Abolição do Crime de Desacato a Autoridade
Tipo de documento:Artigo cientifíco
Área de estudo:Direito
Palavras-chave: Desacato; Descriminalização; Superior Tribunal de Justiça; Controle de Convencionalidade. ABSTRACT The present work proposes to analyze the recent decision of the Superior Justice Tribunal on the decriminalization of the crime of contempt, provided for in article 331 of the Brazilian Penal Code, in a decision of the Fifth Panel of the said Court. Starting from the discussion of its legal grounds and provision, it is analyzed the way in which the doctrine foresees the occurrence of contempt, in order to analyze the validity of the decision, the grounds on which STJ is based, and the possible abolition of that decision. Crime in the concrete case. In order to do this, it seeks to review the literature on the subject, using as a source of data collection the most relevant books, articles and jurisprudences produced on the topic, seeking to evaluate the more general literature.
Para outros, no entanto, ela atrai críticas severas, pois consideram que descriminalizar tal conduta é uma maneira de negar o anterior tratamento dado acerca desse assunto pela jurisprudência e pela doutrina que, até então, consideraram que a figura penal do desacato não prejudica a liberdade de expressão, pois não impede o cidadão de se manifestar, desde que o faça nos parâmetros da lei. Diante disso, nota-se que há dois posicionamentos referentes à decisão do STJ. A presente pesquisa, portanto, por meio de uma revisão de literatura, objetiva analisar os efeitos da decisão do STJ sobre a descriminalização do desacato, com especial enfoque nas jurisprudências que dispõem acerca do tema, bem como pretende discutir ambas as posições que tratam da validade ou não dessa decisão.
A resposta à primeira crítica destaca que seu fundamento é a adequação ao que dispõe a CADH. A resposta à segunda crítica destaca que o conceito de desacato não vai de encontro ao referido tratado internacional. Em Roma, no período republicano, as penas perderam o caráter purificador, tornando possível que, em vez de o infrator cumprir a sanção, um escravo o fizesse em seu lugar, desde que a vítima concordasse. Tal forma de punição evidencia o caráter de prevenir que infrações fossem cometidas. Já no período imperial, a aplicação da sanção possuía um caráter intimador, uma vez que a pena de morte e o trabalho forçado eram as sanções aplicadas. Em relação ao crime de desacato, acredita-se que ele tenha surgido no Direito antigo e no Direito Romano, intulado de iniuria atrox.
A conduta visava, de forma prioritária, zelar pelo respeito aos magistrados, cerceando as ações e ofensas proferidas em desfavor deles. p. Considerando o conceito supracitado, enquandram-se como funcionários públicos apenas os que possuem cargos públicos na Administração Direta, o que exclui os os agentes honoríficos - que prestam serviços ao Estado, em carater temporário, e normalmente sem remuneração -, e os agentes delegados – pessoas incumidas de exercer alguma atividade sob as normas do Estado. Entretanto, para o Código Penal, o conceito de funcionário público é mais abrangente, na medida em que dispõe, no artigo 227, que Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal. § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. Um policial, prestando depoimento, pode desacatar o juiz, enquanto este pode desacatar o colega, em igual situação. Pode, ainda, o delegado desacatar o investigador de polícia. p. Outro fator a ser analisado é a forma como ocorre o desacato. De acordo com Greco (2017), “Para que ocorra o delito de desacato, faz-se necessária a presença do funcionário público, não se exigindo, contudo, que seja a ofensa proferida face a face, bastando que, de alguma forma, possa escutá-la”.
No caso, a Comissão IDH manifestou-se no sentido de que o crime de desacato é incompatível com a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, uma vez que utiliza-se dele como um instrumento para silenciar ideias e opiniões impopulares, reprimindo assim o debate crítico necessário ao pleno funcionamento das instituições democráticas. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em 1995, emitiu um informe intitulado Informe sobre la compatibilidade entre las leyes de desacato y la Convención Americana sobre los Derechos Humanos, no qual dispôs que as leis de desacato violam o disposto no art. da CADH. O Chile, por sua vez, descriminalizou o descato em 2005. Na ocasião, a CIDH manifestou-se afirmando que é competência dos Estados garantir a convencionaidade das leis com as disposiões da Convenção.
Doravante, não somente os tribunais internacionais (ou supranacionais) devem realizar esse tipo de controle, mas também os tribunais internos. O fato de serem os tratados internacionais (notadamente os de direitos humanos) imediatamente aplicáveis no âmbito do direito doméstico, garante a legitimidade dos controles de convencionalidade e de supralegalidade das leis no Brasil. pp. Assim sendo, quanto ao controle de convencionalidade realizado internamente, os tratados internacionais de direitos humanos podem ser utilizados como preceito para o controle de convencionalidade. Além disso, tal controle deve ser feito por juízes e órgãos vinculados à administração da justiça em todos os níveis. Ainda é direito dos estados-membros, legislar visando tornar efetivos os direitos e liberdades de expressão. Seguindo o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em dezembro de 2008, no Recurso Extraordinário nº 466.
SP, em que decidiu que tratados de direitos humanos do qual o Brasil é signatário, no que concerne ao Direito interno, ocupam o status da supralegalidade no país, estando abaixo da Constituição e acima das leis. O Pacto San José de Costa Rica possui status de norma supralegal. Conforme Gilmar Ferreira Mendes, ministro que votou nos autos do recurso, o endendimento do STF é de que Portanto, diante do inequívoco caráter especial dos tratados internacionais que cuidam da proteção dos direitos humanos, não é difícil entender que a sua internalização no ordenamento jurídico, por meio do procedimento de ratificação previsto na Constituição, tem o condão de paralisar a eficácia jurídica de toda e qualquer disciplina normativa infraconstitucional com ela conflitante.
Às normas da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, portanto, aplica-se o controle de convecionaidade, tendo em vista ter caráter supralegal. Nesse sentido, além de compatível com a Constituição Federal, as leis nacionais têm de estar também com a CIDH. Para Ramos (2013), no caso do Brasil, a adesão a tratados que versam sobre direitos humanos pode evidenciar um caráter de busca de reconhecimento político em âmbito internacional, bem como suprimir a fama opressora de violação aos direitos humanos obtida no período da ditadura. Contudo, para ele também existem outros pontos que justificam a ratificação desses tratados, como, dentre outros, o histórico de miserabilidade social e a crise de emprego; fatores que deixam claro o desrespeito aos direitos humanos.
Assim, a adesão não seria mais do que uma forma de buscar a mudança, ou pelo menos firmar um compromisso em realizar tal feito. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência. Conforme se pode depreender desse artigo, criminalizar o desacato é uma forma de coibir a liberdade de pensamento ou de expressão do indivíduo, pois impede que ele se manifeste diante de situações adversas.
Além disso, é importante destacar a tentativa dessa norma buscar defender a liberdade do cidadão de procurar, receber e difundir informações, uma vez que o desacato pode surgir a partir da não conformidade com a atitude do funcionário público em não querer, seja por motivo legal ou não, divulgar uma informação. Frisa-se também o fato de a CIDH prever que não pode haver censura prévia a esse direito. do Código Penal. Na decisão da Quinta Turma do Supremo Tribunal Federal, que descriminalizou o desacato, uma das fundamentações é que a condenação por desacato, baseada em lei federal, é incompatível com o tratado do qual o Brasil é signatário. Dessa forma, o STJ considerou se tratar de inconvencionalidade o art.
do Código Penal. PARECER DA DECISÃO No caso em que o STJ descriminalizou a conduta de desacato, foi julgado, após recurso especial do Ministério Público de São Paulo, um homem havia sido condenado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) à pena de cinco anos, cinco meses e dez dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de doze dias-multa, pela prática do crime do art. Além disso, fundamentou que o Pacto de San José da Costa Rica não é incompatível com o crime de desacato, pois a garantia da liberdade de expressão e pensamento não autoriza ofensa gratuita dirigidas a servidores públicos e, por fim, que a previsão do delito de desacato insere-se em hipótese de responsabilidade ulterior pela ocorrência das violações mencionadas no item 2 do art.
da Convenção, o que não a caracteriza como uma prévia censura. O STJ, no entanto, no julgamento do recurso especial entendeu que os tratados de direitos humanos, ratificados pelo país, têm força supralegal, o que significa dizer que toda lei antagônica às normas emanadas de tratados internacionais sobre direitos humanos é destituída de validade. Assim, estaria o crime de desacato incompatível com o artigo 13 da CADH. Utilizando-se ainda da lição de Marinoni (2013), que afirma que "O exercício do controle de convencionalidade é um dever do juiz nacional, podendo ser feito a requerimento da parte ou mesmo de ofício" o STJ entendeu ser necessário a aplicação do controle de convencionalidade no deleito de desacato. A decisão destaca ainda que penalizar por proferir palavras e por condutas possam ofender os agentes públicos torna o direito de liberdade de expressão restrito, visto que desestimula as pessoas a expor o que pensam por medo de serem condenadas penalmente.
Interessante a consideração da Corte dos Estados Unidos frente à conduta que poderia ser considerada desacato. Conforme é justifica o parecer da decisão: A Suprema Corte dos Estados Unidos desenvolveu, a partir do caso Chaplinsky v. New Hampshire (1942), o entendimento de que o right of free speech (Primeira Emenda) não protegeria a utilização de palavras que incitassem à quebra imediata da paz social (fighting words doctrine). Entretanto, em casos posteriores, tendo como paradigma o precedente firmado em Lewis v. Ademais, o desacato pode ser praticado também por funcionário público, e não apenas pelo particular. Argumento mais razoável seria a necessidade de manter a pena do crime de ofensa à funcionário público maior do que à da ofensa ao particular, porém razoável (não tão discrepante).
Mas aí a questão se resolve na suposta afronta o à liberdade de expressão, mas na violação à proporcionalidade. Assim, não seria justificável descriminalizar o desacato por ele representar afronta à liberdade de expressão e manifestação do pensamento, tendo em vista que, caso o funcionário público se manifeste no sentido de suprimir os direitos de outrem, ele seria condenado conforme a previsão no Código Penal. Em comparação com o crime de injúria, no qual é possível deixar de aplicar a pena caso o ofendido tenha, de forma reprovável, provocado a injúria, ou no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria; no desacato, é possível a aplicação dessa mesma regra. Já em 2015, o deputado federal Jean Wyllys apresentou o PL n° 602/2015 com o objetivo de extinguir o crime de desacato e estabelecer o abuso de autoridade como um ato de improbidade administrativa.
A saída proposta seria a incorporação nos ordenamentos penais de uma excludente de aplicação da pena para os casos em que o sujeito passivo fosse um funcionário ou uma figura pública, bem como nos casos em que o particular ofendido estivesse envolvido em assunto de interesse público. Diante dessa tendência à descriminalização do desacato, é necessário avaliar a possibilidade da abolitio criminis. Para Greco (2017) “a ocorrência da abolitio criminis conduz à chamada descriminalização, ou seja, o fato que anteriormente era considerado como uma infração penal passa a ser considerado como um indiferente penal. ” Nesse sentido, uma das possíveis saídas seria a exclusão da penalidade quando o sujeito passivo for funcionário público, uma vez que é sobre esse ponto que reside o crime de desacato.
Por fim, analisou também como o crime, na prática, torna-se mecanismo para o Estado se sobrepor a sociedade, cerceando o direito constitucional da liberdade e, consequentemente, sendo fonte de hierarquização social. Entretanto, foi analisada também as posições contrárias à decisão de descriminalização do desacato, as quais defendem que ele é um instrumento de tutela jurídica que visa ao adequado funcionamento da administração pública. Nesse sentido, pode-se concluir que é inegável que o tipo penal de desacato é incompatível com o disposto na CADH. A decisão do STJ, dessa maneira, acaba por ser um importante passo para a abolição do crime na seara penal, uma vez que é incoerente a sua manutenção quando o Brasil é, concomitantemente, signatário do Pacto de San José da Costa Rica.
Um país deve desenvolver sua legislação em harmonia com todos os preceitos a que adere, infringir uma norma a qual deveria respeitar pode ser a forma de revelar a dominação de interesses de determinados grupos sociais. Disponível em: <http://www. stj. jus. br/static_files/STJ/Midias/arquivos/Noticias/RECURSO%20ESPECIAL%20N%C2%BA%201640084. pdf>. Constituição Federal. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: < http://www. planalto. gov. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. ª ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, v. p. RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos. ª ed.
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