Artigo: A justiça na República de Platão

Tipo de documento:Revisão Textual

Área de estudo:Filosofia

Documento 1

Na medida em que a justiça se manifesta tanto na cidade como no indivíduo, será abordada a tripartição da alma definida por Platão e como esta se relaciona com a justiça na polis. Palavras-chave: Alma. Cidade. Justiça. Teoria das Virtudes. A debate principal da República é a busca pela definição da justiça e suas implicações para a constituição de uma cidade justa. Nesse sentido, o objetivo do trabalho é fornecer um panorama da concepção de justiça tomando como base os livros I, III, III e IV da República. Vale ressaltar que compreendemos que as demais partes da obra também são permeados pelo tema da justiça; portanto, o recorte serve mais como forma de discutir os desdobramentos da definição de justiça para a cidade perfeita nesses livros específicos do que fornecer pormenores da República.

A primeira parte deste trabalho apresenta as concepções de justiça propostas por Céfalo, Polemarco e Trasímaco, em contraste com as refutações de Sócrates. No segundo momento, será discutida a justiça na cidade a partir da constituição das três classes do Estado (governantes, guardiães e produtores); e, por fim, a tripartição da alma (racional, irascível e apetitiva) correspondente à justiça no indivíduo. Portanto, o que ocorre é que “a definição de Céfalo é censurável por não ser, pura e simplesmente uma definição” (PAPPAS, 1995, p. Com a saída de Céfalo do diálogo, Polemarco intervém e apresenta um novo parecer sobre a justiça. Tomando o poeta Simônides como apoio, afirma que justiça é “dar a cada um o que lhe é devido” (331e-332a) e “favorecer aos amigos e prejudicar os inimigos” (332d).

Agora, somente um contraexemplo tal como colocado por Sócrates não será suficiente para rebater o ponto de vista de Polemarco. Sócrates contrapõe ele argumentando que a primeira concepção pressupõe a justiça sem um lugar ou objeto específico, enquanto a segunda se baseia em uma postura que só tem sentido em contextos de guerra (FEITOSA, 2006, p. ” (335d). A partir desse momento, Polemarco não encontra mais argumentos para oferecer a Sócrates. Mesmo com uma concepção mais sofisticada que Céfalo, Polemarco apenas defende uma noção compatível com as opiniões correntes de justiça presentes em sua cultura, fazendo com que entendimento de justiça também seja convencional. Contudo, vale ressaltar que Platão insere na República uma parte das teses enunciadas por Céfalo e Polemarco.

Então, a tese de Simônides é aproveitada no livro I, no que se refere à relação de cada cidadão entre si e deles com o todo, numa perspectiva de reciprocidade, ou seja, o que compete a cada um é a tarefa de oferecer o que lhe é destinado em prol do bem comum. Para Trasímaco, então, o governante ideal deverá promulgar leis em benefício de si próprio. Independentemente de quem detém o poder, a lei deverá servir para conservar o domínio dos mais fortes, de tal modo que a justiça se resumirá ao cumprimento das leis estabelecidas pelos governantes. Tal pressuposto, segundo Belini (2009), baseia-se no princípio de uma lei natural; ou seja, quando é violada constitui grande injustiça e merece punição. Uma das objeções de Sócrates a essa ideia se sustenta na comparação da technê com o seu objeto; a saber que a arte, quando verdadeira e pura, se propõe exclusivamente ao aprimoramento do seu objeto, e não ao interesse do próprio sujeito.

Sendo assim, “não há chefe em nenhuma posição de comando, enquanto chefe, que investigue e determine o que é de vantagem para si mesmo, porém para o seu subordinado, em benefício de quem ele exerce sua arte” (342e). A recuperação da tese de Trasímaco é feita por Glauco através da ideia de pacto social. Glauco entende a justiça como convenção social pela qual os homens conseguem garantir sua própria segurança. Sem esse contrato, os homens ficariam à mercê das injustiças alheias e ocorreria uma violência generalizada, daí a necessidade de leis que regulem a vida em sociedade. Portanto, conforme Glauco, os homens não compreendem a justiça como um bem em si mesmo, mas a toleram por questões de conveniência.

Nesse cenário, a injustiça é melhor do que a justiça1, pois esta última é mediada por relações de contrato e punição. A base da especialização é fazer com que as diferenças se complementem numa relação de cooperação entre indivíduos que contribuem para a cidade (âmbito social) e a cidade para eles. O resultado da cooperação é a harmonização da cidade, pois Platão pensa o homem essencialmente como um ser social (FEITOSA, 2006, p. Tal ideia de comunidade é ironizada por Glauco, porque ele considera que Sócrates expõe uma cidade na qual fica difícil imaginar manifestações de justiça e injustiça. Isso faz com que os debatedores passem então a pressupor uma cidade na qual a nobreza e o luxo se instalaram, fazendo emergir uma série de pessoas dedicadas à produção de coisas supérfluas, tais como vestimentas sofisticadas, perfumes, sobremesas e iguarias.

Como destaca Jaeger (1995), devido ao constante desejo de expansão territorial desses Estados, haverá a necessidade imediata da criação do ofício de guerreiro. Para cada uma dessas classes, Platão atribui uma virtude (areté) específica. À classe superior dirigente é destinada a sabedoria (sophia), pois eles devem ter a capacidade de guiar corretamente a cidade e tomar decisões tendo sempre em mente a ordem do todo. Aos guardiães é destinada a coragem (andreia), virtude política relacionada tanto com a defesa da cidade quanto com a formação de opiniões verdadeiras, visto que a educação dessa classe os prepara para deve ser temido ou não, e como devem ser enfrentadas as dores e os prazeres. Aos trabalhadores, por sua vez, é destinada a temperança (sophrosyne) ou moderação.

Ao contrário da coragem e da sabedoria, que se encontram em classes distintas, a temperança permeia toda a cidade (432a). Formulação semelhante será aplicada para a compreensão da justiça manifestada no indivíduo, já que “o homem justo em nada diferirá da cidade justa, no que diz respeito ao conceito da justiça, mas terá de ser semelhante a ela” (435b). Essa preocupação desemboca na tripartição da alma elaborada por Platão. A JUSTIÇA NO INDIVÍDUO E AS TRÊS PARTES DA ALMA Durante o diálogo com Adimanto e Glauco, Sócrates foi solicitado a mostrar como a justiça aparece na alma. Sócrates e seus interlocutores, no entanto, decidiram analisar inicialmente a justiça na cidade, para depois compreender como ela se manifesta no indivíduo.

Partindo do pressuposto de que a alma é marcada por conflitos, Platão a divide em três partes, que são: (I) apetitiva (conscupisível); (II) irascível; e (III) racional. Apesar de intermediária, a parte irascível está mais inclinada à parte racional. Consoante Pappas (1995, p. “uma vez adestrada, a ira pode fazer vale a lei moral no interior da alma do indivíduo, pois enfrenta em força os apetites”. Sendo assim, através de uma educação bem guiada, a ira pode levar os homens a agir como ordena a razão. Por conta dessas características delineadas, essa parte da alma está identificada com os guardiães. Para tanto, fez-se necessário apresentar como a justiça se insere no diálogo a partir das concepções de Céfalo, Polemarco e Trasímaco, e trazendo as refutações de Sócrates.

Posteriormente, foi apresentado outro momento diálogo, no qual entram Glauco e Adimanto, que defendem a tese de que a vida do injusto é mais vantajosa que a do justo. A partir de determinado momento, o foco da discussão entre os debatedores muda para aparecer o tema da justiça na cidade e suas respectivas classes (governantes, guardiães e produtores). Por fim, foi discutido como a justiça se manifesta na alma do indivíduo em três partes (apetitiva, irascível e racional). No primeiro momento, Sócrates encontra dificuldades para conseguir chegar a um acordo com seus interlocutores, pois estes oferecem apenas noções de justiça convencional, ligadas principalmente às opiniões correntes da época. A justiça, ao contrário das demais virtudes cardinais, não se encontra exclusivamente em nenhuma das classes, mas em todas elas.

Sem a justiça, a própria ordem que garante unidade às classes sucumbiria, levando à ruina da cidade. Como a justiça que é manifestada na cidade está imbrincada com o indivíduo, Platão utiliza a alma tripartite para mostrar como esta, por estar em conflito entre as partes opostas, necessita de ordem e harmonia tal como nas classes. Quando as atribuições se misturam entre as classes e os homens deixam de cumprir o papel que lhes cabe, ocorre a injustiça e a ruína da cidade. De modo semelhante, a alma cujas partes passam a ocupar outras funções que não são de seu caráter promovem a desordem da alma. A questão da unidade e do ensino das virtudes em Platão. Tese (Doutorado em Filosofia) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.

Universidade de São Paulo, 2006. JAEGER, W. Paidéia. Lisboa: edições 70, 1995. PLATÃO. A República (ou: sobre a Justiça. Gênero Político). Trad.

1334 R$ para obter acesso e baixar trabalho pronto

Apenas no StudyBank

Modelo original

Para download