Morte e os processos de elaboração

Tipo de documento:TCC

Área de estudo:Filosofia

Documento 1

Ao mesmo tempo que refletiram sobre a vida e assuntos a ela pertinentes, esmiuçaram o fim da mesma à exaustão. Por mais que temamos a morte como naturalmente tememos o que nos é desconhecido, finamos para renascer dia após dia e nos tornamos sujeitos diferentes com o passar do tempo. Estamos sempre experimentando uma nova versão de nós mesmos. Insetos, por exemplo, em geral, vivem coletivamente e vivenciam o nascimento, a reprodução e a morte. Cigarras livram-se de seu exoesqueleto ao passo que borboletas libertam-se de seu casulo. Para tal, consultamos livros impressos e artigos acadêmicos que encontram-se alocados em plataformas tais como Scielo e Pepsic. Tais trabalhos foram assinados por especialistas nas áreas de Filosofia e Psicologia. II – DESENVOLVIMENTO 2. A morte e suas definições Aquele dito popular que atesta que “para morrer, basta estar vivo”, apesar de trazer em si uma carga de obviedade, ainda é capaz de inquietar muitos que temem o abraço derradeiro da morte.

Segundo os autores do Dicionário de Símbolos (2009), A morte designa o fim absoluto de qualquer coisa de positivo: um ser humano, um animal, uma planta, uma amizade, uma aliança, a paz, uma época. A morte é personificada por Tânatos, filho da Noite irmão do Sono, arisco, insensível, impiedoso (LAVD, 656-664). Na iconografia antiga, a morte é representada por um túmulo, um personagem armado com uma foice (. uma serpente ou qualquer outro animal psicopompo (cavalo, cachorro etc. É que a Morte tem inúmeras significações. Liberadora das penas e das preocupações, ela não é um fim em si; ela abre o acesso ao reino do espírito, à vida verdadeira; mors janua vitae ( a morte, porta da Vida). No que diz respeito aos chineses, estes seguem algumas tradições bastante curiosas: se são filhos do falecido, homens e mulheres vestem branco ou preto.

Se são netos, usam azul. Em oposição ao ocidente, a cor branca simboliza a morte. O falecimento é anunciado por intermédio de convites, que são geralmente impressos em folhas brancas. Caso o morto tenha passado dos oitenta anos, os convites são em tom de rosa, pois a cor representa a longevidade. SILVA, 2016, p. No trecho supracitado, nota-se que a população preferia resguardar-se de seus mortos por questões religiosas e higiênicas. Neste outro recorte, Silva fala-nos acerca dos banquetes oferecidos aos mortos como tentativa de amenizar o temor coletivo causado pelo óbito. Do ponto de vista da cultura material, a variedade de concepções e ritos em torno da morte encontrava o seu denominador comum num motivo artístico cuja presença é atestada em inúmeros contextos funerários até a fase tardia do Império: o Totenmahl ou “banquete dos mortos”, que poderia ser representado por meio de uma escultura, pintura, mosaico ou qualquer outro suporte (JENSEN, 2008, p.

A cena clássica do Totenmahl era a do morto reclinado num divã (kliné), portando nas mãos uma taça de vinho e tendo à sua frente uma trípode sobre a qual depositavam-se as iguarias. E acrescentava-se: “ que a terra te seja leve, em uma demonstração de quanto se acreditava que o mesmo ser continuaria a viver debaixo da terra e lá conservando a habitual sensação de bem-estar ou de sofrimento. No epitáfio, escrevia-se que o defunto ali repousava: afirmação essa que sobreviveu às próprias crenças e que, atravessando os séculos, chegou até nossos dias(. Idem, pp. As reuniões em prol de um falecido – hábito do povo romano, por exemplo, e costume entre os americanos - eram celebradas com lautos banquetes, conforme relata-nos Silva (2016), com riqueza de detalhes.

Dentre as cerimônias associadas aos funerais, o banquete ocupava um lugar de destaque, reproduzindo-se, assim, no recinto da tumba, a mais recorrente modalidade de entretenimento no Império Romano, presente na vida dos indivíduos do berço à sepultura. Antes do encerramento deste capítulo, tomamos a liberdade de esboçar a síntese de uma matéria que trata da perspectiva de alguns filósofos acerca do tema de nosso trabalho. A revista Nova Escola, baseando-se em artigo produzido por Lya Luft - intitulado “ O ciclo da vida” - para a Veja n° 2388, de agosto de 2014, elaborou um texto que versa sobre a morte na perspectiva de seis filósofos. Esse texto foi publicado pela já mencionada revista em março de 2018. Sócrates definiu a Filosofia como “ preparação para a morte”.

Se não houvesse esse encerramento da vida, certamente não existiria a Filosofia. Já para Michel de Montaigne, há dois caminhos para se meditar sobre a morte: por meio da reflexão ou da contemplação. O filósofo concebe a morte como uma ponte para a liberdade. Aqueles que conseguem concebê-la como algo natural e até mesmo necessário, são mais felizes e podem desfrutar melhor da vida. Dessa forma, o temor pelo destino final de todos é suprimido. No que diz respeito a Arthur Schopenhauer, um dos objetos de nosso estudo, podemos dizer que, tal como Sócrates, ele coloca que a morte relaciona-se intrinsecamente com o pensamento filosófico. Na visão cotidiana, a morte é compreendida como algo que falta(. Outras vezes, a morte é pensada como o amadurecimento de uma fruta ou a etapa final do amadurecimento.

Porém, essa analogia também é problemática, pois em alguns casos a vida chega ao fim sem que, do nosso ponto de vista, o amadurecimento tenha se completado, por exemplo, a morte de uma criança ou de um jovem ( CARDINALLI, 2015,p. Sua maior abrangência requer uma análise apurada do ser e da relação de abertura do ser do homem ( Dasein). Ou seja, o fenômeno humano denominado morte ocorre com um indivíduo que é um ser-na-morte e, por conseguinte, um ser-no-mundo e um ser-de-projeto. Se olharmos sob a ótica da biologia, nós somos todos mortos em prorrogação ( MACHADO, p. No momento final, dessa ruptura com o mundo, o Dasein inexiste e deixa de existir também o homem como ser-no-mundo. Por meio da contemplação da morte de um terceiro, pode-se dizer que o Dasein cumpriu seu papel, contudo, havendo um corpo morto, ainda há um Ser, mesmo que este seja inanimado.

Machado(2012) coloca que para a compreensão de nosso próprio falecimento, é importante entendermos como se dá o fim da existência alheia. De acordo com sua posição, a morte do outro não é uma questão crucial. Para Heidegger, a morte é um sinal evidente do que é singular e finito; ela está contida na existência e apresenta-se como uma possibilidade real de ser-para-a-morte. Se estamos vivos, ela já está operando em nós. O ser humano marcha em direção à morte. Ainda segundo Machado (2012), (. o filósofo, quando afirma que todos os conceitos filosóficos são indícios formais, diferentemente dos conceitos científicos, remete ao fato de a ideia fenomenológica da morte não poder ser pensada como uma coisa simplesmente dada (Vorhandenheit) na medida em que o ser humano, de uma forma própria ou não, sempre se relaciona com a morte de uma maneira singular (.

Sua intenção de interromper a passagem dos dias é inútil. Ele quer burlar o tempo e morar em um tempo inexistente. De acordo com o filósofo, A angústia se angustia pelo próprio ser-no-mundo (. o mundo não é mais capaz de oferecer alguma coisa nem sequer a co-presença dos outros. A angústia retira, pois, do ser-aí a possibilidade de, na decadência, compreender a si mesmo a partir do mundo e na interpretação pública (HEIDEGGER, 1989a, p. Nisto consiste o fato de nós próprios – os homens que somos – refugiarmo-nos no seio dos entes. E por isso que, em última análise, não sou “eu” ou não é “ você” que se sente estranho, mas a gente se sente assim (. A angústia nos corta a palavra (HEIDEGGER,1989b , p.

Ainda no tocante à angústia, para Heidegger, há uma distinção entre este sentimento e o sentimento de temor, conforme coloca Cardinalli(2015). Para Heidegger (1927/1988), a angústia não é um sintoma ou uma condição patológica, é um estado fundamental da existência humana, que aproxima do ser humano a sua condição de precariedade e provisoriedade. Tais volumes tem como base o idealismo transcendental kantiano. O filósofo foi responsável por introduzir conceitos budistas bem como temas que permeiam a cultura indiana no pensamento metafísico alemão. Estudou com afinco os Upanishads e costumes do povo indiano, conforme notamos neste fragmento: Nascimento e morte pertencem igualmente à vida, e formam contrapeso; um é a condição da outra; são as duas extremidades, os dois pólos de todas as manifestações da vida.

É o que a mitologia dos hindus, a mais sábia de todas as mitologias, exprime por um símbolo, dando como atributo a Schiva, o Deus da destruição, um colar de caveiras, e o Lingam, órgão símbolo da geração; porque o amor é a compensação da morte, o seu correlativo essencial; neutralizam-se, suprimem-se um ao outro (SCHOPENHAUER, 1951, pp. No que concerne à questão da morte, tema principal deste trabalho, ele a coloca como outra face do amor, isto é, algo tão natural que deveria ser plenamente acolhido por todos. Tal pensamento é esboçado no seguinte trecho do texto de Medeiros: O filósofo descreve que, a partir de um ponto de vista empírico, a consciência natural nos diz que o homem teme a morte mais do que qualquer coisa, tanto para si quanto para os outros (SCHOPENHAUER, 2015, p.

É nessa fuga em relação à morte que o homem comum busca alguma crença que se adeque ao seu entendimento e alcance ideias paliativas que amenizem suas dores e temores, tornando a vida um fardo mais suportável (Idem, p. O indivíduo temeroso então busca uma crença ou uma válvula de escape que lhe sirva de conforto imediato para suas angústias. Desse modo, o homem comum fica entorpecido e deixa de produzir o que lhe pode ser útil ou benéfico. Schopenhauer coloca a imortalidade como uma falácia, como uma condição capaz de produzir verdadeiros malefícios à alma humana, uma vez que ele crê que o homem, em sua individualidade, é medíocre. O filósofo dizia que na Índia existia uma confiança na morte e um desprezo por ela, acima de tudo (SCHOPENHAUER, 2015, p.

MEDEIROS, 2018, p. Em oposição ao pensamento de Martin Heidegger, a angústia, no âmbito das religiões orientais, seria praticamente inexistente, uma vez que há essa necessidade de focar no momento presente – o que persistentemente tentamos obter por intermédio de meditações constantes - e esse sentimento ambíguo de confiança e desprezo pela morte, o que faz com que tal povo vivencie esse assunto de maneira mais liberta e tranquila. Desse modo, segundo Schopenhauer, o sujeito é incapaz de fruir a vida de maneira integral já que, assim como o angustiado de Heidegger, seus olhos estão vidrados no objetivo – a morte - e não no percurso, a viagem, a própria vida. A vida mesma é um mar cheio de escolhos e arrecifes, evitados pelo homem com grande precaução e cuidado, embora saiba que, por mais que seu empenho e arte o leve a se desviar com sucesso deles, ainda assim, a cada avanço, aproxima-se do total, inevitável, irremediável naufrágio, sim até mesmo navega direto para ele, ou seja, para a morte.

Quando no outro outono se observa o pequeno mundo dos insetos, e se nota que um prepara um leito para dormir o pesado e longo sono do inverno, que outro prepara o casulo para passar o inverno no estado de crisálida e renascer num dia de primavera com toda a mocidade e em plena perfeição, e que enfim, esses insetos, na maior parte, pensando em repousar nos braços da morte, se contentam em colocar cautelosamente o ovo no sítio favorável, para renascerem um dia rejuvenescidos, num novo ser — que é isto senão a doutrina da imortalidade ensinada pela natureza? Ela desejaria fazer-nos compreender que entre o sono e a morte não há uma diferença radical, que nem um nem outro põe a existência em perigo (SCHOPENHAUER,1951, p.

Percebemos que o filósofo alemão é bastante detalhista em suas observações e coloca a morte como irmã do sono, como a mitologia o faz. Tão natural quanto o sono a morte lhe parece. Ele sabe que chegará o momento em que dormiremos o sono eterno e isto não é motivo para angústia. Contudo, embora tal fragmento transmita a ideia de que o animal sente a morte com naturalidade, Medeiros, em sua tese, nos afirma, ao citar Schopenhauer, que este temor também está presente nos seres irracionais. sabemos que Schopenhauer é influenciado pelas escrituras védicas, precisamente os “Upanixades”, que tratam da unidade essencial presente em todas as manifestações da natureza. Para Schopenhauer, essa unidade é uma das características da Vontade. O pensamento oriental das escrituras védicas expressa uma relação amistosa com a morte, e isso é extremamente diferente do trato habitual do homem comum no ocidente ( MEDEIROS, 2018,p.

Embora não sejamos capazes de vivenciar a experiência de nossa própria morte de maneira integral, conforme colocou Heidegger, é possível observarmos a morte alheia. A morte do outro não provoca em nós o mesmo impacto que o causado por nosso próprio fim. Esta satisfação do eu físico não tem relação com as reflexões sobre a morte, de modo que o sofrimento – a angústia heideggeriana – acompanhará o sujeito até o fim. Entendemos que, para Schopenhauer, a morte não passa de um fato necessário ao equilíbrio da Vontade manifesta no mundo. No caso do homem, trata-se da destruição da subjetividade que é produto do seu “eu” corpóreo. Todavia, a nossa verdadeira essência, a Vontade, permanece livre e intocada.

O querer viver exige satisfação do corpo limitado e produz sofrimento na debilidade do fenômeno, sofrimento que só termina após o último suspiro (Idem, 2018, p. O alimento para o espírito e para a mente se torna menos nutritivo do que o alimento oferecido à matéria. Muitos creem que serão imortalizados a partir do momento que geram filhos pois, em sua imaginação, estes continuarão com seu legado e marcarão seus nomes no mundo pela eternidade. A não ser que estes descendentes façam algo realmente grandioso, colaborando com o pensamento filosófico ou artístico, por exemplo, seus nomes serão apagados quando não forem nada mais do que pó. A perda e sua elaboração O luto por um ente querido caracteriza-se por intenso pesar e por um sentimento de impotência diante da morte de alguém.

O ser humano vivencia o luto em inúmeras situações da vida, à medida que transita da infância à adolescência, por exemplo, ou quando vivencia situações traumáticas de perda. Segundo o entendimento de Freud, ao distinguir o luto da melancolia, O luto profundo, à reação à perda de alguém que se ama, encerra o mesmo estado de espírito penoso, a mesma perda de interesse pelo mundo externo – na medida em que este não evoca esse alguém - , a mesma perda da capacidade de adotar um novo objeto de amor ( o que significaria substitui-lo) e o mesmo afastamento de toda e qualquer atividade que não esteja ligada a pensamentos sobre ele (. FREUD, 1974,p. A pessoa enlutada sofre a subtração do ser amado de sua vida.

Este padecimento dá-se, na maior parte do tempo, de forma interiorizada e causa uma apatia com relação ao que ocorre no resto do mundo. O mundo exterior perde seus atrativos por completo. Com a evolução da catexia do objeto, há o esvaziamento do ego. A hipercatexia, característica do processo de luto, pode ser elaborada a partir de um teste da realidade que visa provar ao enlutado que o objeto perdido ou ausente é inexistente. Tal procedimento presta-se a preservar o ego, adiando o desejo de obter prazer, intrínseco ao ser humano, para uma ocasião mais propícia no futuro. Tal teste exige a remoção de toda a libido relacionada àquele objeto. No entendimento das autoras Pinho e Rosa, Cada um dos elos que ligam o Eu ao objeto, as recordações e expectativas, são invocadas e superinvestidas tendo em vista o desligamento libidinal.

A melancolia, portanto, toma emprestado do luto alguns dos seus traços e, do processo de regressão, desde a escolha objetal narcisista para o narcisismo, os outros. É, por um lado, como o luto, uma reação à perda real de um objeto amado; mas, acima de tudo isso, é assinalada por uma determinante que se acha ausente no luto normal ou que, se estiver presente, transforma este em luto patológico. FREUD, 1974,p. As fases da elaboração O processo do luto passou a ser tratado com maior empenho e seriedade a partir de três ocasiões distintas: a princípio, com a publicação da obra de Sigmund Freud, Luto e Melancolia, que deu-se em 1915; em seguida com a criação e implementação da Teoria Comportamental Cognitiva, com o objetivo de tratar pacientes que sofriam de estresse pós-traumático, em meados de 1960 e com a difusão da Teoria do Apego, que estende-se por três volumes, de autoria do psiquiatra e psicanalista John Bowlby ( 1969-1982).

Tratando especificamente desse último, vale colocar que Bowlby contemplou os efeitos da ausência materna na criança e, por intermédio desses estudos,concebeu as fases de luto diante da perda. Vários estudos de caso estão dispostos nesse volume, de modo que contamos com uma vasta gama de opiniões a respeito das enfermidades, do enfrentamento das patologias e do luto. Segundo a especialista, a Negação é uma defesa temporária, sendo logo substituída por uma aceitação parcial (Idem,p. Tais estágios variam de pessoa para pessoa e estas fases têm um período de duração mais curto ou mais longo, dependendo de cada um. Em caso da morte de um ente querido, a princípio negamos que tal fato tenha ocorrido pois é desse modo que reagimos ao choque após o recebimento da notícia.

Somos acometidos por um misto de torpor, desorientação, negação, mutismo e isolamento. Na concepção de Ross, Contrastando com o estágio de negação é muito difícil, do ponto de vista da família e do pessoal hospitalar, lidar com o estágio de raiva. Deve-se isso ao fato de a raiva se propagar em todas as direções e projetar-se no ambiente, muitas vezes sem razão plausível (Ibidem, 1981, pp. O estado subsequente a este é o da Negociação ou Barganha. Nesta fase,o indivíduo recorre a uma divindade que, em seu imaginário, pode restaurar sua saúde ou a vida de um ente querido, caso faça com ela um pacto e prometa, por exemplo, ser melhor, mais consciente, mais amoroso, sereno ou prestativo.

Este se torna uma criança birrenta que, caso não consiga algo por intermédio de suas exigências, passa a suplicar usando do artifício da educação. Geralmente é importante para a pessoa acometida pela depressão que saiba que a vida de outras pessoas continuam bem sem a presença dela, contudo, a psiquiatra coloca que não é benéfico desviar o olhar de uma pessoa de sua própria morte ao entreter-lhes com estes pensamentos mais felizes ( ROSS, 1981). O paciente não deveria ser encorajado a olhar o lado risonho das coisas, pois isto significaria que ele não deveria contemplar sua morte iminente. Dizer-lhe para não ficar triste seria contraproducente, pois todos nós ficamos profundamente tristes quando perdemos um ser amado (. ROSS, 1981, p. Em seguida à depressão, chegamos finalmente ao estado de Aceitação.

A importância do luto e seus benefícios Como sabemos, cada povo tem seu método particular de vivenciar o luto. Alguns, logo que transitam por todos os estágios anteriormente deslindados, recuperam-se plenamente e, passado algum tempo, encontram um novo objeto amado. Porém, cedo ou tarde, é certo que este se verá envolto em novo período de luto. Assim é a vida. Não somos incólumes à tristeza. Investigações etnológicas mostram que, em diferentes culturas, não se trata a morte como um acontecimento instantâneo e nem como um evento de natureza meramente biológica. A morte é um fato social e público acompanhado por ritos solenes que produzem uma escansão no ritmo da comunidade. Suspensão temporal necessária para que o grupo consiga remendar o tecido social rompido.

De acordo com Da Matta (in VAN GENNEP, Ibidem, p. os cerimoniais são como “as etapas de um ciclo que se deseja marcar e revelar, uma espécie de moldura especial, mesmo quando o quadro que ela determina, circunscreve e torna consciente, é banal ou mesmo cruel” (PINHO; ROSA, 2014, p. Pinho e Rosa citam Van Gennep (1909/2011) e Peirano (2003) ao tratar da relevância destes ritos. Interessado na dinâmica dos processos de mudanças, Van Gennep (1909/2011) observou que os ritos de passagem seguem um movimento sequencial composto de três tempos: primeiro, há separação de um status (ritos preliminares), depois, um período de margem (ritos liminares) e por fim, agregação em um novo status (ritos pós-liminares) (. Nos ritos funerários, por exemplo, prevalece o tempo de margem, período no qual se localiza o luto: “O luto é um estado de margem para os sobreviventes, no qual entram mediante ritos de separação e do qual saem por ritos de reintegração na sociedade geral” (p.

O estado de margem é delicado, perigoso tanto para os sobreviventes quanto para o falecido. A função dos ritos liminares é “reduzir tensões e os efeitos perturbadores próprios à mudança” (PEIRANO, 2003, p. Não obstante, Dastur observa que, nesse momento de mais completa individuação, tornamo-nos idênticos ( GUIDA, 2010, pp. Tal fragmento remete-nos novamente a Heidegger e à condição intransferível do morrer. Essa consciência da finitude é uma antecipação do Dasein. O que mais apavora os seres humanos é a incerteza de quando a morte os visitará e de que não poderão dela fugir ou esquecer-se. Somos seres progressivamente mais mortos do que vivos. Contudo, se o corpo definha, a mente desanda, os órgãos falham e o ser humano está lá, privado de movimentos, respirando de modo artificial, será que é são desejar o prolongamento de sua dor apenas para que isto satisfaça o nosso ego? Ross (1981, p.

prevê um mundo em que as pessoas são mantidas vivas em máquinas, que servem como simuladoras de seus órgãos vitais, e computadores que as monitoram para checar se outros órgãos devem ser reparados ou substituídos por mecanismos eletrônicos. Acaso nosso temor da morte chega a tal ponto que não nos importamos em nos fundirmos às máquinas e nos tornarmos ainda mais mecânicos? Será que a máquina também estará apta, um dia, a mimetizar nossas emoções, nossas dores mais legítimas e profundas e, quiçá, nosso luto? Nenhuma máquina ou mão humana pode reproduzir as centenas de abismos com que nos deparamos em nossas vidas. Os lutos experimentados pela perda de um amigo, de um grande amor, pela aposentadoria insatisfatória que recebemos, pela transição da adolescência à fase adulta, pela saída da casa dos pais são abismos úteis onde, em inúmeras ocasiões, deparamos com pontes ou cordas que nos içam às alturas.

Tememos uma queda que, geralmente, nunca vem. Seu ego é tomado pelo medo. Nas palavras de Kierkegaard, ao elaborar a efemeridade da vida e o “grande desenlace” – como Schopenhauer chama a morte - , encontramos: “ aí está o mistério profundo da vida: é, ao mesmo tempo, angústia. Sonhador, o espírito projeta a sua própria realidade, que é um átimo, e a inocência vê sempre e sempre, diante de si, esse nada”( Idem, p. Este nada a que tanto tememos pode ser encontrado a qualquer momento, a qualquer hora, em qualquer esquina ou dentro de qualquer moradia. Nas palavras de Schopenhauer, Semelhantes aos carneiros que saltam no prado, enquanto com o olhar, o carniceiro faz a sua escolha no meio do rebanho, não sabemos, nos nossos dias felizes, que desastre o destino nos prepara precisamente a essa hora, - doença, perseguição, ruína, mutilação, cegueira, loucura, etc.

Quando deparamos com uma manchete na internet que reflete um crime hediondo, nosso subconsciente experimenta uma espécie de consolação porque estamos a salvo, dentro de nosso apartamento confortável, vivendo a nossa vida imutável de sempre. Temos as nossas angústias, nossas dores, nossos problemas, porém, são perfeitamente contornáveis uma vez que escapamos da morte. Contudo, ao retomarmos nosso temor da morte e revisitarmos o pensamento de Heidegger, que diz que somos um ser em marcha para a morte, por que não deixamos simplesmente de pensar a respeito de nosso fim e passamos a dar continuidade e a concluir nossos projetos de vida,como bons seres-em-projeto que poderíamos ser? Já que não podemos escapar do carniceiro que nos aguarda ao final, já que vemos nosso corpo paulatinamente arruinando-se, nossas carnes tornando-se flácidas e nossos órgãos envelhecendo, por que não aceitarmos que um dia tudo se encerrará para nós? E se o mesmo ocorre com nossos entes queridos, não seria melhor que experimentássemos o luto ao deixá-los partir do que se os víssemos sofrer presos a uma cama de hospital, até as últimas consequências? De acordo com Guida, ao citar análise do filósofo Alexandre Costa: O filósofo Alexandre Costa, num diálogo com o fragmento 26 de Heráclito – “O homem toca a luz na noite, quando com visão extinta está morto para si; mas vivendo, toca o morto, quando com visão extinta dorme; na vigília toca o adormecido” (1980, p.

–, tece significativas reflexões em torno desse entrelaçamento de morte e vida. Um entrelaçamento que se dá como tensão. Acaso ele se ocuparia de algo, projetaria algo sabendo que é imortal? Certamente não. É muito provável que o homem não ousasse projetar nada. Portanto, as reflexões acerca de seus objetivos bem como as reflexões a respeito de sua própria morte são conjecturas que o levam a pensar na vida, no modo como a está levando, no porquê de todas as coisas. É fundamental que o ser humano reflita de modo filosófico e adote uma postura de autoconhecimento. No entendimento de Ross, Embora todo homem, por seus próprios meios, tente adiar o encontro com esses problemas e estas perguntas enquanto não for forçado a enfrentá-los, só será capaz de mudar as coisas quando começar a refletir a própria morte, o que não pode ser feito a nível de massa, o que não pode ser feito por computadores, o que deve ser feito por todo ser humano individualmente ( ROSS, 1981, p.

GUIDA, 2010, pp. Se nos condicionássemos a pensar o envelhecimento como o murchar de um fruto, que ocorre de forma harmoniosa, certamente perderíamos totalmente o temor da morte. Contudo, com as promessas vazias da eterna juventude feitas hoje, aliadas a um corpo esbelto e cheio de energia, tudo que vai de encontro a essa ilusão nos afronta. Nosso fascínio não permite que reflitamos que a beleza não está somente na casca do fruto, no exterior. Além disso, em termos internos, é praticamente impossível que nossas vísceras acompanhem um físico mais forte, assim como é praticamente improvável que nosso cérebro suporte uma vida permeada por doentios ciclos repetitivos. Se não conseguimos refletir sobre o presente porque adotamos algumas doenças que nos fazem cegos ou ocupados demais para reflexões, tendemos a procrastinar tudo.

Se vivemos com o foco no futuro – no que ambicionamos para nossas vidas e naquilo que mais tememos – a tendência é que soframos com crises agudas de ansiedade. Então, qual seria o tempo certo? O mais saudável a fazer é ocupar-nos do hoje, estabelecendo metas para o futuro, mas sem que nos aflijamos com a dúvida da concretização das mesmas. O posicionamento mais saudável a se adotar é vivenciar cada dia com plenitude e com consciência. Caso estejamos de luto no presente momento e a pessoa que partiu era exemplar em vários sentidos, talvez fosse interessante se nos esmerássemos para seguir seu exemplo. Não guardamos qualquer lembrança desse momento. Certamente não teremos registro algum da morte. Apenas quem pode registrá-la, conforme declara Heidegger, é o outro que se faz presente em nosso leito de morte.

Com ele restará todo o assombro, toda a angústia, todo o medo e um processo de luto em formação. Deixaremos de ser um corpo vivo para ser um corpo inanimado. Há aqueles que celebram e há os que choram por dias a fio. A morte não é uma ferida eterna. O processo de luto está aí para comprovar isso. Experimentamos as fases de negação, raiva, negociação, depressão e aceitação ao nosso ritmo. Apenas nós podemos ter consciência da dor que sentimos e de quais sentimentos predominam em um determinado estágio do luto. pdf> Acesso em: 16/03/2019. CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de símbolos: mitos, sonhos, costumes, gostos, formas, figuras, cores, números. Rio de Janeiro: José Olympio, 2009. ed. Rio de Janeiro, 2010.

HEIDEGGER,Martin. Ser e Tempo. Tradução de Márcia de Sá Cavalcanti. Petrópolis: Vozes, 1989a. Disponível em:<http://pepsic. bvsalud. org/pdf/nh/v14n1/a02. pdf> Acesso em: 12/03/2019. MEDEIROS, Vitor Hugo Melo de. org/pdf/trivium/v6n1/v6n1a04. pdf> Acesso em: 27/03/2019. ROSS, Elizabete Kubler. Sobre a morte e o morrer. São Paulo: Martins Fontes, 1981. SILVA, Gilvan Ventura da. Ritos funerários e relações de sociabilidade em Antióquia: a propósito do Mosaico do Banquete de Mnemosyne. Disponível em:<http://www. scielo. br/pdf/his/v35/1980-4369-his-35-e88.

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