O Consumidor e a Indústria Automobilística Casos do Ford Pinto EUA e do Fiat Tipo Brasil

Tipo de documento:Redação

Área de estudo:Religião

Documento 1

Análise da jurisprudência relacionada aos incêndios do Fiat Tipo. Palavras-chave: Direito do consumidor. Consumerismo. Defeito de produto. Vício oculto. Defective product. Latent defect. Car fire. Auto industry: Ford pinto. Auto industry: Fiat tipo. Princípio da Boa-Fé 15 2. Princípio da Informação 16 2. Princípio do Acesso à Justiça 17 2. Defeito e Vício do Produto ou Serviço 18 2. Causas Eximentes de Responsabilidade do Fornecedor 19 3 A INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA E O CONSUMIDOR: Dois Casos Emblemáticos 21 3. A seguir como introdução para o estudo dos casos concretos, são analisados os conceitos de defeito e vício e as causas eximentes de responsabilidade do fornecedor. Faz-se uma análise do caso que foi uma das causas de origem do consumerismo atual; não por acaso, ocorrido com um dos ícones de consumo na maior economia do mundo.

Para tanto, é ressaltada a opção entre corrigir o defeito ou indenizar mortos e feridos, algo que hoje seria ilegal. Após, são analisadas, em seus principais aspectos, as conseqüências dessa opção e os prejuízos que o fabricante teve ao decidir que o lucro deveria prevalecer sobre a proteção da vida. A seguir, é descrito o caso de acidente de consumo que mais repercutiu no mercado automobilístico brasileiro, ironicamente causado por um carro importado, o Tipo 1. Os conflitos daí decorrente forçaram a adaptação de muitas regras e costumes, verdadeiros dogmas da era pré-industrial, à nova realidade. O Brasil, assim como o resto do mundo, demorou para reconhecer a responsabilidade civil objetiva como dever de indenizar pelos danos decorrentes de acidentes de consumo, que sequer eram reconhecidos como tal.

Antes da edição da Lei 8. era a jurisprudência que regulava o assunto, orientada, basicamente pelo Código Civil de 1916, que preceituava em seu artigo 159: aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste Código, arts. Definição esta que guarda, em sua estrutura,a idéia de culpa quando se cogita da existência de ilícito(responsabilidade subjetiva), e a de risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa (responsabilidade objetiva) (DINIZ, 2007, p. Marques, Benjamin e Miragem, ao comentar o CDC, dão o seguinte enfoque à responsabilidade civil objetiva: Afastando-se, por conseguinte, do direito tradicional, o Código dá um fundamento objetivo ao dever de indenizar.

Não mais importa se o responsável legal agiu com culpa (imprudência, negligência ou imperícia) ao colocar no mercado produto ou serviço defeituoso. Não é sequer relevante tenha ele sido o mais cuidadoso possível. Não se trata, em absoluto, de mera presunção de culpa que o obrigado pode elidir provando que atuou com diligência. VIII – Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: [. responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Art. § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros.

Art. Seus princípios e normas são de ordem pública e interesse social, vale dizer, de aplicação necessária, conforme expressamente disposto logo em seu primeiro artigo. Promover a defesa do consumidor (Constituição Federal, art. XXXII) importa restabelecer o equilíbrio e a igualdade nas relações de consumo, profundamente abaladas por aquele descompasso entre o social e o jurídico, ao qual nos referimos (Código de Defesa do Consumidor, art. III). Em outras palavras, a vulnerabilidade do consumidor é a própria razão de ser do nosso Código do Consumidor; ele existe porque o consumidor está em posição de desvantagem técnica e jurídica em face do fornecedor. é o princípio pelo qual é reconhecida pelo sistema jurídico positivado brasileiro reconhece a qualidade daquele ou daqueles sujeitos mais fracos na relação de consumo, tendo em vista a possibilidade de que venham a ser ofendidos ou feridos, na sua incolumidade física ou psíquica, bem como no âmbito econômico, por parte do sujeito mais potente da mesma relação.

O princípio da vulnerabilidade decorre diretamente do princípio da igualdade, com vistas as estabelecimento de liberdade, considerado [. que somente pode ser reconhecido igual alguém que não está subjugado por outro (MORAES, 1999, p. Entendendo, então, que a vulnerabilidade decorreu do princípio da igualdade, com o objetivo de estabelecer a liberdade aos naturalmente subjugados no mercado de consumo, cabe citar José Reinaldo de Lima Lopes que, em artigo na Revista do Consumidor, apresenta estudo clarificador sobre o assunto: [. existe nas sociedades de classes e especialmente pobres como o Brasil, duas espécies de consumidores: os privilegiados e os desfavorecidos (ou hipossuficientes, como diz nosso CDC, no art. O Estado também pode incentivar a criação de organizações privadas de tutela do consumidor. Inclui, também, o amparo estatal àquelas pessoas que, por sua condição de hipossuficiência, não podem arcar com encargos da demanda, como custas de honorários advocatícios.

Outro aspecto é o enfoque sob o princípio do dever governamental, em que é dever do próprio Estado promover continuadamente, segundo o art. °, VII do Código de Defesa do Consumidor, a “racionalização e melhoria dos serviços públicos” (BRASIL, 2009, p. Temos aqui a figura do Estado-fornecedor, além de suas eventuais responsabilidades. ° Os produtos e serviços no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar informações necessárias e adequadas a seu respeito. Parágrafo único. Em se tratando de produto industrial, ao fabricante cabe prestar as informações a que se refere este artigo, através de impressos apropriados que devam acompanhar o produto.

Art. ° O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança. c, da lei espanhola de proteção ao consumidor (Ley nº 20/1984, de 19 de julho). Cumpre ao magistrado pesquisar se as partes agiram com boa-fé para conclusão do negócio jurídico de consumo, a fim de verificar se a cláusula sob exame é ou não válida à luz do preceito legal sob comentário. A utilização da equidade, como técnica de julgamento no processo civil, é circunscrita nos casos autorizados por lei, segundo dispõe o art. do CPC. A norma aqui analisada dá ao juiz a possibilidade de valoração da cláusula contratual, a fim de verificar se é ou não contrária à equidade e boa-fé.

A esperada clareza das informações, junto com o princípio da boa-fé objetiva – o dever das partes de agirem buscando honestidade e lealdade – deve ser constantemente almejada, como forma de estabelecer equilíbrio e harmonia nas relações de consumo. Assim, podem ser acomodados os interesses de ambas as partes, sem ocasionar-lhes qualquer lesão ou ameaça de direito. Princípio do Acesso à Justiça O Princípio do Acesso à Justiça pressupõe a possibilidade do cidadão discutir suas demandas junto aos órgãos do Poder Judiciário, desde que obedecidas as regras estabelecidas pela legislação processual para o exercício do direito. Nossa Constituição é clara a este respeito, quando em seu art. º, XXXV, preconiza: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (BRASIL, 2009, p.

Defeito e Vício do Produto ou Serviço Um defeito num produto ou serviço relaciona-se aos acidentes de consumo, de forma que atinja o consumidor e lhe cause dano material e/ou moral. O CDC trata da responsabilidade pelo defeito no seu art. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre a utilização e riscos (BRASIL, 2009, p. Se o problema, no entanto, for menos grave e seus efeitos fiquem restritos à própria coisa ou serviço, estaremos diante de um vício; algo que vá causar mau funcionamento, ou até impedir que o produto funcione, mas sem outras conseqüências.

Para sanar o vício, o fornecedor poderá, a critério do consumidor, reparar ou substituir o produto, abater o preço, de forma a compensar o desvalor, ou desfazer o negócio, devolvendo a quantia recebida. Cív. AC 1. Rel. Des. José Flávio de Almeida, Acórdão de 29 out. Considerando que a indenização mede-se pela extensão do dano (art. do CC/02), no caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor deve indenizar o ofendido das despesas do tratamento até ao fim da convalescença (art. do CC/02) (MINAS GERAIS, 2009). prejuízo aos que ingeriram o refrigerante. Todavia, o produto chegou às mãos de consumidores por motivo de força maior, que é o acontecimento da natureza. Cív. RI 71001795483, Rel. Vivian Cristina Angonese Spengler, Acórdão de 20 maio 2009.

AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. MÁ REAÇÃO POR UTILIZAÇÃO DE TINTA PARA CABELOS. A INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA E O CONSUMIDOR: Dois Casos Emblemáticos e Fiat Tipo. Destacam-se aqui dois casos emblemáticos3, os automóveis Ford Pinto 3. Pinto: o Caso Norte-Americano Será que a Ford Motor Company agiu de forma ética quando decidiu não corrigir o problema do tanque de combustível de um carro que começou a ser fabricado em 1971, somente vindo a fazê-lo em 1978? Fugiria à ética uma análise de custo/benefício que coloca preço na vida humana? A administração da companhia recusou-se a ouvir os alertas dos engenheiros sobre o problema? E o governo dos Estados Unidos, país onde se deu o caso, por que não impediu tantas mortes, resultantes de um projeto defeituoso? O presente trabalho apresenta dados sobre este caso complexo, com intrincadas relações entre consumidores, agentes públicos, diretores da empresa, administradores.

O que aconteceu na maior economia do mundo, e o que se aproveitou disto, viria a se tornar o paradigma das relações de consumo no mundo contemporâneo, influenciando a legislação consumerista de vários países, inclusive o Brasil, onde, nos anos 90, também tivemos um carro que pegava fogo, embora por causa diferente e sem perdas de vidas. Trata-se de uma interação complexa de organizações, pessoas, políticas públicas, pressa e pressões financeiras. Adjetivo: malhado. parafusos do eixo5, furando e espirrando gasolina na estrada em torno do carro, bastando uma faísca para incendiar tudo. Figura 2 – A propaganda enaltece o avanço tecnológico do carro, salientando a trajetória evolutiva da Ford (FORD, [2005?]). Mesmo sabendo disso, a direção da Ford decidiu fabricar o carro de qualquer maneira, pois as máquinas da linha de montagem já tinham sido fabricadas quando o defeito fora detectado (DOWIE, 1977, p.

HAGAN, 2008, p. Colisão iminente Impacto: inicia-se a deformação da carroceria. Prossegue a deformação da carroceria. A gasolina espirra (a mancha branca na foto) Inicia-se a combusta da gasolina espirrada. O fogo se alastra. Figura 3 – Colisão, quadro a quadro (FORD. Não importava quão ridículo fosse cada argumento, acompanhado de milhares de páginas com afirmações altamente técnicas, tomavam meses ou, preferivelmente, anos do governo para testá-los. A Ford tinha um grande a ativo escritório em Washington, especializado em aplicar essas técnicas embusteiras nas agências governamentais. Como o Departamento dos Transportes não sabia identificar o que era ou não verdade nas afirmativas da Ford, contratou diversos grupos independentes de pesquisas para estudar os incêndios em automóveis.

Isto demorou muitos meses, e esta demora coincidia com os interesses da empresa. Concluídos os estudos, entretanto, revelaram que os incêndios em automóveis eram de uma magnitude que os oficiais de transportes jamais haviam imaginado. Parece que os júris foram muito mais rápidos que os burocratas para ver a verdade e começaram a decidir contra a companhia, concedendo indenizações de milhões de dólares aos demandantes7 (DOWIE, 1977, p. Pouco depois, o governo determinou a indenização de duzentos mil dólares por morte, e a Ford fez uma análise de custo-benefício, concluindo que seria mais barato pagá-las a ter que introduzir na linha de montagem uma melhoria de onze dólares, para impedir 180 mortes por ano. Lee Iacocca teria sido flagrado dizendo: segurança não vende (DOWIE, 1977, p.

Caso Histórico O caso do Ford Pinto representa um trágico exemplo da estimativa do valor da vida numa estrutura de custo-benefício. Na tarde de 10 de agosto de 1978, Judy Ulrich levava sua irmã Lyn e sua prima Donna Ulrich de Osceola, Indiana, para um jogo de vôlei numa igreja da cidade vizinha, Goshen (AASENG, 1997, p. O caso foi a julgamento em Winamac, Indiana, em 15 de janeiro de 1980 e Albert Clark (AASENG, 1997, p. uma testemunha da acusação, relatou que viajava na pista contrária, junto com sua esposa e viu que a colisão tinha sido pequena. Ele e várias outras testemunhas disseram que o caro de Judy estava em movimento, o que deve ter reduzido o impacto quando os carros colidiram. William Martin (AASENG, 1997, p. que também viu a colisão, estimou a velocidade da perua em 80 km/h e a do Pinto em 25 km/h, o que resultaria num impacto de 55 km/h, visto estarem no mesmo sentido.

A acusação também se baseou no relatório dos legistas, para alegar que a colisão não teria sido grave, pois, segundo o médico Robert Stein (AASENG, 1997, p. as vítimas morreram em razão das queimaduras, e não de lesões internas que poderiam ter sido causadas pelo impacto (Figura 6). Figura 6 – Destroços do Ford Pinto 1973. Nota: A foto se refere ao acidente no qual morreram queimadas as irmãs Judy e Lyn Ulrich e sua prima, Donna Ulrich, em 10 de agosto de 1978 (AASENG, 1997, p. Também o Dr. Usando os valores médios de indenização por homicídio culposo e lesões corporais, foi calculada a implicação legal de não modificar o veículo. Usando um valor de duzentos mil dólares para cada pessoa morta e sessenta e sete mil para cada ferido, chegaram ao total aproximado de cinqüenta milhões de dólares (Isto também inclui uma pequena quantia para o custo dos carros danificados).

A Ford concluiu, então, que seria mais negócio pagar indenizações por responsabilidade civil, quando necessário, em vez de melhorar o seu produto. Por que a Ford não agiu de outra forma, aprimorando seu produto, agregando a peça de onze dólares e acrescentando essa quantia no preço do carro? Vidas poderiam ser salvas e, afinal, o aumento no preço seria irrisório. Aprofundando um pouco a análise da questão e tentando entender o ponto de vista da empresa, veremos que o desenvolvimento de um produto complexo como um automóvel implica na tomada de milhares de decisões, muitas delas envolvendo questões de segurança. – que teriam origem no seu departamento de engenharia. Ademais, estes se referiam aos carros fabricados em 1971 e 1972 e o carro das vítimas era de 1973.

O documento mais importante a ser excluído foi um relatório altamente desfavorável da NHTSA (National Highway Traffic Safety Administration), que informava altas taxas de vazamento de combustível anotadas nos testes de colisão do carro. O motivo da exclusão foi, novamente, que os carros testados eram de 1971 e 1972, e a empresa alegava ter feito aperfeiçoamentos no modelo 1973. Ao comentar a absolvição da empresa, Clarence Ditlow, um conhecido líder nas críticas à indústria automobilística, reavivou a questão sobre o grau de culpa, num comentário que foi largamente veiculado: Tendo em vista as restrições impostas pelo juiz quanto à admissibilidade das provas da acusação, mas admitindo o teste de impacto apresentado pela Ford, senti que o resultado já estava predestinado.

Visando a evitar mais publicidade negativa que poderia se originar de um confronto com a NHTSA, logo depois que esta notificou a Ford sobre o defeito, a empresa promoveu um recall de todos os veículos fabricados entre 1971 e 1976 (BIRSH; FIELDER, 1994, p. Apesar de manifestar-se publicamente discordando da agência que constatara que o carro era inseguro, prometeu que as modificações foram projetadas para reduzir significativamente o risco de incêndio nas colisões traseiras. Como a fábrica não tinha outro carro pequeno para oferecer, o Pinto, já com as modificações que praticamente eliminavam o problema, continuou a ser 9 Mother Jones é uma organização sem fins lucrativos, especializada em jornalismo investigativo político e de justiça social. Atualmente, vale-se de dois veículos principais: uma premiada revista bimestral de circulação nacional (tiragem de 240.

exemplares), e um website que apresenta notícias novas e originais, vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana. unidades (FISSE; BRAITHWAITE, 1983, p. e nenhum dos concorrentes tocou no assunto da insegurança do carro, devido ao medo que isto também pudesse ser invocado contra seus próprios produtos. Os últimos quatro mil Pintos produzidos foram adquiridos pelo governo, para o serviço postal. Contrariamente aos boatos, que insistiam na tese do fim da produção devido à má imagem que o carro adquiriu com os incêndios, o mais provável é que tenha sido por ter chegado ao final do seu ciclo de vida, planejado para10 anos. Apesar de ter vendido cerca de 2,9 milhões de unidades, não foi um produto lucrativo, por vários motivos: perda de receita devida à queda nas vendas, custo do recall, custas legais do julgamento criminal e das demandas civis por indenizações e, principalmente, o abalo da imagem da empresa perante o mercado consumidor.

A defesa desta tese sustentava que a responsabilidade exclusiva do fornecedor inviabilizaria a pesquisa e o progresso científico-tecnológico, frustrando o lançamento de novos produtos. No esforço pelo desenvolvimento de novidades, o fornecedor, por adentrar em terreno novo e ainda parcialmente desconhecido, não teria como dimensionar corretamente os riscos que tal atitude pioneira acarretaria e, em conseqüência teria dificuldade para valorá-los e incorporá- los ao preço final do produto, a fim de dividi-los com seus consumidores. Superestimá-los, visando a se precaver de uma eventual condição de risco maior que a inicialmente vislumbrada, acarretaria aumento de preço, consequente perda de competitividade e, no extremo, inviabilidade da comercialização. O caso do Ford Pinto parece ter enfrentado essa situação, mormente levando-se em consideração o contexto do mercado e das normas governamentais que, à época ainda estavam em discussão.

Olhando-se, no entanto, para o passado com o enfoque do CDC brasileiro, a discussão sequer começaria, pois ficaria evidente que o carro teve um defeito de projeto ou de concepção, facilmente enquadrável no artigo 12, caput: Art. O fabricante incorreria, ainda, nos crimes de consumo previstos nos seguintes artigos do Título II, do CDC, referente às infrações penais: Art. Constituem crimes contra as relações de consumo previstas neste código, sem prejuízo do disposto no Código Penal e leis especiais, as condutas tipificadas nos artigos seguintes (BRASIL, 2009, p. A Ford sabia dos problemas do Pinto antes mesmo de sua colocação no mercado e, mesmo assim, o comercializou e defendeu publicamente que o carro era seguro, incorrendo na infração do artigo 64. Art.

Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado: Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa (BRASIL, 2009, p. São circunstâncias agravantes dos crimes tipificados neste código:. II - ocasionarem grave dano individual ou coletivo; III - dissimular-se a natureza ilícita do procedimento (BRASIL, 2009, p. Tipo: da Itália para o Brasil O Tipo foi lançado no mercado europeu em janeiro de 1988, num grande evento com transmissão via satélite para cerca de 1. jornalistas de todo o mundo (CLUBE DO TIPO, 2005), que assistiram a apresentação do produto, simultaneamente, em Roma, Paris, Madri, Londres e Frankfurt. Desenhado pelo centro de estilo da marca, com a colaboração do estúdio Idea de Turim, o carro surpreendia pelo amplo espaço interno, linhas modernas e inovação tecnológica, sendo fabricado em uma nova unidade em Cassino, na Itália, com uma linha de produção altamente robotizada – referência neste aspecto entre as marcas européias.

Em 1995, no auge das vendas, um infeliz episódio maculou para sempre a imagem deste carro: os incêndios que destruíram em torno de cem unidades. Os episódios eram semelhantes: em dias muito quentes, após manobras intensas como as de estacionamento, o motorista fechava o carro e, uns trinta segundos após, via uma fumaça branca saindo do compartimento do motor e invadindo a cabine. Em poucos minutos, chamas consumiam o veículo. A Criação de Uma Associação As vítimas formaram a AVITIPO (Associação de Consumidores de Automóveis e das Vítimas dos Incêndios de Tipo) e contrataram peritos para analisar os restos dos veículos e as circunstâncias em que os incêndios ocorriam. Concluíram que a causa era o sistema de assistência hidráulica da caixa de direção e instaram a Fiat a tomar providências.

Até os modelos que nada tinham a ver com o caso se desvalorizaram, como os 2. e o 1. mpfi nacional. A revista Veja, em sua edição de 20 de novembro de 1996 (GRINBAUM, 1996), mostra a repercussão que o caso teve na época (ANEXO A). Análise de Acórdãos Sobre o Fiat Tipo O trauma sofrido por ver seu carro pegando fogo sem motivo aparente acometeu em torno de cem donos (CARROS. grifei). O decisum é uma ótima síntese sobre as relações de consumo e sobre o caso específico do Fiat Tipo 1. i. e. A ementa já evidencia o conhecimento da história do carro, e reconhece a inversão do ônus da prova: EMENTA:. À luz do CDC, a garantia de segurança e do bom funcionamento do produto deve corresponder a um desdobramento do princípio geral de proteção da confiança e da boa-fé.

Ao adquirir um veículo fabricado por uma montadora tradicional, o consumidor espera que o bem tenha consigo a confiabilidade do nome de seu fabricante (ANEXO B). A grafia correta é AVITIPO. Mais adiante, ao pronunciar-se sobre o que disse o fabricante, passa a definir seu voto, onde, novamente, a inversão do ônus da prova se sobressai: A apelada sustenta a inocorrência de defeito de fabricação, afirmando que o veículo de propriedade do apelante participou de dois recalls (fl. o que garantiu o reparo do problema, afastando a hipótese de que o incêndio noticiado tenha sido gerado por vício originário e oculto, mas não carreou aos autos qualquer documento capaz de comprovar tal afirmação. Entrou com agravo de instrumento no STJ, não conhecido por falta de procuração nos autos14.

b) Decisão a Favor da Fiat Em 2003, uma seguradora, ao propor ação regressiva contra a Fiat, não logrou êxito. O nexo de causalidade não foi reconhecido, nem foi concedida a inversão do ônus da prova. Em sede de recurso, a sentença foi mantida, como veremos na análise do acórdão referente ao processo 2. relatado pelo Des. Diante do exposto, não conheço do agravo. A Fiat afirma que o defeito não foi demonstrado (falta de nexo causal) e que houve um recall do carro amplamente divulgado e que, mesmo que o CDC fosse aplicável ao caso, a culpa seria exclusiva do segurado, por não ter atendido o recall. A eximente de responsabilidade é do § 3º do art. § 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar: [.

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (BRASIL, 2009, p. Outro fato curioso é que se tratava do Tipo 1. mpi, de fabricação nacional que, até então, seria imune aos problemas que seu antecessor italiano teve antes do segundo e definitivo recall. A ação foi proposta perante a 3ª Vara Cível de Rio Grande e o autor. Informava, na inicial, que adquirira o carro em fevereiro de 1996, tendo o mesmo se incendiado sete meses depois, em decorrência de autocombustão do motor15. A ré alegou decadência do direito e pediu a extinção do processo, pela via do art. Há evidente verossimilhança na narrativa dos fatos feita pelo autor na petição inicial. E é também evidente que se cuida de uma relação 15 A íntegra do acórdão está no Anexo B, p.

de consumo, sujeita ao regramento do Código de Defesa do Consumidor. O Código de Defesa do Consumidor estabeleceu, entre os direitos básicos do consumidor, no seu art. º (vetor do microssistema): "V – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; [. Com relação ao dano moral, no entanto, houve concordância com a pretensão do consumidor, conforme segue: Reputo-o devidamente caracterizado no caso concreto analisado. Ao adquirir um bem de consumo durável, tinha o autor uma justa expectativa de poder dele usufruir por largo período de tempo. Tal expectativa se frustrou de forma abrupta e inesperada. Houve aí uma grande decepção, uma verdadeira frustração. O autor correu risco de vida e submeteu a sua família ao mesmo risco grave, ao utilizar o veículo no seu cotidiano.

Relator, Cesar Asfor Rocha. O acórdão foi publicado em 7 de junho de 2006. CONCLUSÕES O presente trabalho procurou trazer, pela análise dos casos de dois carros, reflexões mais profundas sobre o tema dos acidentes de consumo em geral e com automóveis. Os riscos aos quais os fabricantes submetem o consumidor quando omitem informações e não são suficientemente diligentes na solução dos problemas dos seus produtos foram o foco do primeiro caso analisado. Antes das leis consumeristas, ao adquirir um produto ou contratar um serviço, o consumidor assumia o risco do mesmo apresentar defeito ou ser prestado de forma insatisfatória, sujeitando-se a um calvário na tentativa de provar dolo ou culpa do fornecedor. You Are The Juror. Minneapolis: Oliver, 1997. p.

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Belo Horizonte: Del Rey, 1999. ANEXO A – Reportagem em Periódico Nacional Reportagem da Veja (GRINBAUM, Ricardo. O Tipo que Arde: a Fiat monta plantão de fim de semana para trocar peças do carro que já teve 63 casos de incêndio. Faz jus à indenização por danos morais e materiais o proprietário de veículo incendiado, quando a história automobilística relata casos idênticos em outras unidades do mesmo modelo, mormente diante da inexistência de prova nos autos de que o automóvel tenha passado pelo recall realizado pela montadora e que o defeito tenha sido sanado. Apelação parcialmente provida. APELAÇÃO CÍVEL N° 1. COMARCA DE BARBACENA - APELANTE(S): RICHARDSON PEREIRA - APELADO(A)(S): FIAT AUTOMOVEIS S/A - RELATOR: EXMO. SR.

Salientou que, a partir de 1995, vários veículos do mesmo modelo sofreram idêntico sinistro, fato que ensejou um recall, oportunidade em que se constatou que o problema ocorria no tubo "convergedor" do ar quente, gerado pelo costume brasileiro de pulverizar óleo ou querosene no veículo quando das lavagens, assim, o referido equipamento, revestido de papelão, ficaria sensível ao calor e entraria em combustão espontânea. Após iniciativa da Associação dos Consumidores de Automóveis e das Vítimas dos Incêndios de Tipo - AVIATIPO, um novo exame concluiu que os incêndios ocorriam durante as manobras do sistema de direção, cuja válvula não suportava a pressão do fluído que, ao vazar, pegava fogo em virtude da sua natureza altamente inflamável.

Acrescentando que seu automóvel estava em perfeito estado de conservação, tendo passado pelas revisões regulares, requereu indenização pelos danos morais e materiais suportados. O MM. Juiz julgou improcedentes os pedidos exordiais, fls. A apelada apresentou suas contra-razões às fls. É o relatório. Observados os requisitos de admissibilidade, conheço da apelação. O cerne da controvérsia consiste na verificação da existência ou não de responsabilidade da montadora apelada pelo evento danoso noticiado na inicial. Pois bem. In Código Brasileiro de Proteção do Consumidor, Forense Universitária, 95, p. No caso dos autos, colhe-se que o veículo sinistrado foi fabricado em 1994, mas o apelante somente o adquiriu em 2004, quando contava com 10 anos de uso, como se infere do documento de fl.

inexistindo qualquer informação sobre possíveis problemas mecânicos apresentados durante esse período ou comprovação de que o automóvel passou pelos dois (2) recalls, realizados em 1996, pela fabricante. Por outro lado, é fato incontroverso que, em 28/05/2006, quando o apelante trafegava com seu veículo pela BR 381, nas proximidades de Campanha/MG, ocorreu um incêndio no painel, que rapidamente se alastrou, tomando todo o veículo, acarretando a sua completa destruição, como demonstram as fotografias de fls. A apelada sustenta a inocorrência de defeito de fabricação, afirmando que o veículo de propriedade do apelante participou de dois recalls (fl. Assim, ao ser constatado o evento danoso, surge o dever de indenizar, dispensando-se a prova do prejuízo, quando presentes os requisitos legais para que haja a responsabilidade civil.

Assim, de se reconhecer que o apelante sofreu abalo na esfera de seus direitos subjetivos, mormente no que se refere à integridade psíquica, à segurança, à confiabilidade, de modo a justificar a devida reparação. A indenização pelo dano extrapatrimonial deve significar uma efetiva satisfação ao lesado, sem incorrer em enriquecimento injustificado, tendo o efeito de dissuadir o agente da prática de novo atentado, observando-se a extensão do prejuízo causado, bem como sua repercussão, além das condições sócio-econômicas do ofensor e do ofendido. Na hipótese dos autos, sopesando as circunstâncias e razões que deram azo ao fato, às condições dos envolvidos e aos requisitos mencionados, de se considerar exagerados os R$35. trinta e cinco mil reais), pleiteados na peça vestibular, devendo, portanto, ser o valor da indenização fixado em R$10.

§3º do Código do Consumidor a responsabilidade objetiva do fabricante, construtor, produtor ou importador, pelos defeitos do produto, os quais, para se eximirem da responsabilidade, têm o ônus de comprovar uma das causas excludentes ali referidas". TJMG, 15ªCC. Ap. Rel. Unias Silva, j. Em cumprimento ao disposto no §2º supra, o Decreto Estadual nº 43. estabelece: "Art. º - Nas hipóteses abaixo relacionadas, a isenção depende de reconhecimento mediante requerimento apresentado à repartição fazendária do município de registro, matrícula ou licenciamento do veículo, acompanhado de: VI - certidão expedida pela autoridade policial competente, nas hipóteses dos incisos VIII e IX do 'caput' do art. º (equivalente ao artigo 3º da Lei Estadual 14. Também o Código de Trânsito Brasileiro disciplina a hipótese: "Art. §§ 3º e 4º, do CPC), ficando, no entanto, suspensa a exigibilidade de tais verbas, nos termos do Artigo 12 da Lei nº.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): ELECTRA BENEVIDES e ALBERTO ALUÍZIO PACHECO DE ANDRADE. SÚMULA : DERAM PROVIMENTO PARCIAL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS APELAÇÃO CÍVEL Nº 1. B. Victor Schettino Salles. Belo Horizonte, 16 de outubro de 2003. JUIZ VALDEZ LEITE MACHADO Relator V O T O JUIZ VALDEZ LEITE MACHADO: Companhia Real Brasileira de Seguros ajuizou ação sumária regressiva em face de Fiat Automóveis S. A. alegando que, no dia 10-05-1997, o Fiat tipo 1. Aduz que o Código de Defesa do Consumidor não pode ser aplicado ao presente caso, vez que a autora é pessoa jurídica e a sub-rogação é apenas material. Alega que, mesmo que o código supramencionado fosse aplicável, não haveria responsabilidade por culpa sua, sendo esta exclusiva do segurado, o qual não deu conservação adequada ao veículo e deixou de atender ao recall, agravando os riscos e perdendo contratualmente o direito ao seguro.

Alega, ainda, que, se a seguradora pagou a indenização contrariamente ao avençado, não há sub-rogação. Às f. TA, sobreveio aos autos a r. Às f. TA, a apelada apresentou contra-razões, onde refutou todas as alegações da apelante, colacionando citações jurisprudenciais. O recurso é próprio, tempestivo, foi contra-arrazoado e devidamente preparado, por isso, estando presentes os pressupostos de admissibilidade, dele conheço. O r. decisum que julgou improcedente o pedido, não merece qualquer censura, posto que, para que ficasse assentada a responsabilidade da ré pelo evento danoso, necessária seria a prova do defeito do veículo colocado no mercado, ou seja, do veículo incendiado, prova esta que não se efetuou. Dessa forma, à míngua de prova, especialmente sobre vício ou defeito de fabricação do automóvel e a respeito do nexo de causalidade, a improcedência da ação realmente se impõe.

Pelas razões expostas, nego provimento ao recurso, mantendo a r. sentença recorrida pelos seus próprios e jurídicos fundamentos. Custas, ex lege. JUIZ VALDEZ LEITE MACHADO Superior Tribunal de Justiça AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1. MPI, de fabricação nacional, incendiado em decorrência de autocombustão do motor. Automóvel novo, recém-adquirido e sob garantia. Acidente de consumo. Responsabilidade civil objetiva da empresa fabricante pelo fato do produto. Art. Apelação parcialmente provida. Rogério Wonghon Pickersgill, apelante – Fiat Automóveis S. A. apelada. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. A. Narra o autor, na inicial, que adquiriu, em fevereiro de 1996, um automóvel Fiat tipo 1. MPI, ano modelo 1995/1996, zero quilômetro, de fabricação nacional da ré. Após sete meses de uso, o veículo incendiou em virtude de autocombustão do motor, restando de todo inutilizado.

Afirma que fatos semelhantes ocorreram com vários veículos da mesma marca, porém de fabricação estrangeira. Asseverou que o sinistro relatado na inicial em nada se assemelha com os que envolveram os modelos importados. Afirmou que o incêndio poderia ter ocorrido por culpa do próprio demandante. Sublinhou incomprovados os danos materiais, visto que o autor recebeu o prêmio da seguradora e afirmou estar em juízo discutindo com esta a diferença do preço pago a menor. Enfatizou ter a seguradora se sub-rogado nos direitos do autor, que nada despendeu com locomoção enquanto providenciava a aquisição de novo veículo, pois lhe emprestou um carro similar ao sinistrado. Argumentou que o autor não apresentou nenhuma prova de que tenha sofrido algum tipo de dano moral.

Sustentou que os testemunhos dos funcionários da Fiat não podem ser considerados isentos de coação de seus empregadores, e, além disso, eles possuem interesse no deslinde do feito. Concluiu assinalando que as supostas causas do acidente são de todo irrelevantes e destacando o risco de vida a que submeteu a si e a toda sua família e os traumas psicológicos advindos do indigitado sinistro, os quais reclamam a devida reparação. O recurso interposto foi recebido no duplo efeito. Contra-arrazoando, a empresa-apelada propugnou pela manutenção da sentença, reprisando os argumentos expendidos na sua resposta. Subiram os autos a este Tribunal. Após sete meses de utilização do automóvel, ele restou completamente destruído em incêndio decorrente de autocombustão do motor.

Tal é o que revelam, quantum satis, a comunicação de ocorrência policial, a declaração de ocorrência subscrita pelo 1º Tenente Comandante da 1ª Seção de Combate a Incêndio do 3º Grupamento de Combate a Incêndio da Brigada Militar do Município de Rio Grande e as fotografias acostadas aos autos com a inicial (vide fls. Segundo informações do autor constantes da comunicação de ocorrência policial, houve uma pane do motor, que pegou fogo, restando o automóvel totalmente queimado. O fato ocorreu em 1º-10-96, no trevo de acesso ao Tecon, município de Rio Grande, quando aquele se deslocava ao seu local de trabalho. Na edição da revista Veja, de 20-11-96 (uma semana após o fato em comento), foi publicada matéria na seção de Economia e Negócios encimada pela seguinte manchete: "O Tipo que Arde – A Fiat Monta Plantão de Fim de Semana para Trocar Peças do Carro que já Teve 63 Casos de Incêndio".

Existem outros 100. Tipo com risco de queimar rodando por aí. Aqueles que perdem o carro em um incêndio recebem outro modelo da Fiat. „Estamos fazendo tudo o que está ao nosso alcance, mas o consumidor também precisa colaborar e comparecer às oficinas‟, diz Nilson Bretz, gerente de atendimento aos clientes da Fiat. Algumas pessoas ficaram insatisfeitas com a indenização oferecida pela montadora e criaram a Associação de Consumidores de Automóveis e Vítimas de Incêndio do Tipo, a Avitipo. VII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do Juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência".

Grifei. Aqui, a verossimilhança das alegações do demandante é manifesta. Não há como desconsiderá-la, observadas as regras ordinárias de experiência. O fato é excepcional e inusitado. As hipóteses são alternativas, como claramente indica a conjunção ou, expressa na norma ora comentada (Nery, DC, 1/218; Watanabe, CDC Coment. A hipossuficiência respeita tanto a dificuldade econômica quanto a técnica do consumidor em poder desincumbir-se do ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito (Nery, DC, 1/217)". Vê-se, portanto, que a respeitável sentença fustigada não deu adequada aplicação ao princípio da inversão do ônus probatório, tampouco ao aspecto da verossimilhança das alegações do autor postas na inicial. A defesa da ré fulcra-se na asserção de que inexistiam ocorrências de sinistros similares (de incêndio por autocombustão) envolvendo os veículos fiat tipo de fabricação nacional.

E a sentença acolheu essa tese, como se vê da sua motivação. do CDC, a dispor: "Art. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos". De sua vez, o § 1º desse mesmo dispositivo legal deixa claro: "§ 1º. O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, dentre as quais: I – sua apresentação; II – o uso e os riscos que dele razoavelmente se esperam; III – a época em que foi colocado em circulação".

Ora, não é razoável supor que um veículo novo, recém-saído da fábrica e no período de garantia, vá incendiar e restar inutilizado por completo! Outrossim, o onus probandi de que inexistiram os defeitos no produto fabricado toca a quem o fabricou e o colocou no mercado consumidor, ut § 3º do mesmo dispositivo do CDC: "§ 3º. Sendo objetiva a responsabilidade civil decorrente do fato do produto (CDC, art. reclama apenas a comprovação do acidente de consumo, do dano dele emergente e do nexo causal entre o fato e o dano. In casu, o autor (aqui apelante) desincumbiu-se a contento em demonstrar a existência dos danos de ordem material e moral decorrentes da total combustão (perda) do veículo objeto mediato da lide, com os elementos documentais de convicção já antes mencionados.

De outra parte, é bem de ver que, na resposta da ré, a ocorrência do acidente de consumo e dos danos daí emergentes não são alvo de impugnação, tendo ela sustentado, apenas: a) a decadência do direito de reclamar indenização; e b) a inexistência do defeito. Contudo, o dever de reparar os danos decorre da simples demonstração do fato do produto e do nexo de causalidade entre ele e os danos evidenciados. § 3º, II, e em seu art. § 3º, I, deixa expresso que compete ao fornecedor o ônus de comprovar a inexistência de defeito no produto ou no serviço. Essa modificação na distribuição dos encargos probatórios pela própria lei é o que se denomina de inversão ope legis do ônus da prova.

O motivo é claro. Historicamente, a proteção efetiva ao consumidor sempre foi dificultada pela necessidade de ele comprovar os fatos constitutivos de seu direito. dos autos. O demandante efetivamente recebeu da seguradora do veículo, em razão do sinistro noticiado à exordial, a importância de R$ 18. dando plena e geral quitação dessa quantia (ut recibo da fl. Mostrou-se renitente em apontar o valor do efetivo prejuízo material que teria experimentado, como se extrai da leitura dos autos (peças da fase postulatória). Chegou o autor a dizer que foi forçado pelo juízo "a estabelecer os limites de sua pretensão" (fl. Do dano moral ou extrapatrimonial. Reputo-o devidamente caracterizado no caso concreto analisado. Ao adquirir um bem de consumo durável, tinha o autor uma justa expectativa de poder dele usufruir por largo período de tempo.

Tal expectativa se frustrou de forma abrupta e inesperada. Houve aí uma grande decepção, uma verdadeira frustração. E, portanto, deve ser observada a capacidade econômica do atingido, mas também do ofensor, de modo a que não haja enriquecimento injustificado, mas que também não ocorra indenização que não atinja o caráter pedagógico a que se propõe. De acordo com o magistério de Caio Mário, Responsabilidade Civil, 3ª ed. Forense, pp. Como tenho sustentado em minhas Instituições de Direito Civil (vol. II, nº 176), na reparação por dano moral estão conjugados dois motivos ou duas concausas: I – punição ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial; II – pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer a oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material, o que pode ser obtido „no fato‟ de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa e de qualquer maneira o desejo de vingança".

É como voto. Des. Odone Sanguiné (Revisor) – De acordo. Desª Marilene Bonzanini Bernardi (Presidente) – De acordo. D. ART. CAPUT' E §§ 1º E 3º DO CDC. O PRODUTO É DEFEITUOSO QUANDO NÃO OFERECE A SEGURANÇA QUE DELE LEGITIMAMENTE SE ESPERA. AUSÊNCIA DE PROVA DE CAUSAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE. A EMPRESA RÉ NÃO LOGROU COMPROVAR QUE O DEFEITO OCASIONADOR DO SINISTRO NÃO EXISTIU OU QUE HOUVE CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. Publique-se. Brasília, 30 de maio de 2006. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA Relator.

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