O FORJAR DA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO DO MST: DAS CONTRIBUIÇÕES DOS PENSADORES RUSSOS À PROPOSTA EDUCACIONAL DO MST

Tipo de documento:Dissertação de Mestrado

Área de estudo:Pedagogia

Documento 1

Não se pretendeu nessa oportunidade esgotar as fontes de informação sobre o tema em questão. Porém, conhecer os antecedentes para uma proposta educacional do MST pode contribuir para a compreensão original da pedagogia, já que foi desta conjuntura que partiu toda a concepção que se tem sobre a educação socialista que nos interessa. Histórico da Revolução Russa e aspectos da Educação “Amigos, precisamos terminar a revolução imediatamente. Aqueles que a prolongam não colhem os seus frutos. ” (John Reed, 2017). O lavrador "libertado", mas obrigado a comprar ínfimas porções de terra habilmente recortadas, passa da servidão feudal à servidão econômica: trabalhará muito mais. A Indústria manufatureira encontrará na zona rural a mão-de-obra de que necessita (SERGE, 1993, p.

A condição do lavrador ficou ainda mais precária, pois apesar de livres, encontraram-se imersos em dívidas e sujeitos à fome. O fim da condição de servidão abriu espaço para o capitalismo, não só na Rússia, como nos Estados Unidos, que havia passado pela Guerra da Secessão, abolindo o trabalho escravo. Ainda assim, haviam graves desigualdades civis e os interesses das classes minoritárias seguiam desvalorizados. Tive a sensação que a multidão ia entoar, de repente, espontaneamente, sem nenhum sinal, um hino religioso. Trotsky leu uma resolução que dizia que 'pela causa dos operários e dos camponeses derramaremos a última gota de sangue: - Quem concorda?'. A multidão incalculável levantou as mãos como um só homem.

Eu via aquelas mãos levantadas e os olhos ardentes de homens, mulheres, adolescentes, operários. soldados, mujiques. Jonh Reed na obra “Dez dias que abalaram o mundo”, retrata a Revolução de Outubro. A monarquia já estava derrubada, mas nada ainda havia sido feito concretamente e a esquerda estava dividida. Reed (2017) claramente apresentou o cenário da ocasião: os soldados, os camponeses e os operários não reconheciam que o antigo regime estava de fato dissolvido. Enquanto se aguardava a Assembleia Constituinte que seria realizada em novembro, esses três grupos iniciaram, a seu modo, frentes de resistência. Os primeiros desertaram em bando, os trabalhadores do campo destruindo as grandes propriedades e os últimos, através das greves (REED, 2017). Extinguiram-se com ela os fundamentos de uma democracia socialista na Rússia, substituída agora por uma ditadura revolucionária que se tornaria um padrão para o futuro, não questionada mesmo em períodos subsequentes de maior “abertura”, nos anos 1920 ou nos anos 1950 (REIS, 2017, p.

Em 1921, durante o Congresso do Partido Comunista, Lenin apresentou o que ele chamou de Nova Política Econômica (NEP), que seria uma transição entre o capitalismo e o socialismo. Com a morte e consequente enfraquecimento de muitos operários, os bolcheviques não tinham mias apoio popular. Assim, eles assumiram o poder e uma forma de governo, cujos fundamentos formaram o cenário perfeito para a ditadura de Stalin que se sucedeu (OYAMA, 2010). Mormente, cabe ressaltar, especialmente diante do nosso objetivo de estudo, o projeto de educação socialista na Rússia de Lenin e Krupskaia, dentro do período compreendido por três momentos da história: final do século XIX, quando o partido operário social inicia a sua atuação, em seguida, o golpe de Estado promovido pelos bolcheviques e finalmente, a consolidação da revolução até a década de 1930.

Logo, os antecedentes da revolução de outubro, a partir da educação das massas focou-se em “desestabilizar o governo, instigar o ódio à burguesia e à autocracia russas, para a consecução da revolução socialista (OYAMA, 2010, p. Após a insurreição, fim da guerra civil e da intervenção estrangeira, o governo de Lenin tinha três metas para a educação: “a) erradicação do analfabetismo e elevação cultural da população; b) o Programa do Partido de 1919 para a educação; c) a participação da educação no plano de reconstrução econômica e social” (OYAMA, 2010, p. O Programa do Partido lançou os fundamentos para as escolas e para a pedagogia soviética. Na verdade, representava um rompimento com o modelo tradicional vigente burguês e czarista.

A escola não deveria ser um privilégio das classes mais abastadas, tão pouco sustentada por ideais religiosos e formadora de serviçais resignados. Lenin se ancorava na teoria marxista que pressupunha a educação burguesa como instrumento para atender ao Capital. Neste sentido, o capitalismo promovia um tipo de educação que embotava a classe trabalhadora, de forma que esta não se conscientizasse da luta de classe necessária. Por outro lado, a pedagogia social tinha um viés político, na medida em que introduzia nos mais desprivilegiados a resistência contra o jugo imposto, seja pelos grandes proprietários ou pelos governos imperiais. Assim, este tópico tem o objetivo de abordar a concepção de Marx sobre a relação entre trabalho e educação.

Apresentar o ensino como um meio que se oferece a todos, como uma oportunidade de subida social, oferecida no alvorecer da vida, independentemente da origem social dos indivíduos, é típico da abstrata e oca democracia burguesa e procede uma dupla mistificação, que só tem influência sobre os pequenos burgueses que oscilam entre as classes exploradoras e a explorada. Inicialmente, Engles alertou para o problema do trabalho infantil nas fábricas inglesas, fato que as impedia de desenvolver sua educação (BEMVINDO, ALMEIDA e TURRINI, 2014). Engles (2006) aponta alguns aspectos sobre a educação: todas as crianças devem ser escolarizadas pelo Estado; a possibilidade da prática laboriosa e educação; a educação como forma de ascensão na cadeia produtiva; a extinção das divisões de classe por meio do ensino.

Educação de todas as crianças, a partir do momento em que podem passar sem os cuidados maternos, em estabelecimentos nacionais e a expensas do Estado. Combinar a educação e o trabalho fabril. A educação permitirá aos jovens passar rapidamente por todo o sistema de produção; colocá-los-á em condições de passar sucessivamente de um ramo de produção para outro, conforme o proporcionem as necessidades da sociedade ou as suas próprias inclinações. A educação politécnica se baseia em compreender, estudar e vivenciar na prática todos os desdobramentos e etapas da produção, já que esta segue rigorosa organização (OYAMA, 2010). Assim como acontece na vida organizada pelo governo socialista. Logo, o trabalhador não teria apenas um conhecimento prático, dentro da sua função específica, mas estaria habilitado para outras atividades como planejamento, compra de matéria-prima, maquinário, história da luta do movimento operário, desenvolvendo uma consciência crítica (OYAMA, 2010).

O aluno deveria obter uma visão da produção como um todo, aprender os procedimentos e o funcionamento dos mecanismos mais simples e mais complexos, de modo que a escola deve despertar no aprendiz um grande interesse pela produção, assim como o desejo de elevar a produção a um nível sem precedente. Por outro lado, a escola politécnica permitirá iniciá-lo na organização do trabalho tanto individual quanto coletivo, criar as condições higiênicas apropriadas; ela ensinará os princípios da segurança do trabalho em toda empresa industrial, inclusive na indústria têxtil. Com a decadência de instituições tradicionais, abriu-se caminho para uma nova formação. Contudo, a insuficiência cultural e analfabetismo tanto de camponeses, quanto de operários eram entraves para a revolução de classe que se desenvolvia na Rússia (MARX e ENGLES, 2009).

A educação burguesa alimentava o estado de alienação dos trabalhadores. Esta condição era importante para atender o objetivo do capital: Para que ela se transforme num poder "insuportável", quer dizer, num poder contra o qual se faça uma revolução, é necessário que tenha dado origem a uma massa de homens totalmente "privada de propriedade", que se encontre simultaneamente em contradição com um mundo de riqueza e de cultura com existência real; ambas as coisas pressupõem um grande aumento da força produtiva, isto é, um estágio elevado de desenvolvimento. Ele constitui igualmente uma condição prática sine qua non, pois é unicamente através desse desenvolvimento universal das forças produtivas que é possível estabelecer um intercâmbio universal entre os homens e porque, deste modo, o fenômeno da massa "privada de propriedade" pode existir simultaneamente em todos os países (concorrência universal), tomando cada um deles dependente das perturba­ções dos restantes e fazendo com que finalmente os homens empiricamente universais vivam numa esfera exclusivamente local.

Após a Revolução de Outubro, Pistrak construiu juntamente com outros intelectuais russos, o novo Sistema Educacional Russo. Para Pistrak, as metas do ensino russo naquele momento giravam em torno de duas ações: lutar e construir. A educação deveria instrumentalizar a população para manter as conquistas advindas da revolução socialista. Ademais, a escola transmitiria os valores culturais comunistas (ABREU e LIMA, 2013). Essas formulações de Pistrak deram origem à parceria entre trabalho e escola: Neste tipo de trabalho deve se produzir algo útil na escola, no tocante aos objetos e aos instrumentos de produção e deve ser assegurado às crianças a vivência em experiências diversas, que desenvolva a criatividade técnica, científica e artística. PISTRAK, 2009, p. Conforme Saviani (2007) trabalho e educação são constituintes do ser humano, ou seja, são da dimensão ontológica do ser.

O homem se define pela razão, contudo, como já apontado por Marx, é a capacidade de produzir que difere o homem dos animais. Logo, essencialmente o homem se faz à medida em que ele produz algo a partir do que a natureza lhe fornece: Ora, o ato de agir sobre a natureza transformando-a em função das necessidades humanas é o que conhecemos com o nome de trabalho. Podemos, pois, dizer que a essência do homem é o trabalho. Como já abordado anteriormente, uma estratégia utilizada para superar esse problema no regime socialista era a politecnia, que neste contexto refere-se à “especialização como domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas utilizadas na produção moderna” (SAVIANI, 2007, p. Pistrak iniciou a organização das escolas-comunas (FREITAS, 2009). Tendo tudo em comum, a educação para o pedagogo, ancorada em Marx, colocaria um fim na cisão entre trabalho intelectual e braçal, de modo que assim uma classe não dominaria mais sobre a outra.

Neste diapasão, Pistrak concebia a importância de situar o jovem na conjuntura política vivida na Rússia durante o começo do século XX. É preciso que a nova geração compreenda qual a natureza da luta travada pela humanidade, qual o espaço da classe explorada e qual o espaço que deve ser ocupado por cada adolescente, e que cada um saiba em seus respectivos espaços travar a luta pela destruição das formas inúteis, substituindo por um novo edifício (PISTRAK, 2000, p. A “Escola Única do Trabalho”, germinada da Revolução Bolchevique, tem algumas características que a define de forma singular. Primeiro, a escola é uma instituição formadora dos jovens, tem papel fundamental na luta pela sociedade que estava se construindo, ela serve para conscientizar e emancipar os indivíduos.

Em seguida, o conceito de unicidade, quer dizer que todos os membros da sociedade são iguais, e merecem o mesmo tipo de educação, sem a escola forme duas classes distintas: aqueles que exploram e os que são explorados. Finalmente, a dimensão do trabalho, que tanto retoma-o como formador da vida humana, como na sua ligação com a produtividade – politecnia (FREITAS, 2012). Nela, quase todos os estudos reduzem-se a uma única grande disciplina, ainda não diferenciada: o conhecimento, pelo trabalho, do meio ambiente natural e social que cerca a criança. Assim, o trabalho se tornaria anêmico, perderia sua base ideológica (PISTRAK, 2000, p. A proposta de Shulgin para a politecnia diferia-se da formulada por Pistrak. Enquanto este centralizava-se na questão do trabalho do campo e educação, Shulgin acreditava que era por meio do trabalho operário nas fábricas que uma escola politécnica poderia ser efetivada (SHULGIN, 2013).

Para ele, “politecnismo é um indicador da extinção do fosso entre a cidade e o campo. As mesmas pessoas vão ocupar-se com a agricultura e com a indústria. Isso pode ser melhor explicado abaixo: [. o trabalho desenvolvido tem um valor social na medida que favorece a seleção e a preparação das sementes que chegarão para a coletividade por meio das cooperativas, o que beneficiará a população no cultivo destes grãos, logo, contribuirá na organização e na edificação da sociedade comunista. Seu valor pedagógico localiza-se no próprio desenvolvimento do trabalho, e se desenvolve para o estudo dos procedimentos técnicos e científicos, por meio do estudo das máquinas, dos grãos, da sua qualidade e da germinação que envolvem processos de pesquisa, de análise e de investigação (LEITE e BORGES, 2017, p.

Freitas (2009) revisitou os principais expoentes russos a respeito da educação estabelecendo um paralelo com a Pedagogia da Escola Nova, de John Dewey. Vale ressaltar que, o contexto econômico anterior a revolução era de um modelo capitalista, enquanto que Dewey lança sua teoria no seio do liberalismo. Os jogos seriam uma forma de desenvolvimento físico – seguindo a premissa apontada por Marx do ensino da ginástica, portanto, numa perspectiva de Educação Integral. Ao mesmo tempo, os jogos desenvolveriam a inteligência, a iniciativa, o interesse e os hábitos de organização. O trabalho realizado pelos “Jovens Pioneiros” teria valor para a escola na medida em que, além de oferecer hábitos de auto-organização dos alunos, forneceria a aplicação de novos métodos de ensino, os quais aumentariam nos alunos o “interesse para o estudo e a sede de conhecimento” (KRUPSKAIA, s/d, p.

FREITAS, 2012, p. Ademais, Krupskaia defendia que a escola, como agente formadora : [. não se preparam apenas para viver, mas já vivem uma verdadeira vida” (PISTRAK, 2000, p. pois “[. o regime soviético é em si mesmo uma escola colossal” (PISTRAK, 1977, p. FREITAS, 2009, p. Finalmente, para concluirmos a presente exposição sobre os renomados teóricos socialistas, Freitas (2009) dedicou-se também a apresentar Anton Makarenko, cujo trabalho na Colônia Gorki se tornou ums dos fundamentos para uma vida coletiva. Era a busca pelo mais eficiente ou desenvolvido, tendo em vista as necessidades da União Soviética. A ciência moderna era referência na medida em que, como expressão do domínio humano sobre a natureza, era responsável, também, pelo aumento da riqueza material produzida. Essa condição era necessária para que a Rússia rompesse, inclusive, com a escassez de alimentos; garantia básica da existência humana (FREITAS, 2009, p.

Leite e Borges (2017) analisaram a questão do trabalho como modelo educacional na Rússia pós-revolução no centenário da mesma. Os autores se dedicaram a expor os fundamentos da Escola Única do Trabalho, que em linhas gerais buscou associar teoria e prática: Constata-se que os soviéticos recuperam o real sentido do trabalho no desenvolvimento humano e social, como trabalho produtivo15 no qual, independentemente do tempo histórico, define o modo humano de existir, criando e recriando o ser humano. Neste sentido o autor sistematizou os tópicos convergentes, como a relação entre escolarização e a divisão social do trabalho; no papel da ciência; importância estratégica da educação da classe trabalhadora; o trabalho como prática que desenvolve os indivíduos tanto física como intelectualmente; conceitos como “atualidade”, “complexos” e “auto-organização”, e, finalmente, mas igualmente importante, a relevância do trabalho com caráter formativo.

Este tópico apresentou a concepção teórica e propostas dos principais educadores russos sobre a pedagogia social implantada na Rússia pós-revolução. Não se pretendeu esgotar o tema da pedagogia social, já que não se abordou neste estudo como se deu o desenvolvimento desta em outros países como Itália, México e Espanha. A seguir dedicaremos uma sessão para discorrer sobre a Pedagogia do Movimento Sem Terra. PEDAGOGIA DO MOVIMENTO SEM TERRA “O ser humano se forma transformando-se ao transformar o mundo” (Caldarte, 2012). Neste sentido, tudo o que o homem, trabalhador do campo faz no seu cotidiano contribui para formá-lo. Assim, o “sujeito educador principal é o próprio movimento, não apenas quando trabalha no campo específico da educação, mas fundamentalmente quando sua dinâmica de luta e de organização intencionaliza um projeto de formação humana” (CALDART, 2012, p.

Vale ressaltar que quando se fala em Pedagogia do Movimento não se trata de algo novo, contudo é uma retomada radical, ou seja, na matriz da formação humana. Desse modo, percebeu-se que essa pedagogia extrapolava o MST e requeria um projeto político pedagógico estruturado que valorizasse duas premissas básicas: os movimentos sociais fomentam a educação para que os envolvidos desenvolvam um raciocínio crítico sobre si, sua batalha e a sociedade em que vivem. E, por conseguinte, essa pedagogia está baseada no desenvolvimento do protagonismo dos sujeitos em oposição ao sistema capitalista vigente (CALDART, 2012). A criação do MST se depara com a realidade brasileira sem a devida Reforma Agrária necessária e a educação tida como privilégio de poucos, especialmente os de classe abastada.

Esse cenário motivou não só a criação das primeiras escolas do campo, como a formação de professores. Importante relembrar que a formalização do movimento é contemporânea ao primeiro encontro nacional de professores dos assentamentos. Assim, parte da luta do MST visava a criação de escolas públicas nos assentamentos. Para tal organizou-se o Setor de Educação, que seria responsável por esta parte. podemos dizer que, a pedagogia socialista soviética, incorpora o trabalho como princípio educativo para além do desenvolvimento de trabalhos pontuais no interior da escola. A síntese desafiadora das proposições de Pistrak e a formulação da educação por complexos de estudos, indicam caminhos de reflexão e práticas pedagógicas promissoras que inspiram formulações curriculares na atualidade ao legar três dimensões diferenciadas e complementares de incorporação do trabalho no processo educativo em articulação com o conhecimento, a atualidade e autoorganização, certamente por agirem em dimensões distintas do ser humano, bem como por interferirem, de distintas formas, na realidade.

Sendo, primeiramente, a incorporação do trabalho humano enquanto prática social, como objeto de estudo científico, artístico e de análise das contradições que perpassam o mundo do trabalho, recorrendo à historicidade dos fenômenos sociais e naturais para compreenderem as contradições e do devir, e progressivamente os estudantes se apropriarem da concepção materialista histórica-dialética do mundo. O segundo diz respeito a dimensão do autosserviço (trabalho simples), e o terceiro se desenvolve para a dimensão do trabalho socialmente necessário, aquele que é imprescindível para a coletividade e que tem valor pedagógico e social, que resulta em valor de uso, de produtos ou de serviços necessários à construção da sociedade socialista. LEITE e BORGES, 2017, p. O Censo da Reforma Agrária, realizado pelo INCRA durante o ano de 1997 em parceria com algumas universidades brasileiras apontou um índice de 29,5% de jovens e adultos analfabetos nos assentamentos, urna realidade que sabemos chegar a mais de 80% em algumas regiões.

e uma escolaridade média não superior a quatro anos, sendo encontrado um índice inferior a 2% de assentados com o ensino médio. Ou seja, de modo geral, a realidade dos sem-terra repete e em alguns casos aprofunda os índices que caracterizam especialmente o meio rural brasileiro. Se observarmos que esta pesquisa acontece depois de mais de uma década de trabalho do MST para promover a escolarização de sua base social, fica ainda mais clara a situação encontrada no início da luta (CALDART, 2000, p. Em segundo lugar, outro importante elemento que fomentou o nascimento das escolas do MST foi a luta das famílias, pela promessa de que a educação é um caminho para uma vida “melhor”. Vale ressaltar que tal degradação social se origina no período escravagista e pós-abolicionista.

Neste sentido, a educação foi ligada ao projeto de desenvolvimento nacional. Contudo, apesar do Brasil ser um país notadamente agrário, a educação do campo não recebeu devida menção nas Constituições anteriores a 1937. Em 1937 tivemos a quarta constituição da história brasileira decretada pelo então presidente Getúlio Vargas, no mesmo dia em que se implantava no país a ditadura do Estado Novo, transcorrida até 1945. O artigo 132 do texto destaca a importância do trabalho no campo e nas oficinas para a educação da juventude. Isso implica em reestruturação do trabalho do campo e da cidade, e, portanto, um redirecionamento da formação deste trabalhador (D’AGOSTINI, 2011, p. Para tal realização, a politecnia se baseia em alguns princípios, como compreender a escola em todos os seus aspectos, como gestão, currículo e práxis.

Sendo que esta última sempre deve ser concebida como um veículo de transformação da realidade social. Não se pode negar que enquanto houver separação e luta de classes, a politecnia não pode ser aplicada em sua totalidade, contudo: “É possível avançar, mas deve-se considerar que a superação destes limites só é possível através da categoria contradição, que permite compreender que o capitalismo traz inscrito em si, ao mesmo tempo a semente de seu desenvolvimento e de sua destruição” (D’AGOSTINI, 2011, p. O MST, ao se colocar numa posição contrária à organização da sociedade capitalista, por via da luta pelo acesso a terra, traz experiências formativas ao realizar denúncias sobre o caráter destrutivo da sociedade capitalista, por meio de suas mobilizações, tendo como horizonte a Reforma Agrária e a transformação social.

em um acampamento, que, em geral, tende a ser um espaço no qual a luta de classes é mais evidente. As escolas itinerantes vêm responder à necessidade concreta de assegurar a escolarização das pessoas que vivem em acampamentos, inicialmente as crianças. Era comum que elas perdessem o ano letivo devido às mudanças constantes, à falta de vagas nas escolas próximas dos acampamentos, e à discriminação sofrida pelo fato de serem sem-terra (BAHNIUK e CAMINI, 2012, p. Finalmente, este tópico apresentou de forma sintética um pouco do que se entende da Pedagogia do MST. A educação é para o Movimento um instrumento poderoso de luta e resistência contra o capitalismo e ao que ele representa na segregação de pessoas, negando-lhes direito sociais básicos. Esta possibilidade de conduzir trabalhos pedagógicos que superem a sala de aula como espaço central de aprendizagem traz também outro potencial, que é a construção de estratégias que visem superar a fragmentação do conhecimento vigente na grande maioria dos processos de ensino-aprendizagem, neste caso, sem ser “privilégio” das escolas do campo (MOLINA e SÁ, 2012, p.

Segundo Freitas (2009) o método de ensino ou didática proposto por Pistrak serviria para viabilizar as mudanças necessárias na escola, já que possibilitaria a compreensão da realidade. Do ponto de vista dialético, essa pedagogia ajudaria o aluno a refletir sobre os fenômenos naturais, implicando-os na prática. Neste sentido, supera a mera noção de aprendizado interdisciplinar, pois há certo direcionamento na escolha dos objetos de estudo, de modo que os temas necessariamente precisariam dialogar com o plano social. Freitas (2009) citando Pistrak (2000) usa o exemplo do estudo do complexo: “o homem”. Ademais, ainda salienta que é necessário ampliar (LEITE, 2017, p. Neste diapasão, faz-se importante esclarecer o que seja um tema gerador, já que é uma concepção fundamental dos Complexos de Estudo: “não é apenas um “tema”, mas a articulação entre a atualidade, a auto-organização e o trabalho” (DALMAGRO, 2016, p.

Leite (2017) explica que são temas que se apropriam do real, dentro do recorte temporal atual. Destarte, tais assuntos são estratégias de transformação da própria realidade a partir do vivenciado socialmente. Contudo, é importante observar que: [. A escola do MST cumpre uma missão de problematizar a educação vigente na atualidade, dentro da realidade brasileira, ao passo que apresenta uma metodologia diferenciada, onde a escola não só reproduz o cenário social, mas compreende que “se individualmente o acesso à escola é uma necessidade para inserção e disputa de posições sociais, para os setores organizados da classe trabalhadora, há muito tempo, trata-se de transformá-la articulando-a aos interesses dos grupos e da classe” (DALMAGRO, 2016, p. Contudo: A educação para o novo somente é possível no contexto que enseja este novo, o que não ocorre livre de inúmeros impasses, desafios e contradições.

Este ponto é importante de ser esclarecido para não cairmos na idealização de que chegaremos a uma sociedade melhor nos educando de modo diferente, mas sem que se alterem as bases materiais que geram a educação. Desta forma, a mudança da educação está vinculada às mudanças na base material da sociedade. É esta última que pode assegurar uma educação efetivamente distinta. Já no estado do Paraná, ela foi organizada em 2003 e a introdução dos Complexos de Estudos se deu em 2013. As escolas itinerantes se ligam à escola base, que no caso do paranaense é o Colégio Estadual do Campo Iraci Salete Strozak, localizado no Assentamento Marcos Freire em Rio Bonito do Iguaçu/PR. Toda a organização burocrática se dá na escola base. Desde o ano de 2010, a estrutura pedagógica é direcionada pelos Ciclos de Formação Humana, mas já se observavam alguns indicadores dos Complexos.

A formalização do sistema de complexos se deu pelo Plano de Estudos, que funciona como o currículo do programa. Cabe esclarecer que a escola movida pelos Complexos promove um espaço de formação política dos alunos, de forma que estes se sentem cada vez mais parte dos processos decisórios, e portanto, autônomos e implicados com sua escolarização (SAVI, 2016). Na proposta curricular por Complexos de Estudo, indica-se que o dia escolar seja organizado da seguinte forma: tempo abertura, tempo trabalho, tempo leitura, tempo reflexão escrita, tempo cultura, tempo aula, tempo de estudo, tempo oficina, tempo notícia, tempo de estudo independente orientado, tempo dos núcleos setoriais e tempo dos educadores. As formas dessa organização já constituem práticas nas escolas do MST, reordenadas de outro modo na proposta em questão (SAVI, 2016, p.

A figura 2 representa a o sistema de auto-organização dos estudantes, com base na organização da escola. Figura 2 - Sistema de auto-organização dos estudantes Fonte: Sapelli (2015, p. CULTURA E COMUNICAÇÃO Atuam no processo de socialização de informações na escola e no acampamento/assentamento, proporcionando a todos a conexão com os fatos da escola, na comunidade de entorno. Organizam a rádio escolar, jornais e murais. Realizam leitura do diário no tempo formatura para toda a comunidade escolar. Diversas linguagens, como: escritas, faladas, e domínio das diversas tecnologias como: rádio, internet, jornal, mural. APOIO AO ENSINO Organizam-se em torno da dimensão do ensino na escola e o acesso ao conhecimento científico, desde o planejamento de ensino ao cronograma de tempos educativos; organizam materiais e equipamentos de suporte ao ensino (televisor, o rádio, aparelho de DVD), e os materiais didáticos, a organização da biblioteca e secretaria escolar.

Além de executarem tarefas práticas de limpeza, fazem orientação à boa alimentação, cuidado com a higiene e espaços limpos e organizados. Procedimentos práticos de limpeza e higiene, bem como compreensão sobre alimentos saudáveis e sua preparação. AGRÍCOLA São responsáveis pelas práticas agrícolas na escola e possibilitam a vivência do cuidado com a terra e com o meio ambiente. Planejam a produção de alimentos para o consumo na escola e na comunidade através de hortas agroecológicas, pomar e plantio de outros alimentos, também na criação de animais. Práticas da vida no campo, desde planejar o plantio, a colheita, com base em conhecimentos científicos sobre produção agrícola. Apesar dos desafios e limitações observados na implantação do modelo de Complexos nas escolas itinerantes do Paraná, elas têm servido como modelo para outros estados.

Ainda acerca dos limites, o que se observou foi que estes estavam ligados à questão do trabalho socialmente necessário, pois ainda falta instrumentalizar mais a este respeito. Além disso, há problemas nos recursos disponíveis para capacitação dos profissionais, bem como entraves na definição dos conteúdos. Finalmente, a escola vem sofrendo ataques, a fim de atingir sua dissolução (SAPELLI, 2017). Atualmente, a maior dificuldade do MST para prosseguir no processo é o ataque que a escola itinerante vem sofrendo por parte do governo estadual (PSDB), fato que tem dificultado a permanência dos integrantes do Movimento na docência da educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas em questão. LIMA, F. C. S. O pensamento pedagógico socialista: reflexões sobre a experiência educacional desenvolvida na Rússia pós-revolucionária sob a orientação de Pistrak.

 Educação e Emancipação, São Luís, v. Universidade Federal Do Recôncavo da Bahia, 2016. BAHNIUK, Caroline; CAMINI, Isabela. Escola itinerante. In: CALDART, Roseli et al. org. São Paulo: Expressão Popular, 2000. Educação do Campo. In: CALDART, Roseli et al. org. Dicionário da Educação do Campo, RJ/SP, EPSJV/Expressão Popular, 2012. Contribuições da pedagogia socialista para a educação do MST V Encontro Brasileiro De Educação E Marxismo. Marxismo, Educação E Emancipação Humana. Anais, 2011 – UFSC – Florianópolis – SC – Brasil. DALMAGRO, S. L. FREITAS, C. R. O escolanovismo e a pedagogia socialista na União Soviética no início do século XX e as concepções de educação integral e integrada. – Cascavel, PR; UNIOESTE, 2009. dissertação de mestrado].

n. Disponível em: https://ojs. franca. unesp. br/index. In: CALDART, R. et al (Org. Dicionário da Educação do Campo. São Paulo e Rio de Janeiro: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio; Expressão Popular, 2012. p. As Diferentes Questões. Lisboa: Editorial Avante. MARX, K. ENGELS, F. Textos sobre Educação e Ensino. MOLINA, Mônica Castagna ; SÁ, Lais Mourão. Escola do Campo. In: CALDART, R. et al (Org. Dicionário da Educação do Campo. br/index. php/revistagerminal/article/view/9503/6927>. Acesso em: 11 Fev. doi:http://dx. doi. de Luiz Carlos de Freitas. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2003. A Escola Comuna. São Paulo: Expressão Popular, 2009. Pistrak e Viktor N. Shulgin para a pedagogia do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Perspectiva, Florianópolis, v.

n. p. X. v33n3p1163. SAVI, Claudinéia Lucion. Complexos de estudo: investigando um experimento de currículo em uma escola de assentamento do MST no Paraná. f.   Available from <http://www. scielo. br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S1413-24782007000100012&lng=en&nrm=iso>. access on  13  Feb.  p.   July  2017.   Available from <http://www. scielo. br/scielo. SHULGIN, Viktor. Rumo ao politecnismo. São Paulo: Expressão Popular, 2013. SOLDA, Maristela. Proposta pedagógica complexos de estudo: escola, trabalho, conhecimento e ensino. do centenário --Brasília : Senado Federal, Conselho Editorial, 2017. v. – (Edições do senado Federal ; v. A-C).

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