A personagem da ficção

Tipo de documento:Resumo

Área de estudo:Literatura

Documento 1

Os autores descartam a observação estrutural, considerando mais importante considerar as várias camadas de significação que os textos literários oferecem, na elaboração de descrições que extrapolam o dado objetivo, o que chama de “mundo fictício ou mimético que frequentemente reflete momentos selecionados e transfigurados da realidade empírica exterior à obra”. A seguir, conceituam a personagem de ficção nos aspectos ontológico, lógico e epistemológico. No que tange ao primeiro, explica que a ficção, de modo geral, parte do particular (o personagem) para chegar ao geral - que é o aspecto de identificação do público, diferentemente de um texto de não ficção, onde, um biólogo, por exemplo, irá se referir ao coletivo para informar a respeito de uma espécie, por exemplo, que não necessariamente remete à particularidade.

Já o problema lógico abarca a questão da verdade/verossimilhança do texto, sendo que a primeira é propriedade ligada ao produto científico, por exemplo, enquanto a ficção, embora já surja em um pacto de leitura que pressupõe um universo não objetivamente correspondente à realidade, mantém uma construção lógica, uma aparência de realidade caracterizada pela coerência interna, o rigor nos detalhes e outras minúcias que agregam maior vigor à obra. A respeito do problema epistemológico, o foco é a personagem, que Rosenfeld et al. Para os autores, mesmo o cenário mais simples, de papelão, adquire cores e profundidade quando, em seu centro, a personagem “projeta em torno de si o espaço e o tempo irreais e transforma, como um golpe de magia, o papelão em paisagem, templo ou salão”.

No cinema, chama a atenção para a função dos movimentos de câmera, que exercem uma função narrativa (a câmera focaliza, aproxima, recorta, expõe, descreve). Considera que “Em tôdas as artes literárias e nas que exprimem, narram ou representam um estado ou estória, a personagem realmente “constitui” a ficção”, com a ressalva de que, no teatro, o ator não apenas constitui a ficção como funda onticamente o espetáculo, ou seja, é a razão de ser do mesmo. O palco não pode ficar vazio, enquanto o cinema pode adquirir caráter documental, por exemplo, e a literatura, da mesma forma, reportar imagens e palavras suficientes para os efeitos desejados. Sobre o paradoxo pessoa/personagem, a reflexão gira em torno da concretude da realidade que, embora fragmentária na perspectiva do observador, nunca será tão fragmentária quanto a sua recriação no espaço ficcional.

Já a relevância estética surge na medida em que o autor consegue projetar este imaginário à base de orações, o que requer uma composição estilística especialmente sonora. De modo geral, os grandes personagens da literatura constituem um denso tecido de valores “de ordem cognoscitiva, religiosa, moral, político-social e tomam determinadas atitudes em face desses valores”. Nas tramas, confrontam-se com a necessidade de tomar decisões pessoais ou de implicação ética, atravessar conflitos e situações-limite, momentos que revelam aspectos essenciais, trágicos, sublimes, grotescos ou luminosos. “Muitas vezes de ordem metafísica, incomunicáveis em toda a sua plenitude através do conceito, revelam-se, como num momento de iluminação, na plena concreção do ser humano individual. ” Os autores consideram a ficção um lugar ontológico privilegiado, uma vez que nele o homem pode viver e contemplar, por meio das personagens, a plenitude da sua condição.

O mesmo autor faz uma alusão ao Homo sapiens em paralelo ao Homo fictus. O segundo “come e dorme pouco”, mas viveria mais intensamente no plano das emoções. Um aspecto complementar para entender a construção da personagem de ficção é considerar o papel da memória. Ao rememorar, traços imprecisos, embora com base no vivido, vão se delineando. Essa recriação será sempre uma modificação do real, no acréscimo ou supressão de detalhes. Por fim, no monólogo o personagem pode “pensar alto” em sua solidão, por vezes, lírica e essencialmente elaborativa. Devido a questões operacionais, muitas vezes o teatro recorreu a personagens padronizados, escolhendo tipos padrões para assumirem o elenco, o que permitia às companhias girar o mundo com pequenas variações de repertório, o que costumava agradar ao público no nível do entretenimento, em uma lógica circense.

Já na atualidade, “o realismo moderno, ao contrário, condena a personagem a ser unicamente ela mesma, expulsando o autor de cena, relegando-o aos bastidores, onde deve permanecer invisível e em silêncio. ” Enquanto a obra literária é um prolongamento do autor, a personagem constitui um paradoxo, porque é fruto da imaginação do romancista ou do dramaturgo que adquire existência artística, “quando se liberta de qualquer tutela, quando toma em mãos as rédeas do seu próprio destino: o espantoso de toda criação dramática — em oposição à lírica — é que o autêntico criador não se reconhece na personagem a que deu origem”. Assim, o teatro vai ainda mais longe pois, no palco, haverá embates entre ator e personagem e ator e dramaturgo.

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