e de crianças, ou então, de acôrdo com os sintomas apresentados, grupos de psicóticos ou de neuróticos. A escolha que um terapeuta faz do tipo de grupo no qual opera e do número de cpmponentes, reside numa preferência pessoal e na sua capacidade de lidar com êle. Moreno diz que "uma determinante importante quanto ao número, reside na expansividade emocional, ou seja, o número de pacientes que podemos fazer funcionar terapêuticamente. N o vos membros poderão ser introduzidos no grupo na base do poder de absorção do mesmo sem perder a produtividade terapêutica".

Aspectos transferenciais — Quando a interação assume o caráter específico de uma relação neurótica, independente da situação terapêutica, toma o nome de distorção paratáxica (Sullivan); será relação transferenciai, quando se manifesta no âmbito terapêutico. Constituímos um grupo atuante no psicodrama (5 elementos), escolhidos de acôrdo com seus problemas comuns; ainda assim, no subgrupo escolhido para a representação apareceu um sentimento de hostilidade para com a paciente que iria desfrutar de maior atenção em virtude de ser o personagem central do psicodrama. Pareceu-nos que o sentimento agressivo para com a paciente que desempenhava o papel principal visava aniquilá-la e eliminá-la, restabelecendo a igualdade no grupo. Episódios como êsses são observados freqüentemente. A Bíblia nos relata um fato que se identifica com o que observamos: trata-se da situação ocorrida com José e seus irmãos na qual a preferência do pai por José provocou um sentimento de hostilidade nos irmãos que, reunidos em grupo, tomaram uma atitude agressiva, vendendo o irmão, eliminando, assim, o elemento provocador.

Do mesmo modo notamos que os elementos restantes do pavilhão, por sua vez, começaram a hostilizar o grupo escolhido para a representação; êste revidou, congregando-se e reagindo à agressão. Analisando esta atitude sob a luz transferenciai, podemos considerar o terapeuta como um símbolo que gratificava, trazendo a si os componentes bons do grupo que melhoravam; os outros, com o intuito de tentarem obter a mesma gratificação e aceitação, procuravam colaborar na cura, criando uma vivência otimista favorecedora. A base fundamental dêsse processo estaria na gratificação infantil regressiva, sem contudo eliminá-la. Podemos também compreender pelo dinamismo transferenciai, o método no qual o terapeuta procura fazer uso de sua personalidade para influenciar um grupo cujo ego é fraco, incapaz de solucionar os seus conflitos e dar soluções adequadas aos seus problemas.

Assim, o terapeuta, mediante processo de identificação estará ampliando as fronteiras do ego do grupo que se vê identificado com a figura do líder. Isto constitui para alguns (Wender), o princípio da miragem: diante dos olhos do faminto, cansado e desapontado, deparam-se visões de abundância, segurança e bem-estar. Esta cisão de dois pólos emocionais opostos em relação a uma figura padrão, projetados sôbre dois pacientes diferentes, permitem maior compreensão dos fenômenos afetivos que ocorrem no grupo. Diferença entre a terapia individual e a de grupo — Há diferença acentuada entre as situações criadas na terapia de grupo e na terapia individual. Nesta, o paciente possui o terapeuta só para si, não tendo necessidade de compartilhar com outro essa posse.

N o grupo a situação se modifica, sentindo cada paciente que o terapeuta não é só dêle, vendo-se coagido a compartilhar com os outros algo que gostaria fôsse de sua exclusividade. Uma nova carga emocional entra em ação: a necessidade de disputar a atenção e o amor do terapeuta que deve compreender a atitude e a situação emocional criada, pois os componentes do grupo têm maior possibilidade de reviver situações penosas ou traumáticas, em virtude da situação competitiva, criando-se uma resistência que poderá culminar com o abandono do grupo por lhe ser insuportável resistir a situação. Constitui-se assim o fenômeno contra-transferencial. É pràticamente impossível deixar de existir essa modalidade transferenciai, pois a diversidade dos componentes do grupo, com características pessoais variáveis, torna o terapêuta mais vulnerável a contra-transferir.

A contra-transferência pode ser considerada sob um prisma construtivo (positivo) e, para tanto, no estudo que realizamos após cada sessão, três itens são pesquisados: 1) vivências sentidas pelo observador ou pelo terapeuta; 2) impressões causadas pela sessão; 3) interações observadas nos diferentes componentes do grupo (incluindo o terapeuta e os observadores). Desta forma conseguimos surpreender, tanto no terapeuta como nos observadores, reações contra-transferenciais das quais nos servimos para melhor compreensão das emoções vivenciadas. Recentemente, uma observadora nos chamou a atenção para o fato de chamarmos um dos componentes do grupo de "você" e outro de "senhor". Pela visão da vivência atual, de uma situação passada, a apreciação se efetua em vários planos. O impacto situacional permite maior indução, possibilitando a outros pacientes se identificarem e associarem com situações e modalidades afetivas idênticas, abrindo caminhos a possíveis rememorações.

Temos observado que, no grupo, o tono emocional é maior do que na psicoterapia individual, criando situações tensionais mais opressivas e mais intensas. Êste fato talvez possa ser explicado pelo que os sociólogos chamam de "reação circular" que se passa na área dos sentimentos e das emoções; à medida que atua, tende a intensificar os sentimentos e emoções das pessoas por êle abrangidas. Assim, as expectativas do paciente A provocam certas formas de comportamento em B, as expectativas de Β provocam cer­ tas formas de comportamento em A; portanto, ao presenciar a reação de Β, A é novamente estimulado; assim A age e Β responde-lhe. O próprio clima de grupo serve, portanto, como teste de sua maturidade. A Psicoterapia de Grupo está ainda em fase inicial. Freqüentemente sua eficiência é comparada com a da Psicoterapia Individual.

Pensamos que estas duas formas de terapêutica não se opõem e sim que elas se integram. As conquistas de uma se aplicam à outra. Segundo o autor, a Psicoterapia de Grupo e a Psicoterapia Individual não se opõem, mas se completam. SUMMARY Technical aspects of group psychotherapy. The author studies the mechanisms concerned to the human grouping and their uses for therapeutic purposes, stressing that the phenomenon of interaction is the basic dynamism in the group reactions. Parallels are traced between the author's ideas and Bion's point of view; a comparative study is also made of Moreno, Bion and Sullivan's ideas. The author suggests that the feelings of love and hostility appear in connection with the good or bad functioning of the primary contact, which characterizes the dependence.

e WILLENS, E. — Leituras Sociológicas. Edições da Revista de Sociologia, São Paulo, 1940. BEUKEMKAMP, C. — The multidimensional orientation in analytic group therapy. BION, W. R. — Group Dynamics: A Review; New Directions in Psycho-analysis. Tavistock Publications Ltd. Londres, 1955. J. Psychoanalysis, 1:263, 1954. FREUD, S. — Psicologia de las Masas, trad, castelhana. Editorial Biblioteca Nueva, Madrid, 1948. MORENO, J. L. — Progress in Psychotherapy. Grune & Stratton, Nova York, 1956. M U L L A N , H. R. — An Introduction to Group Therapy. The Commonwealth Foundation, Nova York, 1943. THOMPSON, C. — Sullivan and Fromm. Psychotherapy, 2:381, 1951. Rua 7 de Abril, 404, 11º andar — São Paulo, Brasil.

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