A fenomenologia de Sartre: os conceitos de Angústia, Ansiedade e Autenticidade

Tipo de documento:Revisão Textual

Área de estudo:Gestão de crédito

Documento 1

“Penso, logo existo” representou o nascimento da área fenomenológica, com René Descartes (1596-1650) propondo a “dúvida radical” que anunciou a existência, admitindo sua completa certeza no ato de duvidar (CERBONE, 2012). A coisa pensante (res cogitans) é representativa do dualismo corpo-mente, mas não indica idealismo. Como indutivista, Descartes não deve ser visto como proponente de uma teoria da verdade. Sua intenção era provar a existência do ser, e o fez através da redução. Negando a existência de tudo e todos, pôde conciliar a própria existência à única vertente inegável e indubitável, o pensamento. O primeiro, porque é da natureza essencial da experiência: desempenha-se papel de observador quanto à própria experiência e não se é definido por ela. Isola-se o fluxo da experiência consciente, e a pureza desse fluxo é uma função da suspensão de quaisquer questões com respeito à relação entre a experiência e o mundo circun- dante.

O segundo, porque diz respeito à consciência ter acesso a aspectos fora dela, transpondo ou transcendendo um limite intangível (CERBONE, 2012). Os existencialistas, tais como Jean-Paul Sartre (1905-1980), Martin Heidegger (1889-1976) e Maurice Merleau-Ponty (1908-1961) desafiam a posição purista, ou transcendental, suspeitando a redução fenomenológica entendida por Husserl. Passa- se a considerar aquele que experiencia em seu sentido concreto, em vez de abstrato e anônimo. Dizer que a consciência é intencional é dizer que sempre almeja algo fora de si mesma. Não se deve aqui confundir o conceito “ser-em-si“, pois é fundamentalmente diferente da maneira de ser consciente (LEVY, 2002) “A consciência é revelação-revelada dos existentes, e estes comparecem a ela fundamentados pelo ser que lhes é próprio. Mas a característica do ser de um existente é não se revelar a si, em pessoa, à consciência: não se pode despojar um existente de seu ser; o ser é fundamento sempre presente do existente, está nele em toda parte e em parte alguma; não existe ser que não seja ser de alguma maneira ou captado através dessa maneira de ser que o manifesta e encobre ao mesmo tempo.

Contudo, a consciência sempre pode ultrapassar o existente, não em direção a seu ser, mas ao sentido desse ser. Por isso podemos denominá-lo ôntico-ontológico, já que uma cracterística de sua transcendência é transcender o ôntico rumo ao ontológico. Nós somos fundamentalmente engajados com o mundo; nós agimos com ele antes de observarmos ele. As entidades do mundo são reveladas a nós como um equipamento (visão objetivista). Eles têm um lugar em nossos projetos antes de serem uma mera extensão. Pode-se pensar: que consequências têm essas instâncias fenomenólogicas sobre o mundo e nós mesmos? Fundamentalmente, que nós vivemos em um mundo que não tem significado. Signficado - valores, os traços de projetos humanos - não são impostos por objetos, mas objetos são revelados a nós através de seus significados.

O existente para-si é capaz de assumir uma perspectiva particular do mundo (ser-em-si), lhe atribuindo valor. LEVY, 2002) Embora o ser-em-si tenha semelhanças cartesianas, o para-si é fundamental- mente diferente de cogito, ergo sum. O para-si é separado do ser-em-si por um nada, e esse nada é o que, em certo sentido, permite que este se retire do mundo em si mesmo para questioná-lo. O nada vem ao mundo através do para-si, porque o para-si é o seu próprio nada. O nada e esse questionamente tem uma relação íntima, não apenas porque ele permite o para-si questionar o mundo, mas porque o nada questiona-se perpetuamente. O ser para-si é para-outro enquanto ser de si mesmo, e revela o ser seu sem ser para-si. “Descrevemos a realidade humana a partir das condutas negativas e do Cogito.

Seguindo esse fio condutor, descobrimos que a realiade humana é para-si. Será tudo que é? Sem sair de nossa atitude de descrição reflexiva, podemos encontrar modos de consciência que parecem indicar, mesmo se conservando estritamente para-si, um tipo de estrutura ontológica radicalmente diverso. Esta estrutura ontológica é minha; é de mim mesmo que cuido, e, no entanto, esse cuidado (cura) “para-mim” revela um ser que é meu sem ser-para-mim. É, portanto, livre, a todo instante que possue a liberdade do ser quem é. O escolher-se dá-se como ação no mundo, e o mundo se significa. O mundo que nos cerca é escolhido e escolhemos a nós mesmo. O existencialista posiciona-se que ser livre não é obter-se o que se quer, mas sim determinar-se a querer, uma vez que o êxito, em absoluto, não importa à liberdade.

O conceito de liberdade sartriano é, dessa forma, único e intrínseco: autonomia de escolha (SCHNEIDER, 2011). Tal escolha afetará meu futuro e uma das características essenciais da liberdade é a do compromisso ontológico, que quer dizer que ao me escolher, ainda que de forma alienada, sob pressão das circunstâncias, eu escolho o ser que eu sou e serei. A consciência da liberdade, a sua descoberta, gera angústia no plano reflexivo. Enquanto o indivíduo permanece no plano da ação e da urgência do mundo, não perceberá a liberdade. “A angústia sartriana nada tem a ver com a agonia decorrente do medo, do desespero ou da ansiedade, pois angústia e medo não podem ser confundidos, dado que aquela diz respeito tão somente a mim, porque aquilo que realizo depende exclusivamente de mim, já o medo diz respeito ao que pode ocorrer comigo, ou seja, a algo exterior.

A angústia em questão deve ser compreendida a partir da relação entre o que sou em um determinado momento, o que fui anteriormente e o que serei em um tempo futuro. “Nós percebemos o problema (consciência irreflexiva do mundo); então nós percebemos nós mesmo como tendo um problema para resolver (reflexão); com base nesta reflexão, concebemos uma ação na medida em que devemos realizá-la (reflexão); então vamos ao mundo praticar a ação (irreflexão), não considerando mais nada além do objeto sobre o qual agimos. ” (SARTRE, 1993) O conceito sartriano de angústia vem de uma ação reflexiva. Para Sartre, emo- ções, como a ansiedade e o medo, têm causas extrínsecas irreflexivas, ou seja, são frutos de um objeto dado na realidade.

Atualmente, há autores 1 que consideram a angústia como sinônimo de ansiedade. Nestes, a angústia vem de uma relação interna, quando o homem age sobre a situação, enquanto o medo é derivado das relações com os seres do mundo, ou seja, é a situação agindo sobre o homem. Se um comportamente menifesta propriedades que uma pessoa realmente possui, e não são apenas fixados de maneira que se finge que é, então esse comportamento demonstra autenticidade. Ver HOSTE, 2016. “Mas, porque uma tal concepção da autenticidade aponta para uma reviravolta, em contra corrente com as relações da impessoalidade mediana? É que, para alguém apreendê-la, só o será com tanto mais densidade, quanto mais se dispuser, ele próprio, ao modo-de-ser da autencidade aberta, que para o pensamento sartriano, não deixa de ser também agir ético.

” (BARANOWSKE, 2012) Sartre descreve a crença no determinismo fisiológico como a base de todas as atitudes de desculpas qaunto à negação da liberdade e falta de autenticidade. Não obstante, a autenticidade necessariamente envolve a descoberta da liberdade e, assim, a angústia. A ética em Sartre é excludente à concepção de liberdade. Parece impossível a partir do existencialismo determinar uma maneira de se proceder, o que ser e o que pensar. “A liberdade como identificação entre intenção e ato, conforme pretendida pelo senso comum (e por alguns intelectuais), não é mais que um engodo; e não apenas isso, afinal, além de ser falsa e irrealizável, torna a liberdade e consequentemente toda ética impossível. Caso abra-se a guarda da liberdade para a determinação é de se supor que, no limite, todas as ações humanas possam ser justificadas – seja por ignorância do resultado do ato, seja pela recorrência a algo que interferiu na intenção daquilo que foi projetado, seja lá o que mais a criatividade humana considerar aceitável.

” (SILVA, 2012) A ética Sartriana pode-se denominar, portanto, inexistente. É livre absolumente em suas ações e escolhe, por isso, libertar-se. Dessa forma, as relações sociais é que definem a ética Sartriana. Silva (2012) nos esclarece. “É em sociedade que os papéis são definidos e se a fonte absoluta é a liberdade humana, nada mais natural que o Mal tenha aí também sua fonte: são as relações sociais, embora enviesadas, que constituem as funções de todos aqueles que estão a serviço do Bem. ” (SILVA, 2012) Reduzir a liberdade à identidade entre o projeto e o resultado obtido não se interrelaciona ao para-outro, não desperta a liberdade de outrém e faz deste uma interconexão social. Dissertação (Programa de Pós-Graduação em Filosofia), Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2012.

CERBONE, David R. Fenomenologia. Petrópolis: Vozes, 2012. CHALMERS, Alan F. HOSTE, Vinicius X. A Constituição da Angústia em Sartre: do Patológico ao Ontológico. Revista Sofia. v. n. OXFORD UNIVERSITY PRESS, Oxford Learner’s Dictionary, 2019. Disponí- vel em <https://www. oxfordlearnersdictionaries. com>. Acesso em 01 de dezembro de 2019. ed. Petrópolis: Vozes, 1997. SILVA, Luciano Donizetti da. A Ética Sartriana nos Limites da Liberdade. Pen- sando – Revista de Filosofia, v.

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