HERMENÊUTICA NA PERSPECTIVA DE LENIO STRECK DIREITO FUNDAMENTAL A RESPOSTAS JURIDICAMENTE ADEQUADAS

Tipo de documento:Análise

Área de estudo:Direito

Documento 1

O objetivo geral consubstancia delinear as principais ponderações teóricas feitas pelo referido autor à hermenêutica jurídica tradicional brasileira, segundo uma análise panorâmica de sua obra. Os objetivos específicos são abordar os fundamentos destes pontos e verificar as críticas correlatas. A justificativa condiz com a atualidade do tema e a importância de reflexão sobre as bases teóricas da aplicação do direito no país. Na conclusão, houve a confirmação da hipótese, pelas razões lá alinhavadas. Palavras-chave: hermenêutica; crítica; democrático; coerência; integridade ABSTRACT: this paper ir a bibliographical revision research, great area juridical hermeneutic, subject critical of that matter according to the theoretical reference of the Brazilian jurist Lenio Streck. Verdade, 2. Decidir conforme a consciência, 2.

Pan-priciologismo, 3. Conclusão, Referências 1. INTRODUÇÃO Este trabalho constitui o resultado de pesquisa de revisão bibliográfica sobre o assunto crítica hermenêutica do jurista Lenio Streck, grande área hermenêutica jurídica. Passa-se ao também habitual estudo de processos de interpretação, espécies, sistemas, regras e formas de integração da lei, já ensinados ao primeiranista da faculdade de direito, a partir de um clássico, por exemplo, de Limongi França, que segue a tradicional hermenêutica3. Como se fosse o que de mais desenvolvido houvesse na contemporaneidade na matéria. Após o recurso aos princípios gerais de direito, ainda hoje considerados mecanismos de hetero-integração da lei, segundo clássicos manuais de propedêutica jurídica4 ou mesmos os mais modernos5 utilizados em universidades afora no país, salvo exceções6, chega-se, aparentemente, à consolidação do estudo da hermenêutica.

Sem um triz de abordagem dos notórios avanços da filosofia dos séculos XVIII e XIX, como se as instituições jurídicas fossem naturalmente explicáveis por elas mesmas, o que já foi refutado por Marx há mais de dois séculos7. Daí, quem sabe, um indício de limitação do próprio Direito nos dias atuais, afinal, “cada ciência aceita sua limitação e faz dela seu método positivo”8. No caso de ciência jurídica, a lei como ápice de uma verdade sobre seu objeto de regulamentação, subtraindo do intérprete qualquer contributo ao alcance do significado daquilo que se interpreta. Diferentemente, tem-se a influência dos pré-conceitos do intérprete, ou seja, seus juízos próprios sobre o que se vai interpretar.

Não fica neutralizado ao ato de interpretar, como diz o adágio latino “in claris cessat interpretatio”, mas dele faz essencial parte. Já a ideia de tradição tem a ver com o conceito de mundo de vida, substancialmente histórico, “que não tem em mente a um universo do ser”, a ‘um mundo que é’”, mas sim o que “estamos vivendo como seres históricos”10. Mas com isso não se sustenta que pré-compreensão seja o mesmo que subjetivismo no interpretar, temática de ampla correlação com o assunto discricionariedade judicial, a ser abordado adiante. Isto se dá porque o humano como ente, já-está em relação com o ser, mesmo sem uma compreensão de si próprio, dado que já-está lançado no mundo.

A compreensão do ser mescla-se com a compreensão do ser-aí, ou seja, o sentido do ser a partir da compreensão do ser do ente. Não há uma ‘metalinguagem’ para a compreensão do ser, mas um imbricamento do ser com o ente, que para compreender precisa ser-aí na sua singularidade. Por esse motivo Heidegger afirma que a essência do ser-aí reside na sua existência, devendo-se esclarecer que essa análise existenciária não se confunde com as escolhas pessoais (existenciais ou ônticas da vida concreta). E essa estrutura essencial, cabe salientar, mostra-se nos diferentes modos de ser-aí, dado que irá condicionar toda a possibilidade de investigação ontológica15. Portanto, “o ser não representa uma simples ‘realidade’, mas sempre está ligado a uma determinada ‘possibilidade’”21.

Em suma, é a partir sobretudo destes principais referenciais filosóficos – Gadamer e Heidegger – que Lenio Streck assenta os fundamentos a sua crítica à hermenêutica jurídica tradicional, enveredando para uma hermenêutica filosófica. Mas para conhecer o teor dessas críticas e sua operacionaliação no âmbito do entendimento de Streck, necessário se faz abordá-las separadamente. São eles interpretação, verdade, decidir conforme a consciência e pan-priciologismo, que animam os subtópicos seguintes. Interpretação Para fundamentar a crítica a respeito da interpretação, Lenio Streck retrocede até 388 a. Ou seja, contendem as personagens sobre o papel da linguagem: verdade (Crátilo) ou método (Hermógenes)? Ao fim, Platão oferece seu ponto de vista, sustentado que o nome das coisas constitui o produto de um trabalho de inteligência do “dador de nomes”, quem tem acesso ao mundo ideal e nele colhe a adequada forma de representar a coisa.

A posição de Crátilo constitui o cerne da metafísica clássica, que é um ramo da filosofia que procura investigar as coisas, a partir da fundamental pergunta “o que é”, mas também busca perquirir qual a essência destas coisas. Teve grande destaque até o século XX, embora no sentido clássico ora referido, até o século XVIII23. Amoldando-a às perspectivas filosóficas de Crátilo, tal modo de filosofar implica o total afastamento do intérprete, cuja atividade intelectual fica restrita, unicamente, a captar a essência da coisa, que já está em sua intrínseca essência, que é dada – já existe, inarredavelmente imutável. Neste cenário, tem-se o paradigma da objetividade, o sujeito não existe. Eis, em linhas gerais, as bases do movimento denominado filosofia da consciência, que ultrapassou o esquema da objetividade da metafísica clássica, passando ao esquema da subjetividade.

O sujeito existe. O conhecimento dessas informações, ainda que evidentemente teóricas e de dificultosa compreensão, é importante porque a partir delas é que, basicamente, se erigiu a atividade de interpretar ao longo da história da filosofia25. E mais: tais modelos de objetivismo-subjetivismo constituíram as condicionantes dos três modelos de positivismo criados a partir do século XIX, do positivismo jurídico, de toda a sistematização doutrinária feita na ciência jurídica sobre esse tocante a partir de então e, por conseguinte, a forma de aplicação do direito nos casos concretos submetidos à análise do Poder Judiciário. Com o pequeno (rectius: enorme) detalhe, porém, de que tais vertentes filosóficas e todas suas vastas repercussões no campo da experiência jurídica não receberam os influxos da filosofia da linguagem, máxime de Gadamer e de Heidegger, que são contemporâneos àqueles marcos do saber.

A verdade formal é a verdade estabelecida nos autos do processo, não necessariamente condizente com os fatos tais como se deram. A verdade real é aquela estabelecida nos autos e que correspondente aos fatos como efetivamente se deram32. O campo de aplicação é principalmente debatido no âmbito do processo penal, sobretudo em decorrência dos bens jurídicos em jogo. Salvo exceções33, a doutrina dos manuais indica ser o processo um instrumento apto a alcançar a reconstrução histórica dos fatos exatamente como se deram, que será, por fim, apreendida pelo estado-juiz, que a enunciará na sentença34. E tal perspectiva da doutrina é de larga aplicação no Poder Judiciário, por exemplo: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. O processo permite alcançar os fatos tal como ocorreram, por exigência do referido princípio.

Além disso, a verdade pode ser desvelada pelo juiz (sujeito), quem, mediante sua inteligência, consegue alcançá-la (objeto) através de uma reconstrução histórica dos fatos, que indicará os fatos da forma como foram efetivados. Patente o esquema sujeito-objeto, da subjetividade inerente à filosofia da consciência Descartiana. Ocorre que tais construções teóricas sobre a verdade remontam, na processualística, ao estudos clássicos de Carnelutti36. Mas este mesmo autor, na fase de maturidade do seu pensamento, elaborou o imperdível trabalho Verdade, Dúvida e Certeza, no qual basicamente refuta toda sua teoria acerca das verdades processuais em detrimento de uma ideia de certeza: “não ocorre a dedução pura e simples da verdade a partir das premissas silogísticas constituídas pelas provas, mas tão somente a busca de argumentos que amparem uma decisão já tomada”37.

É por isso que Lenio Streck propõe a superação da verdade real a partir dos critérios estudados da filosofia da linguagem, que é a pedra de toque da nova hermenêutica. Superando-se o esquema de objetividade (metafísica clássica) e subjetividade (filosofia da consciência), para o primado da intersubjetividade40. Para a concretização disso, isto é, a efetiva aplicação na análise dos casos submetidos à análise do judiciário, necessário se faz a abordagem do decisionismo. Assunto objeto de estudo do tópico seguinte, que versa sobre o decidir conforme minha consciência. Decidir conforme a consciência Outro corifeu da processualística é o sistema de apreciação das provas da decisão conforme a consciência41, previsto de maneira expressa nos artigos 155 do Código de Processo Penal e 371 do Código de Processo Civil.

Enquanto for Ministro do Superior Tribunal de Justiça, assumo a autoridade da minha jurisdição. O pensamento daqueles que não são Ministros deste Tribunal importa como orientação. A eles, porém, não me submeto. Interessa conhecer a doutrina de Barbosa Moreira ou Athos Carneiro. Decido, porém, conforme minha consciência. Em relação a mim, certamente, não é, mas, para efeitos constitucionais, minha investidura obriga-me a pensar que assim seja42. Outro exemplo das práticas em testilha, máxime do ativismo judicial, segundo Streck, decorre do emblemático julgamento conjunto da ADPF 132-RJ e da ADI 4. DF pelo Supremo Tribunal Federal: 1. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). PERDA PARCIAL DE OBJETO. RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA COMO FAMÍLIA. PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES.

Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de “interpretação conforme à Constituição”. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Tornando-o, ao contrário, indevidamente alguma outra coisa, como a moral: Direito não é moral. Direito não é sociologia. Direito não é filosofia. Direito é um conceito interpretativo e é aquilo que é emanado pelas instituições jurídicas, sendo que as questões a ele relativas encontram, necessariamente, respostas nas leis, nos princípios constitucionais, nos regulamentos e nos precedentes que tenham DNA constitucional, e não na vontade individual do aplicador (mesmo que seja o STF)45.

Nessa ordem de ideias é que Lenio sustenta o direito de todo e qualquer cidadão a uma resposta constitucionalmente adequada do Poder Judiciário, que deve ser dar, em princípio, com a aplicação da lei, salvo seis hipóteses que o autor esquematiza. Já a integridade é duplamente composta, conforme Dworkin: um princípio legislativo, que pede aos legisladores que tentem tornar o conjunto de leis moralmente coerente, e um princípio jurisdicional, que demanda que a lei, tanto quanto possível, seja vista como coerente nesse sentido. A integridade exige que os juízes construam seus argumentos de forma integrada ao conjunto do direito, constituindo uma garantia contra arbitrariedades interpretativas; coloca efetivos freios, através dessas comunidades de princípios, às atitudes solipsistas-voluntaristas. A integridade é antitética ao voluntarismo, do ativismo e da discricionariedade47.

Lembrando, por oportuno, que a teoria de Dworkin vai de encontro à concepção de Alexy, sobre aplicação dos princípios através da técnico de sopesamento. Diuturnamente concretizada nos tribunais brasileiros a partir de uma ideia, quem sabe verdade sociológica já, de que sopesar princípios é a mesma coisa que refletir à luz do caso concreto e decidir qual deles deve prevalecer na espécie, mas sem eliminação de um ou outro – máxima eficácia. Assim, a criação de novos standards hermenêuticos se apresenta como um interessante mecanismo ao incremento da própria experiência jurídica, mais racional e em consonância com um rico modelo filosófico. No plano teórico, a questão se apresenta de toda valia, na medida em que consubstancia uma crítica qualificada às concepções do direito a partir dos modelos da metafísica clássica e da filosofia da consciência.

Se a concretização, porém, será possível, o tempo presente só indicia. Um importante papel já tem o novo dispositivo de lei, o art. do CPC, que evidentemente encampa a tese de Streck, sendo até uma própria emenda sugerida por esse autor. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2000. COELHO, Luiz Fernando. Teoria crítica do direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. São Paulo: Saraiva, 2008. FRANÇA, R. Limongi. São Paulo: Saraiva, 2017. GRINOVER, Ada Pellegrini Et. Alli. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2006. Hemernêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2009. MONTORO, Franco. Introdução à ciência do direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. A verdade em Carnelutti e os caminhos do processo penal brasileiro.

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