A Banalização do Dolo Eventual

Tipo de documento:Monografia

Área de estudo:Direito

Documento 1

Examinador NOTA FINAL ____________________ Dedico esta monografia primeiramente a Deus, pelo dom da vida, aos meus pais, à minha irmã e à minha namorada, pessoas estas que sempre me apoiaram. AGRADECIMENTOS Agradeço muito a Deus por mais uma vitória em minha vida, por ter me dado saúde e inteligência para concretização desse sonho. Aos meus pais Mohamed Bashir e Rocio que tanto amo e que me apoiaram nessa caminhada, pois eles são minha base e sem eles nada seria. À minha irmã Mariam que me incentivou nos momentos difíceis. À minha namorada Raissa que me ajudou da maneira que pôde e sempre me apoiou de forma incondicional. Palavras-chave: Dolo. Culpa. Banalização. Dolo eventual. Culpa consciente. Conscious guilt. Sumário 1 introdução 9 2 DOLO 10 2. CONCEITO E TEORIAS DO DOLO 10 2.

ESPÉCIES DE DOLO 15 2. Dolo direto ou imediato 15 2. Caso Rafael Mascarenhas 56 Caso Thor Batista 57 5. Motorista que atropelou 12 pessoas na Raposo Tavares é solto 57 6 DOUTRINA 60 6. DIVERGÊNCIA NA CONCEITUAÇÃO ENTRE DIFERENTES DOUTRINADORES 60 7 Conclusão 63 Referências 65 1 introdução Estado Democrático de Direito, este é a definição de nosso Estado brasileiro e, exatamente por ela, deve-se haver, também, os Direitos Penal e Processual Penal democráticos, ou seja, justos, onde seja garantido todos os direitos, como a dignidade da pessoa humana e o devido processo legal. A grande discussão que vem há algum tempo atormentando a sociedade e o Direito Penal, acerca da devida aplicação do dolo eventual ou culpa consciente em alguns delitos, tem se tornando cada vez maior. No presente trabalho iremos abordar essa complexa questão, porém, antes de adentrar nesta discussão, devemos expor alguns conceitos importantes relativos à questão trabalhada.

o crime é doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”. Em outras palavras, significa afirmar que o dolo é a vontade e consciência do indivíduo de realizar os elementos inseridos no tipo legal. A primeira, o autor deve abranger todos os elementos do tipo, prevendo os dados importantes dos elementos típicos e futuros, especialmente o resultado e processo causal. Já o segundo, significa tomar a atitude da ação típica, estendendo-se a todos os elementos objetivos sabidos pelo autor que servem de base à sua decisão em praticá-la. Segundo Fernando Capez (2003 apud CALLEGARO, 2012, p. Nesse sentido Bittencourt (2003)4 ensina que a “vontade é a essência do dolo, aqui o agente não visa a violação da lei, mas sim a realização de determinada conduta e a obtenção de seu resultado”.

Bittencourt (2003) não descarta a representação consciente do fato, já que indispensável, todavia, dá maior ênfase à vontade do agente em causar o resultado. Esta teoria descreve o dolo direto, no qual age dolosamente aquele que, de forma direta, quer a produção do resultado. É a vontade livre e consciente de querer praticar a infração penal. Para existir a configuração do dolo, os que defendem está teoria afirmam que é necessária a presença de dois requisitos: 1º) O agente deve conhecer os atos e sua significação; 2º) Representação e vontade, ou seja, o agente estar disposto a produzir o resultado. MIRABETE leciona que “existe dolo simplesmente quando o agente consente em causar o resultado ao praticar a conduta6”. Esta teoria explica que para existir a configuração do dolo é necessário que o agente faça a previsão do resultado, sem que se exija que o agente queira produzi-lo, ou seja, o dolo existe com o simples consentimento do agente de causar o resultado ao praticar a conduta.

O Código Penal Brasileiro (BRASIL, 1940) adotou a Teoria da Vontade quanto ao dolo direto e a Teoria do Assentimento para o dolo eventual. Uma terceira teoria, conhecida por Teoria da Representação defende que existirá mesmo que haja apenas uma previsão das chances de ocorrência de um fato danoso, de modo que, mesmo com essa previsão o agente insista em manter sua conduta. Tal teoria diverge da teoria do assentimento, pois nesta não se fala no agir indiferente do agente, ante os possíveis danos de sua conduta, ou mesmo, se acreditava em sua inocorrência. Assim, se matematicamente for comprovada que a conduta adotada por um agente tem maiores chances de ocasionar um resultado danoso, sempre que um agente a praticar e obtiver o mesmo resultado, terá agido com dolo, independente do chamado elemento volitivo entendido como, o juízo de aceitação, ou não, do resultado da conduta praticada pelo agente no momento em que realiza a conduta9.

O Código Penal adota a Teoria Finalista da Ação, cujo principal escopo é o preceito de que toda conduta humana tem uma finalidade, de modo, que “não se concebe vontade de nada ou para nada, e sim dirigida a um fim. A conduta realiza-se mediante a manifestação da vontade dirigida a um fim10”. O dolo então, existirá no momento que, o agente tiver a intenção de realizar determinada conduta. O professor Seixa SANTOS leciona: A votuntae scelerata (vontade criminosa), a voluntas necendi (vontade de prejudicar), enfim, a vontade é sempre uma faculdade de querer, quer contra a lei penal, quer criminosamente. Enfim, a consciência (previsão ou representação) abrange a “realização dos elementos descritivos e normativos, do nexo causal e do evento (delitos materiais), da lesão ao bem jurídico, dos elementos da autoria e da participação, dos elementos objetivos das circunstâncias agravantes e atenuantes que supõem uma maior ou menor gravidade do injusto (tipo qualificado ou privilegiado) e dos elementos acidentais do tipo objetivo”.

Além do conhecimento dos elementos positivos exigidos pelo tipo objetivo, o dolo deve abranger também o conhecimento dos “caracteres negativos”, isto é, de elementos, tais como “sem consentimento de quem de direito” (art. do CP), “sem licença da autoridade competente” (art. do CP), da inexistência de nascimento (art. do CP) etc. De modo que, o dolo direto tem seus contornos firmados pela teoria da vontade, a dolo eventual, tem sua delineação feita pela teoria do assentimento. ESPÉCIES DE DOLO O conceito de dolo se divide em duas espécies: dolo direto ou imediato e dolo indireto ou mediato, este último subdivide-se em dolo alternativo e dolo eventual. Essas classificações se mostraram necessárias devido à necessidade de abranger o objetivo desejado pelo agente infrator, como também o meio utilizado, a relação de causalidade e o resultado.

É importante ressaltar que esta classificação é somente doutrinária, portanto, não causando nenhum efeito prático, já que o Código Penal Brasileiro (BRASIL, 1940) não recepcionou as várias hipóteses de dolo, sendo todo enquadrado em seu artigo 18, inciso I. Dolo direto ou imediato Está previsto no artigo 18, inciso I, primeira parte do Código Penal (BRASIL, 1940): “diz-se o crime doloso, quando o agente quis o resultado [. O segundo trata dos efeitos colaterais ocorridos por ocasião da conduta praticada pelo agente, aqui o dolo direito diferencia-se do dolo eventual, pois se trata de resultado possível, e não obrigatório. O exemplo clássico da doutrina aqui é o sujeito que desejando matar determinado indivíduo, e sabendo que este estará em determinado voou, planta um dispositivo explosivo no avião, com a explosão não apenas o indivíduo alvo morrerá, mas também todos aqueles presentes, de modo que o agente age com dolo direto de primeiro grau em relação ao seu alvo, e dolo direito de segundo grau em relação às outras vítimas.

Um exemplo clássico é o caso do indivíduo que conduzindo seu veículo avista seu desafeto transitando a pé sobre a calçada e projeta propositalmente o veículo em direção a este, causando-lhe a morte. Ou o caso do agente que desfere golpes de faca na vítima, matando-a. Nesses casos fica evidenciado que o objetivo do agente era efetivamente causar a morte do atingido, constando assim que o dolo é direto. O dolo indireto possui duas subdivisões, quais sejam, dolo alternativo e dolo eventual, sendo este último um dos pontos mais importantes do presente trabalho. No dolo alternativo o agente prevê pluralidade de resultados e dirige sua conduta na busca de realizar qualquer um deles indistintamente. É o caso do agente que quer praticar lesão corporal ou homicídio, não se importando com qual dos dois resultados irá se configurar, pois o agente tem a mesma vontade de um ou de outro, tanto faz qual se consumar.

Quanto ao dolo eventual, este presente na segunda parte do inciso I do artigo 18 do código prevê que o agente praticou a conduta assumindo o risco de produzir seus resultados, NUCCI leciona o dolo eventual como sendo “a vontade do agente dirigida a um resultado determinado, porém vislumbrando a possibilidade de ocorrência de um segundo resultado, não desejado, mas admitido, unido ao primeiro15”, ou seja, o agente prática determinada conduta visando um resultado, todavia, ciente, que outros resultados não desejados ocorrerão. Damásio de JESUS define o dolo eventual como sendo quando o sujeito assume, admite e aceita o risco de produzir determinado resultado: Ele não quer o resultado, pois se assim fosse haveria dolo direto. de Jesus (2005 apud CONCEIÇÃO, 2010) nos dá outro exemplo que deixa bastante evidenciado a distinção entre dolo direto e dolo eventual: O agente pretende atirar na vítima, que se encontra conversando com outra pessoa.

Percebe que, atirando na vítima, pode também atingir a outra pessoa. Não obstante essa possibilidade, prevendo que pode matar o terceiro é-lhe indiferente que este último resultado se produza. Ele tolera a morte do terceiro. Para ele, tanto faz que o terceiro seja atingido ou não, embora não queira o evento. Para que possa ser comprovada é necessário um juízo prévio de valor, sem o qual não se sabe se ela está presente ou não. Os crimes considerados culposos são abertos, não trazem a definição de culpa, apenas a sua pena. Para a verificação da culpa, há que se comparar a conduta do agente com o cuidado exigível de uma pessoa prudente e com discernimento diante do caso concreto.

Eugenio Pacelli descreve que Pode-se afirmar, portanto, que a culpa constitui uma conduta voluntária, sem intenção de produzir um resultado típico, porém, previsível. Trata-se, em suma, da inobservância do dever de diligência, do cuidado ao realizar condutas, para que estas não causem danos a bens jurídicos alheios. “Consiste no agir sem precaução, precipitado, imponderado”. Exemplo: uma pessoa não sabe lidar com arma de fogo e mesmo assim a manuseia e provoca o disparo, matando outra pessoa. A negligência consiste em deixar de fazer aquilo que se sabe que é devido, o autor tem conhecimento de qual conduta deve tomar, mas deliberadamente age de modo contrário. É a ausência de precaução, a falta de cuidado, é a inércia do agente que, podendo tomar as cautelas exigíveis, não o faz por displicência, preguiça, desleixo ou desatenção.

Novamente, André Estefam (2010, p. Reitera-se que se o resultado for objetivamente imprevisível, o que equivale dizer que uma pessoa considerada inteligente também não o vislumbraria, não há que se falar em crime culposo ou sequer em culpa. Contudo, a título de distinção da culpa inconsciente da culpa consciente, considera-se se o sujeito representou ou não desfecho em sua esfera psicológica. Na primeira, o desfecho é objetivamente previsível, mas o sujeito não o previu subjetivamente por qualquer razão; na segunda, o resultado também é objetivamente previsível, e, mais ainda, o sujeito o representou no seu consciente, contudo, não acreditou que se realizasse20. Para o código penal brasileiro não há distinção entre o tratamento dado as duas espécies de culpa e de dolo.

Temos então que o dolo é uma conduta voluntária e intencional de um agente, que ao praticá-la ou omitir-se, busca um resultado danoso visando causar dano a outro. É a imprevisão passiva, o desleixo, a inação (culpa in ommittendo). É não fazer o que deveria ser feito. Negligente será́, por exemplo, o motorista de ônibus que trafegar com as portas do coletivo abertas, causando a queda e morte de um passageiro. No que tange à imperícia, esta se encontra absolutamente ligada à falta te técnica, aptidão, habilidade para o exercício de determinado ato, profissão, etc. Rogério Greco explica, nesse sentido: Fala-se em imperícia quando ocorre uma inaptidão, momentânea ou não, do agente para o exercício de arte, profissão ou ofício.

BRASIL, 1940). Sobre o tema, Bitencourt descreve: Só impropriamente se pode admitir falar de culpa em uma conduta que prevê̂ e quer o resultado produzido, sob pena de violentar os conceitos dogmáticos da teoria do delito. A chamada culpa imprópria só́ pode decorrer de erro, e de erro culposo sobre a legitimidade da ação realizada. E erro culposo não se confunde com crime culposo. Com efeito, a culpa imprópria, culpa por extensão ou assimilação decorre do erro de tipo evitável nas descriminantes putativas ou do excesso nas causas de justificação. Este também representa um dos pontos com maior relevância no estudo. A culpa consciente é a culpa com previsão. Nesse caso, o agente pratica o fato, prevê a possibilidade de ocorrer o resultado, porém, de maneira leviana, confia na sua habilidade, e o produz por imprudência, negligência ou imperícia.

Ou seja, o sujeito prevê a possibilidade de ocorrer o resultado, mas acredita fielmente que ele não irá aparecer ou que possa evitá-lo, porém, o resultado acaba por acontecer. É chamado também de culpa com previsão. Em outras palavras, esta espécie de culpa trata das situações em que o agente deveria agir com previsibilidade e não o faz, ocasionando um resultado que ele não desejava e muito menos previu, embora fosse previsível, quando este deveria estar alerta. É a culpa comum. DOLO EVENTUAL X CULPA CONSCIENTE Como é perceptível através dos capítulos anteriores, as diferenças entre o dolo direto e culpa inconsciente são bastante latentes e de entendimento não conturbado na doutrina e jurisprudência, como mostra o Quadro 1.

Porém, isso não acontece em suas ramificações, mais precisamente no que se refere ao dolo eventual e culpa consciente. Nesse caso, o eventual e o consciente se estreitam tanto que sua linha diferenciadora se torna muito tênue e nebulosa, gerando por consequência, grande discussão doutrinária e jurisprudencial quanto à ocorrência do dolo eventual ou culpa consciente nos casos concretos. Se ele não assumiu tal risco, ele terá agido culposamente. A necessidade da distinção entre ambos se baseia nas injustiças, que muitas vezes ocorre, considerando alguns casos de culpa consciente como de dolo eventual. Embora a ínfima linha que separa o dolo eventual da culpa, tais institutos em muito se assemelham, em ambos o agente não deseja o resultado, embora preveja o resultado e aja a despeito disto.

Por certo, entre o dolo eventual e a culpa consciente existe uma linha fugaz. Ambos coabitam na região limítrofe (fronteiriça) em relação ao outro, sendo que a distinção entre estes pode ser exposta da seguinte maneira: na culpa consciente, o sujeito não assume o risco na produção de um resultado ilícito, como no dolo eventual. Por não haver dúvida, geralmente não se fala em hesitação na culpa consciente, contrariamente ao dolo eventual26. Figura recorrente no dia a dia, presente em diversos noticiários, é corriqueiro a presença das palavras dolo eventual quando se fala de crimes. Normalmente acompanhada da frase o indivíduo assumiu o risco do resultado. O dolo eventual como citado acima ocorre quando o agente age ou deixa de agir, tem consciência do risco de resultado danoso que esta ação ou omissão poderá trazer e um bem jurídico tutelado, e se conforme caso este dano ocorra.

Aqui não basta o agente conhecer o risco (culpa) ou muito menos não basta agir quando não deveria (imprudência), é necessário o conformismo com a ocorrência, ou possiblidade desta, do resultado danoso. do Código Penal), em que é elementar do tipo saber ser a coisa produto de crime. O tipo penal é claro em dizer “sabe” – só recaindo, portanto, o dolo direto; caso quisesse abarcar o dolo na modalidade eventual, teria trazido a expressão “deve saber” como elementar, ou outra que indique assumir o risco, como ocorre no § 1º do próprio art. e os caput dos art. e 245, todos do Código Penal. O conhecimento especial da circunstância também se verifica nos tipos penais da denunciação caluniosa (art. A identificação da existência de qualquer um destes institutos não pode ocorrer meramente por conveniência, mas sim em busca de justiça e adequação.

É imperiosa uma análise pormenorizada sobre as intenções do agente e as circunstâncias do crime. Não é novidade o interesse e influência da mídia sobre crimes e a atuação das autoridades, não é raro um canal que não possua um jornalismo investigativo, cujo foco e objetivo é a cobertura dos diversos crimes ocorridos em sua cidade de atuação. Crimes que geram comoções, seja pelo status dos envolvidos, seja pela chamada brutalidade do crime, levam a mídia a iniciar um trabalho onde levam ao ar matérias e mais matérias, cobrindo por dias a finco cada detalhe que puder ser explorado. A vida da vítima é exibida em detalhes, o sofrimento dos familiares muitas vezes extraídos de entrevistas, em momentos íntimos, muitas vezes no próprio sepultamento.

O dolo consistente na intenção clara do indivíduo em fazer algo e a culpa na falta de dever de cuidado e previsibilidade do resultado. É necessário compreender que tais institutos têm consequências diferentes e seu emprego incorreto gera precedentes perigosos. Como explanado, se a dúvida estivesse apenas no campo do dolo, independente da modalidade o resultado final da imputação seria o mesmo, mas envolvendo a culpa, a linha que os separa é extremamente tênue. Em grande monta, nos crimes de trânsito o dolo eventual surge corriqueiramente, em especial no homicídio, quando o agente o comete sob influência do álcool. Nestes casos a imputação de dolo eventual ocorre de maneira quase automática. Tal situação afronta diretamente preceitos constitucionais. Em tempo, não se propõe que todo homicídio praticado na direção de veículo automotor seja indiciado na modalidade culposa, o que se busca é o estudo sobre caso e suas circunstâncias, não apenas um indiciamento por conveniência.

Rogério Greco acerca deste assunto escreve: O movimento da mídia, exigindo punições mais rígidas, fez com que juízes e promotores passassem a enxergar o delito de trânsito cometido nessas circunstancias, ou seja, quando houvesse a conjugação da velocidade excessiva com a embriagues do motorista atropelador, como de dolo eventual, tudo por causa da frase contida na segunda parte do inciso I do art.  8 do Código Penal, que diz ser dolosa a conduta quando o agente assume o risco de produzir o resultado32. Não podemos dizer que esses crimes não despertam o interesse da população, levando a picos de ibope e consequentemente arrecadação. Jamais foi visto no banco dos réus alguém que confessasse ao juiz: “no momento da conduta eu pensei que a vítima poderia morrer, mas, mesmo assim, continuei a agir”.

…) O juiz, na investigação do dolo eventual, deve apreciar as circunstâncias do fato concreto e não buscá-lo na mente do autor, uma vez que, como ficou consignado, nenhum réu vai confessar a previsão do resultado, a consciência da possibilidade ou probabilidade de sua causação e a consciência do consentimento34. Nesta mesma seara leciona Aníbal Bruno: A representação do resultado como possível e a anuência a que ele ocorra são dados íntimos da psicologia do sujeito, que não podem ser apreendidos diretamente, mas só deduzidos das circunstâncias do fato. Da observação destas é que pode resultar a convicção da existência daqueles elementos necessária ao julgamento da situação psíquica do agente em relação ao fato como dolo eventual.

Se elas não conduzem seguramente a esta conclusão, e a dúvida se mantém, deve-se admitir a solução menos severa, que é a da culpa consciente. Em um primeiro momento, deve ser analisada o que o autor chama de valorização do resultado. Aqui ele descreve como sendo o “valor que é atribuído pelo agente ao resultado que se pretende obter38”. Na hipótese de dolo eventual, o valor dado ao resultado almejado é tão elevado, que a possibilidade de incorrer em crime para atingi-lo torna-se aceitável. Se outro lado, o valor atribuído ao resultado seja pequeno, fica mais propenso a se caracterizar a culpa consciente, eis que não seria razoável admitir que pessoa em sã consciência admitisse incorrer em crime para atingir pífio resultado39.

Quando o agente valora demasiadamente o resultado, para o autor, se está diante do dolo eventual, já quando o resultado desta conduta não tem maior valor para o agente, é mais propício a caracterização da culpa. Se acredito de forma mais intensa acarretar o dano e não renuncio à atitude, demonstro maior resistência à norma jurídica, o que leva a crer que assumo o risco do resultado42. Por último, deve ser analisada a seriedade do dano, ou seja, a valoração dos resultados da conduta típica do agente. Quanto maior o nível de censura do evento danoso advindo da conduta, mais se aproxima o agente do dolo eventual, pois, quanto maior o dano causado pela conduta, maior é o dever de abstenção e maior deve ser a repressão estatal.

Os dados necessários para concluir de que tipo de crime se trata, são dados íntimos gerados da psicologia do agente, e, portanto, necessita-se observar as circunstâncias do fato para solucionar a dúvida. Há que se confirmar a existência daqueles elementos necessários ao julgamento da situação psíquica do agente em relação ao fato como dolo eventual e, se elas não conduzirem seguramente a esta conclusão, e a dúvida se mantém, deve-se admitir a solução menos severa, que é a da culpa consciente. Por fim, Estefam (2010) também entende que, em ambos os casos, o agente prevê o resultado e não deseja que tal ocorra. No entanto, na culpa consciente o agente tenta evitar o fato, coisa que não acontece no dolo eventual, em que o agente, diante da ocorrência do fato, se mostra indiferente e não tenta impedir a consumação.

PRINCIPAIS APLICAÇÕES Necessário se faz também, além do subjetivo do agente, analisar quais as circunstâncias fáticas idôneas a reconhecer o dolo eventual ou culpa consciente. Almejando aproximar o tema do presente estudo à realidade brasileira, discorremos abaixo sobre casos altamente discutíveis sobre a aplicação dessas ramificações do Direito e suas interpretações doutrinárias: Embriaguez ao volante (art. Aqui talvez esteja um dos pontos de maior discussão doutrinária e social nos dias de hoje. outro delito de bastante discussão, embutido no crime de racha. TEORIAS A propósito do tema, existem algumas teorias sobre o dolo eventual, as quais ajudam a diferenciá-lo da culpa consciente. teoria da indiferença: idealizada por Engisch (apud KÖCHE, 2006), a qual sintetiza a ideia de que o dolo eventual passa a existir quando o agente recebe com indiferença a ocorrência do evento acessório, negativo, meramente possível, de seu ato; teoria da representação: idealizada por Schroder (apud KÖCHE, 2006), dispensa a indagação sobre a vontade do agente, bastando apenas a possibilidade de ocorrência do resultado; teoria da não colocação em prática da vontade de evitar o resultado: seguida por Armin Kaufmann (apud KÖCHE, 2006), o simples fato de o agente não fazer nada para evitar o evento já configura o dolo eventual; teoria do risco: o conhecimento do risco indevido (ilícito) por parte do agente tem de estar presente para a existência do dolo eventual; teoria da probabilidade ou verossimilhança: não basta a previsão, é necessário que seja provável o resultado e que o agente admita sua ocorrência ou não; teoria do consentimento ou vontade/aprovação/ aceitação: é necessário que, além da representação do evento e a consideração da possibilidade, o agente consinta com a sua produção.

Essa é a teoria adotada pelo Código Penal Brasileiro (BRASIL, 1940); teoria hipotética do consentimento: segundo a teoria hipotética do consentimento o dolo eventual existe em relação ao resultado representado como possível, de acordo com a fórmula I, de Frank (apud KÖCHE, 2006), quando a previsão do mesmo resultado como certo não teria atuado como contra motivo eficaz; teoria positiva do consentimento: Há dolo eventual quando o agente não toma devida consideração na possibilidade, por ele prevista, da ocorrência do resultado e age, assumindo o risco de produzi-lo. Segundo a fórmula II, de Frank (apud KÖCHE, 2006), o agente diz consigo mesmo seja como for, aconteça isto ou não, em todo caso agirei. As decisões judiciais, costumam seguir os mesmos princípios já abordados.

Como exposto a complexidade do tema, exige cautela e cuidados redobrados do julgador quando de sua aplicação. O primeiro caso43 trata de uma apelação dirigida pelo Ministério Público ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: JÚRI. TRÂNSITO. CINCO IMPUTAÇÕES DE HOMICIDIO TENTADO E UMA DE HOMICIDIO CONSUMADO. Elementos probatórios que evidenciam ter o acusado observado proceder meramente culposo com relação ao primeiro atropelamento (1º fato), nada estando a indicar ter ele, na primeira ocasião, assumido o risco de causar a morte das vítimas. E, tendo apenas uma das vítimas representado criminalmente, impositiva, quanto a outra, a declaração de extinção da punibilidade. Decisão reformada. Réu pronunciado para ser submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri pela prática dos crimes de homicídio consumado (5º fato - art.

caput, do Código Penal) e lesão corporal culposa no trânsito (1º fato - art. Recebida a denúncia, foi o acusado citado, respondendo à acusação, seguindo-se regular instrução do feito, sobrevindo decisão onde a magistrada desclassificou as imputações referentes ao 1º fato delituoso e absolveu sumariamente o apelado quanto ao 2º, 3º, 4º, 5º e 6º fatos descritos na denúncia, com fundamento no artigo 415, inciso IV, do Código de Processo Penal. O ministério Público recorreu, em seu voto o Relator DES. HONÓRIO GONÇALVES DA SILVA NETO, pontuou que duas foram as dinâmicas do caso: (i) inicialmente, o réu, buscando sair do local onde ocorria a festa, já durante a madrugada, embarcou no veículo de sua propriedade (havia estacionado o automotor na Avenida Beira Mar, horas mais cedo, quando, ao que indicam os elementos probatórios, a rua ainda não estava isolada) e, em razão do acúmulo de pessoas, acabou atingido as vítimas Tássia e Mateus, lesionando-as (1º fato); (ii) posteriormente, populares, inconformados com a situação, teriam passado a depredar o veículo do réu, agredindo-o fisicamente, o que então teria determinado que o denunciado, na tentativa de se livrar das agressões, teria acelerasse o automotor e atropelasse os demais ofendidos, levando um deles à morte (fatos 2º à 6º)47.

Deste modo, o acusado ao retirar seu veículo do local atingiu a vítima Tássia, vindo a ser agredido pela população, acelerou seu veículo e assim atingiu as demais vítimas. Embora a magistrada do juízo a quo tenha entendido que o acusado se enquadrava na hipótese de inexigibilidade de conduta diversa, o juízo ad quem entendeu que as agressões tiveram origem na própria conduta do acusado, que ao tentar retirar seu veículo pelo meio da multidão veio a atingir as 2 primeiras vítimas. Deste modo, foi provida a apelação para o fim de determinar a submissão do réu a julgamento perante o Tribunal do Júri por infração ao artigo 121, caput, do Código Penal (5º fato) e ao artigo 303 do Código de Trânsito Brasileiro (1º fato delituoso, apenas quanto à vítima Mateus), declarando, ainda, extinta sua punibilidade com relação ao demais fatos descritos na denúncia.

O Segundo caso consiste num atropelamento cujo dolo eventual ficou comprovado49. Ementa: HOMICIDIO. ATROPELAMENTO. DOLO EVENTUAL. CULPA CONSCIENTE. DISTINCAO. CARACTERIZACAO. REU QUE AGE NA DUVIDA. PRONUNCIA. O réu demonstrou nenhuma importância pelo que poderia ocorrer. Não se trata de ter confiado não ocorresse o resultado, porquanto o que existe nos autos até o momento está a indicar ter havido, realmente, um desinteresse real pela sorte da vítima. E isso é o quantum satis para deixar caracterizado o dolo eventual. Trata-se, a pronúncia, de uma peça de cognição incompleta, cabendo assim, ao Júri, posteriormente, examinar a correção, ou não, da tese acusatória. Meu voto é no sentido da confirmação da decisão de pronúncia51. Nota-se que esta interpretação foi assimilada tanto pelo juiz que prolatou a decisão de pronúncia em primeira instância, como pelo relator, o qual afirmou que “(.

esse desinteresse pela sorte daquela que viria a ser a vítima é que extrema, que caracteriza a diferença entre dolo eventual e culpa consciente”. Embora o desembargador Marco Aurélio C. M. Oliveira também se posicione pela ocorrência do dolo eventual, declara haver dúvida sobre o animus dolandi do agente, invocando o princípio in dubio pro societate para justificar a decisão de pronúncia. R. foi denunciado por infração ao artigo 121, caput, por duas vezes, pelo artigo 129, § 1º, I e II, e pelo artigo 69, todos do Código Penal, porque (. dirigindo uma camionete tipo D-10, em velocidade acima da permitida para o local e sob efeito de bebida alcoólica, perdeu o controle do veículo, vindo a subir na calçada e a colher duas senhoras, que faleceram em consequência de terem sido atingidas pelo veículo, além de ferir uma terceira pessoa.

Foi o ora recorrente preso e autuado em flagrante e mantido preso até que o Juiz de Direito da Vara do 1ª Tribunal do Júri desta Comarca, entendendo que o réu não agiu com dolo, quer direto, quer eventual, desclassificou a infração para a competência do Juiz Singular, dando-o como incurso nas penas do artigo 121, § 3º, e 129, § 6º, ambos do Código Penal. Dessa decisão, o Ministério Público (…) interpôs recurso em sentido estrito, pretendendo, nas extensas razões, que o réu seja pronunciado nos termos da denúncia e julgado pelo Tribunal Popular. O dolo eventual exige, como amplamente debatido, a previsibilidade do resultado e consentimento do agente em relação à conduta. Desta forma existe uma corrente doutrinária que julga incabível a ocorrência do dolo eventual em crimes de trânsito, que resultem em eventos danosos ao próprio agente.

Tal parte da doutrina entende que não é razoável admitir em determinadas condutas, (ex. ultrapassagem pela contramão em via dupla,) o agente concorde com a possibilidade da colisão frontal contra outro veículo, de modo a colocar sua integridade física em risco. Nesse sentido o professor Nelson HUNGRIA leciona: Dentre alguns casos, a cujo respeito fomos chamados a opinar, pode ser citado o seguinte: três rapazes apostaram e empreenderam uma corrida de automóveis pela estrada que liga as cidades gaúchas de Rio Grande e Pelotas. Caso Boate Kiss O caso trata de incêndio ocorrido em 27 de janeiro de 2013, por volta das 3 horas da manhã, na cidade de Santa Maria no Rio Grande do Sul, na sede do clube noturno da Boate Kiss. Tal acidente acabou por vitimar 242 pessoas.

Segundo a versão dos peritos que trabalharam no caso, o incêndio foi iniciado pelo uso de um fogo de artificio, cuja destinação é ambientes externos, e foi acionado dentro do estabelecimento por um dos membros da banda que tocava no dia. Acionados os fogos de artifícios entraram em contato com uma esponja inflamável que revestia a estrutura da boate. O revestimento ao entrar em combustão liberou monóxido de carbono no ar, que em contato com o organismo das vítimas que estavam dentro da boate, tornando inevitável sua morte. MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, 201262. Deste modo, não há dolo eventual, quando o agente com sua conduta visualiza um possível resultado e age duvidando de sua ocorrência, ou mesmo por mero egoísmo.

Para a caracterização do dolo eventual é necessário que o agente se conforme com o dito resultado, sendo que este não possui nenhuma confiança de que a eventualidade não irá ocorrer. De modo contrário, quando o agente perceve a presença de tal confiança, ou seja, acredita que os danos futuros não ocorrerão estamos diante de culpa consciente. Sabendo o agente que sua conduta resultaria em tal evento não teria agido, por isso não há conformação com o resultado. Com efeito, a culpa comum fundamenta-se na previsibilidade. Havendo previsão efetiva, adentra-se no terreno da culpa consciente e do dolo eventual. Uma vez que houve previsão das mortes, cumpre também afastar a hipótese de culpa consciente, porque esta pressupõe a adoção de cautelas que permitam confiar, ainda que levianamente, no controle do risco criado, como é o caso do atirador da elite que, mesmo conhecendo o risco de seu comportamento, acredita estar no controle da situação, com base em sua expertise no emprego da arma.

“A imprudência consciente se caracteriza, no nível intelectual, pela leviandade em relação a possível produção do resultado típico e, no nível da atitude emocional, por confiar na ausência ou não evitação desse resultado, por força da habilidade, atenção, cuidado, etc. na realização concreta da ação” (Juarez Cirino dos Santos, A Moderna Teoria do Fato Punível, Editora Fórum, 2004, p. MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO SUL, 2012,)64 O primeiro argumento trazido, “Uma vez que houve previsão das mortes, cumpre também afastar a hipótese de culpa consciente, porque esta pressupõe a adoção de cautelas que permitam confiar, ainda que levianamente, no controle do risco criado, como é o caso do atirador da elite que, mesmo conhecendo o risco de seu comportamento, acredita estar no controle da situação, com base em sua expertise no emprego da arma65” afirma que a culpa consciente foi afastada por se pressupor a adoção de medidas cautelares que controlar ainda que de levianamente o risco criado.

Na culpa consciente o sujeito age eivado por excessiva confiança, de tal modo que confia completamente na ausência do resultado. Basicamente o sujeito acredita que a o resultado de sua conduta não existirá. Na verdade, a culpa consciente se opera de maneira oposta da que foi dita, sendo caracterizada muito mais pelo descuido do que pela cautela. Ou seja, o excesso de confiança é uma inclinação para que se aja descuidadamente e não o contrário. Não se pode agir levando em consideração que as vítimas e os membros da banda ao adentrarem neste recinto checaram cada um destes itens de segurança. Repete-se socialmente não existe uma cultura destinada a essa prevenção. Deste modo, os membros da banda não agiram influenciados em relação a qualidade da segurança do estabelecimento.

Outro elemento a se destacar é a reputação sólida que a boate dotava até a ocorrência do acidente. Ademais, o próprio fato de a boate ser dotada de reputação sólida até a data de tamanha catástrofe é um próprio pressuposto de confiança. Se alguém pratica culposamente a conduta descrita em um tipo penal doloso, este não se responsabilizará penalmente, pois certo é que, sob a luz desse princípio, sua conduta será atípica. Conclui-se disso que referido disposto aufere que a excepcionalidade do crime culposo tangencia apenas a previsão do tipo penal. O Ministério Público afirmou que este princípio diz que entre dolo e culpa devemos sempre preferir o dolo, o que é crasso absurdo e contorcionismo conceitual. Ele diz respeito apenas ao tipo penal (doloso como regra) e não a uma suposta “preferência de dolo sobre culpa na aplicação70 Considerando o princípio da não culpabilidade, o direito penal deve ser invocado no sentido de beneficiar o acusado.

Colocar o dolo em detrimento da culpa implica em inverter essa ordem, e afrontar claramente o princípio da presunção de inocência. De acordo com a polícia, o teste comprovou que ele havia ingerido 1,1 miligrama de álcool e o permitido pelo Código de Trânsito é 0,59. O homem que atropelou e matou a promotora de eventos Fabiana Cardoso Guimarães em dezembro de 2006 foi condenado a seis anos de prisão nesta terça-feira (1º) em Sorocaba (SP). Apesar disso, ele vai ficar em liberdade até o julgamento do recurso. A decisão saiu no fim desta tarde. HOMEM. Os réus Rafael Bussamra e Gabriel Ribeiro apostavam corrida no túnel quando Bussamra atropelou Mascarenhas. CISSA. grifos do autor). Apesar da pressão midiática feita sobre o caso acima relatado, o caso foi julgado corretamente em relação ao delito cometido, qual seja, homicídio culposo.

Deve-se compreender que não pode haver divergências na própria jurisprudência acerca dessa questão, uma vez que vemos alegações de dolo eventual, e outras de culpa consciente, referentes ao mesmo tipo delituoso, o que tem por consequência diferentes juízes naturais para a mesma questão, uma vez que, ao se tratar de dolo eventual, cabe ao Tribunal do Júri julgar o acusado, e, se culpa consciente, caberá ao próprio juiz de direito julgá-lo, o que fere outro princípio constitucional, o princípio da isonomia, já que não se pode tratar casos iguais de formas diferentes, o que, em consequência disso, causaria uma insegurança jurídica. CISSA. grifos do autor). Motorista que atropelou 12 pessoas na Raposo Tavares é solto O acidente que provocou a morte de seis jovens e deixou outros seis feridos em estado grave (três deles ainda se recuperam no Conjunto Hospitalar de Sorocaba) ocorreu no último dia 6.

O comerciante Fábio Hiroshi Hattori conduzia a Saveiro Cross pela Rodovia Raposo Tavares quando, nas imediações do km 108, sentido Capital, perdeu o controle do veículo e atropelou doze pessoas. MOTORISTA. O promotor explicou que o dolo eventual exige que o responsável preveja e não se importe com o resultado. MOTORISTA. A juíza então concordou com o parecer do Ministério Público e determinou o pagamento de 40 salários mínimos para a soltura de Hattori. “O valor se justifica diante da gravidade dos fatos, do elevado número de vítimas, das consequências trágicas e da condição financeira do acusado”, afirmou ela. MOTORISTA. Em que pese a previsão do tipo penal do homicídio culposo no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) (BRASIL, 1997), os defensores de citado instituto defendem sua aplicação como uma forma de diminuir o sentimento de impunidade, bem como de conscientização e prevenção.

Nesse contexto, Leiria (1976) entende ser totalmente possível a aplicação do dolo eventual em caso de ocorrência de homicídio na direção de veículo automotor, não havendo de maneira automática a aplicação do elemento subjetivo culposo: Não se podem aceitar orientações simplistas que, obviando dificuldades e sutilezas que a matéria envolve, procuram concluir de maneira a priori que todos os danos à vida e a integridade corporal das criaturas humanas, levados a efeito por irresponsáveis ao volante, decorrem de procedimento meramente culposo de seus autores. Uma generalização desta natureza agride a cultura jurídica, como também compromete a autoridade daqueles que têm o dever de zelar pelo império da justiça na ordem social. LEIRIA, 1976, p. Em sentido contrário, Hungria (1978, p.

Quando a atitude psíquica do agente não se revelar inequívoca, ou se há inafastável dúvida se houve, ou não, aceitação do risco do resultado, a solução deve ser baseada no princípio in dubio pro reo, vale dizer, pelo reconhecimento da culpa consciente”. Nos delitos de trânsito, há um decisivo elemento de referência para o deslinde da dúvida entre dolo eventual e culpa consciente: o risco para o próprio agente. Com efeito, é difícil aceitar que um condutor de veículo, na plenitude de sua sanidade mental, seja indiferente à perda de sua própria vida – e, eventualmente, de pessoas que lhe são caras – em desastre que prevê como possível consequência de manobra arriscada que leva a efeito, como, por exemplo, uma ultrapassagem forçada ou sem visibilidade.

Aduz o autor acima citado que, na existência de dúvida quanto à ocorrência do dolo eventual ou culpa consciente, deve-se aplicar o princípio do in dubio pro reo. Já em crimes cometidos na direção de veículo automotor, para o autor é difícil acreditar que o condutor do veículo, em plena consciência, seria indiferente com relação à possibilidade de perder a própria vida e/ou de seus familiares. Merece ser frisado, ainda, que o Código Penal, como vimos, não adotou a teoria da representação, mas, sim, a da vontade do assentimento. Exige-se, portanto, para a caracterização do dolo eventual, que o agente anteveja como possível o resultado e o aceite, não se importando realmente com a sua ocorrência.

Continuando, Greco (2000) aduz que o clamor social pelo maior rigor nas penas aplicadas ao condutor que comete grave crime da direção de veículo automotor, sob efeito de álcool ou outra substância entorpecente e/ou em excesso de velocidade, não pode ter a finalidade de mudar a estrutura do direito penal, condenando o agente por crime doloso, quando na verdade agiu com culpa. O Ministro Relator Luiz Fux (2011 apud SCARAVELLI, 2014), durante julgamento do Habeas Corpus no 107. SP, assevera que, para a aplicação do dolo eventual, na ocorrência de homicídio no trânsito, sob a influência de álcool, é necessária a comprovação da teoria da actio libera in causa (ação livre na sua origem), ou seja, comprovação de que a embriaguez foi pré-ordenada, que o agente embriagou-se para praticar o crime.

Ter a ciência de que o agente agiu dolosamente ou culposamente é imprescindível, e deve ser extraída dos elementos constante nos autos, considerando que dificilmente um acusado irá manifestar sua consciência da possibilidade ou da probabilidade de seu resultado danoso, menos ainda falará sobre sua consciência do consentimento. Em relação aos crimes de trânsito ficou evidente que possibilidade de aplicação do instituto do dolo eventual nestes crimes, desde que salvaguardada a existência da previsibilidade do evento danoso e o consentimento, ainda que de modo implícito, do agente para com o resultado de sua conduta. O magistrado ao exercer sua função jurisdicional deve buscar, ante os elementos constante nos autos, sempre garantir os princípios constitucionais referentes ao processo penal e ao direito penal, ainda mais, quando um bem jurídico tão valioso quanto à liberdade individual está em jogo.

A linha tênue entre o dolo eventual e a culpa consciente exigem do magistrado uma análise atenta do conjunto probatório visando resguardar sobre tudo a presunção de inocência e não o contrário. Entre os casos estudados, percebe-se que o caso da boate Kiss, teve uma aplicação ampliada do dolo eventual, que pode ser amplamente debatido, ante os argumentos expostos, ficou claro que o judiciário agiu visando acalmar os ânimos de uma mídia que por dias cobriu sem cessar a morte de 242 jovens. E-Gov, Portal de e-governo, inclusão digital e sociedade do conhecimento, 26 out. Disponível em: <http://www. egov. ufsc. br/portal/conteudo/linha-t%C3%AAnue-que-distingue-o-dolo-eventual-da-culpa-consciente-nos-homic%C3%ADdios-de-tr%C3%A2nsito>. Florianópolis, SC: Terceiro Milênio; OAB/SC, 1998. BRASIL. Decreto-lei nº 2.

de 7 de dezembro de 1940. Código penal. Lei nº 9. de 23 de setembro de 1997. Institui o Código de Trânsito Brasileiro. Presidência da República. Casa Civil. f. Monografia (Graduação em Direito) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – Unijuí, Ijuí, RS, 2012. Disponível em: <http://bibliodigital. unijui. edu. CISSA Guimarães: assumir um risco exige intenção; mas prever o resultado, não. Para entender Direito, UOL, 23 jul. Disponível em: <http://direito. folha. uol. com. br/site/index. php?n_link=revista_artigos_ leitura%20%20&artigo_id=8149>. Acesso em: 28 nov. CORRÊA, Fabricio da Mata. Disponível em: <http://www. migalhas. com. br/Gramatigalhas/10,MI64295,91041-Dolo>. Acesso em: 28 nov. br/site/palavras/dolo/>. Acesso em: 28 nov. ESTEFAM, André. Direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2010. html>.

Acesso em: 04 dez. HUNGRIA, Nelson.   Comentários ao Código Penal: arts. a 27. br/pdf/Nazareno%20Ramos%20Koche. pdf>. Acesso em: 28 nov. LEIRIA, Antônio José Fabricio.   Delitos de trânsito. Justiça decreta a liberdade provisória de Fábio Hattori. Cruzeiro do Sul, 23 abr. Disponível em: <http://www. jornalcruzeiro. com. folha. uol. com. br/cotidiano/2014/04/1444382-justica-manda-soltar-motorista-que-atropelou-12-na-raposo-tavares. shtml?mobile>. Disponível em: <http://www. ambito-juridico. com. br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=14885>. Acesso em: 28 nov.

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